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Compromisso com a Liberdade: A Luta dos Fãs pela Representatividade das Identidades Políticas

Resumo

Objetivo

O objetivo do presente estudo é investigar como os fãs se comportam em relação a uma maior introdução de identidades políticas na cultura pop.

Referencial teórico

A ideia do consumo como instrumento de construção da identidade, as crescentes discussões sobre identidades políticas e o surgimento da indústria do entretenimento como arena de resistência do consumidor estão associadas entre si.

Metodologia

A arqueogenealogia foucaultiana foi aplicada ao fórum online chamado TheForce.net.

Resultados

A militância e a afinidade foram identificadas como agências morais dos consumidores. Apesar de sua singularidade, elas demonstram compromisso com a liberdade e indicam como os fãs veem a representatividade das identidades políticas como uma luta contínua contra as forças ideológicas dominantes.

Implicações práticas e sociais da pesquisa

A análise e interpretação foucaultianas permitem discutir a articulação ética produzida pelos fãs como um compromisso social. É uma resposta cultural dos fãs à recente inserção da representatividade na indústria do entretenimento. Assim, a presente pesquisa fornece os fundamentos para pensar sobre as aplicações e consolidação potencial das produções éticas nas investigações da teoria da cultura do consumidor (CCT, na sigla em inglês).

Contribuições

A teoria de Foucault sobre a constituição do sujeito moral foi adotada para analisar o consumo como uma prática alinhada à crescente demanda por representatividade na indústria do entretenimento.

Palavras-chave:
Subjetividade; identidade política; cultura pop; arqueogenealogia; Star Wars

Abstract

Purpose

The aim of the current study is to investigate how fans behave towards the greater introduction of political identities in pop culture.

Theoretical framework

The idea of consumption as an identity-building instrument, the growing discussions on political identities and the emergence of the entertainment industry as an arena for consumer resistance are associated with each other.

Design/methodology/approach

Foucauldian archeogenealogy was applied to the online forum called TheForce.net.

Findings

Militancy and sympathy were identified as moral agencies of consumers. Despite their uniqueness, they show commitment to freedom and indicate how fans see the representativeness of political identities as a continuous struggle vis-à-vis dominant ideological forces.

Practical & social implications of research

Foucauldian analysis and interpretation allow us to discuss the ethical articulation produced by fans as a social commitment. This is a fan culture response to the recent inclusion of representativeness in the entertainment industry. Thus, the current research provides the basis to think about the applications and potential consolidation of ethical productions in CCT investigations.

Originality/Value

Foucault’s theory about the constitution of the moral subject was adopted here to analyze consumption as a practice aligned to the growing demand for representativeness in the entertainment industry.

Keywords:
Subjectivity; political identity; pop culture; archeogenealogy; Star Wars

1 Introdução

O consumo apresenta inúmeras possibilidades para uma gama de performances culturais. De acordo com a teoria da cultura do consumidor (CCT, na sigla em inglês), o consumo é entendido como a forma como os consumidores produzem projetos identitários (Arnould & Thompson, 2007Arnould, E. J., & Thompson, C. J. (2007). Consumer culture theory (and we really mean theoretics): dilemmas and opportunities posed by an academic branding strategy. In: R. W. Belk & J. F. Sherry (Eds.), Research in consumer behavior: Consumer culture theory (Vol. 11, pp. 3-22). Elsevier.; Arsel & Thompson, 2011Arsel, Z., & Thompson, C. J. (2011). Demythologizing consumption practices: How consumers protect their field-dependent identity investments from devaluing marketplace myths. The Journal of Consumer Research, 37(5), 791-806. http://dx.doi.org/10.1086/656389.
http://dx.doi.org/10.1086/656389...
; Belk, 2013Belk, R. W. (2013). Extended self in a digital world. The Journal of Consumer Research, 40(3), 477-500. http://dx.doi.org/10.1086/671052.
http://dx.doi.org/10.1086/671052...
; Kaptan, 2016Kaptan, Y. (2016). Marking differences, consuming identities: Race, sexuality, disease and “global Turkishness” in the United Condoms of Benetton campaign. Journal of Consumer Culture, 16(2), 447-466. http://dx.doi.org/10.1177/1469540514521075.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405145210...
; Mikkonen et al., 2011Mikkonen, I., Moisander, J., & Fırat, A. F. (2011). Cynical identity projects as consumer resistance - the Scrooge as a social critic? Consumption Markets & Culture, 14(1), 99-116. http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2011.541163.
http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2011....
). Esse processo está cada vez mais presente nos movimentos sociais, como de etnia ou raça (Banks, 2021Banks, P. (2021). High culture, black culture: Strategic assimilation and cultural steering in museum philanthropy. Journal of Consumer Culture, 21(3), 660-682. http://dx.doi.org/10.1177/1469540519846200.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405198462...
; Pittman, 2020Pittman, C. (2020). Shopping while Black: Black consumers’ management of racial stigma and racial profiling in retail settings. Journal of Consumer Culture, 20(1), 3-22. http://dx.doi.org/10.1177/1469540517717777.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405177177...
), gênero (Arend, 2016Arend, P. (2016). Consumption as common sense: Heteronormative hegemony and white wedding desire. Journal of Consumer Culture, 16(1), 144-163. http://dx.doi.org/10.1177/1469540514521076.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405145210...
; Kuehn & Parker, 2021Kuehn, K. M., & Parker, S. (2021). One of the blokes: Brewsters, branding and gender (in)visibility in New Zealand’s craft beer industry. Journal of Consumer Culture, 21(3), 519-538. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518806956.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405188069...
; Walther & Schouten, 2016Walther, L., & Schouten, J. W. (2016). Next stop, Pleasure Town: Identity transformation and women’s erotic consumption. Journal of Business Research, 69(1), 273-283. http://dx.doi.org/10.1016/j.jbusres.2015.07.040.
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) e sexualidade (Kaptan, 2016Kaptan, Y. (2016). Marking differences, consuming identities: Race, sexuality, disease and “global Turkishness” in the United Condoms of Benetton campaign. Journal of Consumer Culture, 16(2), 447-466. http://dx.doi.org/10.1177/1469540514521075.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405145210...
; Neal, 2018Neal, M. (2018). Dirty customers: Stigma and identity among sex tourists. Journal of Consumer Culture, 18(1), 131-148. http://dx.doi.org/10.1177/1469540516648373.
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). Dessa forma, parece haver convergência entre a elaboração de projetos identitários por meio do consumo e as discussões sobre a formulação de identidades políticas a partir de discursos observados na vida social (Arsel & Thompson, 2011Arsel, Z., & Thompson, C. J. (2011). Demythologizing consumption practices: How consumers protect their field-dependent identity investments from devaluing marketplace myths. The Journal of Consumer Research, 37(5), 791-806. http://dx.doi.org/10.1086/656389.
http://dx.doi.org/10.1086/656389...
; Parsons, 2010Parsons, E. (2010). Markets, identities and the discourses of antique dealing. Marketing Theory, 10(3), 283-298. http://dx.doi.org/10.1177/1470593110373189.
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).

Com base na perspectiva pós-estruturalista, as políticas identitárias são abordadas em associação com a questão da subjetividade (Deleuze & Guatarri, 1987Deleuze, G., & Guatarri, F. (1987). A thousand plateaus: Capitalism and schizophrenia. University of Minnesota Press.; Laclau & Mouffe, 2014Laclau, E., & Mouffe, C. (2014). Hegemony and socialist strategy: Towards a radical democratic politics (3rd ed.). Verso.), às vezes em termos homólogos (Hall, 1992Hall, S. (1992). The question of cultural identity. In S. Hall, D. Held & A. G. McGrew (Eds.), Modernity and its futures: understanding modern societies (Vol. 4, pp. 273-326). Plity Press.). No âmbito da CCT, essa articulação passa pela própria constituição da subjetividade dos consumidores (Belk, 2013Belk, R. W. (2013). Extended self in a digital world. The Journal of Consumer Research, 40(3), 477-500. http://dx.doi.org/10.1086/671052.
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; Coskuner-Balli, 2020Coskuner-Balli, G. (2020). Citizen-consumers wanted: Revitalizing the American dream in the face of economic recessions, 1981-2012. The Journal of Consumer Research, 47(3), 327-349. http://dx.doi.org/10.1093/jcr/ucz059.
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), que tem sido tratada principalmente a partir de um olhar crítico com base na elaboração teórica de Michel Foucault a esse respeito (Arnould & Thompson, 2015Arnould, E., & Thompson, C. J. (2015). Introduction: Consumer culture theory: Ten years gone (and beyond). In: A. E. Thyroff, J. B. Murray & R. W. Belk (Eds.), Research in consumer behavior: Consumer culture theory (Vol. 17, pp. 1-21). Emerald Group Publishing Limited. http://dx.doi.org/10.1108/S0885-211120150000017001.
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).

Segundo Foucault (1988aFoucault, M. (1988a). An aesthetics of existence. In L. D. Kritzman (Ed.), Michel Foucault, politics, philosophy, culture: Interviews and other writing 1977-1984. Routledge., 2012aFoucault, M. (2012a). The history of sexuality: The use of pleasure (Vol. 2). Vintage.), a subjetivação se dá à medida que os indivíduos procuram conhecer a si mesmos. Esse processo pressupõe um movimento entre a moralidade e o prazer, que culmina no estatuto ético. Assim, a ideia sobre quem somos e o mundo em que vivemos perpassa a constituição da ética, inerente às práticas sociais e de desejo exercidas em processos contínuos de autotransformação (Foucault, 2012bFoucault, M. (2012b). The history of sexuality: The care of the self (Vol. 3). Vintage.). Tais práticas têm fundamentos epistêmicos e possibilitam a construção da subjetividade a partir de verdades incorporadas e ressignificadas, seja por meio de discursos propagadores de conhecimento, seja por meio de agências que conduzem comportamentos (Foucault, 2011Foucault, M. (2011). The courage of truth. Springer.). Esse processo resulta de posturas tomadas na época para lidar com as forças do poder, por meio de atos de resistência que afetam a forma como o poder é conduzido, ao invés de anulá-lo (Foucault, 2012bFoucault, M. (2012b). The history of sexuality: The care of the self (Vol. 3). Vintage.).

Assim, fica evidente como a subjetividade na teoria de Foucault vai ao encontro do conceito de identidades políticas (Ivic & Lakicevic, 2011Ivic, S., & Lakicevic, D. D. (2011). European identity: Between modernity and postmodernity. Innovation, 24(4), 395-407.; Parsons, 2010Parsons, E. (2010). Markets, identities and the discourses of antique dealing. Marketing Theory, 10(3), 283-298. http://dx.doi.org/10.1177/1470593110373189.
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). Nesse sentido, Hanna (2013)Hanna, P. (2013). An investigation into the ‘experiments with subjectivity’ on offer within the promotion of sustainable tourism in the UK. Journal of Consumer Culture, 13(3), 366-386. http://dx.doi.org/10.1177/1469540513485270.
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indicou que o pensamento foucaultiano permite interpretar como os indivíduos se encontram em meio a uma disputa envolvendo posições dominantes e subjetividades autônomas - essas subjetividades são possibilitadas pelo exercício da resistência.

Em um contexto em que as tecnologias permitem que os públicos se apropriem da mídia de que desfrutam, os consumidores não estão mais subordinados à indústria cultural (Sauter, 2014Sauter, T. (2014). ‘What’s on your mind?’ Writing on Facebook as a tool for self-formation. New Media & Society, 16(5), 823-839. http://dx.doi.org/10.1177/1461444813495160.
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). Segundo Martín-Barbero (2018)Martín-Barbero, J. (2018). Dos meios às mediações: 3 introduções. Matrizes, 12(1), 9-31. http://dx.doi.org/10.11606/issn.1982-8160.v12i1p9-31.
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, os sujeitos são capazes de se apropriar da linguagem difundida pela mídia. Nesse sentido, Kellner (2020)Kellner, D. (2020). Media culture: Cultural studies, identity, and politics in the contemporary moment. Routledge. http://dx.doi.org/10.4324/9780429244230.
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destaca como a cultura midiática ubíqua contemporânea fornece um espaço de conectividade para os consumidores se apropriarem de conteúdos para expressar suas subjetividades.

