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Exige a automatização maiores qualificações?

ARTIGOS

Exige a automatização maiores qualificações?

James R. Bright

Professor-Adjunto de Administração de Emprêsas da "Graduate School of Business Administration" da "Harvard University"

Esta pergunta é tão importante que não pode ser respondida com argumentos mal fundamentados. A análise crítica fornece-nos respostas surpreendentes.

* Exige a complexidade da maquinaria automática retreinamento extenso da mão-de-obra?

* Estará ao desemprêgo o trabalhador não qualificado?

* Causarão as necessidades de manutenção e as dificuldades técnicas, mudança radical na composição da mão-de-obra?

* Em que base deveriam ser distribuídos os aumentos de produtividade decorrentes da automatização?

* De que forma a nova natureza do trabalho afetará nossas diretrizes atuais de salários e de avaliação de cargos?

Grande parte da celeuma em tôrno da automatização diz respeito ao impacto que causa na mão-de-obra e, portanto, na sociedade. As perguntas acima representam pontos-chave da controvérsia levantada pela suposição de que a automatização exige maiores qualificações.

Embora pareça óbvio e lógico que a maquinaria automática resulte em necessidade de maior habilitação da mão-de-obra, pode-se afirmar que assim seja? Nosso ponto de vista é de que não - de que, a despeito de algumas exceções, a realidade está mais próxima do inverso. Segue-se, então, que muitos administradores podem cometer erros sérios em diretrizes de salários, no recrutamento de pessoal, em negociações contratuais com a mão-de-obra, nas relações sindicais e no planejamento de programas de treinamento, devido à incompreensão do impacto da automatização neste sentido.

É mesmo possível que se adote legislação social que, devido à falta de consideração crítica dos verdadeiros fatos, seja injusta e defeituosa.

Um dos objetivos dêste artigo é apresentar uma hipótese quanto à forma por que a automatização afeta a contribuição humana às tarefas da produção. Esta hipótese ajuda a explicar muitas das conseqüências da automatização sôbre a mão-de-obra, sôbre sua qualificação e seu treinamento, que contradizem outras hipóteses e afirmação generalizadas.

VERDADE E CONSEQÜÊNCIAS

O pensamento popularizado é tão persuasivo e simples que quase todos tendemos a aceitar, ou pelo menos a não refutar firmemente, as conclusões a que leva. No tópico que ora examinamos, essas conclusões se encontram repetidamente nos testemunhos levados ao Congresso quando êste examina o assunto, em muitos manifestos de sindicatos, em discursos e artigos diversos e em numerosas declarações de administradores, engenheiros, economistas, e estudiosos da administração. (1 1 ) Vide Automation and Technological Change, Hearings before the Subcommittee on Economic Stabilization to the Joint Committee on the Economic Report, 84th Congress, First Session, págs. 106, 273 etc. ) Se bem que haja muitas variedades de opiniões nesta escola, de pensamento, para encontrar pontos de vista diferentes teremos que procurar muito e bem na literatura atual sôbre automatização. (2 2 ) Vide Arthur M. Turner, "A Researcher Views Human Adjustment to Automation", Avanced Management, maio de 1956, pág. 21. ) Em seus têrmos mais simples, o raciocínio é o seguinte:

1. A automatização resulta em maquinaria de natureza mais complexa, dirigida por contrôles altamente automatizados. Tanto a maquinaria quanto os dispositivos de contrôle são mais complexos e sofisticados em sua ação e devem ser cuidadosamente integrados para funcionarem bem.

2. Portanto, a mão-de-obra que trabalha com êste equipamento deve ter um grau superior de conhecimento, maior treinamento, maiores habilidades e mesmo novos níveis de instrução. Assim, a natureza de cada uma das funções de fabricação exigirá, em geral, maiores qualificações.

3. As emprêsas terão, portanto, que empregar maior número de operários habilitados. O efeito da maquinaria automática será eliminar muitos trabalhadores, que serão substituídos por operadores altamente habilitados. Ao mesmo tempo, haverá, em relação à mão-de-obra, uma proporção maior de pessoal de manutenção. A mão-de-obra da fábrica será, obviamente, mais qualificada e isto será essencial e inevitável.

Desta conclusão surgiram dois pontos de vista gerais. Muitos administradores, fabricantes de maquinaria, engenheiros e entusiastas da automatização têm afirmado que a necessidade de maior habilitação é uma bênção da automatização, pois libertará a mão-de-obra de trabalho rotineiro, monótono e repetitivo; que os níveis superiores de educação e treinamento merecem e trarão maior prestígio e remuneração para o trabalhador; que a automatização deveria ser bem aceita, pois levará a mão-de-obra a posição econômicas e sociais de maior gabarito, dignidade e satisfação.

O outro ponto de vista - veementemente defendido por muitos líderes sindicais, mas também apoiado por muitos sociólogos, psicólogos, escritores e até alguns políticos - tem origem nas mesmas premissas e conclui: exatamente! O trabalhador médio não só será deslocado pelo equipamento automático de produtividade maior, mas também barrado da fábrica, pois lhe faltam a instrução, o treinamento e a capacidade necessários para o exercício de funções automatizadas. A fábrica automatizada se torna, então, numa "zona tecnológica" vedada ao homem comum. Esforços intensos de retreinamento e leis para amparar a mão-de-obra são, portanto, uma urgente necessidade social.

Repousam tais generalizações em bases sólidas? Em que premissas fundamentais se apóiam? Há diversas suposições, neste raciocínio, que parecem estar ligadas:

1. A maquinaria automática exige níveis mais altos de qualificações e/ou treinamento do trabalhador que o equipamento antigo.

2. A manutenção da maquinaria automática exige, em relação à antiga, maior atenção e/ou qualificações superiores.

3. Há necessidade de mais engenheiros e técnicos para planejar, construir, instalar e operar maquinaria altamente automática de produção.

4. Estas transformações estão ocorrendo em porcentagens significativas e em pouco tempo.

5. A mão-de-obra atual não pode atender à nova demanda, pelo menos sem retreinamento intenso.

6. As condições na emprêsa são tais que haverá, tão logo seja adotada a automatização, uma substituição líquida e certa da mão-de-obra não habilitada por operários qualificados.

REPUTAÇÃO DAS CRENÇAS GENERALIZADAS

Nos diversos anos que passamos pesquisando problemas da administração em fábricas "automatizadas" e examinando o assunto com industriais e outras pessoas ligadas direta ou indiretamente à atividade empresarial, não achamos que a necessidade de maior capacidade fôsse tão extensa quanto se poderia crer. (3 3 ) Vide resultados desta pesquisa em James R. Bright, Automation and Management, Division of Research, Harvard Business School, Boston, 1958. )

Ao contrário, havia mais evidência de que a automatização reduzira as exigências de qualificação da mão-de-obra de operação e, ocasionalmente, de tôda a mão-de-obra da fábrica, inclusive da ligada à manutenção. Observamos inúmeros casos em que foi desmentida pelos fatos a crença da administração de que a automatização exigira um gabarito mais alto de mão-de-obra. Outros administradores admitiram que haviam cometido erros substanciais ao atribuir altos níveis salariais a algumas funções automatizadas. Êsses níveis salariais não só eram muito altos em relação à dificuldade das tarefas, mas também injustos em comparação aos salários de empregados que trabalhavam com maquinaria convencional. Como veremos adiante, o tempo de treinamento para algumas das funções-chave foi muito reduzido, em comparação ao que se exigia anteriormente.

