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A estratégia na empresa: um estilo de direção

COLABORAÇÃO INTERNACIONAL

A estratégia na empresa - um estilo de direção

Fernando Lacueva

Professor na Universidade de Navarra - Instituto de Estudios Superiores de la Empresa

Tradução de José Carlos Barbieri

Professor no Departamento de administração da Produção e Operações Industriais da EAESP/FGV e professor na área de Administração da Economia na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS/CCHS)

1. NECESSIDADE DA ESTRATÉGIA

Os estudiosos e os profissionais da direção de empresas concordam ao afirmar que corresponde especificamente aos administradores de nível determinar o futuro desejável para a sua empresa, cabendo-lhes, portanto, a responsabilidade de projetar e construir a estrutura organizacional, de dirigir seu pessoal e de orientar as operações para alcançar o futuro escolhido.

Os administradores, ao desempenhar as atividades acima citadas, devem buscar a consecução da finalidade primordial da empresa que é produzir bens e serviços para a comunidade que os requer, promovendo as pessoas que nela trabalham. Tudo isso ao mesmo tempo que se consegue gerar valor econômico adicionado suficiente para permitir a continuidade da empresa como supridora dos serviços e bens que a comunidade demanda.

Para que uma situação como a descrita anteriormente possa ocorrer de maneira eficiente, torna-se necessário ordenar a ação humana na empresa mediante um processo de direção coerente e lógico que estimule e permita a eleição e a configuração formalizada de um futuro melhor e mais justo que o atual. Isto implica, a sua vez, pôr em marcha um grande número de ações administrativas indicando o que corresponde às pessoas que nelas trabalham e responsabilizando-as pela sua execução. A experiência demonstra que, independentemente das pessoas terem metas ou objetivos e de estarem conscientes de que devem alcançá-los, isso nem sempre ocorre, apesar de sua boa vontade. Por isso, torna-se necessário, completando o processo de direção, desencadear uma série de impulsos motivadores de ação positiva que conduziria a atuação de toda a organização, a fim de alcançar o futuro imaginado e desejado.

Esses impulsos, que exigem uma grande dose de imaginação de quem tem a responsabilidade de aplicá-los, devem conduzir, orientar, corrigir, ajudar e fomentar a atuação diretiva dos componentes da organização para produzir o futuro escolhido para a empresa, em outras palavras, tornar a estratégia uma realidade.

A implantação de uma estratégia, juntamente com sua formalização, é uma das principais tarefas e desafios com que o executivo de nível deve se defrontar. Este deve ser capaz de traduzir sua visão estratégica em planos de ação concretos que tornem possível que os fatos ocorram como foram previstos e se realizem na prática quando tiverem de ser produzidos, por quem deve produzi-los e com os recursos e meios que forem convenientes.

2. FERRAMENTAS PARA A IMPLANTAÇÃO DA ESTRATÉGIA

Existe um número quase infinito de sistemas para que os administradores coloquem em marcha a estratégia da empresa. Não se pode dizer que um dado sistema seja o adequado para implantação em qualquer empresa. A implantação depende de numerosos fatores, tais como o grau de mudanças que se deseja, os recursos disponíveis, os estilos e as capacidades próprias de direção, e, inclusive, o conteúdo da estratégia que se deseja implantar, bem como as características concretas da empresa objeto da ação estratégica.

2.1 O conhecimento do conteúdo da estratégia

O eixo central de toda implantação é, evidentemente, a estratégia, instrumento de direção que, concebido e utilizado com imaginação realista, pode transformar a situação atual da empresa em outra melhor.

Para que as pessoas (estrutura humana) encarregadas de levar a empresa à situação futura desejada possam cumprir essa missão, elas devem conhecer com exatidão o conteúdo da estratégia, pois esta é o guia da sua atuação diretiva. E, para conhecê-la, toma-se necessário explicitá-la. A explicitação e a formalização consistem na comunicação que a alta direção formula aos administradores da empresa sobre todos os componentes da estratégia para, em seguida, instrumentalizar a sua implementação.

A comunicação e institucionalização da estratégia, conforme a empresa, poderá ser feita formalmente por escrito ou verbalmente. O importante é que sua implantação não se transforme num simples desejo, mas sim em ação concreta e identificável.