A indústria do entretenimento surgiu como uma arena de possibilidades cada vez maiores para o exercício da resistência do consumidor (Martin, 2019Martin Jr, A. L. (2019). Fandom while black: Misty Copeland, Black Panther, Tyler Perry and the contours of US black fandoms. International Journal of Cultural Studies, 22(6), 737-753. http://dx.doi.org/10.1177/1367877919854155.
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; Monaghan, 2021Monaghan, W. (2021). Post-gay television: LGBTQ representation and the negotiation of ‘normal’ in MTV’s Faking It. Media Culture & Society, 43(3), 428-443. http://dx.doi.org/10.1177/0163443720957553.
http://dx.doi.org/10.1177/01634437209575...
; Press & Liebes, 2016Press, A., & Liebes, T. (2016). Feminism and Hollywood: Why the backlash? Communication Review, 19(4), 267-279. http://dx.doi.org/10.1080/10714421.2016.1237717.
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), uma vez que desempenha um importante papel na criação e manutenção de identidades políticas (Cooper et al., 2010Cooper, H., Schembri, S., & Miller, D. (2010). Brand-self identity narratives in the James Bond movies. Psychology and Marketing, 27(6), 557-567. http://dx.doi.org/10.1002/mar.20344.
http://dx.doi.org/10.1002/mar.20344...
; Kozinets, 2001Kozinets, R. V. (2001). Utopian enterprise: Articulating the meanings of Star Trek’s culture of consumption. The Journal of Consumer Research, 28(1), 67-88. http://dx.doi.org/10.1086/321948.
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; Walther & Schouten, 2016Walther, L., & Schouten, J. W. (2016). Next stop, Pleasure Town: Identity transformation and women’s erotic consumption. Journal of Business Research, 69(1), 273-283. http://dx.doi.org/10.1016/j.jbusres.2015.07.040.
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). Seu modus operandi está alinhado às novas configurações do capitalismo; assim, implica não apenas relevância econômica, mas também política e cultural (Hackley & Hackley, 2019Hackley, C., & Hackley, A. M. (2019). Advertising at the threshold: Paratextual promotion in the era of media convergence. Marketing Theory, 19(2), 195-215. http://dx.doi.org/10.1177/1470593118787581.
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; Toubia et al., 2019Toubia, O., Iyengar, G., Bunnell, R., & Lemaire, A. (2019). Extracting features of entertainment products: A guided latent dirichlet allocation approach informed by the psychology of media consumption. JMR, Journal of Marketing Research, 56(1), 18-36. http://dx.doi.org/10.1177/0022243718820559.
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). Por outro lado, também está associado à forma como as novas tecnologias de comunicação e informação e o papel desempenhado pelos meios de comunicação reconfiguraram a vida social (Chen, 2021Chen, Z. T. (2021). Poetic prosumption of animation, comic, game and novel in a post-socialist China: A case of a popular video-sharing social media Bilibili as heterotopia. Journal of Consumer Culture, 21(2), 257-277. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518787574.
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; Sugihartati, 2020Sugihartati, R. (2020). Youth fans of global popular culture: Between prosumer and free digital labourer. Journal of Consumer Culture, 20(3), 305-323. http://dx.doi.org/10.1177/1469540517736522.
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).

Esse processo permite que os consumidores convirjam e atuem na chamada cultura pop de forma participativa (Fuschillo, 2020Fuschillo, G. (2020). Fans, fandoms, or fanaticism? Journal of Consumer Culture, 20(3), 347-365. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518773822.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405187738...
; Seregina & Schouten, 2016Seregina, A., & Schouten, J. W. (2016). Resolving identity ambiguity through transcending fandom. Consumption Markets & Culture, 20(2), 107-130. http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2016.1189417.
http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2016....
). Os fãs são melhor definidos como consumidores ativos que se envolvem com a cultura pop interagindo uns com os outros, bem como com textos de mídia e desenvolvedores de conteúdo (Guschwan, 2012Guschwan, M. (2012). Fandom, brandom and the limits of participatory culture. Journal of Consumer Culture, 12(1), 19-40. http://dx.doi.org/10.1177/1469540512438154.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405124381...
; Hills, 2012Hills, M. (2012). Twilight fans represented in commercial paratexts and inter-fandoms: Resisting and repurposing negative fan stereotypes. In A. Morey (Ed.), Genre, reception, and adaptation in the twilight series (pp. 113-29). Aldershot: Ashgate.). Esse engajamento lhes permite muitas vezes expressar posições políticas (Fuschillo, 2020Fuschillo, G. (2020). Fans, fandoms, or fanaticism? Journal of Consumer Culture, 20(3), 347-365. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518773822.
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; Jenkins, 2006aJenkins, H. (2006a). Convergence culture: Where old and new media collide. New York University Press.) e, consequentemente, criar ou manter projetos identitários (Booth & Kelly, 2013Booth, P., & Kelly, P. (2013). The changing faces of Doctor Who fandom: New fans, new technologies, old practices? Participations, 10(1), 56-72.; Kozinets, 2001Kozinets, R. V. (2001). Utopian enterprise: Articulating the meanings of Star Trek’s culture of consumption. The Journal of Consumer Research, 28(1), 67-88. http://dx.doi.org/10.1086/321948.
http://dx.doi.org/10.1086/321948...
).

O objetivo do presente estudo foi investigar como os fãs se comportam em relação a uma maior introdução de identidades políticas na cultura pop. Essa investigação pode contribuir para o campo da CCT ao focar na associação entre práticas de fãs e produtos midiáticos como tema interdisciplinar (Hackley & Hackley, 2019Hackley, C., & Hackley, A. M. (2019). Advertising at the threshold: Paratextual promotion in the era of media convergence. Marketing Theory, 19(2), 195-215. http://dx.doi.org/10.1177/1470593118787581.
http://dx.doi.org/10.1177/14705931187875...
; Sugihartati, 2020Sugihartati, R. (2020). Youth fans of global popular culture: Between prosumer and free digital labourer. Journal of Consumer Culture, 20(3), 305-323. http://dx.doi.org/10.1177/1469540517736522.
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), bem como ao articular como identidades políticas pautadas por práticas de consumo (Arend, 2016Arend, P. (2016). Consumption as common sense: Heteronormative hegemony and white wedding desire. Journal of Consumer Culture, 16(1), 144-163. http://dx.doi.org/10.1177/1469540514521076.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405145210...
; Crockett, 2022Crockett, D. (2022). Shopping while Black: Consumer racial profiling in America. Journal of Consumer Culture. In press. http://dx.doi.org/10.1177/14695405211050125.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405211050...
; Kates, 2004Kates, S. M. (2004). The dynamics of brand legitimacy: An interpretive study in the gay men’s community. The Journal of Consumer Research, 31(2), 455-464. http://dx.doi.org/10.1086/422122.
http://dx.doi.org/10.1086/422122...
; Lamont & Molnár, 2001Lamont, M., & Molnár, V. (2001). How blacks use consumption to shape their collective identity: Evidence from marketing specialists. Journal of Consumer Culture, 1(1), 31-45. http://dx.doi.org/10.1177/146954050100100103.
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) podem ser interpretadas com base na teoria de Foucault (Arnould & Thompson, 2015Arnould, E., & Thompson, C. J. (2015). Introduction: Consumer culture theory: Ten years gone (and beyond). In: A. E. Thyroff, J. B. Murray & R. W. Belk (Eds.), Research in consumer behavior: Consumer culture theory (Vol. 17, pp. 1-21). Emerald Group Publishing Limited. http://dx.doi.org/10.1108/S0885-211120150000017001.
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; Holt, 2017Holt, D. B. (2017). Consumer culture strategy. In J. F. Sherry Jr & E. Fischer (Eds.), Contemporary consumer culture theory (pp. 215-24). Rotledge. http://dx.doi.org/10.4324/9781315563947-12.
http://dx.doi.org/10.4324/9781315563947-...
).

A presente pesquisa analisou as repercussões dos novos filmes da saga Star Wars entre os fãs. Star Wars foi criado por George Lucas na década de 1970 e se tornou uma das franquias de filmes mais famosas e rentáveis até o momento (Benson, 2020Benson, J. (2020). Star Wars: the triumph of nerd. Rownan & Littlefield.; Watson, 2020Watson, A. (2020, October 26). Star Wars - statistics & facts. Statista.com. https://www.statista.com/topics/4362/star-wars/
https://www.statista.com/topics/4362/sta...
). Por mais de quatro décadas, a saga conquistou fãs e admiradores de várias gerações (Hills, 2003Hills, M. (2003). Star Wars in fandom, film theory and the museum: the cultural status of the cult blockbuster. In J. Stringer (Ed.), Movie blockbusters (pp. 178-89). Routledge.; Wood et al., 2020Wood, R., Litherland, B., & Reed, E. (2020). Girls being Rey: Ethical cultural consumption, families and popular feminism. Cultural Studies, 34(4), 546-566. http://dx.doi.org/10.1080/09502386.2019.1656759.
http://dx.doi.org/10.1080/09502386.2019....
), além de ter desempenhado papel fundamental em um movimento que visava legitimar consumidores que antes inibiam seu vínculo à cultura pop (Hills, 2003Hills, M. (2003). Star Wars in fandom, film theory and the museum: the cultural status of the cult blockbuster. In J. Stringer (Ed.), Movie blockbusters (pp. 178-89). Routledge.; Taylor, 2014Taylor, C. (2014). How Star Wars conquered the universe: The past, present, and future of a multibillion dollar franchise. Basic Books.).

Novos filmes lançados após a aquisição da franquia pela Disney em 2012 proporcionaram maior espaço narrativo para personagens que representam identidades políticas associadas a gênero, etnia e sexualidade (Brown, 2017Brown, J. A. (2017). #wheresRey: Feminism, protest, and merchandising sexism in Star Wars: The Force Awakens. Feminist Media Studies, 18(3), 335-348. http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2017.1313291.
http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2017....
; Condis, 2015Condis, M. (2015). No homosexuals in Star Wars? BioWare, “gamer” identity, and the politics of privilege in a convergence culture. Convergence (London), 21(2), 198-212. http://dx.doi.org/10.1177/1354856514527205.
http://dx.doi.org/10.1177/13548565145272...
; Proctor, 2018Proctor, W. (2018). ‘I’ve seen a lot of talk about the #blackstormtrooper outrage, but not a single example of anyone complaining’: The Force Awakens, canonical fidelity and non-toxic fan practices. Participations: International Journal of Audience and Reception Studies, 15(1), 160-179.). Tais identidades se destacam entre as mais abordadas em pesquisas de consumo focadas em analisar o mercado como arena política para a elaboração de projetos identitários (Kuehn & Parker, 2021Kuehn, K. M., & Parker, S. (2021). One of the blokes: Brewsters, branding and gender (in)visibility in New Zealand’s craft beer industry. Journal of Consumer Culture, 21(3), 519-538. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518806956.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405188069...
; Neal, 2018Neal, M. (2018). Dirty customers: Stigma and identity among sex tourists. Journal of Consumer Culture, 18(1), 131-148. http://dx.doi.org/10.1177/1469540516648373.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405166483...
; Pittman, 2020Pittman, C. (2020). Shopping while Black: Black consumers’ management of racial stigma and racial profiling in retail settings. Journal of Consumer Culture, 20(1), 3-22. http://dx.doi.org/10.1177/1469540517717777.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405177177...
).

