Resumos
OBJETIVO: Identificar os fatores obstétricos e perinatais associados à morbimortalidade perinatal em gestações que cursaram com amniorrexe prematura.
MÉTODOS: Estudo transversal de base hospitalar, com dados secundários de prontuários de pacientes (n=87) que evoluíram com quadro de amniorrexe prematura com idade gestacional entre 24 e 42 semanas, definida pela ultrassonografia, e internadas no período de janeiro a abril de 2013 em uma maternidade pública no estado do Acre, região Norte do Brasil. Os dados foram submetidos à análise bivariada para seleção de variáveis que compuseram o modelo múltiplo utilizando a técnica de regressão logística de Poisson.
RESULTADOS: A prevalência de morbimortalidade perinatal foi de 51,4%. Nesse total estão computados 2,3% de óbitos fetais (2 casos) e 9,2% de óbitos neonatais (8 casos). As variáveis que apresentaram associação no modelo múltiplo final com morbimortalidade foram: número de consultas de pré-natal ≥6, com razão de prevalência (RP) 0,5 e intervalo de confiança de 95% (IC95%) 0,3-0,9, idade gestacional ≥30 semanas (RP=0,6; IC95% 0,4-0,8), baixo peso ao nascer (RP=2,9; IC95% 1,5-5,4) e necessidade de ventilação mecânica (RP=3,8; IC95% 2,0-7,2).
CONCLUSÃO: Observou-se elevada morbimortalidade perinatal entre casos que cursaram com amniorrexe prematura. A morbimortalidade esteve associada a fatores como menor número de consultas de pré-natal, extrema prematuridade e o baixo peso.
Ruptura prematura de membranas fetais; Prematuro; Morbidade ; Corioamnionite; Recém-nascido de baixo peso
PURPOSE: To identify obstetric and perinatal factors associated with perinatal morbidity and mortality in pregnancies that progressed with ruptured membranes.
METHODS: A cross-sectional hospital-based study with secondary data from records of patients (n=87) that evolved with the premature rupture of membranes between 24 and 42 weeks of gestation, admitted from January to April 2013 to a public hospital in Acre State, North of Brazil. Data were subjected to bivariate analysis for selection of variables to be used in a multiple regression model according to Poisson logistic regression with robust error.
RESULTS: The prevalence of perinatal morbidity-mortality was 51.4%, including a 2.3% death rate (2 cases) and a 9.2% fetal neonatal death rate (8 cases). The variables associated with mortality in the final multiple model were: number of prenatal consultations ≥6, with a prevalence ratio (PR) of 0.5 and a 95% confidence interval (95%CI) of 0.3-0.9, gestational age ≥30 weeks (PR=0.6; 95%CI 0.4-0.8), low birth weight (PR=2.9; 95%CI 1.5-5.4), and mechanical ventilation (PR=3.8; 95%CI 2.0-7.2).
CONCLUSION: Perinatal morbidity and mortality were high among cases of ruptured membranes. Morbidity and mortality were associated with factors such as fewer prenatal visits, extreme prematurity and low birth weight in this group.
Fetal membranes, premature rupture; Infant, premature ; Morbidity; Chorioamnionitis ; Infant, low birth weight
Introdução
A ruptura prematura das membranas (RPM) ou amniorrexe prematura (AP) é definida como a perda de integridade das membranas ovulares (coriônica e amniótica) antes do início do trabalho de parto, independente da idade gestacional, ocorrendo em cerca de 8% das gestações1. A RPM pré-termo, isto é, ruptura das membranas em idade gestacional inferior a 37 semanas, é observada em cerca de 2% das gestações e tem como principal repercussão o aumento das taxas de nascimentos prematuros, respondendo por até um terço desses casos2.