Tínhamos, aqui, uma série de resultados que se opunham frontalmente às crenças mais comuns. Êsses resultados colocavam em dúvida a verdade ou, pelo menos, a aplicabilidade universal da suposição de que a fábrica automatizada exige mão-de-obra mais altamente qualificada. Não negamos que houvesse exemplos de aumentos de qualificação decorrentes da automatização. Pareceu-nos, contudo, que sua importância foi superestimada.

Uma conclusão importante dêsse estudo é a de que a automatização não redunda inevitàvelmente em falta de oportunidade para a mão-de-obra não qualificada. Ao contrário, a maquinaria automatizada tende a exigir menor habilidade do operador, depois que são atingidos certos níveis de mecanização.

Parece-nos que o trabalhador médio será capaz de perfazer diferentes tarefas mais rápida e fàcilmente com o uso de maquinaria altamente automática. Muitos cargos-chave especializados que exigem atualmente longo treinamento e experiência, serão reduzidos a tarefas de atendimento de máquinas, de fácil aprendizagem. Para entender de que forma isto acontece, examinaremos as exigências que a maquinaria automática realmente faz do trabalhador.

O "OPERÁRIO QUALIFICADO"

A melhor forma de começar talvez seja a de perguntar: que espécies de contribuições dá o operário para as tarefas da produção? Ou, ainda melhor, por que contribuições é êle pago? Na lista geral de coisas pelas quais êle recebe pagamento, podemos incluir:

1. Esfôrço físico - dispêndio de energia pela movimentação do corpo, para manipular materiais e ferramentas, ou controlar as condições do ambiente.

2. Esfôrço mental - uso da capacidade mental para perceber e analisar as exigências do trabalho e para agir no sentido adequado; implica também em atenção e concentração.

3. Habilidade manual - emprêgo de destreza física especializada.

4. Habilidade geral - compreensão e capacidade numa tarefa que não pode ser aprendida fàcilmente pela rotina mecânica ou pela análise formal. Esta habilidade é semelhante à competência na arte.

5. Educação - conhecimento e competência no uso de teoria formal aplicável à tarefa.

6. Experiência - habilidade, compreensão e julgamento que resultaram da prática do trabalho.

7. Riscos de Acidentes - condições extraordinárias em que é pequena a segurança do operador.

8. Condições indesejáveis de trabalho - condições desagradáveis de ambiente ou arranjos físicos que exigem consideração especial.

9. Responsabilidade - grau em que o trabalhador controla a segurança, a qualidade e a produtividade da atividade com respeito a pessoas, equipamento e/ou materiais.

10. Decisão - grau em que o operano deve ou pode fazer julgamentos que podem afetar de maneira significativa o bom funcionamento do trabalho.

11. Influência na produtividade - grau em que o trabalhador eleva a produtividade acima de um padrão esperado, por meio de esfôrço, habilidade, conhecimento e capacidade extraordinários.

12. Antigüidade - medição mecanística de serviço que presumivelmente reflete maior contribuição do operano em alguns dos fatôres acima e, possivelmente, também um prêmio pela dedicação.

Se bem que esta lista possa ser criticada em seus pormenores, seu conceito parece ser válido: o de que há diferentes atividades físicas e mentais com que o trabalhador pode contribuir para uma tarefa de produção. O desacôrdo quanto a essas atividades ou às definições que para elas sugerimos, indica que a expressão "operário qualificado" tem uma conotação altamente subjetiva. Essas palavras não são usadas com sentido único, quer pelos teóricos, quer pela indústria.

É evidente que nem tôdas essas exigências ou contribuições são igualmente importantes numa dada tarefa, assim como é óbvio que elas não têm importância relativa constante nas diferentes tarefas. Mesmo numa atividade simples, a contribuição do operário pode variar, dependendo do equipamento usado. É diferente, por exemplo, o esfôrço físico de um trabalhador de construção que use pá e carrinho de mão, da capacidade, esfôrço mental e experiência exigidos para o uso de motoniveladora nas mesmas tarefas. Logo, a fim de entender como a automatização afeta as qualificações da mão-de-obra, devemos considerar de que maneira cada uma das exigências de uma dada tarefa é afetada pelo maior grau de mecanização e de contrôle automático. De que forma é a natureza da função modificada pela maior sofisticação de um mecanismo qualquer?

DIMENSÕES DA MECANIZAÇÃO

A mecanização não é igual em todos os sistemas de produção. Uma linha de produção é mais "mecanizada" que outra. Onde está a diferença? Parte da explicação é que a mecanização tem, pelo menos, três qualidades ou dimensões fundamentais:

a) Amplitude - grau em que a mecanização se estende na seqüência de etapas da produção.

b) Nível - grau de mecanização com que uma dada ação da produção é realizada (refletindo, pois, em parte, o fato de que o contrôle automático faz com que a adaptação da maquinaria às condições do ambiente seja mais sofisticada).

c) Penetração - grau em que tarefas secundárias e terciárias de produção, tais como lubrificação, ajuste e consêrto, são mecanizadas.

O conceito de nível, que é o aspecto que tem maior impacto no operador, é baseado na suposição de que há diferentes graus de mecanização da maquinaria. Podemos conhecer êsses graus se respondemos à seguinte pergunta: de que forma a maquinaria suplementa os músculos, os processos mentais, o julgamento e o grau de contrôle do homem?

Podemos examinar as características do desempenho mecânico pela análise da forma pela qual as ferramentas refinam e suplementam as habilidades do homem. Esta análise, resumida, dá-nos a possibilidade de ràpidamente verificar a relação entre as contribuições do homem e da máquina, à medida que aumenta a automatização. (Vide Quadro I.) É evidente que há uma evolução de um nível para outro:


Primeiro, há a substituição do esfôrço manual pelo poder mecânico, o que retira um pouco da carga do trabalhador (depois do Nível 2).

Segundo, à medida que graus maiores de contrôle fixo resultam na ação desejada da máquina, o trabalhador passa a dar menos e menos orientação à ferramenta (Níveis 5-8).

Terceiro, à medida que a maquina adquire capacidade de medição, parte das informações que servem de base para decisão é mecânicamente obtida do operador (depois do Nível 8).

Quarto, à medida que a máquina chega a níveis mais altos de automatização, mais e mais decisões e contrôles são tomados e feitos mecânicamente (isto é, pelos mecanismos). Por exemplo: à medida que a seleção de velocidades de contrôles de temperatura de máquina, por exemplo, é mecanizada, deixam de ser exigidos do operário julgamentos, decisões, experiência e mesmo atenção. (Níveis 12-14.)