Assim, a presente pesquisa analisou como os fãs de Star Wars se comportam em relação à introdução de identidades políticas nos novos filmes pertencentes à franquia. Nesse sentido, seguimos o entendimento de Kozinets (2020)Kozinets, R. V. (2020). Netnography: The essential guide to qualitative social media research. Doing ethnographic research online. Sage. http://dx.doi.org/10.4324/9781003001430.
http://dx.doi.org/10.4324/9781003001430...
sobre a escolha de uma plataforma interativa online que reúna consumidores que lidam com o objeto investigado e que seja representativo, relevante e atual. Assim, o estudo se concentra nas interações dos fãs de Star Wars no maior fórum da saga cinematográfica, que é constantemente realimentado com novos comentários e conteúdos produzidos pelo fã-clube (Proctor, 2013Proctor, W. (2013). Holy crap, more Star Wars! More Star Wars? What if they’re crap?”: Disney, Lucasfilm and Star Wars online fandom in the 21st Century. Journal of Audience and Reception Studies, 10(1), 198-224.; Whitney, 2017Whitney, A. (2017). Formatting nostalgia. In D. Hassler-Forest & S. A. Guynes (Eds.), Star Wars and the history of transmedia storytelling (pp. 265-276). Amsterdam University Press.). Além disso, o estudo se alinha ao entendimento de Denegri-Knott e Tadajewski (2017)Denegri-Knott, J., & Tadajewski, M. (2017). Sanctioning value: The legal system, hyper-power and the legitimation of MP3. Marketing Theory, 17(2), 219-240. http://dx.doi.org/10.1177/1470593116677766.
http://dx.doi.org/10.1177/14705931166777...
sobre a validade de realizar uma análise foucaultiana em dados obtidos por meio de tratamento netnográfico.

2 Demanda por representatividade na indústria do entretenimento

A indústria do entretenimento se consolidou como um mercado global de relevância cultural (Hackley & Hackley, 2019Hackley, C., & Hackley, A. M. (2019). Advertising at the threshold: Paratextual promotion in the era of media convergence. Marketing Theory, 19(2), 195-215. http://dx.doi.org/10.1177/1470593118787581.
http://dx.doi.org/10.1177/14705931187875...
; Toubia et al., 2019Toubia, O., Iyengar, G., Bunnell, R., & Lemaire, A. (2019). Extracting features of entertainment products: A guided latent dirichlet allocation approach informed by the psychology of media consumption. JMR, Journal of Marketing Research, 56(1), 18-36. http://dx.doi.org/10.1177/0022243718820559.
http://dx.doi.org/10.1177/00222437188205...
). A indústria cinematográfica se destaca entre seus principais ramos, pois introduz e legitima projetos de identidade (Kozinets, 2001Kozinets, R. V. (2001). Utopian enterprise: Articulating the meanings of Star Trek’s culture of consumption. The Journal of Consumer Research, 28(1), 67-88. http://dx.doi.org/10.1086/321948.
http://dx.doi.org/10.1086/321948...
; Walther & Schouten, 2016Walther, L., & Schouten, J. W. (2016). Next stop, Pleasure Town: Identity transformation and women’s erotic consumption. Journal of Business Research, 69(1), 273-283. http://dx.doi.org/10.1016/j.jbusres.2015.07.040.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jbusres.2015...
), além de possibilitar que os consumidores se identifiquem com eles (Cooper et al., 2010Cooper, H., Schembri, S., & Miller, D. (2010). Brand-self identity narratives in the James Bond movies. Psychology and Marketing, 27(6), 557-567. http://dx.doi.org/10.1002/mar.20344.
http://dx.doi.org/10.1002/mar.20344...
; DeLorme & Reid, 1999DeLorme, D. E., & Reid, L. N. (1999). Moviegoers’ experiences and interpretations of brands in films revisited. Journal of Advertising, 28(2), 71-95. http://dx.doi.org/10.1080/00913367.1999.10673584.
http://dx.doi.org/10.1080/00913367.1999....
). O consumo de filmes permite que as pessoas se identifiquem com personagens e contextos narrativos, fato que molda a experiência de fruição (Choi et al., 2014Choi, H., Ko, E., & Megehee, C. M. (2014). Fashion’s role in visualizing physical and psychological transformations in movies. Journal of Business Research, 67(1), 2911-2918. http://dx.doi.org/10.1016/j.jbusres.2012.06.002.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jbusres.2012...
; Walther & Schouten, 2016Walther, L., & Schouten, J. W. (2016). Next stop, Pleasure Town: Identity transformation and women’s erotic consumption. Journal of Business Research, 69(1), 273-283. http://dx.doi.org/10.1016/j.jbusres.2015.07.040.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jbusres.2015...
). Isso acontece porque as tramas dos filmes muitas vezes mostram representações sociais predominantes na vida cotidiana (Cobb & Horeck, 2018Cobb, S., & Horeck, T. (2018). Post Weinstein: Gendered power and harassment in the media industries. Feminist Media Studies, 18(3), 489-491. http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2018.1456155.
http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2018....
; Lugowski, 1999Lugowski, D. M. (1999). Queering the (New) Deal: Lesbian and gay representation and the Depression-Era cultural politics of Hollywood’s production code. Cinema Journal, 38(2), 3-35.; Wright, 2014Wright, J. K. (2014). Black outlaws and the struggle for empowerment in Blaxploitation cinema. Spectrum: A Journal on Black Men, 2(2), 63-86.).

A indústria cinematográfica atribuiu funções secundárias (por exemplo, alívio cômico) ou papéis coadjuvantes (por exemplo, casal romântico) a grupos sociais não dominantes (por exemplo, mulheres, não brancos, homossexuais) por muito tempo (Bakhitiari & Salimi, 2015Bakhitiari, M. J., & Salimi, F. H. N. (2015). Evolution of the female roles in the US (case study: The Hollywood movies in the late 1970s and early 1980s). International Journal of Women’s Research, 3(2), 185-203.; Molina-Guzmán, 2016Molina-Guzmán, I. (2016). #OscarsSoWhite: How Stuart Hall explains why nothing changes in Hollywood and everything is changing. Critical Studies in Media Communication, 33(5), 438-454. http://dx.doi.org/10.1080/15295036.2016.1227864.
http://dx.doi.org/10.1080/15295036.2016....
). Esse processo tem contribuído para reproduzir e perpetuar estereótipos estigmatizados (Courtney, 2005Courtney, S. (2005). Hollywood fantasies of miscegenation: Spectacular narratives of gender and race - 1903-1967. Princeton University Press. http://dx.doi.org/10.1515/9780691240220.
http://dx.doi.org/10.1515/9780691240220...
; Lugowski, 1999Lugowski, D. M. (1999). Queering the (New) Deal: Lesbian and gay representation and the Depression-Era cultural politics of Hollywood’s production code. Cinema Journal, 38(2), 3-35.; Wright, 2014Wright, J. K. (2014). Black outlaws and the struggle for empowerment in Blaxploitation cinema. Spectrum: A Journal on Black Men, 2(2), 63-86.). No entanto, durante a década de 2010, essa abordagem foi posta em xeque pela soma de eventos que abalaram a imagem da indústria do entretenimento, como boicotes devido à prevalência de brancos em papéis principais e indicações a prêmios (Molina-Guzmán, 2016Molina-Guzmán, I. (2016). #OscarsSoWhite: How Stuart Hall explains why nothing changes in Hollywood and everything is changing. Critical Studies in Media Communication, 33(5), 438-454. http://dx.doi.org/10.1080/15295036.2016.1227864.
http://dx.doi.org/10.1080/15295036.2016....
), bem como denúncias de assédio sexual contra homens que ocupam cargos importantes na indústria (Cobb & Horeck, 2018Cobb, S., & Horeck, T. (2018). Post Weinstein: Gendered power and harassment in the media industries. Feminist Media Studies, 18(3), 489-491. http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2018.1456155.
http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2018....
). Além disso, segmentos do público passaram a exigir maior representação em grandes produções de Hollywood (Martin, 2019Martin Jr, A. L. (2019). Fandom while black: Misty Copeland, Black Panther, Tyler Perry and the contours of US black fandoms. International Journal of Cultural Studies, 22(6), 737-753. http://dx.doi.org/10.1177/1367877919854155.
http://dx.doi.org/10.1177/13678779198541...
; Monaghan, 2021Monaghan, W. (2021). Post-gay television: LGBTQ representation and the negotiation of ‘normal’ in MTV’s Faking It. Media Culture & Society, 43(3), 428-443. http://dx.doi.org/10.1177/0163443720957553.
http://dx.doi.org/10.1177/01634437209575...
; Press & Liebes, 2016Press, A., & Liebes, T. (2016). Feminism and Hollywood: Why the backlash? Communication Review, 19(4), 267-279. http://dx.doi.org/10.1080/10714421.2016.1237717.
http://dx.doi.org/10.1080/10714421.2016....
).

A discussão sobre os novos filmes Star Wars produzidos após a aquisição da Lucas Film pela Disney foi fortemente observada devido à presença de identidades não dominantes em papéis principais (Proctor, 2018Proctor, W. (2018). ‘I’ve seen a lot of talk about the #blackstormtrooper outrage, but not a single example of anyone complaining’: The Force Awakens, canonical fidelity and non-toxic fan practices. Participations: International Journal of Audience and Reception Studies, 15(1), 160-179.; Wood et al., 2020Wood, R., Litherland, B., & Reed, E. (2020). Girls being Rey: Ethical cultural consumption, families and popular feminism. Cultural Studies, 34(4), 546-566. http://dx.doi.org/10.1080/09502386.2019.1656759.
http://dx.doi.org/10.1080/09502386.2019....
). Três tópicos passaram a ser predominantes: o protagonismo das mulheres (Brown, 2017Brown, J. A. (2017). #wheresRey: Feminism, protest, and merchandising sexism in Star Wars: The Force Awakens. Feminist Media Studies, 18(3), 335-348. http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2017.1313291.
http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2017....
; Wood et al., 2020Wood, R., Litherland, B., & Reed, E. (2020). Girls being Rey: Ethical cultural consumption, families and popular feminism. Cultural Studies, 34(4), 546-566. http://dx.doi.org/10.1080/09502386.2019.1656759.
http://dx.doi.org/10.1080/09502386.2019....
) e dos homens negros (Proctor, 2018Proctor, W. (2018). ‘I’ve seen a lot of talk about the #blackstormtrooper outrage, but not a single example of anyone complaining’: The Force Awakens, canonical fidelity and non-toxic fan practices. Participations: International Journal of Audience and Reception Studies, 15(1), 160-179.), além de conjecturas sobre a potencial relação homoafetiva entre dois personagens principais (Condis, 2015Condis, M. (2015). No homosexuals in Star Wars? BioWare, “gamer” identity, and the politics of privilege in a convergence culture. Convergence (London), 21(2), 198-212. http://dx.doi.org/10.1177/1354856514527205.
http://dx.doi.org/10.1177/13548565145272...
).

Esse tipo de repercussão lança luz sobre o papel desempenhado pelos fãs como consumidores especializados e altamente envolvidos que agem de forma proativa, bem como enfatiza como diferentes agências de mercado se sobrepõem e são negociadas (Kozinets, 2002Kozinets, R. V. (2002). Can consumers escape the market? Emancipatory illuminations from Burning Man. The Journal of Consumer Research, 29(1), 20-38. http://dx.doi.org/10.1086/339919.
http://dx.doi.org/10.1086/339919...
; Scaraboto, 2015Scaraboto, D. (2015). Selling, sharing, and everything in between: The hybrid economies of collaborative networks. The Journal of Consumer Research, 42(1), 152-176. http://dx.doi.org/10.1093/jcr/ucv004.
http://dx.doi.org/10.1093/jcr/ucv004...
). Segundo Jenkins (2006a)Jenkins, H. (2006a). Convergence culture: Where old and new media collide. New York University Press., os fãs são a representação máxima da cultura participativa, na qual os indivíduos tentam cada vez mais e de forma espontânea tornar-se participantes ativos no contexto cultural a que pertencem (Fuschillo, 2020Fuschillo, G. (2020). Fans, fandoms, or fanaticism? Journal of Consumer Culture, 20(3), 347-365. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518773822.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405187738...
; Jenkins, 2006bJenkins, H. (2006b). Fans, bloggers and gamers: Exploring participatory culture. New York University Press.).

