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Crise energética, cercamento das águas e resistência: o desafio da construção de comunidades político-epistêmicas

Energy Crisis, Water Enclosure and Resistance: The Challenge of Building Political-Epistemic Communities

RESUMO

Este texto discute os ganhos políticos e epistemológicos advindos da parceria entre historiadores/as, movimentos sociais, organizações e comunidades na discussão sobre a temática das crises energética e ambiental contemporâneas. A partir de categorias e hipóteses lançadas por esses sujeitos políticos, discutimos as formas como os recursos hídricos foram capturados pelas lógicas e necessidades das economias de mercado e, ainda, as soluções para a crise energética atual baseadas em agrocombustíveis. Por fim, defendemos que os/as historiadores/as, ao retomarem lugar no espaço público, devem estar ao lado daqueles que lutam, há pelo menos cinco décadas, por justiça ambiental, apostando na vida.

Palavras-chave:
Crise energética; cercamento das águas; comunidade político-epistêmica

ABSTRACT

This text discusses the political and epistemological gains arising from the partnership between historians, social movements, organizations, and communities in the discussion of the theme of the contemporary energy and environmental crisis. We discuss some categories and hypotheses put forward by these political subjects related to the ways in which water resources were captured by the market economy and the solutions to the current energy crisis based on agrofuels. Finally, we argue that historiography, when resuming its place in the public space, must be on the side of those who have been fighting, for at least five decades, against ecocide and epistemicide, and betting for life.

Keywords:
Energy crisis; Enclosure of Waters; Political-epistemic Community

Ecologia sem luta de classes é jardinagem.

(Chico Mendes apud. Rodrigues, 2020RODRIGUES, Gomercindo. Ecologia sem luta de classes é jardinagem. 22 dez. 2020. Disponível em: Disponível em: https://jacobin.com.br/2020/12/ecologia-sem-luta-de-classes-e-jardinagem/ . Acesso em: 27 jan. 2023.
https://jacobin.com.br/2020/12/ecologia-...
)

Somente a humanidade redimida poderá apropriar-se totalmente do seu passado.

(Benjamin, 2021BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito de história. Tradução de Sérgio Paulo Rouanet. 15 jul. 2021. Disponível em: Disponível em: https://jacobin.com.br/2021/07/sobre-o-conceito-de-historia/ . Acesso em: 27 jan. 2023.
https://jacobin.com.br/2021/07/sobre-o-c...
)

“Como os/as historiadores/as profissionais podem se posicionar frente à questão da sustentabilidade e da crise energética?”. Essa foi a pergunta que recebi da Revista Brasileira de História em julho de 2022. Como aprendi, vivendo no Cerrado e na Amazônia, sobre a impossibilidade de oferecer respostas individuais aos problemas coletivos, interpelei diversas pessoas e instituições.

Ficamos nos últimos meses a pensar numa resposta.

Portanto, a resposta que se oferece é coletiva, e se faz em coautoria com diversos sujeitos individuais e coletivos. Por isso, peço licença para passar à primeira pessoa do plural: nós. Nós que é representado, neste texto, pela coautoria com Valéria Pereira Santos e por aqueles que ajudaram a construir, nesses tempos de silêncio e violência, palavras. Respostas.

COMUNIDADES POLÍTICO-EPISTÊMICAS

A Pandemia, a Guerra na Ucrânia, o aumento dos preços dos combustíveis fósseis, a crise climática e a alteração da Diretiva da União Europeia sobre Energias Renováveis parecem o contexto imediato, aquele que exige, por parte da sociedade brasileira, uma resposta que sirva à demanda de orientação frente a esses eventos, como diria Jorn Rüsen (2001RÜSEN, Jörn. Razão histórica: teoria da história - os fundamentos da ciência histórica. Tradução de Estevão de Rezende Martins. Brasília: Ed. UnB, 2001.). A rapidez com que a Associação Brasileira de História (ANPUH) organizou o debate também indica que estamos (re)assumindo o lugar do intelectual público, que toma posição e propõe direção. Uma posição diferente do que ocorreu nos anos noventa e dois mil, quando havia uma espécie de “encastelamento” acadêmico. O retorno ao espaço público, também, claro está, foi ocasionado por mudanças políticas e sociais no país, que levaram a certa emergência do “histórico” no espaço público a partir de 2013, e se acirrou em 2016 e 2018. Dentro desse processo está a reação à Comissão Nacional da Verdade1 1 Para mais informações, ver Comissão Nacional da Verdade (s.d.). , e a tentativa, por parte de setores da direita e da extrema direita brasileira, de falsificar o passado nacional.

