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Impacto de diferentes medicamentos antiepilépticos na sedação de crianças durante a ressonância magnética

Resumos

Justificativa e objetivos:

A indução e a inibição das isoenzimas do citocromo P450 pelos medicamentos antiepilépticos levam a alterações na depuração de medicamentos anestésicos eliminados pelo metabolismo hepático. Investigamos a duração da sedação e a necessidade adicional de anestésicos durante a ressonância magnética em crianças epilépticas que receberam antiepilépticos que causam a indução ou a inibição de enzimas.

Métodos:

Foram incluídas no estudo 120 crianças, estado físico ASA I-II, entre 3-10 anos. Grupo 1: em uso de antiepilépticos que causam a indução de enzimas do citocromo P450; Grupo 2: em uso de antiepilépticos que causam a inibição de enzimas do citocromo P450; e Grupo 3: que não usavam antiepilépticos. A sedação foi induzida com midazolam (0,05 mg kg−1) e propofol (1 mg kg−1). Um adicional de 0,05 mg kg−1 de midazolam e resgate com 0,5 mg kg−1 de propofol foram administrados e repetidos para manter a sedação. A duração da sedação e a sedação adicional necessária foram comparadas.

Resultados:

A duração da dose inicial foi significativamente menor no Grupo I em comparação com os grupos II e III (p = 0,001, p = 0,003, respectivamente) e significativamente maior no Grupo II em comparação com os grupos I e III (p = 0,001, p = 0,029, respectivamente). A necessidade de midazolam adicional para sedação adequada foi maior no Grupo I em comparação com os grupos II e III (p = 0,010, p = 0,001, respectivamente). Além disso, a dose de resgate de propofol foi significativamente maior apenas no Grupo I em comparação com o Grupo III (p = 0,002).

Conclusão:

Em crianças epilépticas, a variabilidade da resposta aos agentes sedativos iniciais durante a ressonância magnética, resultante da inibição ou indução das isoenzimas do citocromo P450 pelos medicamentos antiepiléticos, exigiu a titulação dos agentes anestésicos.

Epilepsia; Pediátrica; Antiepilépticos; Sedação; RM


Background and objectives:

The induction and inhibition of cytochrome P450 isoenzymes by antiepileptic drugs lead to changes in the clearance of anesthetic drugs eliminated via hepatic metabolism. We investigated the duration of the sedation and additional anesthetic needs during magnetic resonance imaging in epileptic children receiving antiepileptic drugs that cause either enzyme induction or inhibition.

Methods:

In American Society of Anesthesiology I–II, 120 children aged 3–10 years were included. Group 1: children using antiepileptic drugs that cause cytochrome P450 enzyme induction; Group 2: those using antiepileptic drugs that cause inhibition; and Group 3: those that did not use antiepileptic drugs. Sedation was induced with the use of 0.05 mg kg−1 midazolam and 1 mg kg−1 propofol. An additional 0.05 mg kg−1 of midazolam and rescue propofol (0.5 mg kg−1) were administered and repeated to maintain sedation. The duration of sedation and the additional sedation needed were compared.

Results:

The duration of the initial dose was significantly shorter in Group I compared with groups II and III (p = 0.001, p = 0.003, respectively). It was significantly longer in Group II compared with groups I and III (p = 0.001, p = 0.029, respectively). The additional midazolam needed for adequate sedation was increased in Group I when compared with groups II and III (p = 0.010, p = 0.001, respectively). In addition, the rescue propofol dose was significantly higher only in Group I when compared with Group III (p = 0.002).

Conclusion:

In epileptic children, the response variability to the initial sedative agents during the magnetic resonance imaging procedure resulting from the inhibition or induction of the cytochrome P450 isoenzymes by the antiepileptic drugs mandated the titration of anesthetic agents.

Epilepsy; Pediatric; Antiepileptics; Sedation; MRI


Justificación y objetivos:

La inducción e inhibición de las isoenzimas del citocromo P450 por los medicamentos antiepilépticos conllevan alteraciones en la depuración de medicamentos anestésicos eliminados por el metabolismo hepático. Investigamos la duración de la sedación y la necesidad adicional de anestésicos durante la resonancia magnética en niños epilépticos que reciben antiepilépticos que causan la inducción o inhibición de enzimas.