Nesse sentido, eles aproveitam as tecnologias disponíveis no mercado para interagir com os pares e produzir de forma coletiva (Chen, 2021Chen, Z. T. (2021). Poetic prosumption of animation, comic, game and novel in a post-socialist China: A case of a popular video-sharing social media Bilibili as heterotopia. Journal of Consumer Culture, 21(2), 257-277. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518787574.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405187875...
; Guschwan, 2012Guschwan, M. (2012). Fandom, brandom and the limits of participatory culture. Journal of Consumer Culture, 12(1), 19-40. http://dx.doi.org/10.1177/1469540512438154.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405124381...
). Isso acontece devido à convergência midiática (Jenkins, 2006aJenkins, H. (2006a). Convergence culture: Where old and new media collide. New York University Press.), uma vez que o desenvolvimento e a popularização de novos dispositivos e tecnologias permitem que diferentes agentes sociais (por exemplo, participantes do mercado) confluam seus interesses em uma microesfera econômica, sociocultural e política da qual se torna cada vez mais difícil se dissociar.

As práticas de consumo dos fãs levaram a discussões sobre identidade (Booth & Kelly, 2013Booth, P., & Kelly, P. (2013). The changing faces of Doctor Who fandom: New fans, new technologies, old practices? Participations, 10(1), 56-72.; Kozinets, 2001Kozinets, R. V. (2001). Utopian enterprise: Articulating the meanings of Star Trek’s culture of consumption. The Journal of Consumer Research, 28(1), 67-88. http://dx.doi.org/10.1086/321948.
http://dx.doi.org/10.1086/321948...
). Por outro lado, a construção de projetos de identidade por meio do consumo tem sido associada à produtividade do consumidor (Arsel & Thompson, 2011Arsel, Z., & Thompson, C. J. (2011). Demythologizing consumption practices: How consumers protect their field-dependent identity investments from devaluing marketplace myths. The Journal of Consumer Research, 37(5), 791-806. http://dx.doi.org/10.1086/656389.
http://dx.doi.org/10.1086/656389...
; Büscher & Igoe, 2013Büscher, B., & Igoe, J. (2013). Prosuming’ conservation? Web 2.0, nature and the intensification of value-producing labour in late capitalism. Journal of Consumer Culture, 13(3), 283-305. http://dx.doi.org/10.1177/1469540513482691.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405134826...
; Cova & Cova, 2012Cova, B., & Cova, V. (2012). On the road to prosumption: Marketing discourse and the development of consumer competencies. Consumption Markets & Culture, 15(2), 149-168. http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2012.654956.
http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2012....
). Os fãs são vistos como consumidores produtivos (Chen, 2021Chen, Z. T. (2021). Poetic prosumption of animation, comic, game and novel in a post-socialist China: A case of a popular video-sharing social media Bilibili as heterotopia. Journal of Consumer Culture, 21(2), 257-277. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518787574.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405187875...
; Sugihartati, 2020Sugihartati, R. (2020). Youth fans of global popular culture: Between prosumer and free digital labourer. Journal of Consumer Culture, 20(3), 305-323. http://dx.doi.org/10.1177/1469540517736522.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405177365...
), pois produzem identidades em suas relações com os produtos de mídia e os mantêm como referência (Fuschillo, 2020Fuschillo, G. (2020). Fans, fandoms, or fanaticism? Journal of Consumer Culture, 20(3), 347-365. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518773822.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405187738...
; Seregina & Schouten, 2016Seregina, A., & Schouten, J. W. (2016). Resolving identity ambiguity through transcending fandom. Consumption Markets & Culture, 20(2), 107-130. http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2016.1189417.
http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2016....
). Isso acontece porque as identidades podem se manifestar por meio de relações culturais e de mercado; assim, as pessoas podem expressar uma gama de identidades enquanto desempenham diferentes funções e papéis sociais (Pittman, 2020Pittman, C. (2020). Shopping while Black: Black consumers’ management of racial stigma and racial profiling in retail settings. Journal of Consumer Culture, 20(1), 3-22. http://dx.doi.org/10.1177/1469540517717777.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405177177...
; Polese & Seliverstova, 2020Polese, A., & Seliverstova, O. (2020). Luxury consumption as identity markers in Tallinn: A study of Russian and Estonian everyday identity construction through consumer citizenship. Journal of Consumer Culture, 20(2), 194-215. http://dx.doi.org/10.1177/1469540519891276.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405198912...
).

Uma forma de os fãs construírem suas próprias identidades é apropriando-se das tecnologias disponíveis que lhes permitem convergir e expressar valores e significados dentro dos contextos culturais em que interagem (Moura & Souza-Leão, 2020Moura, B. M., & Souza-Leão, A. L. M. (2020). Cultural identity on the National Football League’s Brazilian fans consumption. Cadernos EBAPE.BR, 18(3), 595-608.). Esse desempenho reflete a existência de uma sobreposição entre o uso das tecnologias e a compreensão de seu impacto nas culturas midiatizadas. Nesse sentido, Martín-Barbero (2018)Martín-Barbero, J. (2018). Dos meios às mediações: 3 introduções. Matrizes, 12(1), 9-31. http://dx.doi.org/10.11606/issn.1982-8160.v12i1p9-31.
http://dx.doi.org/10.11606/issn.1982-816...
argumenta que os sujeitos podem se apropriar e se apropriam dos discursos midiáticos e da linguagem midiatizada, opondo-se a uma noção generalizada de que o público simplesmente reproduz ideologias difundidas pelos meios de comunicação de massa.

Essa perspectiva está alinhada à crítica de Kellner (2020)Kellner, D. (2020). Media culture: Cultural studies, identity, and politics in the contemporary moment. Routledge. http://dx.doi.org/10.4324/9780429244230.
http://dx.doi.org/10.4324/9780429244230...
sobre como os consumidores da cultura popular se relacionam com os discursos da indústria. O autor argumenta que a cultura midiática é apropriada pelos consumidores, sendo uma ruptura com os estudos críticos que entendem que a indústria cultural moldaria os sujeitos. Esse raciocínio representa uma significativa guinada de pensamento, uma vez que o conteúdo midiático passa a ser entendido como o esteio para os consumidores exigirem mudanças nos discursos da cultura popular (Hasson, 2015Hasson, D. (2015). Representing youth with disability on television. Peter Lang), bem como manifestarem e elaborarem suas subjetividades e valores morais (Sauter, 2014Sauter, T. (2014). ‘What’s on your mind?’ Writing on Facebook as a tool for self-formation. New Media & Society, 16(5), 823-839. http://dx.doi.org/10.1177/1461444813495160.
http://dx.doi.org/10.1177/14614448134951...
).

3 Entendendo o consumo como arena para a construção da identidade política e do sujeito moral

Segundo Belk (2013)Belk, R. W. (2013). Extended self in a digital world. The Journal of Consumer Research, 40(3), 477-500. http://dx.doi.org/10.1086/671052.
http://dx.doi.org/10.1086/671052...
, os projetos identitários emergentes do consumo possibilitam que os consumidores manifestem diferentes facetas de si mesmos, dependendo dos contextos sociais, culturais e temporais. Portanto, o consumo abre espaço para que os indivíduos definam, reforcem e expressem diferentes identidades. Se levarmos em consideração a dependência entre a cultura e os recursos materiais simbólicos, o consumo pode ser entendido como a base para projetos identitários em qualquer esfera social, inclusive a esfera política (Kaptan, 2016Kaptan, Y. (2016). Marking differences, consuming identities: Race, sexuality, disease and “global Turkishness” in the United Condoms of Benetton campaign. Journal of Consumer Culture, 16(2), 447-466. http://dx.doi.org/10.1177/1469540514521075.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405145210...
; Neal, 2018Neal, M. (2018). Dirty customers: Stigma and identity among sex tourists. Journal of Consumer Culture, 18(1), 131-148. http://dx.doi.org/10.1177/1469540516648373.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405166483...
; Polese & Seliverstova, 2020Polese, A., & Seliverstova, O. (2020). Luxury consumption as identity markers in Tallinn: A study of Russian and Estonian everyday identity construction through consumer citizenship. Journal of Consumer Culture, 20(2), 194-215. http://dx.doi.org/10.1177/1469540519891276.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405198912...
).

Portanto, manifestações identitárias alicerçadas em práticas de consumo podem tanto incorporar quanto (re)produzir agências políticas (Banks, 2021Banks, P. (2021). High culture, black culture: Strategic assimilation and cultural steering in museum philanthropy. Journal of Consumer Culture, 21(3), 660-682. http://dx.doi.org/10.1177/1469540519846200.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405198462...
; Kuehn & Parker, 2021Kuehn, K. M., & Parker, S. (2021). One of the blokes: Brewsters, branding and gender (in)visibility in New Zealand’s craft beer industry. Journal of Consumer Culture, 21(3), 519-538. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518806956.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405188069...
). O consumo, por sua vez, pode ser entendido como uma agência que permite posicionamentos políticos, incluindo as chamadas minorias (Neal, 2018Neal, M. (2018). Dirty customers: Stigma and identity among sex tourists. Journal of Consumer Culture, 18(1), 131-148. http://dx.doi.org/10.1177/1469540516648373.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405166483...
; Polese & Seliverstova, 2020Polese, A., & Seliverstova, O. (2020). Luxury consumption as identity markers in Tallinn: A study of Russian and Estonian everyday identity construction through consumer citizenship. Journal of Consumer Culture, 20(2), 194-215. http://dx.doi.org/10.1177/1469540519891276.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405198912...
). Identidades raciais (ou seja, étnicas) (Banks, 2021Banks, P. (2021). High culture, black culture: Strategic assimilation and cultural steering in museum philanthropy. Journal of Consumer Culture, 21(3), 660-682. http://dx.doi.org/10.1177/1469540519846200.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405198462...
; Crockett, 2022Crockett, D. (2022). Shopping while Black: Consumer racial profiling in America. Journal of Consumer Culture. In press. http://dx.doi.org/10.1177/14695405211050125.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405211050...
; Lamont & Molnár, 2001Lamont, M., & Molnár, V. (2001). How blacks use consumption to shape their collective identity: Evidence from marketing specialists. Journal of Consumer Culture, 1(1), 31-45. http://dx.doi.org/10.1177/146954050100100103.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405010010...
; Pittman, 2020Pittman, C. (2020). Shopping while Black: Black consumers’ management of racial stigma and racial profiling in retail settings. Journal of Consumer Culture, 20(1), 3-22. http://dx.doi.org/10.1177/1469540517717777.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405177177...
), de gênero (Arend, 2016Arend, P. (2016). Consumption as common sense: Heteronormative hegemony and white wedding desire. Journal of Consumer Culture, 16(1), 144-163. http://dx.doi.org/10.1177/1469540514521076.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405145210...
; Kuehn & Parker, 2021Kuehn, K. M., & Parker, S. (2021). One of the blokes: Brewsters, branding and gender (in)visibility in New Zealand’s craft beer industry. Journal of Consumer Culture, 21(3), 519-538. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518806956.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405188069...
) e de sexo (Kates, 2004Kates, S. M. (2004). The dynamics of brand legitimacy: An interpretive study in the gay men’s community. The Journal of Consumer Research, 31(2), 455-464. http://dx.doi.org/10.1086/422122.
http://dx.doi.org/10.1086/422122...
; Neal, 2018Neal, M. (2018). Dirty customers: Stigma and identity among sex tourists. Journal of Consumer Culture, 18(1), 131-148. http://dx.doi.org/10.1177/1469540516648373.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405166483...
) são interesses fundamentais na pesquisa sobre consumidores. Os fãs, muitas vezes alinhados ou mesmo pertencentes a essas identidades políticas, lutam pela emancipação social por meio da construção da identidade a partir de suas práticas de consumo (Booth & Kelly, 2013Booth, P., & Kelly, P. (2013). The changing faces of Doctor Who fandom: New fans, new technologies, old practices? Participations, 10(1), 56-72.; Kozinets, 2001Kozinets, R. V. (2001). Utopian enterprise: Articulating the meanings of Star Trek’s culture of consumption. The Journal of Consumer Research, 28(1), 67-88. http://dx.doi.org/10.1086/321948.
http://dx.doi.org/10.1086/321948...
).