Os/as historiadores/as, convocados ao espaço público por setores da sociedade brasileira - talvez parte dos quais pedem mais livros de História e mandam que se estude história nos debates nas redes sociais - poderiam fornecer ao país um conhecimento que teria tremenda força reparadora (cf. Anexo I ANEXO I - FORÇA REPARADORA DA HISTÓRIA Imagem 01 Charge Fonte: Lotti (2015). É o tipo de enunciação que parece revestir o conhecimento histórico de uma aura reparadora. ). Contudo, é preciso cuidar para não fetichizar o lugar e o alcance desse conhecimento (cf. Ramos Junior, 2020aRAMOS JUNIOR, Dernival Venâncio. Desencobrir o Sul, desfetichizar o pensamento. EntreLetras, v. 11, n. 2, pp. 102-121, 2020a. ). O acúmulo de conhecimento histórico não tem sido suficiente para que as suas possíveis forças reparadoras sejam acionadas. Quando se ausentaram no espaço público, era a esse acúmulo que os/as historiadores estavam dedicados. Como sabemos, o exponencial aumento do tamanho da área de História no Brasil nos últimos 30 anos não foi capaz de impedir que um passado paralelo fosse proposto pelos setores conservadores. Talvez se argumente que faltou divulgação2 2 A capacidade de divulgação e popularização de teses negacionistas, anticientíficas e falsificadoras do passado foi um dos grandes trunfos da direita e da extrema-direita no Brasil, pelo menos, desde 2013. Não poucas vezes, foi como reação a essas teses, nas redes sociais, que os setores progressistas exigiram mais livros de história e mandavam que as pessoas estudassem história. desse saber acumulado, e isso é verdade. Mas nem tanto. Desde a consolidação da internet na vida social, dezenas de iniciativas de divulgação científicas estão no ar; de nossa perspectiva faltou, pelo nos parece, enraizamento social.

Uma das mostras mais interessantes desse processo, no Brasil, é o fato de que os memes pedem história para aqueles que falsificam o passado político do país, mas, até o momento, vimos poucos - nas redes sociais - sugerirem (cf. Anexo II ANEXO II - HISTÓRIA, NATUREZA E CAPITALISMO Imagem 02 Charge Fonte: Beck (2022). Interessante, para os propósitos de nossa argumentação, a hipótese de que a história do Brasil está, ao que parece, conectada ao ecocídio e ao epistemicídio indígenas. Nesse sentido, essa charge é profundamente orgânica com as lutas e hipóteses dos movimentos socioambientais indígenas e quilombolas. ) que o conhecimento da história faça parte do debate sobre a questão socioambiental. É preciso afirmar a relação entre o histórico e o socioambiental. Não apenas porque a questão socioambiental tem uma história, mas porque não existe experiência histórica alheia ao campo do ambiental. O debate sobre sustentabilidade e crise energética no mundo contemporâneo pode ser um bom começo.

O Brasil tem dado passos rápidos rumo à privatização da água, de seus serviços e produtos: concessões de uso para empresas privadas, privatizações no setor de saneamento e hidroelétrico, projeto de lei criando mercado das águas no país. Quanto de experiência histórica tem informado essas decisões? Ao se tratar da privatização da água vêm à memória, na América do Sul, os exemplos chileno e boliviano. O Chile privatizou a água ainda durante a ditadura em 1979, durante a Ditadura Pinochet. 40 anos depois, ativistas como Deisy Avendaño (Sudré, 2020SUDRÉ, Lu. Entenda como se deu o processo de privatização das águas no Chile. 03 ago. 2022. Disponível em: Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2020/08/03/entenda-como-se-deu-o-processo-de-privatizacao-das-aguas-no-chile . Acesso em: 12 set. 2022.
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) denunciam o controle por grandes empresas dos direitos de exploração aquífera, a escassez hídrica e o fato de que 43 mil famílias chilenas sofrem de insegurança hídrica diária. O fato de o país ter sofrido, nos últimos 13 anos (Sequía en Chile, 2021SEQUÍA EN CHILE. Biblioteca do Congresso Nacional de Chile. 2021. Disponível em: Disponível em: https://arcgiswebad.bcn.cl/portal/apps/MapJournal/index.html?appid=efba8ad0d3f34275b4d83eb4b1b07950 . Acesso em: 03 dez. 2022.
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), a maior seca de sua história, não está desconectado da exploração dos recursos hídricos pelas companhias, todas multinacionais, que detêm os direitos de captação e venda. A reação, na Bolívia, ao processo de privatização dos recursos hídricos, em um modelo semelhante ao chileno, levou a uma forte reação popular, no que ficou conhecido como Guerra da água3 3 Karen Piper (2014) fala também sobre as guerras da água no Oriente Médio, especialmente no Egito e no Iraque. , em Cochabamba, em 2001 (Drumond, 2015DRUMOND, Nathalie. A guerra da água na Bolívia: a luta do movimento popular contra a privatização de um recurso natural. Revista NERA, Presidente Prudente, ano 18, n. 28, pp. 186-205, 2015.). Escassez e violência parecem estar no rastro de escolhas que o Estado e setores da sociedade brasileiras têm tomado no que concerne aos recursos hídricos públicos.