Quinto, a máquina adquire o poder de "autocorreção" em pequena e depois em grande parte (Níveis 15-17), até que a atividade de ajustá-la não é mais exercida pelo trabalhador.

Não é necessário que se aceite nossa classificação de "níveis" para que se entenda o ponto fundamental. O desempenho da maquinaria pode ser classificado de outras maneiras, mas qualquer que seja a classificação adotada, a observação cuidadosa levará à conclusão de que o progresso no sentido da automatização geralmente reduz as funções do operador. Em outras palavras, parece-nos que, quanto mais automática fôr a máquina, menos terá a fazer o seu operador.

Havíamos dito, contudo, que reconhecíamos que a contribuição do operário à tarefa incluía mais do que simplesmente "habilidade" ou "esfôrço". A pergunta a fazer, então, é a seguinte: de que forma cada uma das doze possíveis contribuições que aqui arrolamos pode ser afetada pelo maior grau de mecanização? Parece claro que algumas contribuições diminuirão com a maior automatização, mas talvez haja outras que aumentarão.

Não nos parece que seja possível fazer medições quantitativas precisas, pelo menos nesta fase de conhecimento, mas é importante examinarmos diferentes tipos de contribuições formulando hipóteses quanto à maneira pela qual serão afetadas pelo maior grau de mecanização.

ESFÔRÇO FÍSICO, TREINAMENTO E EDUCAÇÃO

Se representarmos gràficamente o esfôrço físico feito pelo trabalhador e o nível de mecanização (vide Gráfico 1), é claro que teremos uma curva descendente. Isto quer dizer que o esfôrço físico despendido pelo trabalhador é maior nos níveis mais baixos de mecanização, diminuindo assim que chegamos às máquinas de ciclo fixo do Nível 5. Deve-se notar que não se exige pràticamente nenhum esfôrço físico do operário depois que é atingido o contrôle inteiramente automático do Nível 12.


Quanto à necessidade de conhecimento, não é correto, que, à medida que encontra equipamento mais complexo, precisa o trabalhador de maior treinamento a fim de compreender a operação da máquina, seu ajuste e sua aplicação à tarefa? Pois não deve êle aprender de que forma a máquina funciona e como usá-la para uma variedade de operações? O treinamento de um meio-oficial de máquina, por exemplo, leva até quatro anos.

Nos níveis mais baixos de mecanização, é claro que, à medida que cresce a complexidade do equipamento, o trabalhador deve ter maior treinamento e educação. Quando o equipamento é motorizado e quando se usam dispositivos de adaptação e regulagem que exigem ajuste cuidadoso para obter-se o uso adequado, o operário obviamente deve aprender mais sôbre a maquinaria - talvez muito mais, se o equipamento fôr complexo. Êle também precisará, talvez, de maior treinamento para entender os princípios que se aplicam à operação e ao ajuste da máquina. Dessa forma, a necessidade de treinamento e instrução definitivamente cresce.

Porém, continua essa necessidade a aumentar à medida que a automatização atinge níveis mais altos? Aparentemente não. No campo da indústria mecânica e em muitos outros equipamentos, o efeito do ciclo automático (Nível 6) é a substituição dos trabalhadores menos treinados ("operadores de máquinas") por oficiais. (4 4 ) Vide exemplos em Automation and Technological Change, Congressional Hearings, op, cit., pág. 254. ) A razão é óbvia: quando uma rotina de ações predeterminadas pode ser atingida mecânicamente, não há necessidade da compreensão, treinamento e educação que eram exigidos do operador quando tinha o ajuste e o contrôle em suas mãos.

Assim, em algum ponto situado além do Nível 4, a necessidade de instrução do trabalhador deixa de crescer. Depois dos níveis de mecanização em que há a introdução de medições (etapas em que a máquina dá sinal quando necessita de decisão humana), o julgamento crítico exigido do operador na realidade diminui. Aqui, novamente, é certo que o grau e ponto de mudança variam com o equipamento, mas o efeito comum parece ser uma curva ascendente e depois descendente. (Vide Gráfico 2.) Em muitos casos, a necessidade de educação e compreensão de princípios pode continuar até os níveis mais altos. Todavia, essas contribuições podem tornar-se desnecessárias à medida que cresce a perfeição do equipamento.


ESFÔRÇO MENTAL E OUTRAS CONTRIBUIÇÕES

Uma das principais conclusões do estudo apresentado por CHARLES R. WALKER em "Toward the Automatic Factory" (5 5 ) New Haven, Yale University Press 1957; vide também Charles R. Walker, "Life- in the Automatic Factory", Harvard Business Review, Janeiro-fevereiro de 1958, pág. 111. ) é a de que o esfôrço mental deve aumentar substancialmente com a automatização. Muitos manifestos de sindicatos também insistem em que o "cansaço mental" do trabalhador é a maior exigência imposta pela maquinaria automática. O que realmente acontece quando comparamos o esfôrço mental aos níveis de mecanização?

Òbviamente, quando trabalha com ferramentas manuais (Níveis 2 e 3) e com ferramentas motorizadas de contrôle manual (Nível 4), o operário deve concentrar-se a fim de evitar o emprêgo errado das ferramentas, para "controlar" a atividade e detectar condições que possam interromper o bom funcionamento. Quando a máquina tem capacidade de estabelecer ciclos automáticos através da seqüência desejada de operações (Níveis 5 e 6), a necessidade de concentração para direção real do equipamento é diminuída; ao mesmo tempo, porém, é possível que a atenção aos erros no funcionamento, à qualidade do produto etc. seja uma tarefa mental mais difícil, pelo menos em alguns casos, devido a haver ciclos mais rápidos. Assim, nestes níveis, pode ser real o maior cansaço mental.

Consideremos agora o que acontece quando, nos níveis mais altos de mecanização, a máquina tem capacidade de medição. A máquina começa a detectar e a registrar o caráter de algumas das condições de operação. Logo, o operador não mais necessita estar tão alerta (dependendo de que características são medidas e assinaladas). Em alguns casos, com válvulas de segurança, por exemplo, o trabalhador não precisa concentrar-se até que lhe seja dado o sinal de aviso. Muitos trabalhadores de linhas de fabricação altamente automatizadas, em que são empregados aparelhos de inspeção e registro, reconheceram êste efeito da automatização. Êles declararam que acharam muitos dêsses trabalhos mais interessantes e menos tediosos, porque não exigiam tanta concentração. A atenção, a concentração e o esfôrço mental faziam-se necessários apenas no momento em que era assinalado desempenho defeituoso.

As exigências de esfôrço mental tendem a diminuir ainda mais à medida que são atingidos níveis mais altos de mecanização. Aqui, a máquina não apenas detecta a necessidade de modificação no seu desempenho, mas também começa a fazer essa modificação sem atenção humana. Podemos dizer que, nos Níveis 9-11, a máquina necessita de ajuda humana. Nos Níveis 12-17, a maquinaria se ajusta na medida do necessário, de maneira cada vez mais sofisticada. Por definição, as máquinas mais automáticas empregam dispositivos de contrôle que regulam seu desempenho de forma a atingir o fim desejado sem atenção humana. Logo, o cansaço mental resultante de esfôrço mental é finalmente reduzido.