O conceito de identidade perpassa por ações políticas observadas nas interações entre agentes e estruturas sociais, a partir da produção do discurso (Ivic & Lakicevic, 2011Ivic, S., & Lakicevic, D. D. (2011). European identity: Between modernity and postmodernity. Innovation, 24(4), 395-407.; Parsons, 2010Parsons, E. (2010). Markets, identities and the discourses of antique dealing. Marketing Theory, 10(3), 283-298. http://dx.doi.org/10.1177/1470593110373189.
http://dx.doi.org/10.1177/14705931103731...
). A luta contra as forças dominantes abre caminho para que os indivíduos se tornem sujeitos capazes de produzir novos conhecimentos sobre si mesmos e alcançar novos modos de ser (Bernauer & Mahon, 2005Bernauer, J., & Mahon, M. (2005). Michel Foucault’s Ethical Imagination. In: G. Gutting (Ed.), The Cambridge companion to Foucault (2nd ed). Cambridge University Press. http://dx.doi.org/10.1017/CCOL0521840821.007.
http://dx.doi.org/10.1017/CCOL0521840821...
; Clifford, 2001Clifford, M. (2001). Political genealogy after Foucault. Routledge.). Em sua trajetória filosófica, Foucault (1988b)Foucault, M. (1988b). Technologies of the self. In L. H. Martin, H. Gutman and P. H. Hutton (Eds.), Technologies of the self: A seminar with Michel Foucault (pp. 16-49). University of Massachusetts Press. descreveu as identidades políticas como subjetivação ética perpassada por instituições normalizadoras, condutas sociais e produção de discursos. Em consonância com a teoria foucaultiana, a pesquisa sobre cultura do consumo articulou a questão da subjetividade com o exercício do poder para possibilitar a resistência (Mikkonen et al., 2011Mikkonen, I., Moisander, J., & Fırat, A. F. (2011). Cynical identity projects as consumer resistance - the Scrooge as a social critic? Consumption Markets & Culture, 14(1), 99-116. http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2011.541163.
http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2011....
; Moisander & Eriksson, 2006Moisander, J., & Eriksson, P. (2006). Corporate narratives of information society: Making up the mobile consumer subject. Consumption Markets & Culture, 9(4), 257-275. http://dx.doi.org/10.1080/10253860600921753.
http://dx.doi.org/10.1080/10253860600921...
) e o autogoverno (Hanna, 2013Hanna, P. (2013). An investigation into the ‘experiments with subjectivity’ on offer within the promotion of sustainable tourism in the UK. Journal of Consumer Culture, 13(3), 366-386. http://dx.doi.org/10.1177/1469540513485270.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405134852...
) nas práticas de consumo (Shankar et al., 2006Shankar, A., Cherrier, H., & Canniford, R. (2006). Consumer empowerment: A Foucauldian interpretation. European Journal of Marketing, 40(9/10), 1013-1030. http://dx.doi.org/10.1108/03090560610680989.
http://dx.doi.org/10.1108/03090560610680...
).

Segundo Foucault (2012b), aFoucault, M. (2012b). The history of sexuality: The care of the self (Vol. 3). Vintage. forma como os indivíduos se constituem como sujeitos decorre de uma formulação ética. Funciona como uma produção que se dá por meio de dois processos simultâneos e indissociáveis, a saber: modos de sujeição, segundo os quais as pessoas reproduzem comportamentos estabelecidos no contexto social em que vivem; e práticas de subjetividade, segundo as quais as pessoas realizam atos para viver da forma mais prazerosa possível. Assim, o ser humano é um indivíduo social e desejoso constituído como sujeito a partir de uma determinada moralidade, de um trabalho ético constituído por um conjunto de elementos e práticas interacionais (por exemplo, modelos de conduta, saberes constituídos como verdade). Segundo Deleuze (1988)Deleuze, G. (1988). Foucault. University of Minnesota Press., isso acontece por meio de montagens que nos associam a elementos heterogêneos por meio de interesses e relações compatíveis.

De acordo com Foucault (1988a), aFoucault, M. (1988a). An aesthetics of existence. In L. D. Kritzman (Ed.), Michel Foucault, politics, philosophy, culture: Interviews and other writing 1977-1984. Routledge. sociedade contemporânea carece de uma moral opressora. Essa lacuna subjetiva permite que os indivíduos se manifestem a partir de interesses e valores que definem quem são e como se reconhecem eticamente. Isso acontece porque os sujeitos se constituem em relações nas quais se livram de impedimentos morais ou de desejo ao estabelecer uma relação íntima consigo mesmos (Clifford, 2001Clifford, M. (2001). Political genealogy after Foucault. Routledge.). Assim, os indivíduos devem exercer certa produtividade política, posicionando-se no contexto sociocultural em que vivem (Foucault, 1988bFoucault, M. (1988b). Technologies of the self. In L. H. Martin, H. Gutman and P. H. Hutton (Eds.), Technologies of the self: A seminar with Michel Foucault (pp. 16-49). University of Massachusetts Press.).

As posições políticas assumidas pelos indivíduos refletem a forma como se relacionam com as diferentes formas de governo; não é possível formular a própria subjetividade sem relacioná-la com certas forças e exercícios de poder. Assim, a subjetivação resulta do autogoverno, uma vez que os indivíduos vivem em ambientes sociais marcados por disputas envolvendo sujeições e subjetividades que surgem de posições ancoradas na resistência ao poder (Foucault, 2000Foucault, M. (2000). Ethics: Subjectivity and truth. In P. Rabinow (Ed.), Essential works of Foucault 1954-1984. Penguin.). Segundo Foucault (2006), aFoucault, M. (2006). The history of sexuality: The will to knowledge (Vol. 1). Penguin. resistência resulta inerentemente do exercício do poder e não da mera oposição a ele. Portanto, tanto o poder quanto a resistência são forças produtivas que atuam na articulação de diferentes agentes sociais (por exemplo, sujeitos, instituições) que convivem em um mesmo contexto cultural, a partir do conhecimento compartilhado (Foucault, 2000Foucault, M. (2000). Ethics: Subjectivity and truth. In P. Rabinow (Ed.), Essential works of Foucault 1954-1984. Penguin.).

O conhecimento fundamenta qualquer poder possível; baseia-se em arranjos discursivos produzidos em determinadas trajetórias sociais e ganha status de verdade quando são (re)significados por sujeitos que se reconhecem como tais (Foucault, 1988aFoucault, M. (1988a). An aesthetics of existence. In L. D. Kritzman (Ed.), Michel Foucault, politics, philosophy, culture: Interviews and other writing 1977-1984. Routledge.). Segundo Paltrinieri (2012)Paltrinieri, L. (2012). L’expérience du concept. Publications de la Sorbonne., os discursos têm uma natureza relacional que não requer a intenção de existir (ou seja, cogito), independentemente de qualquer atividade criadora; verdades derivam de verificações feitas por sujeitos.

Então, diferentes verdades são combinadas para constituir a subjetividade. Eles são a base para a formulação de formas de governo que orientam os sujeitos. Não são construtos lineares ou universais, mas o resultado dinâmico de contínuas disputas de saberes, em meio a certas condutas e moralidades. A transição entre diferentes verdades é o momento em que os indivíduos podem compreender quem são e o mundo em que vivem; a maneira como lidam e negociam as verdades produz sua subjetividade moral (Foucault, 2012bFoucault, M. (2012b). The history of sexuality: The care of the self (Vol. 3). Vintage.).

4 Procedimentos metodológicos

O presente estudo adotou a trilha metodológica foucaultiana para conduzir esta investigação de acordo com sua escolha teórica. Foucault (2012a)Foucault, M. (2012a). The history of sexuality: The use of pleasure (Vol. 2). Vintage. desenvolveu procedimentos metodológicos consistentes com seus temas de pesquisa e abordados em seus ciclos teóricos. Com base em sua trajetória filosófica, cada ciclo representa um avanço em relação ao anterior, assim como ocorreu com sua abordagem metodológica. Assim, a genealogia, que sustenta o trabalho desenvolvido a partir de seu pensamento posterior, sucede a arqueologia, que é seu método mais notório associado ao ciclo do conhecimento (Clifford, 2001Clifford, M. (2001). Political genealogy after Foucault. Routledge.; Deleuze, 1988Deleuze, G. (1988). Foucault. University of Minnesota Press.). A genealogia de Foucault se subdivide em duas etapas, que correspondem aos seus ciclos de poder e ao sujeito ético (Foucault, 2006Foucault, M. (2006). The history of sexuality: The will to knowledge (Vol. 1). Penguin., 2012aFoucault, M. (2012a). The history of sexuality: The use of pleasure (Vol. 2). Vintage., 2012bFoucault, M. (2012b). The history of sexuality: The care of the self (Vol. 3). Vintage.). Dessa forma, o método foucaultiano, em sua totalidade, pode ser entendido como Arqueogenealogia (Paltrinieri, 2012Paltrinieri, L. (2012). L’expérience du concept. Publications de la Sorbonne.). O corpus foucaultiano foi aqui utilizado como fonte de sistematização e identificação de suas categorias analíticas, a fim de torná-lo operacional.

A etapa arqueológica centra-se nas práticas discursivas; é estabelecido por relações entre enunciados, que correspondem a unidades básicas do discurso e cujos agrupamentos formam formações discursivas. Esse processo parte da identificação de tais enunciados e de suas funções enunciativas, que dizem respeito ao modo como os enunciados agem discursivamente. Os critérios que constituem tais funções são análogos e permitem a identificação de regras que constituem as formações discursivas (Foucault, 2002Foucault, M. (2002). The archaeology of knowledge. Routledge.).

Para além da dimensão do conhecimento, as formações discursivas são imanentes e fundamentam as relações de poder (Deleuze, 1988Deleuze, G. (1988). Foucault. University of Minnesota Press.) que possibilitam a observação de práticas não discursivas. Assim, a etapa genealogia do poder mapeia as relações que se constituem entre as práticas discursivas e não discursivas, e revela os diagramas de poder. Esses diagramas estão alicerçados em operadores de poder, que podem ser identificados por meio de formações discursivas, com base em alguns critérios constitutivos (Foucault, 2006Foucault, M. (2006). The history of sexuality: The will to knowledge (Vol. 1). Penguin.) como:

  • Como toda relação de poder funciona como condição e efeito, ela se baseia em sistemas de diferenciação que indicam como as diferentes forças agem umas sobre as outras.

  • Essas relações de poder revelam certos tipos de objetivos, que são propósitos estabelecidos para orientar a conduta dos indivíduos.

  • Esse processo se materializa por meio de modalidades instrumentais, que correspondem a tecnologias de poder que possibilitam seu exercício.

  • Isso acontece em meio às formas de institucionalização, que possibilitam o conhecimento e as regras que fundamentam as condutas.

  • Esse processo é pautado por graus de racionalização, uma vez que as relações de poder se dão em meio a possibilidades diversas e contingentes.

Da mesma forma, ao estabelecer condutas, os diagramas de poder fundamentam os atos individuais (Paltrinieri, 2012Paltrinieri, L. (2012). L’expérience du concept. Publications de la Sorbonne.) e possibilitam identificar as práticas de si mesmo. Assim, a etapa genealogia do sujeito revela formas-sujeito ao abranger as relações de si mesmo, práticas não discursivas e discursivas. Essas formas-sujeito emergem de agentes morais extraídos de diagramas de poder; também se constituem por meio de alguns critérios (Foucault, 2012aFoucault, M. (2012a). The history of sexuality: The use of pleasure (Vol. 2). Vintage.) como:

  • A forma como os indivíduos negociam desejos e normas morais os leva a produzir substâncias éticas.

  • Isso acontece por meio de modos de sujeição que dizem respeito ao modo como os indivíduos lidam com as formas de conduta.