Métodos:

Ciento veinte niños, estado físico ASA I-II, con edades entre los 3 y los 10 años, fueron incluidos en el estudio. Grupo i: niños en tratamiento con antiepilépticos que causan la inducción de enzimas del citocromo P450; grupo ii: niños en tratamiento con antiepilépticos que causan la inhibición; y grupo iii: niños que no estaban bajo en tratamiento con antiepilépticos. La sedación fue inducida con midazolam (0,05 mg/kg−1) y propofol (1 mg/kg−1). Se administró una dosis adicional de 0,05 mg/kg−1 de midazolam y una de rescate con 0,5 mg/kg−1 de propofol y fueron repetidas para mantener la sedación. Se compararon la duración de la sedación y la sedación adicional necesaria.

Resultados:

La duración de la dosis inicial fue significativamente menor en el grupo i en comparación con los grupos ii y iii (p = 0,001; p = 0,003, respectivamente) y significativamente mayor en el grupo iii en comparación con los grupos i y iii (p = 0,001; p = 0,029 respectivamente). La necesidad de midazolam adicional para la sedación adecuada fue mayor en el grupo i en comparación con los grupos ii y iii (p = 0,010; p = 0,001 respectivamente). Además, la dosis de rescate de propofol fue significativamente mayor solamente en el grupo i en comparación con el grupo iii (p = 0,002).

Conclusión:

En niños epilépticos, la variabilidad de la respuesta a los agentes sedativos iniciales durante la resonancia magnética resultante de la inhibición o inducción de las isoenzimas del citocromo P450 por los medicamentos antiepilépticos exigieron la titulación de agentes anestésicos.

Epilepsia; Pediátrica; Antiepilépticos; Sedación; Resonancia magnética


Introdução

A epilepsia é a doença neurológica crônica mais comum entre crianças e é caracterizada por ataques paroxísticos.11. Maranhao MV, Gomes EA, de Carvalho PE. Epilepsy and anesthesia. Rev Bras Anestesiol. 2011;61, 124–236 232–41, 242–54.A ressonância magnética (RM) é uma modalidade de exame de imagem geralmente preferida no manejo de crianças epilépticas.22. Eker HE, Yalcin Cok O, Aribogan A, et al. Children on phenobarbital monotherapy requires more sedatives during MRI. Paediatr Anaesth. 2011;21:998–1002. Nos procedimentos de RM, a seleção dos agentes anestésicos com atividade anticonvulsivante e as interações medicamentosas entre as drogas antiepiléticas (DAEs) e os anestésicos são componentes integrais do plano anestésico para pacientes com epilepsia.33. Kofke WA. Anesthetic management of the patient with epilepsy or prior seizures. Curr Opin Anaesthesiol. 2010;23:391–9.,44. Perks A, Cheema S, Mohanraj R. Anaesthesia and epilepsy. Br J Anaesth. 2012;108:562–71.

A indução e a inibição do citocromo P450 (CYP-450) no metabolismo do fígado formam o mecanismo mais importante nas interações medicamentosas farmacocinéticas das DAEs.44. Perks A, Cheema S, Mohanraj R. Anaesthesia and epilepsy. Br J Anaesth. 2012;108:562–71. As DAEs comumente usadas, como fenitoína, carbamazepina, fenobarbital e primidona, induzem várias isoenzimas do CPY (CYP1A2, CYP2C9, CYP2C19 e CYP3A4), bem como a UDP-glucuronil (UGT) e epóxido hidrolases; por outro lado, o ácido valproico é o inibidor mais importante das enzimas (CYP2A6, CYP2C9 e CYP2B6) no metabolismo da droga.33. Kofke WA. Anesthetic management of the patient with epilepsy or prior seizures. Curr Opin Anaesthesiol. 2010;23:391–9.,55. Tan L, Yu JT, Sun YP, et al. The influence of cytochrome oxidase CYP2A6, CYP2B6, and CYP2C9 polymorphisms on the plasma concentrations of valproic acid in epileptic patients. Clin Neurol Neurosurg. 2010;112:320–3.