A RPM pode gerar complicações tanto maternas quanto perinatais. Em relação ao risco materno, observa-se o aumento da morbimortalidade secundária à infecção e aumento da incidência de cesarianas3. Além disso, as pacientes com RPM pré-termo apresentam maior risco de desenvolver corioamnionite, resultante da ascensão de bactérias do trato genital inferior antes ou após a ruptura das membranas, podendo ser causa ou complicação da ruptura, ocorrendo sepse e óbito, respectivamente, em 0,8 e 0,14% dos casos4.
Para o feto, a perda da integridade das membranas ovulares pré-termo está fortemente relacionada à prematuridade4. O nascimento antes da 37ª semana é considerado uma das principais causas de mortalidade no Brasil, respondendo por 20,4% do total. Outras causas que seguem a prematuridade nesse contexto são infecções (11,7%) e asfixia perinatal (12,7%)5. Como a RPM tem estreita associação com os problemas citados anteriormente, ela aparece como mais uma variável importante no agravamento do cenário da morbidade e mortalidade perinatal. Além disso, é uma das condições que mais levam à internação de recém-nascido (RN) em unidade de terapia intensiva (UTI)6, podendo aumentar os gastos na saúde pública relacionados à manutenção dos que sobrevivem aos agravos, ainda que a maior sobrevida não signifique necessariamente ausência de comorbidades7.
A taxa de mortalidade neonatal diminuiu nas últimas décadas devido aos avanços tecnológicos. No entanto, as incidências de morbidades nos prematuros afetados pela RPM têm mostrado poucas alterações8. Surge ainda uma nova questão trazida pelo avanço tecnológico: o aumento no número de RN muito prematuros e de peso muito baixo, agregando preocupações não somente para a mortalidade, mas também para a sobrevida com sequelas, repercutindo na qualidade de vida futura dessas crianças9.
Em virtude da importância da RPM sobre a morbidade e mortalidade neonatal e perinatal, buscou-se identificar os fatores relacionados ao desenvolvimento desses agravos nesse grupo particular de gestantes. Dessa forma, esse trabalho tem como objetivo avaliar os fatores obstétricos e perinatais relacionados à morbimortalidade perinatal em um estado da região Norte do Brasil.
Métodos
Trata-se de um estudo transversal retrospectivo de base institucional com informações obtidas a partir dos prontuários arquivados no Setor de Arquivos Médicos e Estatística (SAME) da Maternidade Bárbara Heliodora (MBH) de Rio Branco, Acre. Foram obtidas informações sobre os RN e suas mães, sendo selecionadas as gestantes que apresentavam diagnóstico médico de AP à admissão na instituição. Foram excluídos aqueles que apresentaram idade gestacional (IG) inferior a 24 semanas no momento da ruptura da membrana, devido às baixas taxas de sucesso na conduta conservadora nesse período, associadas ao risco elevado de infecção materna, morte neonatal e lesão neurológica grave10. Também foram excluídos os prontuários de gestantes que cursaram com RPM que não possuíam o prontuário com os dados dos seus respectivos conceptos. O cálculo da idade gestacional foi feito a partir das informações contidas na primeira ultrassonografia da gestante e na data da última menstruação (DUM), encontrando-se valores semelhantes nos dois métodos utilizados, optou-se pelo primeiro em virtude do menor número de perdas encontradas na variável.
O diagnóstico da AP foi pautado na história da paciente, com queixa de perda líquida através da vagina, e do exame clínico, com a visualização da saída de líquido amniótico pelo orifício cervical. A ultrassonografia foi utilizada como método complementar, tendo sido sugestivo de AP os casos de diminuição do líquido amniótico (LA) com história clínica de perda líquida através da vagina, excluindo-se outras causas que podem provocar redução do LA.