  • Ela se dá por meio da ação do indivíduo sobre si mesmo, o que diz respeito à elaboração do trabalho ético.

  • Esse processo evidencia a teleologia do sujeito moral, que se baseia na relação que os indivíduos estabelecem com as verdades produzidas por eles mesmos e pelo contexto sociocultural em que vivem.

Para construir um corpus de pesquisa compatível com a análise foucaultiana, adotamos a sugestão de Denegri-Knott e Tadajewski (2017)Denegri-Knott, J., & Tadajewski, M. (2017). Sanctioning value: The legal system, hyper-power and the legitimation of MP3. Marketing Theory, 17(2), 219-240. http://dx.doi.org/10.1177/1470593116677766.
http://dx.doi.org/10.1177/14705931166777...
de utilizar dados obtidos por meio da coleta de dados netnográficos. Para tanto, contamos com as sugestões de Kozinets (2020)Kozinets, R. V. (2020). Netnography: The essential guide to qualitative social media research. Doing ethnographic research online. Sage. http://dx.doi.org/10.4324/9781003001430.
http://dx.doi.org/10.4324/9781003001430...
para identificar um locus empírico representativo e relevante para o fenômeno investigado, bem como para a forma de organizar os dados da pesquisa e os critérios éticos a serem considerados durante o estudo.

TheForce.net, que é o maior fórum de fãs de Star Wars, foi adotado como o locus da pesquisa. É uma plataforma interativa criada e administrada pelos próprios fãs, continuamente atualizada com a publicação de notícias oficiais dos produtores e por atividades criativas produzidas pelos fãs (ou seja, fanarts, fanfics, teorias de fãs, vídeos de fãs, memes). Ambos os conteúdos estão interligados, pois o número de interações aumenta exponencialmente após a publicação de notícias sobre produções relacionadas a Star Wars (ou seja, filmes, séries, livros, quadrinhos, jogos) (Proctor, 2013Proctor, W. (2013). Holy crap, more Star Wars! More Star Wars? What if they’re crap?”: Disney, Lucasfilm and Star Wars online fandom in the 21st Century. Journal of Audience and Reception Studies, 10(1), 198-224.; Whitney, 2017Whitney, A. (2017). Formatting nostalgia. In D. Hassler-Forest & S. A. Guynes (Eds.), Star Wars and the history of transmedia storytelling (pp. 265-276). Amsterdam University Press.).

A estrutura do fórum possui diversos tópicos que propõem discussões sobre diferentes mídias. As mais notórias são aquelas que tratam de notícias sobre lançamentos de filmes e, mais recentemente, séries de televisão consideradas canônicas da saga. Nesse sentido, dos 119 tópicos abertos no filtro “Sequel Trilogy” entre outubro de 2013 e janeiro de 2020, selecionamos aqueles sobre temas associados a identidades políticas introduzidas em novas produções da saga, após a aquisição da Lucasfilm pela Disney em 2012. Esses tópicos se concentraram em discutir o papel de personagens femininas, pessoas de cor (POC, na sigla em inglês) e - possivelmente ou explicitamente - não heterossexuais. No total, 24.459 mensagens produzidas em 40 tópicos de discussão foram analisadas na presente pesquisa.

Além disso, consideramos importante destacar que o nosso estudo atende aos critérios éticos para a realização de pesquisas qualitativas utilizando dados disponíveis em plataformas online (Ravn et al., 2020Ravn, S., Barnwell, A., & Neves, B. B. (2020). What Is “Publicly Available Data”? Exploring blurred public-private boundaries and ethical practices through a case study on Instagram. Journal of Empirical Research on Human Research Ethics; JERHRE, 15(1-2), 40-45. http://dx.doi.org/10.1177/1556264619850736. PMid:31132903.
http://dx.doi.org/10.1177/15562646198507...
). Por se tratar de um espaço público - ou seja, o TheForce.Net permite que os usuários naveguem anonimamente e tenha acesso irrestrito ao conteúdo do fórum - foi possível fazer uso dos dados disponíveis desde que o estudo não prejudicasse os membros do contexto cultural investigado e protegesse suas identidades (Kozinets, 2020Kozinets, R. V. (2020). Netnography: The essential guide to qualitative social media research. Doing ethnographic research online. Sage. http://dx.doi.org/10.4324/9781003001430.
http://dx.doi.org/10.4324/9781003001430...
; van Dijck, 2013van Dijck, J. (2013). The culture of connectivity: A critical history of social media. Oxford University Press. http://dx.doi.org/10.1093/acprof:oso/9780199970773.001.0001.
http://dx.doi.org/10.1093/acprof:oso/978...
).

5 Descrição do resultado

Considerando o objetivo do estudo de compreender os movimentos representativos associados à inserção de identidades políticas no fã-clube de Star Wars, os resultados se concentram na atuação de fãs que defendem esse ponto de vista. Essa escolha reflete o escopo da pesquisa, uma vez que os movimentos contrários a essa agenda estabelecem uma luta entre fãs que dispersaria uma compreensão aprofundada dos movimentos que endossam maior representação de identidades políticas na cultura popular.

A análise aqui realizada permitiu identificar uma única forma-sujeito, que se manifestou por meio de dois agentes morais, cujo conjunto de relacionamentos revelou congruências e singularidades (Figura 1).

Figura 1
Mapa analítico

Assim, os resultados aqui apresentados foram organizados com base nesses agentes morais, a fim de explorar esses aspectos. Os subcapítulos a seguir apresentam as definições das categorias empíricas identificadas (em negrito) e os critérios constitutivos de agentes morais e operadores de poder (em itálico) com base no contexto empírico pelo qual se destacaram. Além disso, cada subcapítulo apresenta a descrição dos dados analíticos, que ilustra o conjunto de relacionamentos de cada agente moral e o procedimento analítico. O raciocínio teórico é realizado no capítulo subsequente de forma a abordar a forma-sujeito identificada.

5.1 Militância

Militância (AM1) refere-se a um movimento de fãs que critica a forma como as identidades políticas são representadas nos novos filmes Star Wars. Exige maior espaço para este tema e melhor aproveitamento de personagens representativos dessas identidades. O agente moral apresenta engajamento (substância ética) quando os fãs se comportam de forma que represente adequação a demandas sociais (modo de sujeição). Tal postura expressa a obrigação (teleologia do sujeito moral) dos fãs da franquia Star Wars em relação às diretrizes sociais. Assim, o fã-clube elabora trabalhos éticos voltados à defesa dos interesses das identidades políticas - buscando representações mais adequadas - e à empatia com as demandas sociais - reconhecendo que o assunto deve ser discutido entre os fãs.

Essa agência moral se baseia em dois diagramas de poder. Referem-se aos comportamentos dos fãs em relação ao uso de personagens que representam identidades políticas, levando em consideração seu valor no universo ficcional e a recepção por outros fãs. A representatividade (PD1) é observada em comentários que exigem identidades políticas confiáveis não apenas no universo Star Wars, mas também na indústria cinematográfica. A cultura dos fãs (PD2), por outro lado, representa articulações para estimular os fãs a apoiarem a representatividade nas produções de Star Wars.

Ambos os diagramas de poder estão ligados à transformação (PO2), que é uma tendência na indústria cinematográfica e de entretenimento que, assim como Star Wars, tem demonstrado crescente interesse por questões de diversidade. Assim, condutas que não apresentam alinhamento com a maior diversidade de personagens são questionadas e rejeitadas pelos fãs. Essa operadora de poder se configura em duas vias que têm em comum a configuração do mercado como forma de institucionalização. Por um lado, é possível observar o empoderamento de identidades políticas (modalidade instrumental) que visa possibilitar uma representação coerente (tipo objetivo) vinculada à mudança (grau de institucionalização), o que reverbera a validade de uma representatividade social (sistema de diferenciação) que emergiu nos novos filmes da saga. Por outro lado, a produção cinematográfica (sistema de diferenciação) tem a adaptação ao mercado como tipo objetivo, pois considera sua adequação (grau de institucionalização) como um monitoramento de tendências (modalidade instrumental) que não se limita ao universo Star Wars, e não como política.

A representatividade do diagrama de poder (PD1) também está ligada à reparação (PO1), que é um operador de poder referente à forma como os novos filmes da saga colocam personagens que representam identidades que antes eram negligenciadas pelo universo ficcional em papéis principais. Esse operador evidencia a busca de uma representação coerente (tipo objetivo) que suporte as demandas por identidades políticas na indústria do entretenimento. Esse fator leva os fãs a conceberem uma mudança (grau de racionalização) na forma como lidam com os arranjos sociais (formas de institucionalização) observados dentro e fora do fã-clube e do universo ficcional. Essas características fundamentam o empoderamento de identidades políticas e o monitoramento de tendências, que são modalidades instrumentais manifestadas pela representatividade social e pela produção da franquia (sistemas de diferenciação), respectivamente. A primeira relação trata do fortalecimento das demandas sociais para minimizar padrões hegemônicos na cultura pop a partir de um conjunto de valores voltados à promoção da igualdade. A segunda relação diz respeito à promoção de práticas alinhadas às tendências sociais, econômicas e culturais observadas nas diretrizes que vêm sendo implementadas nas novas produções da saga.

Ambos os operadores de poder estão vinculados à formação discursiva denominada despertar da força da representatividade (DF1), que remete ao entendimento de que há um movimento em torno da franquia - tanto nas narrativas quanto no fã-clube -, que busca legitimar maior espaço para as identidades políticas. Essa formação discursiva se baseia em duas regras. Uma delas diz respeito às mudanças dos fãs, que se refere ao empenho dos fãs em buscar maior espaço para discussões sobre representatividade. Baseia-se em três funções enunciativas. A primeira refere-se à exigência de representações adequadas e engloba afirmações sobre como os personagens associados a identidades políticas devem ser desenvolvidos de forma não estereotipada e apresentados de forma orgânica às narrativas. A segunda função enunciativa - repudiar o preconceito no fã-clube - é observada em depoimentos que relatam o comportamento de certos fãs que demonstram empatia seletiva em relação a identidades políticas - por exemplo, preferindo mulheres a representações de etnias não caucasianas e homossexuais - ou fazendo críticas diretas a protagonistas femininas, e não a outros personagens. Por fim, a última função enunciativa desse grupo - reproduzir a diversidade na saga - traz depoimentos que destacam como a saga Star Wars sempre abriu espaço para representantes e afirma que o comportamento antidiversidade dos heróis (por exemplo, rebeldes, Jedi) seria abominável no universo fantástico.

Essa última função enunciativa (ou seja, representar a diversidade na saga) e seus enunciados também se relacionam com a outra regra vinculada a essa formação discursiva (ou seja, o despertar da força da representatividade). Trata-se de mudanças na saga que, por sua vez, remetem ao alinhamento da franquia a uma agenda de transformação social. Essa regra está atrelada a mais uma função enunciativa sobre a valorização da diversidade, que compreende declarações por meio das quais os fãs celebram o fato de que a maior representatividade nas novas produções alinha a saga às tendências sociais refletidas na indústria, ajuda a superar preconceitos e potencializa o universo canônico.

Por fim, essa regra de formação também fundamenta a formação discursiva chamada uma nova esperança para a diversidade (DF2), que está ligada ao operador de poder chamado transformação (PO2). Revela o entendimento de que as mudanças implementadas nas novas produções de Star Wars refletem um movimento que atinge toda a indústria do cinema e do entretenimento.

Ao abordar as categorias de análise de dados adotadas aqui, é possível retratar como funciona a agência moral denominada militância nas constatações atuais. Para tanto, vale destacar comentários (Figuras 2 e 3) sobre a importância de anunciar mais papéis femininos nos novos filmes da franquia e a representatividade de ter um personagem negro no elenco principal e com espaço na tela nas últimas produções de Star Wars.