Como se pode afirmar, então, que o cansaço mental continua a crescer com a maior automatização? Tomemos 051 resultados a que chegou CHARLES WALKER. Se os examinamos de perto, verificamos que êles não são absolutamenrs contraditórios. Isto porque, de acôrdo com o que indica a descrição de WALKER, a usina de aço que êle estudou não estava no Nível 17, ou mesmo no Nível 12, de operação. A mecanização era interrompida em diversos pontos, grande parte da maquinaria operava nos Níveis 5 e 6 e somente em alguns casos, na seqüência de fabricação, atingia ou excedia o Nível 12. O aumento de cansaço mental era resultado não do fato de que o equipamento era mais automático, mas de que não era suficientemente automático! Era maior, mais integrado, mais rápido, mas havia maior número de problemas de "contrôle" - agora mais críticos do que nunca, devido à possibilidade de erros graves decorrentes da maior fôrça e velocidade - nas mãos dos operários. Mesmo assim, depois que os operadores se acostumaram ao equipamento, houve - nossa inferência é feita a partir da descrição de suas reações - muito menor cansaço mental.

Em suma, é admissível que a curva apresentada no Gráfico 3 seja típica da relação entre esfôrço mental e automatização.


Por outro lado, pode-se considerar que a responsabilidade aumenta com o equipamento mais caro e mais integrado. Todavia, ela aumenta apenas na medida em que o operário realmente a tenha, sendo o efeito final dos níveis mais altos de automatização o de removê-la das mãos do trabalhador. A detecção de operação defeituosa, sobrecargas, mau funcionamento, faltas de material, mudanças de material, necessidades de fôrça etc., gradualmente passa a fazer parte da função da máquina. Em algum ponto além do Nível 11 ou 12, o mecanismo de contrôle tem a responsabilidade, não o operador.

O mesmo pode ser dito da habilidade de "manipulação". Até o Nível 5, a necessidade de destreza manual pode aumentar, mas acima dêsse ponto a máquina passa a fazer mais e mais. A necessidade de habilidade "geral" aumenta até mais ou menos o Nível 11, onde a máquina começa novamente a fazer mais e essa necessidade decresce. Grande parte da confusão quanto ao efeito da automatização nas qualificações surge, na realidade, de um problema de definição e, particularmente, da falta de reconhecimento da distinção entre as funções do operador e as do mecânico de manutenção, do especialista em contrôle de qualidade e de outros que fazem parte da mão-de-obra indireta.

Poderíamos fazer comparações semelhantes com respeito às demais contribuições arroladas. Se bem que não se possa obter uma curva que seja aplicável a todos os tipos de maquinaria, acreditamos que quase tôdas as curvas mostrariam as mesmas características gerais, ou seja, elas seriam descendentes, nos níveis mais altos de mecanização, para a maioria das contribuições do operário. Assim, no Quadro II, indicamos o caráter da contribuição do trabalhador nos diferentes níveis de mecanização.


CONTRIBUIÇÕES DO OPERÁRIO

Na realidade só raramente as funções da produção exigem apenas uma espécie de contribuição por parte do trabalhador. Elas incluem várias combinações dessas contribuições, em graus diferentes. Assim, é necessário considerar seu efeito conjugado. Isto foi o que fizemos no Gráfico 4, com diversas curvas que indicam o efeito geral da contribuição do trabalhador à medida que aumenta a automatização. Se bem que não seja possível provar quantitativamente que estas curvas estão corretas, elas foram baseadas em nossas observações de exigências reais de trabalhos automatizados na indústria. Para citar vapenas alguns dos muitos exemplos que encontramos:


* Na fabricação de um gabarito, o sistema convencional exigia, para a montagem de 800 unidades por hora, sete operadores. As operações eram as seguintes: montagem manual de pinos em isoladores, montagem manual de gabarito, rebite manual da montagem do isolador e perfuração do mostrador com uma prensa manual. O nôvo sistema exige cinco operadores fazendo funcionar uma linha de montagem altamente automatizada que produz 1.200 unidades por hora. As operações manuais são agora as seguintes: montagem dos rebites, da placa de suporte e do isolador e colocação dêste conjunto numa nacela. Mais adiante na operação, enquanto o produto está na linha, os operadores juntam o fio de ligação e o terminal, e colocam o gabarito no isolador acabado. Tôdas as outras operações são automáticas. O resultado dêste progresso na automatização é a redução do esfôrço físico na montagem, a diminuição da necessidade de atenção na colocação de peças, a eliminação do esfôrço de rebitagem, a redução da necessidade de precisão e esfôrço na perfuração e a eliminação de grande parte da manipulação. A operação é muito mais produtiva e, ainda assim, aquilo que os operadores fazem não exige diferentes qualificações, é mais simples, ou exige menos esfôrço e menor atenção.

* Antigamente, um enrolador de bobinas tinha que ter muita destreza e que trabalhar muito e atentamente para produzir 160 bobinas por hora, com as seguintes operações: a) descascar o isolamento; b) fixar o fio descascado na bobina; c) iniciar o enrolamento das bobinas; d) carregar e descarregar as bobinas no ritmo exigido pelo trabalho. Hoje, dois operadores podem manejar uma máquina automática de enrolamento que produz 1.200 bobinas por hora. Quais são seus deveres? O primeiro carrega as bobinas para torniquetes automáticos de abertura; o seguindo remove e recupera os fios partidos. Sua atitude no trabalho é muito mais descansada, o trabalho pode ser rápida e fàcilmente aprendido, a destreza não é extraordinária e a necessidade de concentração é menor. A máquina perfaz mecânicamente muitas das operações rápidas que antigamente exigiam grande concentração sem mudança de ritmo.

* Numa das mais modernas fábricas de motores dos Estados Unidos a linha automática de usinagem do bloco de motor é considerada como o mais perfeito exemplo de automatização. Para transformar os fresadores, os operadores de mandrilhadeiras etc. em "operadores de automatização", a emprêsa instituiu um curso de treinamento. Quanto tempo foi exigido para êsse esfôrço de retreinamento? De 4 a 24 horas, dependendo da complexidade do equipamento. Significa um curso treinamento dessa duração um aumento significativo nas exigências de qualificações? Éóbvio que não.

* Os forneiros de uma panificadora comum precisavam antigamente de três a seis meses de treinamento; alguns dirigentes da emprêsa achavam que era necessário um ano para treinar um chefe de forno. Na panificadora automatizada desta firma, porém, o treinamento de um forneiro exige agora apenas uma semana.