A formalização deste instrumento de direção, que é a estratégia, permitirá designar tarefas concretas às pessoas da organização, ou seja, permitirá atribuir objetivos aos administradores, no sentido de orientar a sua ação e dar a conhecer os resultados a serem obtidos, bem como os requisitos ou os aspectos importantes que devem ser levados em conta ao realizá-las. Esse objetivo será também utilizado para comparar o que o administrador realizou com a meta que estava prevista. Isso servirá para determinar as correções necessárias para reconduzir a ação ao objetivo determinado. A comparação deve ser feita com a maior objetividade possível, utilizando unidades de medidas indispensáveis para determinar o grau de acerto ou de desvio da ação diretiva com relação aos objetivos fixados.

O ser humano se move, geralmente, com maior eficácia quando sabe o que está fazendo e por que o faz, ao mesmo tempo em que conhece as conseqüências da sua atuação. Portanto, se o administrador conhece a estratégia de sua empresa, orienta sua ação para realizá-la e sabe as conseqüências que irão decorrer do êxito em concretizar os objetivos propostos, é muito provável que sua atuação seja benéfica para a implantação operacional da estratégia, que é. sem dúvida, o essencial.

3. UM ESTILO DE DIREÇÃO

A literatura específica em temas de administração de empresas registra abundantes experiências de diretores de empresas que alcançaram êxito, permitindo configurar estilos ou formas de direção que caracterizam a ação desenvolvida por estes profissionais. A maioria destes estilos ou formas próprias de dirigir empresas apresenta em comum o fato de subordinar a ação à consecução de metas ou objetivos propostos por quem tem a mais alta responsabilidade na empresa.

Inspirando-se neste princípio básico de que a ação seja coerente com as metas ou objetivos, apresenta-se a seguir um sistema ou processo de direção para ser implementado na empresa pela pessoa que tem a responsabilidade de levá-la à concretização de seus fins específicos. A figura processo de direção (ver figura 1) apresenta os diferentes níveis com que este processo se articula para levar a termo a estratégia e os fins da empresa.


3.1 Natureza do processo de direção

O processo de direção enunciado na figura 1 está orientado para a ação e impregnado pela personalidade daquele que, tendo o poder, exerce-o. O processo de direção envolve os seguintes aspectos:

1. Identificação e avaliação do estado em que se encontra a empresa, ou seja, qual é a situação concreta da empresa objeto do processo de direção. Trata-se, em suma, de elaborar um diagnóstico objetivo e realístico da situação presente, tanto no que se refere ao ambiente externo quanto à própria empresa.

2. Planejar um futuro melhor para a empresa quanto à eficácia e justiça e que seja exeqüível e coerente com as condicionantes do seu ambiente e dela própria, conforme identificadas no diagnóstico. Esta concepção do futuro ou estratégia deve ter uma filosofia ou princípios invariáveis que inspirem todas as atividades da empresa, objetivos ou metas possíveis e desejáveis, políticas ou procedimentos mais eficazes para transformar em realidade estes objetivos e, finalmente, planos de ação concretos e realistas que permitam passar da situação presente para a futura, ou seja, que estabeleçam as ações sucessivas que deverão ser realizadas para se atingir a nova situação almejada.

3. Construção e condução da estrutura humana, determinada conforme as competências de seus membros face às responsabilidades provenientes da estratégia, para alcançar os objetivos escolhidos e incorporados nesta mesma estratégia. A condução da estrutura humana implica atribuir as ações conseqüentes às pessoas definidas, tomando como critério para a determinação de responsabilidades a estratégia, as atitudes e os conhecimentos (atuais e potenciais) das próprias pessoas autoras das ações que, em última instância, são as agentes da implantação real da estratégia.

4. Desenvolvimento de ações concretas sobre as pessoas da estrutura, para que orientem suas atividades na direção e com a energia necessária para a realização das tarefas que lhes foram atribuídas. Estas ações, agrupadas num conjunto denominado neste modelo de processo de avanço, devem ser completas e coerentes, capazes de orientar a atuação dos administradores no sentido adequado (o da estratégia da empresa) e com a intensidade necessária para realizar aquela parcela que lhes cabe da estratégia em função das suas competências.

O estilo de direção busca fundamentalmente tornar realidade a estratégia da empresa, pois não basta dizer o que se deseja para a empresa (explicitação e formalização da estratégia), nem como ela deve se organizar (atribuir as responsabilidades às pessoas), mas é necessário também levar a cabo ações que recaiam sobre as pessoas e as coisas, sendo que tudo isso deve ser feito de uma determinada maneira. Como diz o professor Antonio Valero, do Instituto de Estúdios Superiores de la Empresa de Barcelona, "a decisão acertada é necessária, porém somente como condição prévia à ação adequada, sem a qual o futuro escolhido permanecerá num sonho". A tarefa de implantar na empresa o que foi estabelecido na estratégia traz enormes dificuldades e é de vital importância que o previsto como desejável se torne realidade.