Figura 2
Exemplo de militância
Figura 3
Exemplo de militância

A militância (MA1) baseia-se na forma como os fãs reiteram a necessidade de espaço igualitário entre os gêneros. Por um lado, ao depreciar o comportamento dos fãs que criticam o espaço cada vez maior dado às mulheres na saga, explicita como a cultura dos fãs (PD2) necessita do efeito transformador (PO2) operado nos novos filmes do universo ficcional. Por outro lado, essa transformação (PO2) deve estar alinhada a uma conduta de reparação (PO1) tanto na saga quanto na indústria do entretenimento como um todo, fato que indica demanda obrigatória por maior representatividade (PD1).

Ambos os operadores de poder estão ligados à formação discursiva que destaca o despertar da força da representatividade (DF1). A mensagem apresenta duas regras de formação associadas às mudanças na saga, uma vez que as novas produções não seguem mais o modus operandi adotado pela indústria cinematográfica no passado, que era majoritariamente composta por homens brancos; assim como com as mudanças nos fãs, que passaram a exigir maior representatividade na saga, e até confrontaram aqueles que não o fizeram. Essas formações estão alinhadas com a função enunciativa - e seus respectivos enunciados - que reproduzem a diversidade na saga como algo inerente ao seu cânone, uma vez que a narrativa original é uma luta para libertar indivíduos (ou seja, rebeldes, Jedi) de segmentos opressores (ou seja, o Império).

De forma simples e direta, também é possível observar a militância (MA1) na resposta curta de um fã enviada em janeiro de 2020 na discussão sobre o personagem Finn - e a consequente atuação de John Boyega, ator afro-americano - como o primeiro integrante do trio principal em uma trilogia Star Wars. Ao considerar que a representatividade (PD1) importa, isso indica que a inclusão é válida nas novas produções. Nesse sentido, há uma transformação (PO2) nas produções que funcionam organicamente já que o personagem é incrível e faz parte da narrativa. Portanto, quando o fã indica que mudanças na saga caracterizam a Trilogia Sequela, revela a concatenação do Despertar da força da representatividade (DF1) e uma Nova esperança para a diversidade (DF2), pois possui excelentes personagens que ecoam a diversidade na saga para seus fãs.

5.2 Simpatia

A simpatia (MA2) reflete a posição de concordar com o espaço cada vez maior dado às identidades políticas representadas na saga. Segundo essa agência, os fãs defendem a diversidade, embora enfatizem que ela deve ser viabilizada sem descaracterizar o cânone do universo ficcional. Assim como ocorre com a militância (MA1), sua teleologia do sujeito moral está na obrigação que os fãs da saga têm de apoiar os sujeitos oprimidos por meio da adaptação (modo de sujeição) e da empatia (elaboração do trabalho ético) às demandas sociais. No entanto, essa obrigação, em relação à agência moral presente, visa também a preservação do cânone (elaboração do trabalho ético) através do respeito ao seu legado (modo de sujeição), pois os fãs entendem que mudanças na saga só devem ser implementadas sem prejudicar os fundamentos do universo fantástico. A combinação das duas vias revela uma substância ética que diz respeito à tolerância.

O compartilhamento de critérios entre os agentes morais se reflete em ambas as ligações ao diagrama de poder da cultura dos fãs (PD2) (descrito no capítulo anterior). Como singularidade, a simpatia (MA2) fundamenta-se em outro diagrama de poder - a indústria do entretenimento (PD3) - que se refere a como os fãs percebem a nova forma de produzir produtos de mídia - inclusive os novos filmes Star Wars - em conformidade com as mudanças sociais em curso.

Assim, os dois diagramas de poder são suportados pela transformação (PO2), que funciona como operador de poder (descrito no capítulo anterior). A indústria do entretenimento (PD3), por sua vez, também está ligada à forma como o mercado (PO3) opera, uma vez que catalisou mais espaço para identidades políticas em resposta aos interesses dos consumidores sobre ela. Assim como acontece com a transformação, o mercado também se configura em duas vias, uma delas é comum ao PO2: uma produção cinematográfica (sistema de diferenciação) que monitora tendências (modalidade instrumental) pautada pela adaptação ao (tipo objetivo) e configuração do (forma de institucionalização) mercado, sob a lógica da adequação (grau de institucionalização). Na outra via, essa adequação (grau de institucionalização) à configuração do mercado (forma de institucionalização) exige que a franquia (sistema de diferenciação) implemente uma expansão (tipo objetivo) que preze o respeito ao cânone (modalidade instrumental).

Ambos os operadores do poder estão ligados à formação discursiva denominada ascensão de uma indústria igualitária (FD3). Com base no entendimento dos fãs, as mudanças implementadas na franquia Star Wars enfatizam um movimento em toda a indústria, que visa atingir novos públicos por meio da promoção de identidades políticas. Essa formação discursiva se baseia em duas regras: mudanças na saga (descrita no capítulo anterior) e universo aberto, que indica o entendimento dos fãs de que o cânone já possui elementos que lhe permitem atender às demandas de diversidade e representatividade para potencializar a ressonância da franquia.

Ambas as regras estão vinculadas à função enunciativa da valorização da diversidade (descrita no capítulo anterior). A segunda (ou seja, universo aberto) também se refere a atestar um público receptivo, com base em depoimentos que indicam que os fãs se sentem representados pelos novos trailers de filmes da saga e esperam que essa representatividade possa ser contínua.

Mais uma vez, os dados aqui analisados retratam como a agência moral funciona nas constatações atuais. Portanto, vale a pena analisar os discursos dos fãs a respeito. No primeiro (Figura 4), um fã explicou o que acredita que vai acontecer com um possível casal homossexual masculino inter-racial nos novos filmes da franquia. O segundo (Figura 5) apresenta um fã questionando a validade de sucessivas mudanças operadas nas produções da saga, que passaram a ser dominadas por mulheres.

Figura 4
Exemplo de simpatia
Figura 5
Exemplo de simpatia

Essa fala mostra que o fã apoia a possível relação homossexual e mostra simpatia (MA2) por essa possibilidade. O fã destaca que personagens principais como Finn (ou seja, afro-americano) são uma quebra de paradigma para o segmento, mas seu romance inter-racial, seja heterossexual (com Rey, uma mulher branca) seja homossexual (com Poe, um homem latino), exige muita coragem dos produtores. Ao refletir sobre como a indústria do entretenimento (PD3) funciona, o fã pondera que, apesar do efeito transformador (PO2) operado no cinema, ela permanece regulada por limites e interesses do mercado (PO3).

Esses operadores de poder estão vinculados ao reconhecimento da ascensão de uma indústria igualitária (DF3). Segundo eles, a saga Star Wars tem um universo aberto e está mudando, uma vez que novos tipos de relacionamentos românticos se tornaram adequados para sua narrativa. Por outro lado, o operador da transformação (PO2) também está ligado a uma nova esperança para a diversidade (DF2), pois permite que os fãs ponderem sobre narrativas mais inclusivas, mesmo que dificilmente sejam incorporadas ao cinema. Ambas as regras de formação estão associadas à função enunciativa que reúne enunciados que valorizam a diversidade, que ecoa não apenas na saga, mas também na indústria do entretenimento.

Na mensagem, ela/ele inicia e encerra sua argumentação sinalizando sua simpatia (MA2) com o crescimento dos papéis femininos nas principais produções de Star Wars (ou seja, O Despertar da Força, Rogue One, campanha da história de Battlefront II), mas que está preocupado(a) que eles - os produtores - forcem a barra. A premissa do(a) fã é a de que a indústria do entretenimento (PD3) deve inserir papéis importantes para as mulheres, como ocorre em Star Wars. No entanto, a questão é se seria apenas uma questão de marketing (PO3).

Consequentemente, a Ascensão de uma indústria igualitária (DF3) o(a) faz temer que esse movimento possa ser tratado mais como vingança do que como crescimento da agenda de igualdade. Justamente por considerar Star Wars um universo aberto, aponta sua reflexão sobre como a saga deve buscar um equilíbrio em suas produções para atender a todos os gostos, apesar de ter um público receptivo.

5.3 Compromisso com a liberdade

As mudanças operadas nas novas produções de Star Wars levaram seu fã-clube a se articular para endossar essas transformações. Essa articulação entre os fãs lhes parece uma reafirmação do que aprenderam com a saga ficcional, ressignificando as transformações da indústria do entretenimento como um compromisso por mais espaço para a representação de identidades políticas, indo além do objeto cultural que consomem e sobre o qual interagem.

Assim, as agências morais aqui identificadas relacionam diferentes posições para uma maior representatividade das identidades políticas na saga Star Wars. Por um lado, a militância indica comprometimento com essa representatividade em termos de ação política engajada, que emana de uma postura que conhece de perto, ou mesmo vivencia, preconceitos e estigmas sofridos pelas minorias sociais. Por outro lado, a simpatia revela apoio à questão da representatividade, bem como auxilia na legitimação e fortalecimento desse discurso político, a partir de um posicionamento sensível à sujeição imputada a essas identidades.

Por trás de suas singularidades, essas agências revelam um movimento comum que remete à vontade de mudar a indústria do entretenimento e de transformar as interações sociais que ocorrem na cultura dos fãs. Esse processo, por sua vez, remete a uma agenda voltada para a implementação de mudanças sociais e políticas mais amplas, em consonância com os movimentos sociais contemporâneos. Portanto, concluímos que os agentes morais aqui identificados referem-se a diferentes graus de expressão de uma única forma-sujeito, aqui denominada compromisso.

Com base na teoria foucaultiana, argumentamos que se trata de um compromisso com a liberdade. De acordo com Foucault (2011), aFoucault, M. (2011). The courage of truth. Springer. liberdade está ancorada na elaboração da ética do eu em um arranjo de ações que possibilitam a expressão da subjetividade. O exercício da liberdade é condição sine qua non para a constituição de sujeitos éticos. Portanto, é uma condição fundamental no processo de subjetivação, pois impede que os indivíduos sejam objetivados pela sujeição (Foucault, 2012aFoucault, M. (2012a). The history of sexuality: The use of pleasure (Vol. 2). Vintage.).

A liberdade é revelada pela forma como os indivíduos equilibram as agências morais e o uso dos prazeres, que constituem os fundamentos éticos. Resulta da negociação dos desejos em relação aos papéis sociais desempenhados pelos indivíduos. Os indivíduos exercem a liberdade quando manifestam escolhas sociais capazes de refletir singularidades (Du Gay, 1996Du Gay, P. (1996). Consumption and identity at work. Sage. http://dx.doi.org/10.4135/9781446221945.
http://dx.doi.org/10.4135/9781446221945...
; Weiskopf, 2002Weiskopf, R. (2002). Deconstructing “The Iron Cage”: Towards an aesthetic of folding. Consumption Markets & Culture, 5(1), 79-96. http://dx.doi.org/10.1080/1025386029003136.
http://dx.doi.org/10.1080/10253860290031...
). Assim, reconhecem-se como sujeitos perante os agentes de sujeição que assumem funções de governo e pela forma como lidam com elas (Foucault, 2012aFoucault, M. (2012a). The history of sexuality: The use of pleasure (Vol. 2). Vintage.).

Consequentemente, a liberdade baseia-se no exercício da resistência, que é também condição sine qua non para a existência de relações de poder, pois o poder só pode ser exercido sobre sujeitos livres que podem resistir a ele (Foucault, 2012aFoucault, M. (2012a). The history of sexuality: The use of pleasure (Vol. 2). Vintage.). Portanto, a resistência é uma força produtiva que não anula sua força fundadora, mas mantém com ela uma relação simbiótica e existencial (Foucault, 2006Foucault, M. (2006). The history of sexuality: The will to knowledge (Vol. 1). Penguin.). A liberdade permite que os indivíduos governem a si mesmos (Deleuze, 1988Deleuze, G. (1988). Foucault. University of Minnesota Press.).