Os exemplos citados tendem a confirmar as relações gerais entre a automatização e as exigências de trabalho que damos no Gráfico 4. Devemos grifar a palavra "tendem", pois há certamente exceções a esta tese geral. Pode-se dizer, por exemplo, que apesar de tôdas as espécies de contrôles automáticos e de dispositivos de segurança, o pilôto de um jato de transporte de passageiros provàvelmente sentirá muito maior cansaço em virtude da maior responsabilidade que tem: êle leva mais ràpidamente um maior número de passageiros, e voa em condições de tempo mais arriscadas do que seus predecessores. Além disso, a complexidade do equipamento e a margem reduzida de êrro exigem um esfôrço grande de retreinamento se, por exemplo, êle tiver pilotado aviões do tipo DC-3. A analogia pode ser pertinente em alguns casos de novas máquinas automáticas - mas apenas numa pequena minoria.

TENDÊNCIAS OPOSTAS

Seria um êrro, pois, presumir que a redução de conteúdo do trabalho represente o único efeito da automatização. Três outras tendências deveriam ser observadas que compensarão, em alguns casos, a redução gradual da contribuição humana:

1. Responsabilidade por amplitude maior na linha. Em virtude de se exigir menos atenção numa dada máquina, o operador pode ter a seu cargo maior número de máquinas. Êle se torna responsável pelo manejo de uma parte fisicamente maior da seqüência de produção, ou por um número maior de atividades idênticas. Isto pode requerer conhecimento de outras máquinas e, portanto, maiores qualificações técnicas por parte do trabalhador; pode também exigir maior esfôrço e mais atenção. O resultado geral pode significar um aumento substancial de responsabilidade, devido à possibilidade e/ou probabilidade de dano mais custoso se o sistema que está sob seu contrôle não funcionar corretamente. Assim, à medida que o operário se torna responsável por maior número de máquinas, dois tipos de efeitos são possíveis:

a) Pode ser que êle tenha que aprender outra arte técnica de nível semelhante à que já conhece. Por exemplo: é possível que um fresador tenha que aprender a operar uma mandrilhadeira e uma furadeira se estas estão integradas pela automatização no seu pôsto de trabalho. Se bem que estas qualificações possam não ser mais difíceis ou graduadas, elas são, definitivamente, exigências adicionais, que requererão, talvez, treinamento adicional;

b) Pode ser que êle tenha que aprender uma operação que inclua uma qualificação muito mais graduada. Não encontramos muitos casos desta natureza em nosso estudo. Um exemplo foi o de um operador de um painel de contrôle numa fábrica de fertilizantes: o contrôle semi-automático do mecanismo de mistura exigia mais compreensão, atenção e responsabilidade de parte do individuo.

2. Responsabilidade por deveres de mais alto nível. Em alguns trabalhos automatizados, as exigências de deveres convencionais são pràticamente eliminadas, mas os novos deveres do operador podem incluir uma parte do trabalho de ajuste ou de inspeção. Em outras linhas automatizadas, é possível que não haja operador no sentido convencional. O indivíduo responsável por esta área da linha de produção pode ser um ajustador ou um inspetor de qualidade. Encontramos um caso em que um mecânico de manutenção estava "operando" uma linha automática. Em outra linha, em que pistões eram usinados automàticamente até chegar a seu pêso certo, os deveres do "operador" incluíam os convencionais remanescentes e os de um ajustador. Êle punha o sistema em operação, verificava o desempenho e fazia ajustes. Tinha que ter muito maior conhecimento da maquinaria do que um operador de máquina (se bem que não necessàriamente maior do que um meio-oficial ou de um ajustador qualificado). O resultado era um maior grau de qualificação do trabalho.

A linha divisória de "ajuste" e "operação" é fina. Em muitas indústrias, um indivíduo pode perfazer a mesma função de ajuste sem precisar de conhecimento e treinamento muito superiores. Os operadores das mesmas espécies de maquinaria têxteis são um bom exemplo disso. Assim, esta fonte de aumento de conteúdo de trabalho pode não ser freqüente ou séria.

3. Acréscimo de novos trabalhos "especializados". Um efeito da graduação da automatização é criar novas espécies de trabalhos especializados. Êstes podem exigir educação muito superior, ou níveis muito mais altos de compreensão e responsabilidade. Num processo de mineração automática de carvão, o operador devia dirigir um instrumento de mineração contínuo que operava a 1.000 pés de profundidade por meio de contrôle remoto, baseado na observação do desempenho numa tela industrial de TV. Em algumas fábricas onde há muitos transportadores (como nas indústrias de montagem e nas cervejarias) e naquelas indústrias de processamento em que a fábrica é dirigida, em grande parte, de um painel central de contrôle, é evidente que a automatização criou uma nova necessidade de qualificação, educação e responsabilidade de parte do trabalhador que opera o sistema de contrôle.

Cada uma destas tendências trabalha, de alguma forma, contra as curvas descendentes que mostramos no Gráfico 4. Não deveríamos, contudo, inferir daí que elas exigirão qualificações substancialmente mais graduadas da mão-de-obra. O fato é que os trabalhos descritos não existem em grande número na indústria - mesmo em fábricas com alto grau de mecanização geral. Exemplifiquemos com a terceira categoria, isto é, tarefas especializadas no contrôle remoto das operações. Muitas vêzes uma fábrica altamente mecanizada tem apenas uma função de controlador de painéis do tipo descrito e, no máximo, alguns cargos dêsse tipo. Assim, o efeito geral da automatização em quase tôdas as fábricas que estudamos era reduzir _ ou pelo menos não aumentar - a necessidade de qualificações e habilidades de parte da mão-de-obra direta.

Assim como na fábrica, também fora dela. É o carro de hoje, com afogador e câmbio automáticos, freios e direção motorizados, mais difícil ou fácil de dirigir que um Ford "Modêlo T"? Quem necessita de maior habilidade e experiência para bom desempenho: a dona-de-casa que assa num forno automático, ou sua avó que tinha que aprender a arte de cozinhar em seu fogão a carvão através de longa experiência e que tinha de aplicar atenção contínua e crítica para obter bons resultados?

O não entendimento de que a automatização em geral tende a simplificar os deveres do operador pode levar a sérios erros de administração. Podem ser adotadas diretrizes inadequadas em acôrdos sindicais. É possível que sejam estabelecidos padrões excessivamente estritos de recrutamento. Ambos podem aumentar desnecessàriamente os custos da mão-de-obra. Níveis salariais inadequados ou injustos serão estabelecidos se o caráter da qualificação exigida pela automatização não fôr bem entendido.

MÃO-DE-OBRA INDIRETA

Qual é o efeito, nas qualificações, da mudança de pessoal de mão-de-obra direta para funções de mão-de-obra indireta?