O caso das usinas hidrelétricas na Amazônia pode aportar algo à hipótese. Elas são construídas a partir de racionalidade econômica e desconsideram os saberes socioambientais sobre rios, chuvas e fluxos naturais ligados a eles. Mas, no caso de Belo Monte, os saberes universitários também foram desprezados4 4 Para mais informações, ver O “eu te avisei”... (2020). . O painel de especialistas que mostrou os erros de cálculos sobre a vazão do Rio Xingu por parte dos empreendedores de Belo Monte foi desconsiderado, e, no ano passado, a principal voz desse painel foi ameaçada de morte5 5 Para mais informações, ver Araújo (2021). . Nesse ano, o Consórcio Norte Energia pediu ao governo a autorização para implantar usinas termelétricas com o objetivo de alcançar a produção mínima exigida em contrato com o operador nacional do sistema, e assim corroborou o que havia sido feito por pesquisadores, comunidades indígenas e movimentos ambientais. Além do erro em relação à vazão sazonal do Rio Xingu, repetiram-se os erros que levaram ao desequilíbrio ecológico da região, e, consequentemente, à morte de milhares de peixes6 6 Para mais informações, ver Redação (2018). .

Podemos afirmar, portanto, que Estado e corporações privadas são incapazes de aprender com o passado, mesmo neste contexto em que se fala tanto no histórico? A questão é que a escolha ética desses agentes passa ao largo disso. A dissociação, no imaginário político nacional, entre o ambiental e o histórico pode ser percebida como a causa mais imediata dessa incapacidade de aprender com as catástrofes socioambientais que as sociedades contemporâneas viveram no último século, e nós vivemos nas últimas décadas. A isso estamos chamando de falta de enraizamento. O saber histórico não repara nada sozinho, nem tem sido convocado a orientar as decisões do Estado e de agentes privados sobre temas fundamentais para a reprodução da vida social no país. Ele tem que ser politizado, conscientemente produzido como parte da luta política (de classe, raça, gênero, etnia, espaço-territorial e suas interseccionalidades) que informa o projeto de sociedade. Um conhecimento histórico reparador só será potente dentro de um contexto de luta política reparadora! Por isso, ao ser chamado ao espaço público, ou ao ir por conta própria ao espaço público, quem acompanhará os/as historiadores/as? Com quem eles devem falar? A sua enunciação deve ecoar quais projetos? Como pensar o lugar dos/das historiadores/as na emergência das lutas socioambientais contemporâneas? A resposta que podemos oferecer é a de que os/as historiadores/as, ou qualquer outro cientista social ou das humanidades, devem se posicionar nos espaços públicos com consciência do necessário engajamento político e por meio da construção de comunidades político-epistêmicas (Silva, 2022aSILVA, Idelma Santiago da. Trajetória de investigação e práxis crítica: História oral com mulheres camponesas no sudeste do Pará. In: ENCONTRO NACIONAL DE HISTÓRIA ORAL - PANDEMIA E FUTUROS POSSÍVEIS, XVI, 2022, Instituto de História da UFRJ, Rio de Janeiro. Pandemia e Futuros Possíveis: Anais do XVI Encontro Nacional de História Oral Apresentação oral, Rio de Janeiro, 2022a.; 2022bSILVA, Idelma Santiago da. História oral: condições de possibilidades e desafios desde comunidades político-epistêmicas. Mimeo, 2022b.) com movimentos sociais, comunidades e, inclusive, organizações da sociedade civil. Permitam dizer que esse engajamento deve ter caráter prático-político. Não estamos falando de ativismo, estamos falando de militância. E me permitam fazer uma distinção didática: o ativismo é político-discursivo e midiático, a militância é prática-política. Sem colocar a cabeça no lugar em que os seus pés pisam, para usar uma ideia de Pedro Casaldáliga e Leonardo Boff, não haverá intelectuais públicos. A universidade dá espaço para isso, por meio da extensão universitária, e a historiografia, por meio da História Oral, da História Pública e da História Ambiental - para falar de alguns - já possui as ferramentas. Parece, pois, que podemos trilhar um bom caminho. É preciso não apenas ir a público, é preciso se articular com quem sempre esteve lá, inclusive enquanto desfrutamos da proteção política que o isolamento nos proporcionou nos últimos 30 anos. Se queremos articular, no imaginário político, o histórico e o ambiental, é com os movimentos sociais, as comunidades e as organizações que devemos dialogar, e, por meio desse diálogo, produzir conhecimento socialmente relevante e enraizado.