A partir dos prontuários das pacientes e dos RN foi realizado o preenchimento da Ficha Individual de Coleta de Dados, elaborada exclusivamente para este estudo. Para manipulação dos prontuários foi solicitado um documento de autorização e assinado um termo de obrigatoriedade de sigilo das informações acessadas pela direção geral da maternidade Bárbara Heliodora e pela equipe de pesquisa. Os dados foram coletados no período de janeiro de 2013 a abril de 2013. Esses meses foram escolhidos em virtude da organização dos prontuários que davam entrada no Setor de Arquivos Médicos da Maternidade Bárbara Heliodora e eram separados pela funcionária do setor. Em média eram recebidos 25 prontuários de gestantes com RPM a cada mês, o que gerou a necessidade de coletar a informação de 4 meses, já que o cálculo do tamanho amostral era de 87 prontuários.
Para a definição do tamanho amostral foram utilizados os seguintes parâmetros: poder de teste 80,0%, uma proporção de não exposição para exposição de 4,8:1 obtida a partir de estudo piloto com os prontuários da instituição, sendo elegida como variável de exposição o baixo peso ao nascer e as informações de proporção de doentes entre os não expostos de 21,3% e odds artio (OR) de 6,1, obtidas a partir do estudo de Paula et al.7. Com essas informações, utilizando o programa Epi Info 3.5.4 for Windows11 em sua ferramenta Statcalc, se chegou a essa amostra necessária de 87 prontuários para a produção de estimativa de risco com intervalo de confiança de 95% (IC95%).
As variáveis coletadas foram divididas em maternas, que incluem variáveis epidemiológicas, clínicas e obstétricas, e variáveis neonatais. As variáveis maternas incluídas foram: idade materna; município de procedência; estado civil; escolaridade; estado civil; número de consultas pré-natal; idade gestacional no momento do parto utilizando-se o método ultrassonográfico (USG); uso de corticoide em gestantes com idade gestacional entre 24 e 34 semanas7; tocólise; uso de antibiótico profilático; via de parto; e corioamnionite.
O diagnóstico clínico de corioamnionite foi baseado nos critérios estabelecidos pelo protocolo da MBH que são: presença de temperatura axilar ≥37,8ºC, na ausência de outro foco infeccioso ou dois ou mais dos seguintes sinais e sintomas: taquicardia materna, taquicardia fetal, útero irritável, secreção purulenta ou odor fétido do líquido amniótico e leucocitose materna.
As variáveis neonatais avaliadas foram: idade gestacional do RN; índice de Apgar no primeiro e no quinto minuto; peso ao nascer; atendimento em UTI; ventilação mecânica; reanimação cardíaca e óbito do RN; e presença de morbimortalidade. Para caracterização do desfecho principal foram considerados como apresentando morbimortalidade os RN que apresentaram um ou mais dos seguintes sinais e sintomas: síndrome do desconforto respiratório, taquipneia transitória, pneumonia adquirida, kernicterus, icterícia, policitemia, sepse, alterações metabólicas; alterações anatômico-faciais; malformações congênitas. Também foram computados nessa definição os óbitos fetais e neonatais.
Os dados foram digitados no programa Epi Info 3.5.4. Em seguida foi verificada a consistência dos dados através obtenção das tabelas de distribuição de frequência para identificação de valores aberrantes e diferenças notáveis de cada variável. As variáveis quantitativas foram descritas em termos de média, e desvio padrão, e as qualitativas através de medidas absolutas e proporções.
Foi realizada análise de regressão logística hierarquizada por blocos para identificação das variáveis relacionados à morbimortalidade. Para isso foram selecionadas aquelas que apresentaram valor de p<0,1 na aplicação do teste do χ2 (chi-quadrado) de Pearson na análise bivariada. As variáveis foram ajustadas dentro de cada bloco, permanecendo para o ajuste dos blocos seguintes apenas as que mantiveram valor de p<0,05. As variáveis que apresentaram valores de p>0,05 foram retiradas do modelo e reavaliadas uma a uma quanto a alterações na magnitude das RP das variáveis que permaneceram no modelo. Se ocorressem alterações nas magnitudes acima de 10,0%, a variável era novamente inserida e mantida no modelo múltiplo final. As variáveis foram organizadas em quatro blocos hierarquizados: o primeiro foi composto pela variável distal número de consultas pré-natal. O segundo bloco foi composto pelas características e intercorrências no período gestacional (idade gestacional pelo método ultrassonográfico e infecção do trato urinário). O terceiro pelas alterações maternas e fetais no final da gestação e do parto (uso de corticoide, taquicardia fetal, corioamnionite, peso ao nascer, tipo de conduta e tocólise). O quarto bloco por aquelas variáveis relacionadas às condições pós-parto (via de parto, reanimação cardíaca, internação em UTI e ventilação mecânica).