Demonstrou-se que essas isoenzimas estão envolvidas no metabolismo de mais de 50% dos agentes anestésicos. Midazolam, um dos agentes anestésicos com atividade anticonvulsiva mais amplamente usados em procedimentos de RM, é metabolizado por CYP3A4/CYP3A5, ao passo que propofol é metabolizado por CYP2C9, CYP2B6 e UGTs. Assim, as alterações na distribuição e na depuração resultantes do uso simultâneo de agentes anestésicos que compartilham as mesmas vias metabólicas com as DAEs irão alterar a duração da sedação e o nível necessário de sedação.66. Wilfong AA. Monotherapy in children and infants. Neurology. 2007;69:S17–22.88. Cohen M, Sadhasivam S, Vinks AA. Pharmacogenetics in perioperative medicine. Curr Opin Anaesthesiol. 2012;25:419–27.

No presente estudo, nosso objetivo foi investigar se havia uma diferença quanto à duração adequada de sedação, ao agente sedativo adicional usado ou necessário para resgatar agentes sedativos em crianças epilépticas que usavam DAEs que causam indução ou inibição enzimática ou aquelas que não usavam DAEs sob anestesia com midazolam-propofol durante a RM.

Materiais e métodos

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Conselho Institucional de Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Mustafa Kemal. Foram incluídas neste estudo clínico prospectivo 120 crianças com epilepsia, entre 3-10 anos, estados físicos ASA I-II, submetidas à ressonância magnética de crânio com sedação.

As crianças foram classificadas em três grupos: Grupo 1, que usavam agentes que causam indução de enzimas do CYP-450 (n = 30); Grupo 2, que usavam agentes que causam inibição de enzimas do CYP-450 (n = 30); e Grupo 3 (n = 30), que não usavam DAEs (n = 60).

No dia anterior à RM, todos os pacientes foram avaliados por um anestesiologista, incluindo a história da doença atual, história médica e exame físico. Todos os pais foram informados sobre os períodos de jejum permitidos de acordo com as diretrizes da Sociedade Americana de Anestesiologistas para jejum pré-procedimento.99. American Society of Anesthesiologists Task Force on Sedation and Analgesia by Non-Anesthesiologists. Practice guidelines for sedation and analgesia by non-anesthesiologists. Anesthesiology. 2002;96:1004–17.,1010. Cote CJ, Wilson S. Guidelines for monitoring and management of pediatric patients during and after sedation for diagnostic and therapeutic procedures: an update. Pediatrics. 2006;118:2587–602.

Os critérios de exclusão foram crianças com estado físico ASA ≥ III; menos de três anos; distúrbios cardíacos ou pulmonares graves; anomalia congênita de cabeça-pescoço ou facial e hipertrofia tonsilar excessiva; refluxo gastroesofágico ou estômago cheio; obesidade; apneia do sono; e aqueles com testes de função renal anormais ou história de alergia contra os agentes usados no estudo ou história de dificuldade em procedimentos de RM anteriores. Crianças com doenças associadas, como paralisia cerebral ou retardo mental-motor, não foram excluídas.

Antes do procedimento, os termos de consentimento informado assinados pelos pais foram obtidos. Dados demográficos, como peso, idade e gênero, estado físico ASA, história de epilepsia, medicamento antiepiléptico e doenças associadas, foram registrados. Em todos os pacientes, midazolam (0,5 mg kg−1) foi administrado por via oral, misturado em suco de fruta livre de partículas, como pré-medicação 30 min antes da colocação do cateter intravenoso, e os pacientes foram levados para a sala de RM quando a Escala de Ansiedade de Separação Parental atingiu 1-2.1111. Isik B, Arslan M, Tunga AD, et al. Dexmedetomidine decreases emergence agitation in pediatric patients after sevoflurane anesthesia without surgery. Paediatr Anaesth. 2006;16:748–53.,1212. Weldon BC, Watcha MF, White PF. Oral midazolam in children: effect of time and adjunctive therapy. Anesth Analg. 1992;75:51–5. O tempo desde a pré-medicação com midazolam oral até a chegada na sala de RM foi definido como o tempo de preparação para o procedimento (sedação obtida). Em ambos os grupos, midazolam IV (0,05 mg kg−1) foi administrado como sedativo primário, seguido de propofol (1 mg kg−1) por 30 s. O nível de sedação foi avaliado durante todo o procedimento de imagem com a Escala de Sedação da Universidade de Michigan (UMSS)1313. Malviya S, Voepel-Lewis T, Tait AR, et al. Depth of sedation in children undergoing computed tomography: validity and reliability of the University of Michigan Sedation Scale (UMSS). Br J Anaesth. 2002;88:241–5. e foi considerado adequado quando os pacientes podiam ser despertados somente com estímulo físico significativo. O tempo para obter um nível de sedação suficiente (UMSS = 3) foi definido como o tempo de indução. Para evitar a dor da injeção com propofol, lidocaína (0,25 mg mL−1) foi adicionada à seringa.1414. Machata AM, Willschke H, Kabon B, et al. Propofol-based sedation regimen for infants and children undergoing ambulatory magnetic resonance imaging. Br J Anaesth. 2008;101:239–43.