Para que a estratégia possa ser executada com êxito, torna-se necessário o desenvolvimento harmonioso do estilo de direção mencionado anteriormente. É necessária uma ênfase especial nos processos de avanço que, devidamente estabelecidos e postos em marcha, contribuem de forma importante para que os diretores cumpram seus compromissos a cada momento, de forma que a implantação da estratégia não seja um sonho, mas sim algo real e operativo.

4. OS PROCESSOS DE AVANÇO

As ações a serem realizadas para que as pessoas orientem suas atividades na direção necessária, com o objetivo de que cumpram as tarefas que lhes foram encomendadas, dão origem aos processos de avanço. Estes processos, ainda que não excluam outros, apresentam-se em três aspectos distintos que, mesmo inter-relacionados entre si, dispõem de suas próprias características. A figura 2 resume os encargos que caracterizam cada um destes três aspectos.


4.1 Desenvolvimento profissional especifico

Mediante este processo, pretende-se preparar o pessoal da empresa para que adquira a capacidade e destreza necessárias para a execução da estratégia.

O fundamento básico desta ação de formação e desenvolvimento há de ser sua orientação eminentemente prática, realística e adequada às necessidades do pessoal da empresa e de atividades determinadas. Ou seja, essa ação deve recair sobre pessoas perfeitamente identificadas, considerando as deficiências e as necessidades concretas que devem ser superadas para que estas pessoas sejam capazes de realizar com eficiência e eficácia as suas tarefas.

Este tipo de formação e desenvolvimento apresenta os seguintes elementos essenciais:

1. O conteúdo da formação, tanto para os que exercem hoje uma atividade determinada quanto para aqueles que irão exercê-la no futuro, deve ser o resultado de uma extensa e reiterada exploração da realidade da empresa, realidade plasmada na estratégia e na maneira de ser particular da empresa.

2. Os encarregados das tarefas de formação e desenvolvimento devem ser pessoas com experiência em situações semelhantes. Estes profissionais devem conhecer bem o seu trabalho e sua função; e é preciso que tenham refletido sobre estas questões de forma que venham a perceber as deficiências e as exigências do cargo objeto de formação.

3. O material de apoio à formação e desenvolvimento deverá proceder da mesma realidade concreta da empresa, isto é, dos problemas, assuntos, tipos de trabalho, realizações, etc. que ocorrem tanto na administração corrente, quanto na excepcional, levando sempre em conta o que se pretende conseguir e que, além disso, faça parte dos objetivos estratégicos.

4. A metodologia do ensino deve ser sempre ativa, por vezes acompanhada por material teórico sobre conceitos, principios e idéias desenvolvidas nas seções de formação e desenvolvimento, nas quais se discutem situações reais(casos) escolhidas para a tarefa pedagógica.

5. A metodologia deverá orientar-se sempre para incentivar a capacidade de análise e de síntese e, ao mesmo tempo, deverá constituir-se num importante auxílio para a tomada de decisões.

4.2 Motivações políticas

Um processo de avanço eficaz consiste em fomentar as motivações políticas que, no caso de serem positivas, contribuem para estimular a conduta desejável, do ponto de vista da estratégia empresarial. Elas são, entre outras: aumento dos salários, promoções, status, prêmios, citações, distinções e recompensas. Com as motivações negativas, ao contrário, deseja-se frear todas aquelas condutas discordantes da estratégia, de forma a inibir ações que não contribuam para alcançar os objetivos nela contidos. Estas motivações se manifestam quando ocorrem sanções, dispensas, congelamento de salários ou quando não se outorgam prêmios, distinções ou recompensas.

Tais motivações não são as únicas que conduzem à ação desejável. Existem outras, além das que foram citadas, que ora se confundem com estas, ora as complementam. A este respeito, merece citação a opinião de Juan Antonio Pérez Lopez, professor do Instituto de Estudios Superiores de la Empresa de Barcelona, para quem os indivíduos na empresa são motivados à ação positiva quando incitados a dar uma resposta interna face a um valor percebido por «les. Para o professor citado, as motivações são de três tipos: extrínsecas, intrínsecas e transcendentes.