A pesquisa foi conduzida de acordo com a Declaração de Helsinque revisada em 2008 e seguindo as recomendações da Resolução nº 466, de 2012. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Acre, com protocolo número 219.793 (2013).
Resultados
A idade das gestantes que integraram o estudo variou de 16 a 39 anos, com média de 25,4 (±6,2) anos, sendo que 64,0% residiam em Rio Branco, Acre. Apenas três pacientes moravam fora do Estado do Acre. Houve um predomínio de pacientes com ensino fundamental incompleto (29,8%). Em relação ao estado civil, 28,7% delas não têm uma vida conjugal estável.
A idade gestacional no momento do diagnóstico da RPM variou entre 24,2 e 41,1 semanas, com média de 34,9±4,5. Quanto aos períodos de ocorrência da amniorrexe, observou-se que 11,5% das mulheres apresentaram a perda da integridade das membranas ovulares antes da 30ª semana de idade gestacional. Foi constatada gestação múltipla em apenas uma paciente e cirurgia cesárea prévia em 23,3% dos casos. Quanto à paridade, 40,7% eram primíparas e 59,3% multíparas.
Em relação ao pré-natal, 50,6% frequentaram 6 ou mais consultas (média de 5,6±2,5 consultas). Infecção do trato urinário foi evidenciada em 47,2% das gestantes com AP e corioamnionite clínica foi diagnosticada em 14,6% das gestações. Em 68,6% dos casos optou-se por interrupção da gravidez, sendo a via de parto cesárea a mais frequente (60,5%). Realizou-se em 33,3% dos casos o uso de corticoide, sendo a betametasona a principal escolha. A terapia tocolítica foi usada apenas em 4,6% dos casos e o uso de antibioticoprofilaxia, em 78,2% dos casos, sendo mais frequente o uso de ampicilina (73,6%). A média do tempo de internação hospitalar foi de 5,6±2,2 dias, com 95,0% das pacientes não apresentando complicações imediatas no pós-parto. Não foram encontrados registros de óbito materno nos prontuários analisados (Tabela 1).
No tocante às variáveis perinatais, 52,9% dos RN tiveram idade gestacional, aferida pelo neonatologista pelo método Capurro, maior ou igual a 37 semanas e 21,8% com menos de 34 semanas. Apresentaram peso ao nascer menor do que 2.500 g, 42,5% dos RN. A taquicardia fetal (mais que 160 batimentos cardíacos por minuto) foi evidenciada em 13,8% dos casos. Houve a necessidade de internação em UTI em 25,3% e 40,2% dos RN necessitaram de ventilação mecânica.
Das variáveis que compõem o desfecho morbimortalidade perinatal, as que tiveram maior frequência foram sepse (18,6%), síndrome do desconforto respiratório agudo (14,0%), pneumonia (10,5%) e icterícia (10,5%). Apresentaram alterações anatômico-faciais 2,3% dos casos. A frequência de óbito perinatal foi de 11,5%.
A prevalência de morbimortalidade perinatal foi de 51,4%, sendo que a Tabela 1 apresenta os fatores clínico-obstétricos e neonatais que se relacionam com o desfecho, segundo análise bivariada. Essas foram escolhidas para compor o modelo múltiplo por apresentarem p<0,1.