Quando sedação e imobilização não puderam ser obtidas durante o processo de geração de imagens, uma dose de midazolam foi titulada por incrementos de 0,05 mg kg−1 (incremento máximo: 1 mg e dose total máxima: 0,1 mg kg−1) e uma dose de propofol em bolus de 0,25-0,5 mg kg−1 foi administrada como dose de resgate quando a titulação de midazolam falhou. A duração entre a dose inicial e a sedação adicional necessária foi definida como UMSS < 3 e movimentação do paciente causando a repetição do procedimento. O desconforto ou movimento inevitável das crianças resultou na anulação da imagem, a despeito de a sedação ser considerada como inadequada.

Frequência cardíaca e saturação periférica de oxigênio foram monitoradas durante o procedimento (Millennia 3155MVS, EUA) e registradas em intervalos de 5 minutos. As mensurações da pressão arterial não invasiva foram feitas somente antes e após o término do procedimento, pois poderiam despertar os pacientes.99. American Society of Anesthesiologists Task Force on Sedation and Analgesia by Non-Anesthesiologists. Practice guidelines for sedation and analgesia by non-anesthesiologists. Anesthesiology. 2002;96:1004–17. Clinicamente, hipotensão foi definida como uma redução de 20% ou mais da pressão arterial sistólica em comparação com o valor basal.1414. Machata AM, Willschke H, Kabon B, et al. Propofol-based sedation regimen for infants and children undergoing ambulatory magnetic resonance imaging. Br J Anaesth. 2008;101:239–43.

Todas as crianças foram protegidas do barulho durante o procedimento e mantidas com 2 mL min−1 de O2 via máscara facial para preservar a respiração espontânea. Decisões sobre intervenção foram tomadas em casos de SpO2 < 94%, apneia com duração de 20 s, diminuição da frequência cardíaca superior a 20% em relação ao valor basal (bradicardia) e arritmias. Manobras de suporte das vias aéreas foram feitas em casos de obstrução das vias aéreas e hipóxia, incluindo estímulo tátil, levantamento do queixo, colocação de máscara laríngea e ventilação com balão e máscara após a descontinuação da RM.1414. Machata AM, Willschke H, Kabon B, et al. Propofol-based sedation regimen for infants and children undergoing ambulatory magnetic resonance imaging. Br J Anaesth. 2008;101:239–43. Além disso, os eventos adversos que ocorreram durante a indução, a RM e antes da alta hospitalar foram registrados, incluindo náusea, vômito, apneia, tosse, soluço, irritabilidade, agitação, reação alérgica e aspiração.

Os dados obtidos para o tempo de procedimento, término ou repetição do procedimento de RM e aplicações de midazolam ou propofol adicionais foram registrados para todos os pacientes. A duração do tratamento foi definida como o tempo desde o início até a conclusão da RM, incluindo as interrupções.

Quando o exame de imagem foi concluído, as crianças foram transferidas para a sala de recuperação dentro da unidade de RM e observadas pelos pais e um anestesiologista enfermeiro. O tempo de recuperação foi definido como o tempo desde a conclusão da RM até a alta da sala de recuperação (escore modificado de Aldrete ≥ 8 e escore na escala de conforto ≥ 3).1414. Machata AM, Willschke H, Kabon B, et al. Propofol-based sedation regimen for infants and children undergoing ambulatory magnetic resonance imaging. Br J Anaesth. 2008;101:239–43.,1515. Aldrete JA. The post-anesthesia recovery score revisited. J Clin Anesth. 1995;7:89–91. Em seguida, as crianças foram transferidas para o departamento de pediatria e receberam alta após os sinais vitais e os níveis de consciência terem voltado aos valores basais.

