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Cartas ao irmão

RESENHA BIBLIOGRÁFICA

Cartas ao irmão

Edgard Carone

Cartas ao Irmão

Por Lafayette Rodrigues Pereira. Introdução e notas de João Camilo de Oliveira Torres; apêndice de J. Rodrigues de Almeida. São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1968. 248 p. Col. Brasiliana, 342).

A publicação das cartas do Conselheiro Lafayette ao seu irmão Washington Rodrigues Pereira representa achega ao estudo de sua biografia, mas pequena contribuição ao conhecimento da época. A correspondência totaliza 109 cartas e mais uma ao pai, e foram escritas de 1869 a 1895, num momento de grande agitação da vida política brasileira.

As cartas não refletem os grandes problemas do momento, revelam apenas esporadicamente certas questões de maior interesse. Porém, o que surge como constante é a pequena política provincial e as suas relações com a política da Corte, as relações entre cargos e interesses econômicos, a condição da mulher e do casamento, a nomeação do presidente da província e suas relações com os grupos locais, as eleições e os acordos, etc.

É assim que o livro nos informa mais sobre detalhes da pequena política ou do incidente menor. Os exemplos abundam no decorrer de toda correspondência: ao informar o irmão sobre o cargo de inspetor da mesa de rendas, que o presidente de Minas oferecera a Washington, Lafayette diz que é "excelente lugar; dá bastante influência na província. Só tem um defeito e vem o ser - estar na inteira dependência do presidente e portanto precário para quem tem uma opinião política. Eu desejava ver-te juiz de direito, mas enfim, creio que não irás caminho errado se aceitares a nomeação de inspetor. Torno a repetir - como lugar de influência política é excelente".

Outro detalhe sintomático, que aparece ilustrado em vários lugares, é o da questão da nomeação do presidente da província e a problemática dos interesses locais: como se sabe, a nomeação era feita pelo Imperador, e o comum era que o indicado não estivesse ao par dos problemas específicos da província, nem do equilíbrio de forças existentes. Daí o envolvimento, às vezes prejudicial, que sofria o recém-nomeado presidente da província, e a política particularista adotada nesta circunstância. Quando trata da nomeação do Barão de Vila da Barra para presidência da Província do Rio de Janeiro (1876), Lafayette torna claro esta condição, quando diz que o barão é "excelente homem, mas estranho à chicana política e portanto fácil de ser enganado".

As eleições é que aparecem como exemplo de jogos de interesses mais complexos. A política pessoal sobrepassa à partidária, o que leva os entendimentps e acordos a serem rompidos com facilidade, como aparece em vários momentos do livro. Candidato por Minas Gerais, nas eleições de 1876, Lafayette fizera a campanha eleitoral, certo do apoio dos seus correligionários do Partido Liberal; escreve "800 cartas para todos os colégios da província". Mas, os resultados das eleições são negativos, pois, "até ontem, o resultado da apuração dos colégios conhecidos me era favorável; mas hoje o resultado do colégio de Sabará e Santa Luzia desequilibrou-me completamente. É uma traição indigna de Assis Martins. Temendo ser cortado no Serro, Diamantina e São João Batista, onde os católicos não filaram um só voto, o J. Martins sacrificou-me e ao Afonso Pena para dar votos ao Mariz Águia. . . chefe dos católicos do Serro. Mas há de pagar caro essa indignidade. Eu, Pena e Prados (igualmente traído) nos ligaremos na primeira oportunidade. Além disso, o Lobo por sua parte lhe tomará conta". Em outra carta diz ainda esperançoso: "o antigo 2º distrito me tem sido terrivelmente hostil. Em Santa Luzia só tive 5 votos, em Sabará 13, em Sete Lagods 7 e agora no Pará 1. Acredito que nisto andou dedo de J. Martins, porque por toda a província os liberais receberam bem o meu nome".

O Conselheiro Lafayette é um dos signatários do famoso Manifesto Republicano de 1870, que abre perspectivas novas no movimento político brasileiro. Na correspondência não aparece o mínimo índice de suas atitudes republicanas, somente sendo assinalada, numa única nota, a existência do manifesto do Centro Liberal (1868).

Seu casamento mostra, por sua vez, a problemática social da mulher e as condições institucionais vigorantes, aparecendo claramente a ligação entre contrato de casamento e dote, traço comum na sociedade européia da época. "Estou de casamento justo com a Exma. Sra. D. Francisca Coutinho, menina de dezenove anos de idade, formosa como um anjo caído do céu, de uma educação primorosa, modesta, singela, inteligente, amiga da economia, de costumes puríssimos e habituada a viver longe do bulício do mundo. . . é filha legítima do Dr. José Júlio de Freitas"Coutinho, antigo advogado nesta corte e sogro de Silveira Martins. É uma moça tal como eu sempre imaginara para minha mulher, boa, santa e capaz de viver de pouco. É a filha mais moça e herdeira da terça parte do pai".

Os dados sobre os infortúnios da jovem República, a sua atuação durante a Missão ao Chile, e as notas relativas ao Gabinete dirigido por ele (1883) completam o ciclo de informações desta correspondência inédita, publicada atualmente.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Maio 2015
  • Data do Fascículo
    Jun 1972
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