Na modelagem multivariada final, conforme demonstrado na Tabela 2, observa-se associação de morbimortalidade perinatal com as variáveis número de consultas no pré-natal ≥6 (RP=0,5; IC95% 0,3-0,9; p=0,01), idade gestacional pela ultrassonografia no momento do diagnóstico da AP (RP=0,6; IC95% 0,4-0,8; p<0,0001), peso ao nascer (RP=2,9; IC95% 1,5-5,4; p=0,001) e ventilação mecânica (RP=3,8; IC95% 2,0-7,2; p<0,0001).
Discussão
Cerca de um terço dos partos prematuros e 20,0% dos óbitos perinatais são oriundos de gestações que cursaram com RPM1 , 2. Em nosso estudo, 47,1% foram partos prematuros e a taxa de óbitos perinatais foi de 11,5%. As principais causas de morbimortalidade foram a prematuridade extrema, infecções (sepse e pneumonia) e síndrome do desconforto respiratório, estando de acordo com as causas que prevalecem nos países nos países em desenvolvimento, como o Brasil, que são asfixia intrauterina e intraparto, baixo peso ao nascer, afecções respiratórias do RN, infecções e prematuridade12. Causas estas, preveníveis e relacionadas com a qualidade de atenção perinatal.
O pré-natal é o atendimento multidisciplinar que objetiva alcançar e manter a integralidade das condições de saúde materna e fetal, estando sua ausência associada ao aumento do risco de baixo peso ao nascer, partos prematuros e mortalidade materna e infantil13. A realização de seis ou mais consultas obteve associação inversa com a morbimortalidade perinatal, se mostrando como fator protetor para morbimortalidade perinatal. Esses dados reforçam as recomendações do Ministério da Saúde e demonstram a necessidade de conscientização em relação ao número de consultas, para garantir uma gestação saudável e um parto seguro14.
Em relação ao risco materno, observou-se elevada frequência de parto cesáreo (60,5%), sendo o resultado semelhante a outro estudo de gestações que cursaram com AP15. A cesárea apresenta duas vezes mais riscos que o parto vaginal16, implicando em maior permanência hospitalar e ocorrência de comorbidades neonatais, como prematuridade e síndrome do desconforto respiratório do RN.
A frequência de corioamnionite foi de 14,6%. Esse valor foi semelhante ao observado em outros estudos, que detectaram valores de 14,317e 15,0%18, contudo, a literatura relata prevalências de até 60,0%19 em gestações que cursaram nascimento pré-termo. A corioamnionite é um dos principais fatores que levam ao parto pré-termo e a sequelas em gestações20. A antibioticoprofilaxia é preconizada em alguns serviços, como o do presente estudo, que evidenciou uma frequência de 78,2%, sendo preconizado que a mesma seja utilizada após 18 horas de bolsa rota (>37 semanas), quando se instala o trabalho de parto prematuro ou em pacientes para os quais se opta pela conduta conservadora (<34 semanas). Contudo, a literatura ainda é controversa em relação ao benefício da utilização de antibióticos como terapia profilática21 , 22, sendo que a alta aplicação de antibiótico pode ser também ocasionado pelo uso independente da recomendação do protocolo por parte dos médicos. O presente estudo não mostrou associação entre antibióticos e morbimortalidade perinatal, sendo necessários novos estudos para melhor avaliação.
O fator que contribui de forma mais significativa para a morbidade e mortalidade perinatal é a prematuridade, havendo relação inversa entre idade gestacional no momento do parto e sobrevida neonatal23. Em nosso estudo foi encontrada associação entre idade gestacional e morbimortalidade perinatal (RP=0,6; IC95% 0,4-0,8; p=0,000). De forma geral, a prematuridade está associada a diversos problemas de adaptação à vida extrauterina pela imaturidade dos sistemas orgânicos, gerando assim diversos agravos que contribuem para a morbimortalidade no período neonatal, podendo haver mais chances de ocorrer alguma disfunção sistêmica, além do risco maior de sofrer algum comprometimento ao longo do desenvolvimento24. Isso reforça a importância da prematuridade no incremento das taxas de morbimortalidade perinatal, sobretudo em egressos de gestações com RPM pré-termo, além de aumentar os gastos públicos devido à maior demanda de assistência e cuidados de alta complexidade nesse grupo6.