À medida que a automatização substitui o operador de máquina, a linha entre a mão-de-obra direta e indireta se torna difícil de distinguir. É o operador um ajustador ou o ajustador um operador? Qualquer que seja a resposta a esta pergunta, uma modificação importante na qualificação se toma evidente na preparação e ajuste de máquina, que são muitas vêzes mais complexos, difíceis e exigem maior variedade de competência e conhecimentos técnicos. Isto não se deve somente à complexidade do equipamento, mas ainda mais à existência simultânea dos cinco tipos de sistemas de contrôle - hidráulico, pneumático, elétrico, eletrônico e mecânico. Além disso, devem ser sincronizados e regulados os dispositivos de alimentação automática e obtidos novos graus de precisão, por meio de ajuste cuidadoso. As maiores exigências impostas ao ajustador são muito evidentes quando uma fábrica vai do Nível4 de mecanização para o Nível 12, ou outro mais alto. Por outro lado, se o equipamento velho já exigia um alto grau de habilidade de ajuste (como, por exemplo, numa linha convencional de blocos de motores), a mudança para a automatização provàvelmente não aumenta significativamente as necessidades de qualificação e treinamento de ajustador. No caso de uma fábrica de motores recentements automatizada, por exemplo, todos os ajustadores e seus supervisores passavam por três horas de treinamento, além de fazerem o curso básico da familiarização para operadores. Significa isto que tenha havido um aumento importante na necessidade de conhecimento por parte do ajustador? Achamos que não.

Quando a mão-de-obra indireta opera com maquinaria não diretamente produtiva, como casas de fôrça e dispositivos de transporte interno de materiais, que são, em si, automatizados, o resultado é comparável ao da maquinaria da linha de produção. A exigência de qualificação aumenta até certo ponto; depois dêle, a automatização da maquinaria geralmente começa a reduzir a contribuição do operário em quase todos os aspectos.

Pode haver a criação de algumas espécies de tarefas de mão-de-obra indireta que exigem mais alto grau de instrução técnica. A programação de fitas magnéticas, por exemplo, requer, atualmente, considerável educação técnica. Essas tarefas podem ser consideradas como trabalhos de ajuste de alto nível. Além disso, é possível que o treinamento em matemática ou engenharia se torne a instrução mínima para a tradução dos resultados desejados em ordens de programação, ou pelo menos para o estabelecimento dos processos. Se bem que a evidência atual indique que apenas algumas pessoas com essa educação devam trabalhar em cada fábrica, essas tarefas poderão tornar-se tarefas-chave.

Nas emprêsas que fabricam sua própria maquinaria automática, há maior necessidade de talentos especiais para o desenvolvimento de máquinas. Tais casos constituem a principal fonte de reclamações quanto à falta de pessoal devidamente habilitado. Não se exige apenas treinamento -técnico, mas também um certo grau de visualização, imaginação e criatividade mecânica. Essas qualificações não são obtidas simplesmente pelo recrutamento de mais engenheiros, segundo nos afirmaram diversos administradores. Êstes nos disseram também que o verdadeiro ponto de estrangulamento na produção de suas fábricas estava nas áreas de concepção, desenho e construção de nova maquinaria.

Já as firmas que não construíam seu próprio equipamento - e que constituíam a grande maioria - não tinham reclamações dessa espécie.

Quanto à equipe de manutenção, como já dissemos, presume- se, em geral, que a manutenção aumentará de forma absoluta, ou pelo menos proporcionalmente, com a automatização; pois não é óbvio que a manutenção da fábrica automatizada vai exigir nova espécie de qualificações?

Essa pergunta não pode ser respondida com um simples "sim" ou "não", pois a manutenção inclui diversas espécies de qualificações que não são afetadas de modo uniforme na automatização. Por exemplo: não encontramos evidências de que funileiros, encanadores, soldadores e carpinteiros exijam maiores qualificações; encontramos alguma evidência de que os mecânicos de sistemas hidráulicos e pneumáticos necessitam de melhor treinamento por causa da maior complexidade das rêdes de canalização de contrôle; e muita evidência de que uma proporção substancial de eletricistas precisa de retreinamento completo.

O eletricista médio de fábrica não está mais preparado para lidar com a rêde eletrônica do que o eletricista comum para consertar um aparelho de TV. Êste é um mundo técnico inteiramente nôvo, que exige treinamento especializado em teoria e prática. Uma fábrica de motores estudou o problema e concluiu que seriam necessárias cêrca de 2.000 horas de aulas e de trabalho prático para dar instrução eletrônica adequada, além, naturalmente, do treinamento de três anos para meio-oficial eletricista.

Tôdas as fábricas que estudamos e que empregavam maquinaria controlada eletrônicamente, faziam esta mesma reclamação quanto às qualificações para a manutenção. A falta freqüentemente era tão crítica que destorcia as atitudes em relação a todo o problema de manutenção. É aqui que está o problema. Por exemplo: falta de qualificações para manutenção eletrônica era problema crítico numa fábrica. Todavia, um exame mais cuidadoso da questão levou à conclusão de que nem todos os eletricistas necessitavam de treinamento eletrônico. Dos 700 homens da turma de manutenção, aproximadamente 80 eram eletricistas e o engenheiro de fábrica estimou que precisava de 3 a 4 instrumentistas competentes por turno. Em outras palavras, apenas 10% dos eletricistas precisavam de qualificação especializada - e êstes representavam apenas 1% do pessoal total de manutenção!

Tais porcentagens não tornam a falta menos crítica, mas indicam uma escala bastante diferente de dificuldades e um problema de retreinamento muito menor. A automatização também indica a necessidade de um nôvo tipo de instrumentista: aquêle com competência nas cinco espécies de rêdes de contrôle que notamos acima. A razão para esta nova exigência é que é muito caro usar uma turma de instrumentistas ou uma série de especialistas - cada um chegando mais adiante no problema da máquina defeituosa e verificando que sua qualificação não é suficiente. As implicações quanto ao tempo de parada de máquina, neste processo, são mais problemáticas com o desenvolvimento da mecanização. A obtenção desta espécie de qualificação para manutenção inclui um problema de treinamento e de relações com o sindicato que muito poucos administradores tentaram - e ainda menos - conseguiram resolver.

EFEITO QUANTITATIVO

A automatização resultou num aumento na quantidade e na porcentagem da mão-de-obra dedicada à manutenção em diversos casos que estudamos - e numa diminuição substancial em muitos outros. Assim:

* Uma fábrica de revestimentos quadruplicou seu pessoal de manutenção e aumentou sua produção em 50% com o mesmo número de empregados. A manutenção representa agora cêrca de 15% da mão-de-obra.

* Numa indústria mecânica de grande porte, o pessoal de manutenção aumentou de 700 para 900, ao mesmo tempo que houve uma redução da mão-de-obra direta. A nova mão-de-obra era composta de cêrca de 30% de pessoal de manutenção, enquanto que na operação anterior e equivalente representava cêrca de 10%.

* Uma panificadora dobrou seu pessoal de manutenção, ao passo que reduziu sua mão-de-obra em 35%. A manutenção representa agora aproximadamente 8% da mão-de-obra.

Por outro lado, as seguintes firmas declararam que não tiveram que aumentar sua equipe de manutenção:

* A refinaria mais automática - dentre as pequenas - dos Estados Unidos tinha em 1954, uma turma de manutenção que representava 21% da mão-de-obra. As refinarias convencionais mostram um índice de 50-60%.