Por motivação extrínseca entende-se aquele tipo de força que impulsiona a pessoa a realizar uma ação devido às recompensas ou aos castigos que acompanham a sua execução. Por motivação intrínseca entende-se o tipo de força que atrai uma pessoa para a realização de uma ação determinada em função da satisfação que ela espera obter por ter sido o seu agente. A motivação transcendente refere-se a um tipo de forças que impulsiona a atuação das pessoas devido à utilidade - as consequências - das suas ações para outra ou outras pessoas.

Independentemente da denominação ou classificação das motivações, o que é importante para a realização da estratégia é que elas favoreçam a ação positiva e que induzam as pessoas a realizarem o que está previsto na estratégia.

4.3 Medição da atuação dos diretores

Um processo de avanço que tem colhido bons resultados é a medição das atividades do pessoal de direção, pois este, ao saber que é avaliado por seus superiores através de critérios que procedem da estratégia da empresa, orientará suas ações na direção adequada e com a intensidade necessária para alcançar a parcela da estratégia que foi atribuída a cada um.

A ação de medir a atuação dos diretores é uma responsabilidade do executivo de maior nível da empresa e pode ser útil, se ele estiver profundamente familiarizado com a estratégia da empresa para:

1. Informar-se sobre seus subordinados com respeito aos seus conhecimentos, atitudes e qualidades inatas de que estes dispõem para cumprir suas tarefas administrativas.

2. Identificar se tudo o que eles realizam é feito em função da estratégia da empresa.

3. Conhecer o acerto da atuação diretiva, isto é, se a atuação de cada um é a melhor que poderia ser realizada para a consecução da estratégia.

4. Comprovar o grau de desvio ou de ajuste que estiver ocorrendo em relação aos objetivos como resultado da ação diretiva.

5. Programar e realizar atividades de treinamento e desenvolvimento de equipe gerencial, para que seus membros se tornem aptos a executar as tarefas que lhes foram confiadas, bem como para dispor de pessoas capazes de assumir encargos de maior risco e dificuldade que aqueles que possuem no momento.

6. Punir as ações que não conduzam a estratégia e, ao contrário, premiar aquelas que a impulsionem, que a facilitem e que estejam em consonância com ela.

7. Avaliar a qualidade e a quantidade dos recursos utilizados no desenvolvimento da atuação diretiva voltada para a concretização da estratégia.

8. Identificar em termos de qualidade, quantidade e tempo o resultado obtido em decorrência da implementação da atuação diretiva para a realização da estratégia empresarial.

A medição da atuação permite ao administrador objeto deste processo controlar suas próprias ações, contribuindo, dessa forma, para aperfeiçoar o seu senso de responsabilidade, através do incentivo ao seu desenvolvimento pessoal.

A medição da atuação dos administradores é um instrumento mediante o qual a alta administração da empresa pode orientar a ação dos seus subordinados para a realização dos objetivos que foram estabelecidos como desejáveis. Trata-se também de reforçar e estimular a ação diretiva, ao mesmo tempo que procura tomar clara e fluida a comunicação entre todos os administradores.

Não se trata de uma medição exclusiva de resultados, pois com este processo não se pretende comparar o realizado com uma norma ou padrão que tem sua origem (na maioria das vezes) em dados históricos que mostrem o comportamento da empresa no passado, em orçamentos elaborados antecipadamente para o período sujeito ao exame e em resultados de outras empresas apresentados em seus demonstrativos financeiros. Em outras palavras, não se trata de medições quantitativas extraídas do balanço contábil da empresa.

Com a mensuração das atividades dos administradores, na qual se procura averiguar o grau de acerto das ações desenvolvidas por estes para tomar realidade a estratégia, pretende-se, além disso, motivar e preparar estes administradores para que eles possam efetivamente desenvolver ações desejáveis à execução dessa estratégia.

Essa medição, realizada a partir da estratégia, tem por objetivo ser um meio para alcançar os resultados desejáveis, embora algumas vezes isso possa não acontecer dessa forma, pois nem sempre as previsões contidas na estratégia conseguem ser realizadas, apesar de todo o esforço, conhecimento e boa vontade dos diretores. Com efeito, podem ocorrer circunstâncias no ambiente externo e interno da empresa que não tenham sido previstas no momento da formalização ou na reapreciação da estratégia, circunstâncias estas que irão tornar inalcançável, definitiva ou temporariamente, o objetivo previsto, não obstante a ação correta dos administradores.

Concluindo, com o processo de medição da atuação diretiva pretende-se ponderar a adequação, a intensidade, a oportunidade e o resultado da ação daqueles que têm sua atenção centrada na execução da estratégia da empresa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jun 2013
  • Data do Fascículo
    Mar 1988
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