O peso ao nascimento é fator relevante no manejo clínico e na avaliação prognóstica quanto à sobrevida e ao dano pós-natal25. O baixo peso ao nascer é um indicador importante de desnutrição e representa o fator de risco que mais influencia a sobrevivência infantil, estando relacionado à maior morbimortalidade neonatal26. Isso foi evidenciado no presente estudo, que verificou associação entre peso menor que 2.500 g e morbimortalidade perinatal. Dessa forma, a idade gestacional e o peso ao nascimento estão consistentemente relacionados ao aumento na incidência da mortalidade e a algumas morbidades relacionadas à prematuridade25 - 27.
Foi visto que o uso de ventilação mecânica está associado à morbimortalidade perinatal (RP=3,8). Em neonatos prematuros, a ventilação pode provocar lesão pulmonar ou exacerbar condições pré-existentes que levaram à necessidade do referido procedimento6 , 28. Os neonatos sob risco de desenvolver displasia broncopulmonar geralmente têm dificuldade respiratória intensa, que exige períodos prolongados de ventilação mecânica e oxigenioterapia29. A prematuridade pode estar associada à presença de enfisema intersticial pulmonar, persistência do canal arterial, baixa pressão parcial do CO2 com 48 horas de vida, pres são inspiratória máxima elevada, maior resistência das vias aéreas na primeira semana de vida e pressão arterial pulmonar elevada, contribuindo para o agravamento do dano pulmonar e aumento do tempo de permanência em ventilação mecânica30.
Este trabalho apresentou algumas limitações, como dificuldades de obter informações sobre a evolução do RN que obtiveram alta hospitalar com 24 a 48 horas por não apresentarem morbimortalidade ao nascer. Assim, se esses RN voltassem ao serviço por alguma morbimortalidade evidenciada ainda no período neonatal, não seria possível avaliar, pois dariam entrada no serviço com novos prontuários. Também não foi possível avaliar o período de latência, isto é, o tempo decorrido entre a RPM e o parto, por falta de informação nos prontuários. Além disso, a coleta de dados secundária também representa uma limitação do presente estudo, pois dificultou a obtenção de informações relevantes para a avaliação da morbimortalidade como, por exemplo, a confirmação diagnóstica de algumas doenças, que pode ter subestimado a proporção de complicações nos RN. Novas investigações, com casuísticas mais substanciais, permitirão avaliar aspectos ainda obscuros relacionados ao presente desfecho, permitindo sobrevivência com qualidade dos RN acometidos. Vale destacar também que a metodologia utilizada é adequada ao objetivo proposto de identificar fatores que contribuem para o adoecimento e morte dos RN e fetos de gestações complicadas pela RPM ovulares.
Em síntese, observa-se elevada morbimortalidade perinatal em gestações que cursaram com RPM, sendo essa um importante problema de saúde pública, por estar associada à extrema prematuridade e ao baixo peso ao nascer, principais causas de morbimortalidade perinatal no mundo1 , 2. Além disso, verifica-se associação desse quadro com a assistência pré-natal, devendo-se incentivar a realização de consultas pré-natais, além de avaliar a qualidade das mesmas para dar melhor suporte à gestação, a fim de diminuir os fatores que levaram a RPM e que por sua vez levam a um maior risco de prematuridade, e assim diminuir a necessidade de internações em UTI e uso de suporte mecânicos à vida, como a ventilação mecânica, diminuindo a morbimortalidade perinatal e os gastos públicos.