* Duas grandes fábricas de auto-peças, empregando cada uma mais de 10.000 pessoas, devotaram sua atenção à produção automática desde 1946. Ambas são bem conhecidas nos círculos da engenharia por realizações importantes na automatização e usam centenas de máquinas altamente mecanizadas. Ambas as equipes de manutenção são caracterizadas por uma particularidade - ausência de modificação. A turma de manutenção permaneceu nas porcentagens de 3.½ a 5% da mão-de-obra numa delas e de 6 a 8% na outra. nos últimos doze anos de mecanização intensa com maquinaria automática.

Estas e outras experiências indicam que o efeito da automatização na manutenção tem sido mal compreendido. Por quê? Pensamos que uma das razões tem sido a falta de apreciação da verdadeira natureza do "problema" de manutenção. Uma emprêsa sente que há diferença nos efeitos sôbre a manutenção "antes" e "depois" da automatização. É o grau desta diferença que ajuda a criar o "problema", não o grau absoluto da automatização empregada. Êste contraste é proporcional à combinação de uma série de fatôres que aumentam e diminuem a manutenção. (6 6 ) Vide em James Bright, op. cit., pág. 165, quadros de fatôres que aumentam e diminuem a manutenção. )

Exemplificando: um dos efeitos da automatização é comprimir a linha de produção e reduzir literalmente a quantidade física total de maquinaria para uma dada produção, se bem que a maquinaria possa ser mais complexa. Assim, em diversos casos, a equipe de manutenção foi reduzida simplesmente porque o volume total da maquinaria diminuiu. Esta redução compensou muito bem a maior complexidade do equipamento.

Da mesma forma, a manutenção não é proporcional à automatização da maquinaria, como instintivamente tendemos a supor, porém mais certamente um reflexo da novidade ou particularidade do equipamento. Se bem que a maquinaria altamente automática dê muito pouco trabalho quando aperfeiçoada, a manutenção de. uma máquina especial pode ser extremamente cara e dar lugar a frustrações, pois ocorrem muitas dificuldades e inúmeros tempos perdidos de produção enquanto se aperfeiçoa o desenho e se ganha experiência de manutenção.

ENGENHEIROS E TÉCNICOS

Há necessidade de maior número de engenheiros e técnicos para projetar, construir, instalar e operar maquinaria altamente automática de produção? Se a fábrica constrói seu próprio equipamento automático, é possível que sejam necessários mais projetistas e construtores - mas não muitos mais. Por exemplo: o programa de automatização de uma fábrica de 10.000 homens resultou no acréscimo de uma seção de construção de máquinas de 63 pessoas. Esta pequena proporção era típica das poucas firmas desta categoria que observamos. Os números de técnicos necessários, naturalmente variavam com a intensidade da atividade de construção de máquinas. Esta atividade poderia, teoricamente, ser grande, mas comumente era limitada pelo pessoal e orçamento disponíveis.

Aquelas firmas que não constroem sua própria maquinaria automática não contratarão, obviamente, projetistas e construtores, mas precisarão elas de maior auxílio técnico nas operações? Em alguns casos, observamos que os mestres faziam trabalhos mais complexos. Aqui e ali engenheiros foram contratados como supervisores de linha e de manutenção. Se bem que o número de tais casos fôsse, pequeno, notava-se que a falta de supervisores treinados de forma adequada era uma das principais queixas da administração. Os ingredientes que faltavam, diziam os administradores, eram atenção, percepção e julgamento com respeito à operação do equipamento e às implicações de tempo de parada de máquina. "A habilidade de prever - de planejar, em vez de viver o dia a dia - é o que o velho mestre de linha não tem."

A despeito dêsse sentimento, era de se notar que quase tôdas as emprêsas continuavam - e bem - com seus mestres antigos. Em suma, não nos parece que a emprêsa que adote a automatização tenha que contratar muitosou poucos - engenheiros, a menos que pretenda desenvolver ou construir seu próprio equipamento automático.

Vemos, pois, pouca justificação para a crença generalizada de que a mão-de-obra atual seja aproveitável em fábricas automatizadas apenas com retreinamento extenso, ou que haja uma grande falta de qualificações para a nova fábrica automatizada. As 13 fábricas que estudamos empregavam cêrca de 50.000 pessoas. Seus sistemas automatizados de produção incluíam aproximadamente 5.000 pessoas e eram atendidos por 2.000 a 3.000 homens de "manutenção" (as funções de limpeza impediram a identificação precisa). Encontramos menos de uma dúzia de casos em que a operação exigia novos níveis de qualificações da mão-de-obra direta ou indireta.

Observamos cêrca de 50 casos de deficiências sérias de qualificações para a manutenção. Êstes refletiam, em grande parte, a falta de treinamento em eletrônica.

No todo, portanto, estas observações limitadas e a teoria que aqui apresentamos indicam que a automatização não resulta necessàriamente numa exigência de maiores qualificações e treinamento da mão-de-obra. (Note-se, contudo, que não tentamos lidar com a necessidade maior de engenheiros e outros técnicos para as indústrias de máquinas e de aparelhos de contrôle à medida que progride a automatização. Pode haver aí sérias faltas, mas êsse problema não se apresenta à emprêsa que utiliza a automatização.)

DIRETRIZES DE SALÁRIOS

Não é suficiente que a administração esteja a par dos possíveis efeitos da automatização sôbre a composição da mão-de-obra. Ficamos, ainda, com um dilema que relativamente poucos administradores enfrentaram até aqui, seja no nível filosófico, seja na prática: que deveriam fazer quanto aos critérios de remuneração? Vimos que, teórica e pràticamente, parece ocorrer uma degradação e, portanto, criam-se problemas de avaliação de cargos, de administração de salários e de negociação de acôrdos sindicais.

O problema de salários pode ser definido da seguinte forma: se o operador não controla quantidade e qualidade, se toma menos decisões relativas à operação da produção, se despende menos esfôrço físico e mental, e se a automatização afasta riscos de acidentes no trabalho e melhora as condições de trabalho, então muitas das contribuições tradicionais do trabalhador são de menor - ou mesmo nenhuma -. -*- ento da produtividade? Se mais, quanto e em que bases?

As possibilidades sugeridas podem ser agrupadas da seguinte forma:

1. Os empregados que trabalham com maquinaria automática deveriam participar do aumento da produtividade. A divisão poderia ser feita de acôrdo com um dos seguintes critérios:

(a) os operários deveriam partilhar do aumento da produção e a firma deveria elevar os salários de maneira proporcional a êsse aumento;

(b) deveria haver um aumento "razoável" de salário - $ 0.05 por hora, ou 10% do pagamento atual, ou outra soma qualquer estipulada (foram sugeridas bases muito vagas quanto ao montante);

(c) cada aumento deveria ser negociado com o sindicato dando-se a devida atenção à situação particular (muitas emprêsas sentiram que esta era uma diretriz muito falha, pois podia dar lugar a muitos conflitos);

(d) o aumento não deveria ser específico, mas parte de um programa de melhoria salarial anual aplicável a todos os empregados (essa diretriz força a administração a manter o aumento de produtividade; oferece uma certeza de ganho de salário a tôda a mão-de-obra e reduz a necessidade de intermináveis negociações);

(e) o aumento deveria ser aquêle que viesse a ser determinado pelo sistema de avaliação (as firmas comumente sentiram que os salários não deveriam ser diminuídos).