O nível de satisfação dos pais com a experiência de sedação foi avaliado com base em uma escala de quatro pontos de Likert (muito insatisfeito, um pouco insatisfeito, um pouco satisfeito e muito satisfeito). A qualidade das sequências de RM foi avaliada, por um radiologista que desconhecia a alocação dos pacientes nos grupos e as técnicas de sedação, de acordo com a presença/ausência de artefatos resultantes de movimentos feitos pelo paciente, com uma escala de três pontos: (1) excelente, nenhum artefato devido a movimento; (2) procedimento concluído com movimento mínimo e (3) movimento amplo e procedimento abortado.1616. Malviya S, Voepel-Lewis T, Tait AR, et al. Pentobarbital vs chloral hydrate for sedation of children undergoing MRI: efficacy and recovery characteristics. Paediatr Anaesth. 2004;14:589–95.

Além disso, uma entrevista por telefone foi feita 24 h após a alta por um residente de anestesiologia que desconhecia o desenho do estudo para investigar a ocorrência de eventos adversos tardios, enurese noturna, insônia e pesadelos.

Análise estatística

O Programa Estatístico para Ciências Sociais (SPSS) versão 13.0 para Windows foi usado para todas as análises. As estimativas do tamanho da amostra foram baseadas na duração da dose inicial (em minutos). Estimou-se que uma amostra de 21 indivíduos por grupo daria poder de 80% para detectar uma diferença clinicamente significante de 1,5 min quando o desvio padrão e erro-α aceitos eram de 8,3 e 0,05, respectivamente. O desvio padrão foi determinado com base em um estudo-piloto com crianças com epilepsia submetidas à RM.

A distribuição normal das variáveis contínuas foi calculada com o teste de Kolmogorov-Smirnov. Testes do qui-quadrado foram usados para as comparações entre as variáveis categóricas. Testes de Kruskal-Wallis e U de Mann-Whitney foram usados para as comparações das variáveis contínuas entre os grupos. Um valor p < 0,05 foi considerado significante para todos os dados estatísticos.

Resultados

Os dados obtidos foram de 120 crianças com epilepsia, em uso de agentes antiepilépticos para convulsões focais ou generalizadas, que não tinham exame de RM e que receberam sedação para fazer o exame de RM para diagnóstico inicial ou para avaliar o curso de remissão, bem como o tratamento de doenças concomitantes durante 19 meses, entre setembro de 2012 e abril de 2013.

A tabela 1 apresenta os dados demográficos e a proporção de pacientes com a taxa de doenças concomitantes em ambos os grupos. Os dados dos procedimentos são apresentados na tabela 2.

Tabela 1
Dados das características dos pacientes
Tabela 2
Dados dos procedimentos nos três grupos

A média da duração da epilepsia foi significativamente menor no Grupo III (30,78 ± 23,80) em comparação com os grupos I e II (58,83 ± 32,33 e 59,93 ± 33,85, respectivamente; p = 0,001).

A duração da medicação antiepiléptica foi semelhante nos grupos I e II (58,06 ± 32,00 mg, 59,60 ± 33,50, respectivamente, p > 0,05).

A duração da dose inicial foi significativamente menor no Grupo I em comparação com os grupos II e III (p = 0,001 e p = 0,003, respectivamente) e significativamente maior no Grupo II em comparação com os grupos I e III (p = 0,001 e p = 0,29, respectivamente). O protocolo de dose inicial com midazolam e propofol foi adequado para concluir o procedimento de RM em 11 pacientes (36,7%) do Grupo I, 21 (70%) do Grupo II e 43 (71,7%) do Grupo III (p = 0,03). Para os demais pacientes, em relação à necessidade de midazolam adicional para sedação adequada, uma dose de midazolam adicional foi incrementada no Grupo I quando em comparação com os grupos II e III (p = 0,010, p = 0,001 e p = 0,003, p = 0,001, respectivamente). Também não houve alteração entre os grupos II e III em relação à necessidade de midazolam adicional. Além disso, a dose de resgate de propofol foi significativamente maior apenas no Grupo I comparado ao Grupo III (p = 0,002).