Agradecimentos
À Universidade Federal do Acre, à equipe do Serviço de Arquivo Médico e Estatística da Maternidade Bárbara Heliodora e ao Lucas Carvalho Dantas.
Referências
- 1 Kurasawa K, Yamamoto M, Usami Y, Mochimaru A, Mochizuki A, Aoki S, et al. Significance of cervical ripening in pre-induction treatment for premature rupture of membranes at term. J Obstet Gynaecol Res. 2014;40(1):32-9.
- 2 Sánchez Ramírez N, Nodarse Rodríguez A, Sanabria Arias AM, Octúzar Chirino A, Couret Cabrera MP, Díaz Garrido D. Morbilidad y mortalidad neonatal en pacientes con rotura prematura de membranas pretérmino. Rev Cuba Obstet Ginecol. 2013;39(4):343-53.
- 3 Tavassoli F, Ghasemi M, Mohamadzade A, Sharifian J. Survey of pregnancy outcome in preterm premature rupture of membranes with amniotic fluid index <5 and ≥5. Oman Med J. 2010;25(2):118-23.
- 4 Gonçalves LF, Silveira SK, Saab Neto JA. Estudo descritivo sobre a antibioticoprofilaxia na ruptura prematura pré-termo de membranas. ACM Arq Catarin Med. 2009;38(2):67-72.
- 5 Maranhão AGK, Vasconcelos AMN, Porto DL, França E. Mortalidade infantil no Brasil: tendências, componentes e causas de morte no período de 2000 a 2010. In: Brasil. Ministério da Saúde. Saúde Brasil 2011: uma análise da situação de saúde e vigilância da saúde da mulher. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012. p. 163-82.
- 6 Costa ALRR, Araujo Júnior E, Lima JWO, Costa FS. Fatores de risco materno associados à necessidade de unidade de terapia intensiva neonatal. Rev Bras Ginecol Obstet. 2014;36(1):29-34.
- 7 Paula GM, Silva LGP, Moreira MEL, Bonfim O. Repercussões da amniorrexe prematura no pré-termo sobre a morbimortalidade neonatal. Cad Saúde Pública. 2008;24(11):2521-31.
- 8 Watts JL, Saigal S. Outcome of extreme prematurity: as information increases so do the dilemmas. Arch Dis Child Fetal Neonatal Ed. 2006;91(3):F221-5.
- 9 Bettiol H, Barbieri MA, Silva AAM. Epidemiologia do nascimento pré-termo: tendências atuais. Rev Bras Ginecol Obstet. 2010;32(2):57-60.
- 10 Bader D, Kugelman A, Boyko V, Levitzki O, Lerner-Geva L, Riskin A, et al. Risk factors and estimation tool for death among extremely premature infants: a national study. Pediatrics. 2010;125(4):696-703.
-
11 Centers for Disease Control and Prevention (CDC) [Internet]. Epi Info Version 3.5.4. Atlanta: CDC; 2013 [cited 2014 Ago 6]. Available from: <http://wwwn.cdc.gov/epiinfo/html/prevVersion.htm>
» http://wwwn.cdc.gov/epiinfo/html/prevVersion.htm - 12 Romero R, Espinoza J, Gonçalves LF, Kusanovic JP, Friel LA, Nien JK. Inflammation in preterm and term labour and delivery. Semin Fetal Neonatal Med. 2006;11(5):317-26.
- 13 Polgliane RBS, Leal MC, Amorim MHC, Zandonade E, Santos Neto ET. Adequação do processo de assistência pré-natal segundo critérios do Programa de Humanização do Pré-natal e Nascimento e da Organização Mundial de Saúde. Ciênc Saúde Coletiva. 2014;19(7):1999-2010.
- 14 Calderon IMP, Cecatti JG, Vega CEP. Intervenções benéficas no pré-natal para prevenção da mortalidade materna. Rev Bras Ginecol Obstet. 2006;28(5):310-5.