2. Não deveria haver nem acréscimos específicos, nem aumentos proporcionais à produtividade: todos êsses ganhos deveriam ser considerados como reservas para aumentos de salários nos momentos "adequados".

3. Os ganhos da automatização, ao contrário daqueles que exigem um acréscimo de contribuição por parte do trabalhador, pertencem à firma. Uma vez que a companhia fornece o capital e o planejamento, os benefícios deveriam ser canalizados para o bem-estar geral do negócio. A longo prazo, isto reverterá em benefício do empregado, pois êle pode ser mais beneficiado se há redução de preços, se o negócio se expande ou há reservas para os dias difíceis.

4. Um dos sindicatos declarou o seguinte: "estas novas classificações e níveis salariais deveriam ser estabelecidos tendo-se em mente que os trabalhos mudaram em sua natureza, de tal sorte que a maior responsabilidade compensa - e bem - qualquer redução em esfôrço físico e destreza manual que acompanhe a automatização. Êste aumento de responsabilidade flui, na maioria dos casos, do investimento muito maior no equipamento que está sob contrôle de cada trabalhador. .. ". (7 7 ) Automation, (UAW-CIO) Education Department, Detroit, 1955, págs. 16-17. )

A afirmação de que há mais maquinaria sob contrôle do trabalhador deveria ser cuidadosamente examinada, pois não é necessàriamente verdadeira. O operário pode ter maior responsabilidade se o equipamento está inteiramente sob seu contrôle. Porém, como já explicamos, a automatização geralmente retira o contrôle do trabalhador, literal e figuradamente. Os acôrdos futuros sôbre salários baseados nesta afirmação de contrôle deveriam ser cuidadosamente examinados, se não quiserem os administradores verificar, mais tarde, que estabeleceram diretrizes embaraçosas e confusas.

Note-se também a afirmação de que a responsabilidade é medida pelo investimento feito. O pagamento pela responsabilidade, quando o investimento é o padrão, pode representar injustiça para a mão-de-obra não automatizada. Torna-se pagamento ao acaso, e o trabalhador de um departamento que usa maquinaria cara deveria alegrar-se por sua boa sorte. Ferramenteiros perderiam enormemente em "status" salarial, assim como os homens de manutenção. A base de investimento perturbaria as estruturas existentes de salários e seria muito injusta para os operadorees nos níveis mais baixos de mecanizações, cujos deveres realmente exigissem mais habilidade, treinamento e outras contribuições.

Porém, a responsabilidade pode ser maior devido à dependência da atenção e inteligência do operador para prevenir as paradas de máquinas que envolvem grande parte da capacidade de produção. Isso talvez se sobreponha a tôdas as outras considerações e justifique substancial compensação adicional. Ainda assim, aquêles que estudam a natureza evolucional da mecanização prevêem que, em algum tempo, serão introduzidos contrôles automáticos que assumirão esta "responsabilidade" também. Eventualmente, mesmo esta contribuição do operador será reduzida ou eliminada.

PROBLEMAS FUTUROS

Suponhamos que alguém diga: "sejamos tão justos e objetivos quanto possível com respeito à remuneração. Apliquemos as melhores técnicas de avaliação ao trabalho automatizado". Eliminará isto nossas dificuldades? Infelizmente, não. Na verdade, apenas as aumentará, pois há poucos sistemas de avaliação que se possam aplicar indistintamente a trabalhos convencionais e automatizados. A ponderação tradicional de fatôres na escala de avaliação de cargos pode criar injustiças se se der muito maior importância à habilidade manual do que, por exemplo, à responsabilidade. Se os fatôres de avaliação do trabalho forem repesados, serão êles justos para os trabalhos convencionais? Deveriam ser usados dois padrões de avaliação? Sem dúvida, uma escala de avaliação de cargos pode tornar-se compatível com tarefas automatizadas e convencionais, mas isto não acontecerá por acaso. Quantos administradores e engenheiros industriais estudaram a adaptação de seus sistemas de avaliação de cargos à automatização?

É evidente que duas questões relativas aos salários adquirirão maior importância à medida que aumente a automatização:

a) Qual é a base adequada de remuneração nos trabalhos automatizados?

b) Como pode uma revisão adequada do sistema de pa_ gamento ser introduzida na fábrica em que existam, lado a lado, tarefas automatizadas e não automatizadas?

Infelizmente, não nos parece possível oferecer à administração respostas nítidas, que se apliquem universalmente a estas dificuldades. Parece evidente, entretanto, que é um êrro que a administração adote a automatização sem considerar de que forma serão afetadas as necessidades de qualificações de sua mão-de-obra, em seu caso particular. É perigoso supor que o aumento de automatização seja diretamente proporcional ao de habilidade. Não está claro, pois, que necessitamos de mais pensamento crítico e pesquisa a fim de obtermos melhor entendimento dos verdadeiros efeitos que os progressos na mecanização têm sôbre as qualificações da mão-de-obra?

NOTA DA REDAÇÃO: Êste artigo é reproduzido sob autorização de "Harvard Business Review", publicação da "Graduate School of Business Administration" da "Harvard University" e foi originalmente publicado no volume 36, n.º 4, de julho-agôsto de 1958, daquela Revista. Tradução do Inglês por Yolanda F. Balcão.

  • 2) Vide Arthur M. Turner, "A Researcher Views Human Adjustment to Automation", Avanced Management, maio de 1956, pág. 21.
  • 3) Vide resultados desta pesquisa em James R. Bright, Automation and Management, Division of Research, Harvard Business School, Boston, 1958.
  • 5) New Haven, Yale University Press 1957; vide também Charles R. Walker, "Life- in the Automatic Factory", Harvard Business Review, Janeiro-fevereiro de 1958, pág. 111.
  • 7) Automation, (UAW-CIO) Education Department, Detroit, 1955, págs. 16-17.
  • 1
    ) Vide Automation and Technological Change, Hearings before the Subcommittee on Economic Stabilization to the Joint Committee on the Economic Report, 84th Congress, First Session, págs. 106, 273 etc.
  • 2
    ) Vide Arthur M. Turner, "A Researcher Views Human Adjustment to Automation", Avanced Management, maio de 1956, pág. 21.
  • 3
    ) Vide resultados desta pesquisa em James R. Bright, Automation and Management, Division of Research, Harvard Business School, Boston, 1958.
  • 4
    ) Vide exemplos em Automation and Technological Change, Congressional Hearings, op, cit., pág. 254.
  • 5
    ) New Haven, Yale University Press 1957; vide também Charles R. Walker, "Life- in the Automatic Factory", Harvard Business Review, Janeiro-fevereiro de 1958, pág. 111.
  • 6
    ) Vide em James Bright, op. cit., pág. 165, quadros de fatôres que aumentam e diminuem a manutenção.
  • 7
    ) Automation, (UAW-CIO) Education Department, Detroit, 1955, págs. 16-17.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Jul 2015
    • Data do Fascículo
      Mar 1963
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