Não houve correlação significante entre a duração da medicação antiepiléptica e a duração da dose inicial ou dose necessária para a sedação adicional nos grupos I e II.

A duração do procedimento foi semelhante nos grupos II e III, enquanto foi significativamente maior no Grupo I em comparação com os grupos II e III (p = 0,034 e p = 0,004, respectivamente).

A respiração espontânea foi obtida sem necessidade de suporte ventilatório em todos os pacientes. Dessaturação temporária de oxigênio (< 95%) foi observada imediatamente após a dose de sedação inicial em três pacientes do Grupo I (10%) e em dois (6,6%) de cada grupo (II e III), que responderam rapidamente ao estímulo tátil, incluindo ligeira extensão do pescoço e suporte do queixo.

Embora a pressão arterial sistólica tenha diminuído para um nível 10% abaixo do valor basal após a sedação, hipotensão não foi observada em nenhum paciente. Além disso, nenhum dos pacientes apresentou eventos adversos cardiovasculares, como bradicardia ou arritmia, durante ou após a sedação. Os tempos de recuperação após a RM foram semelhantes entre os grupos.

Reação paradoxal e efeitos adversos precoces ou tardios não foram observados em qualquer paciente, não houve caso no qual o procedimento de RM não pôde ser concluído por causa da falha de sedação ou movimento amplo e nenhum paciente foi excluído do estudo por esses motivos. Todos os pais ficaram muito satisfeitos com a experiência da sedação. Não foi observada diferença significativa na qualidade das sequências de MR entre os grupos (p > 0,05).

Discussão

Embora os efeitos desfavoráveis das DAEs sobre os sistemas enzimáticos do CYP-450 sejam bem conhecidos, de acordo com nossas pesquisas este é o primeiro estudo a comparar as interações de anestésicos em RM. Os resultados de nosso estudo demonstraram que a duração da dose inicial de midazolam-propofol foi menor em crianças que usavam DAEs que causam indução enzimática, ao mesmo tempo em que foi prolongada em crianças que usavam DAEs que causam inibição enzimática e naquelas que não usavam agentes antiepilépticos. Além disso, os resultados mostraram que a necessidade de sedação adicional foi maior em crianças que usavam DEAs que causam indução enzimática, enquanto foi menor nas que usavam DAEs que causam inibição enzimática.

A nossa hipótese foi que a variação na duração das doses iniciais resultou de alterações no metabolismo dos agentes anestésicos causadas por agentes antiepilépticos que usam vias metabólicas em comum com midazolam e propofol.

Dessa forma, as reflexões clínicas sobre o indutor ou efeitos inibitórios das DAEs também são diferentes em procedimentos de sedação. O uso de DAEs que inibem a indução enzimática pode encurtar o período de sedação dos sedativos, o que resulta, assim, em tempos prolongados de procedimentos por causa das repetições frequentes. Ao contrário, as DEAs com efeitos inibitórios podem prolongar a sedação, bem como o tempo de recuperação. Ambas as situações podem causar insatisfação nas crianças e nos pais, o que resulta em perda de tempo e dinheiro.22. Eker HE, Yalcin Cok O, Aribogan A, et al. Children on phenobarbital monotherapy requires more sedatives during MRI. Paediatr Anaesth. 2011;21:998–1002.,1414. Machata AM, Willschke H, Kabon B, et al. Propofol-based sedation regimen for infants and children undergoing ambulatory magnetic resonance imaging. Br J Anaesth. 2008;101:239–43.,1717. Demir G, Cukurova Z, Eren G, et al. The effect of "multiphase sedation" in the course of computed tomography and magnetic resonance imaging on children, parents and anesthesiologists. Rev Bras Anestesiol. 2012;62:511–9.