As relações de poder se estabelecem na disputa entre os tipos de conhecimento. Por isso, os jogos de verdade sustentam a constituição da subjetividade (Foucault, 2011Foucault, M. (2011). The courage of truth. Springer.). Resistir às verdades e através delas atesta a liberdade; portanto, revela o trabalho ético dos sujeitos (Foucault, 2012bFoucault, M. (2012b). The history of sexuality: The care of the self (Vol. 3). Vintage.). No entanto, a liberdade não é uma premissa da autonomia dos indivíduos, é uma garantia de reflexão sobre os saberes com os quais se deparam (Weiskopf, 2002Weiskopf, R. (2002). Deconstructing “The Iron Cage”: Towards an aesthetic of folding. Consumption Markets & Culture, 5(1), 79-96. http://dx.doi.org/10.1080/1025386029003136.
http://dx.doi.org/10.1080/10253860290031...
). Somente sujeitos livres podem negociar verdades, resistir ao poder e constituir-se de forma ética (Foucault, 2011Foucault, M. (2011). The courage of truth. Springer.). O fato de os indivíduos serem simultaneamente seres sociais e desejosos leva à presunção de posicionamentos políticos (Foucault, 2012bFoucault, M. (2012b). The history of sexuality: The care of the self (Vol. 3). Vintage.) que, por sua vez, pressupõem liberdade (Foucault, 2000Foucault, M. (2000). Ethics: Subjectivity and truth. In P. Rabinow (Ed.), Essential works of Foucault 1954-1984. Penguin.).

Em consonância com a conjectura atual, as práticas de consumo produtivo são frequentemente associadas à liberdade devido à coprodução de experiências de consumo dos próprios consumidores (Büscher & Igoe, 2013Büscher, B., & Igoe, J. (2013). Prosuming’ conservation? Web 2.0, nature and the intensification of value-producing labour in late capitalism. Journal of Consumer Culture, 13(3), 283-305. http://dx.doi.org/10.1177/1469540513482691.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405134826...
; Cova & Cova, 2012Cova, B., & Cova, V. (2012). On the road to prosumption: Marketing discourse and the development of consumer competencies. Consumption Markets & Culture, 15(2), 149-168. http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2012.654956.
http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2012....
). Esse fator pode ser entendido como um tipo de resistência que Shankar et al. (2006)Shankar, A., Cherrier, H., & Canniford, R. (2006). Consumer empowerment: A Foucauldian interpretation. European Journal of Marketing, 40(9/10), 1013-1030. http://dx.doi.org/10.1108/03090560610680989.
http://dx.doi.org/10.1108/03090560610680...
indicam como liberdade, uma vez que os consumidores se permitem fazer escolhas diferentes dos interesses de outros agentes do mercado, como os produtores.

6 Considerações finais

Nossos resultados destacaram que, quando os fãs se engajam para aumentar a introdução de identidades políticas na cultura pop, eles demonstram compromisso com a liberdade. Tal compromisso indica que os fãs veem a representatividade das identidades políticas como uma luta contínua contra as forças ideológicas dominantes. Ele atesta como o consumo, e mais especificamente o fanatismo, é um pilar para a produção de sujeitos éticos. Esse fator está em consonância com as discussões que veem o mercado como uma esfera de constituição de sujeitos éticos por meio das interações dos consumidores (Denegri-Knott et al., 2018Denegri-Knott, J., Nixon, E., & Abraham, K. (2018). Politicising the study of sustainable living practices. Consumption Markets & Culture, 21(6), 554-573. http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2017.1414048.
http://dx.doi.org/10.1080/10253866.2017....
; Hanna, 2013Hanna, P. (2013). An investigation into the ‘experiments with subjectivity’ on offer within the promotion of sustainable tourism in the UK. Journal of Consumer Culture, 13(3), 366-386. http://dx.doi.org/10.1177/1469540513485270.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405134852...
; Jantzen et al., 2012Jantzen, C., Fitchett, J., Østergaard, P., & Vetner, M. (2012). Just for fun? The emotional regime of experiential consumption. Marketing Theory, 12(2), 137-154. http://dx.doi.org/10.1177/1470593112441565.
http://dx.doi.org/10.1177/14705931124415...
).

No contexto de movimentos transformacionais recentes na indústria do entretenimento (Brown, 2017Brown, J. A. (2017). #wheresRey: Feminism, protest, and merchandising sexism in Star Wars: The Force Awakens. Feminist Media Studies, 18(3), 335-348. http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2017.1313291.
http://dx.doi.org/10.1080/14680777.2017....
; Martin, 2019Martin Jr, A. L. (2019). Fandom while black: Misty Copeland, Black Panther, Tyler Perry and the contours of US black fandoms. International Journal of Cultural Studies, 22(6), 737-753. http://dx.doi.org/10.1177/1367877919854155.
http://dx.doi.org/10.1177/13678779198541...
), é válido entender os movimentos dos fãs em relação a essas diretrizes. A proposta adotada pelo presente estudo observa como esses movimentos levam os fãs a se comprometerem com essas transformações, incorporando posturas subjetivas por meio de suas práticas de consumo, mas não se limitando a tal contexto.

Assim, militância e simpatia representam movimentos que convergem para o compromisso com a liberdade, ainda que de forma singular. A militância representa a forma como os fãs assumem a função de produzir verdades para legitimar os representantes das identidades políticas nos produtos da cultura pop. A simpatia, por outro lado, revela uma posição coadjuvante nesse processo. Tais posições se articulam com outros engajamentos políticos por meio do consumo (Joy et al., 2020Joy, A., Belk, R. W., Wang, J. J., & Sherry Jr, J. F. (2020). Emotion and consumption: Toward a new understanding of cultural collisions between Hong Kong and PRC luxury consumers. Journal of Consumer Culture, 20(4), 578-597. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518764247.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405187642...
; Lamont & Molnár, 2001Lamont, M., & Molnár, V. (2001). How blacks use consumption to shape their collective identity: Evidence from marketing specialists. Journal of Consumer Culture, 1(1), 31-45. http://dx.doi.org/10.1177/146954050100100103.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405010010...
; Polese & Seliverstova, 2020Polese, A., & Seliverstova, O. (2020). Luxury consumption as identity markers in Tallinn: A study of Russian and Estonian everyday identity construction through consumer citizenship. Journal of Consumer Culture, 20(2), 194-215. http://dx.doi.org/10.1177/1469540519891276.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405198912...
). Mais especificamente, os fãs entendem que suas interações com e sobre os produtos de mídia levam a posturas que questionam as normas e estruturas sociais (Chen, 2021Chen, Z. T. (2021). Poetic prosumption of animation, comic, game and novel in a post-socialist China: A case of a popular video-sharing social media Bilibili as heterotopia. Journal of Consumer Culture, 21(2), 257-277. http://dx.doi.org/10.1177/1469540518787574.
http://dx.doi.org/10.1177/14695405187875...
; Kozinets, 2001Kozinets, R. V. (2001). Utopian enterprise: Articulating the meanings of Star Trek’s culture of consumption. The Journal of Consumer Research, 28(1), 67-88. http://dx.doi.org/10.1086/321948.
http://dx.doi.org/10.1086/321948...
).

Novas pesquisas sobre o movimento de comprometimento fundamentado na interatividade do consumidor podem descobrir um terreno fértil a partir da presente pesquisa. Vislumbramos pelo menos duas possibilidades como agenda de pesquisa a partir do que foi explorado no estudo. Por um lado, explorando os movimentos contra a inclusão de identidades políticas em produções com grande ressonância na cultura popular, seja no fã-clube de Star Wars seja em produções mais recentes que tiveram que lidar com problemas semelhantes (por exemplo, A Casa do Dragão, O Senhor dos Anéis - Os Anéis de Poder). Por outro lado, por meio de discussões que buscam compreender as nuances que levam os fãs a se engajarem em movimentos políticos mais abrangentes a partir de conteúdos que ressignificam quando convergem com os pares para manifestar identidades culturais (Moura & Souza-Leão, 2020Moura, B. M., & Souza-Leão, A. L. M. (2020). Cultural identity on the National Football League’s Brazilian fans consumption. Cadernos EBAPE.BR, 18(3), 595-608.). Além disso, a abordagem explorada em nosso estudo abre a possibilidade de trabalhos futuros que reflitam sobre os movimentos de consumo da cultura popular por meio da teoria do reconhecimento (Honneth, 2014Honneth, A. (2014). The I in we: Studies in the theory of recognition. Polity Press.) e sua importância para os movimentos transformadores (Fraser, 2017Fraser, N. (2017). A triple movement? Parsing the politics of crisis after Polanyi. In M. Burchardt & G. Kirn (Eds.), Beyond neoliberalism (pp. 29-42). Palgrave Macmillan. http://dx.doi.org/10.1007/978-3-319-45590-7_3.
http://dx.doi.org/10.1007/978-3-319-4559...
), inclusive como os movimentos políticos são articulados para uma maior representatividade (Safatle, 2017Safatle, V. (2017). Fear, helplessness, and political bodies as circuits of affect: Freud on social emancipation. The Undecidable Unconscious: A Journal of Deconstruction and Psychoanalysis, 4(1), 67-91. http://dx.doi.org/10.1353/ujd.2017.0002.
http://dx.doi.org/10.1353/ujd.2017.0002...
).

Em linhas gerais, o presente estudo corrobora o uso das contribuições de Foucault para a pesquisa CCT (Arnould & Thompson, 2015Arnould, E., & Thompson, C. J. (2015). Introduction: Consumer culture theory: Ten years gone (and beyond). In: A. E. Thyroff, J. B. Murray & R. W. Belk (Eds.), Research in consumer behavior: Consumer culture theory (Vol. 17, pp. 1-21). Emerald Group Publishing Limited. http://dx.doi.org/10.1108/S0885-211120150000017001.
http://dx.doi.org/10.1108/S0885-21112015...
; Holt, 2017Holt, D. B. (2017). Consumer culture strategy. In J. F. Sherry Jr & E. Fischer (Eds.), Contemporary consumer culture theory (pp. 215-24). Rotledge. http://dx.doi.org/10.4324/9781315563947-12.
http://dx.doi.org/10.4324/9781315563947-...
), além de fornecer uma sistematização única ao seu método. Não obstante, há a oportunidade de utilizar a metodologia para compreender como as práticas de consumo colaborativo permitem a elaboração de subjetividades e preceitos éticos.

Por fim, o escopo da presente pesquisa é uma limitação para generalização teórica. Essa limitação se reflete em sua restrição a um fã-clube específico de uma determinada saga cinematográfica, o que se justifica pela dimensão do trabalho empírico e pela relevância de Star Wars como produto cultural emblemático na cultura popular e no movimento de fãs. Especificamente, o escopo do estudo expõe a receptividade dos fãs às mudanças na indústria do entretenimento, mas não explora os movimentos contra as expressões sobre a diversidade em sua comunidade.

Assim, a relação entre defensores e não defensores da diversidade apresenta-se como uma agenda de pesquisa. De forma ampla e fundamentada nos desdobramentos do presente estudo, é provável que se faça menção a uma agenda de pesquisa baseada na teoria da subjetividade de Foucault. Outras pesquisas voltadas à investigação de outros contextos de representatividade de identidades políticas devem ser realizadas para auxiliar no aprofundamento dessa discussão - como fundamentação da teorização dos processos de subjetivação fã/consumidor.

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  • Como citar: Souza-Leão, A. L. M., Ferreira, B. R. T., & Moura, B. M. (2022). Compromisso com a liberdade: a luta dos fãs pela representatividade das identidades políticas. Revista Brasileira de Gestão de Negócios, 24(4), p.638-654. https://doi.org/10.7819/rbgn.v24i4.4202
  • Agências de fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEPE).
  • Ciência Aberta: Souza-Leão, André Luiz Souza de; Ferreira, Bruno Rafael Torres; Moura, Bruno Melo, 2022, "Supplementary Data - Commitment to Freedom: A Fannish Struggle for the Representativeness of Political Identities", https://doi.org/10.7910/DVN/C8QE3D, Harvard Dataverse, V1.
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Editora responsável:

Profa. Natalia Rese

Revisores:

Clóvis Teixeira Filho; Leticia Casotti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    25 Mar 2022
  • Aceito
    21 Set 2022
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