- 15 Silva SALC, Moraes Filho OB, Costa CFF. Análise dos fatores de risco anteparto para ocorrência de cesárea. Rev Bras Ginecol Obstet. 2005;27(4):189-96.
- 16 Freitas PF, Savi EP. Desigualdades sociais nas complicações da cesariana: uma análise hierarquizada. Cad Saúde Pública. 2011;27(10):2009-20.
- 17 Becroft DM, Thompson JM, Mitchell EA. Placental chorioamnionitis at term: epidemiology and follow-up in childhood. Pediatr Dev Pathol. 2010;13(4):282-90.
- 18 Strunk T, Currie A, Simmer K, Burgner D. Chronic maternal infections during pregnancy. Lancet Infect Dis. 2012;12(10):747-8.
- 19 Strunk T, Doherty D, Jacques A, Simmer K, Richmond P, Kohan R, et al. Histologic chorioamnionitis is associated with reduced risk of late-onset sepsis in preterm infants. Pediatrics. 2012;129(1):e134-41.
- 20 Machado JR, Rocha LP, Barrilari SEG, Pucci KRM, Reis MA, Castro ECC, et al. Influências das intercorrências maternas e fetais nos diferentes graus de corioamnionite. Rev Bras Ginecol Obstet. 2012;34(4):153-7.
- 21 Flenady V, King J. Antibiotics for prelabour rupture of membranes at or near term. Cochrane Database Syst Rev. 2012;(3):CD001807.
- 22 Amorim MMR, Melo ASO. Avaliação dos exames de rotina pré-natal (Parte 1). Rev Bras Ginecol Obstet. 2009;31(3):148-55.
- 23 Bustamante TF, Gonçalves TA, Ferreira G, Moraes AG. Estudo sobre a mortalidade em UTI neonatal de um hospital escola no sul de Minas. Rev Ciênc Saúde. 2014;4(2):1-11.
- 24 Marete IK, Wasunna AO, Otieno PA. Clinical risk index for babies (CRIB) II score as a predictor of neonatal mortality among low birth weight babies at Kenyatta National Hospital. East African Med J. 2011;88(1):18-23.
- 25 Almeida MF, Alencar GP, Schoeps D, Novaes HMD, Campbell O, Rodrigues LC. Sobrevida e fatores de risco para mortalidade neonatal em uma coorte de nascidos vivos de muito baixo peso ao nascer, na Região Sul do Município de São Paulo, Brasil. Cad Saúde Pública. 2011;27(6):1088-98.
- 26 Motta MEFA, Silva GAP, Araújo OC, Lira PI, Lima MC. O peso ao nascer influencia o estado nutricional ao final do primeiro ano de vida? J Pediatr (Rio J). 2005;81(5):377-82.
- 27 Dammann O, Leviton A, Gappa M, Dammann CE. Lung and brain damage in preterm newborns, and their association with gestational age, prematurity subgroup, infection/inflammation and long term outcome. BJOG. 2005;112 Suppl 1:4-9.
- 28 Van Marter LJ. Epidemiology of bronchopulmonary dysplasia. Semin Fetal Neonatal Med. 2009;14(6):358-66.
- 29 Gonçalves DD, Silva LGP, Paula GM, Bonfim O, Moreira MEL, Assumpção AMB, et al. Ruptura prematura das membranas amnióticas no pré-termo: fatores associados à displasia broncopulmonar. Rev Bras Ginecol Obstet. 2010;32(10):497-503.
- 30 Schulzke SM, Pillow JJ. The management of evolving bronchopulmonary dysplasia. Paediatr Respir Rev. 2010;11(3):143-8.
-
Centro de Ciências da Saúde e do Desporto da Universidade Federal do Acre - Rio Branco (AC), Brasil.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Out 2014
Histórico
-
Recebido
28 Jan 2014 -
Aceito
20 Ago 2014