Em nosso estudo, houve necessidade de doses adicionais; portanto, a duração do procedimento foi acentuadamente maior por causa da duração significativamente menor sob a dose inicial de midazolam-propofol em crianças que usavam DAEs que causam indução enzimática. Em um estudo com crianças com epilepsia que receberam monoterapia com fenobarbital, Eker et al.22. Eker HE, Yalcin Cok O, Aribogan A, et al. Children on phenobarbital monotherapy requires more sedatives during MRI. Paediatr Anaesth. 2011;21:998–1002. relataram que os resultados referentes à necessidade de sedação adicional e duração da sedação estavam de acordo com o nosso estudo. Resultados semelhantes foram demonstrados em modelos animais em relação à indução enzimática.1818. Matsunaga T, Maruyama M, Harada E, et al. Expression and induction of CYP3As in human fetal hepatocytes. Biochem Biophys Res Commun. 2004;318:428–34.,1919. Madan A, Graham RA, Carroll KM, et al. Effects of prototypical microsomal enzyme inducers on cytochrome P450 expression in cultured human hepatocytes. Drug Metab Dispos. 2003;31:421–31.

Embora a duração das doses iniciais de midazolam-propofol tenha sido significativamente prolongada em crianças que usavam DAEs que causam inibição enzimática, isso não resultou em problemas ou efeitos adversos. Além disso, também não resultou em duração prolongada do procedimento, pois não houve repetição de RM.

Não detectamos correlação entre a duração da dose inicial de midazolam-propofol e a necessidade de doses adicionais e a duração do medicamento, incluindo agentes indutores ou inibitórios. A indução ou inibição causada pelos DAEs foi dependente da concentração e não relacionada à duração do medicamento.2020. Perucca E. Clinical implications of hepatic microsomal enzyme induction by antiepileptic drugs. Pharmacol Ther. 1987;33:139–44.2323. Perucca E, Hedges A, Makki KA, et al. A comparative study of the relative enzyme inducing properties of anticonvulsant drugs in epileptic patients. Br J Clin Pharmacol. 1984;18: 401–10. Logo, nossos resultados estão de acordo com a literatura nessa área.

Embora as características demográficas dos grupos tenham sido muito semelhantes, o Grupo III tinha pacientes em idades mais jovens e médias de peso mais baixas. Essa diferença foi atribuída à média de idade menor em crianças submetidas a avaliações para novo diagnóstico no grupo III.

Enquanto as interações metabólicas das isoenzimas específicas do CYP podem variar, a depender de fatores genéticos e ambientais, as variações farmacocinéticas e farmacodinâmicas também podem ser observadas em relação à idade. As isoenzimas do CYP e UGT são acentuadamente diferenciadas durante a maturação das crianças e atingem níveis adultos aos 2-3 anos.2121. Patsalos PN, Perucca E. Clinically important drug interactions in epilepsy: general features and interactions between antiepileptic drugs. Lancet Neurol. 2003;2:347–56. Acreditamos que nossos resultados não foram afetados por essa alteração das isoenzimas, apesar da ampla faixa etária em nosso estudo, por a idade de três anos ter sido selecionada como o limite inferior de elegibilidade.

Uma combinação de fenobarbital ou carbamazepina com agentes anestésicos com perfil semelhante de atividade também pode aumentar os efeitos dos anestésicos.11. Maranhao MV, Gomes EA, de Carvalho PE. Epilepsy and anesthesia. Rev Bras Anestesiol. 2011;61, 124–236 232–41, 242–54. Em nosso estudo, midazolam e propofol foram escolhidos por causa do menor tempo de ação e sua associação com uma recuperação confortável.2424. Kilbaugh TJ, Friess SH, Raghupathi R, et al. Sedation and analgesia in children with developmental disabilities and neurologic disorders. Int J Pediatr. 2010:189142. Além disso, a grande vantagem de propofol foi a falta de reações paradoxais.2525. Slovis TL. Sedation and anesthesia issues in pediatric imaging. Pediatr Radiol. 2011;41:514–6. De acordo com a literatura, nenhum efeito adverso significante ou complicação, incluindo reações paradoxais (sedação, agitação e irritabilidade), foi observado em nossos pacientes.

Em conclusão, as DEAs apresentam muitos efeitos fisiológicos e farmacológicos sobre os agentes anestésicos e são o componente mais importante da prática anestésica. Os anestesiologistas devem estar cientes das interações medicamentosas importantes e dos mecanismos subjacentes durante a sedação de crianças que usam agentes antiepilépticos e precisam que as titulações da dose sejam feitas meticulosamente e observem as respostas clínicas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2014

Histórico

  • Recebido
    16 Set 2013
  • Aceito
    31 Out 2013
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