ÁGUA NÃO É MERCADORIA

Mas é possível que surja a pergunta: como a articulação com movimentos sociais, organizações e comunidades pode ser proveitosa fora do enraizamento político do conhecimento histórico? No caso que nos interessa, aqui, a privatização da água, de seus serviços e produtos, nos parece que pode ser muito proveitosa, ainda, de um ponto de vista epistemológico. Um exemplo interessante, o recorte que tematiza a construção das hidrelétricas na Amazônia, pode ajudar a sustentar esse ponto. Poderíamos afirmar que existem dois paradigmas (Ramos Júnior, 2020bRAMOS JUNIOR, Dernival Venâncio; LUCENA, Mariane; SILVA, Harley. Geopolítica das Usinas Hidrelétricas, Lutas por re-existência e pedagogias da colonialidade na Amazônia do Tempo Presente. In: REIS, Tiago Siqueira et al. (Orgs.). Coleção história do tempo presente. Vol. III. Boa Vista: Editora da UFRR, 2020b. pp. 263-286.) que tratam desse tema. O primeiro deles, o paradigma dos impactos, envolve diversas áreas do conhecimento, inclusive a historiografia. Ele postula que devemos estudar os impactos socioambientais e, não poucas vezes, dá a entender que seria possível ir aprendendo com os casos, até chegar a uma capacidade de minorá-los a níveis aceitáveis. A essa “ecologia política”, chamada por Joan Martinez Allier (2018ALLIER, Joan Martínez. O ecologismo dos pobres. Tradução de Maurício Waldman. São Paulo: Editora Contexto, 2018.) de evangelho da ecoeficiência7 7 Allier (2018) divide o movimento ambientalista em três tendências: Culto à vida silvestre, evangelho da ecoeficiência e ecologismo dos pobres, ou movimento por justiça ambiental. , movimentos sociais como o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens)8 8 Para mais informações, ver Movimento dos atingidos por barragens (s.d.). e o MAM9 9 Para mais informações, ver Movimento pela soberania popular... (s.d.). (Movimento pela Soberania Popular na Mineração), e comunidades tradicionais envolvidas em conflitos por água causados por hidrelétricas, mineração ou monoculturas10 10 Para mais dados sobre conflitos pelas águas, ver Comissão Pastoral da Terra (s.d.). , têm levantado a hipótese de que estamos a testemunhar um processo de mercantilização dos recursos hídricos, de serviços e produtos a ele associados.

A hipótese da mercantilização das águas nos parece válida - e não somos os primeiros a testá-la (Swyngedouw, 2004SWYNGEDOUW, Erik. Privatizando o H2O: transformando águas locais em dinheiro global. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 06, v. 1, pp. 33-53, mai. 2004. ; Dardot; Laval, 2016DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.). De modo diferente do caso da Bolívia (Drummond, 2015), no Brasil, os processos de cercamento das águas via mercantilização foram construídos ao longo dos últimos 25 anos por meio da transferência da exploração de recursos hídricos para o setor privado. O marco institucional para esse processo é a Lei 8987/1995, aprovada durante o governo Fernando Henrique Cardoso. Além da privatização de setores como a telefonia e a mineração, no caso do setor hidrelétrico, o chamado Apagão em 2001 ajudou a construir a legitimidade política e institucional para a abertura da concessão privada de exploração dos recursos hídricos. Nos governos do Partido dos Trabalhadores, esse processo seguiu a partir da construção de 1011 11 Em 2015, entre planejada, construída e em construção, havia, pelo menos, 50 usinas hidrelétricas na Amazônia Brasileira. Porém, para a Amazônia internacional havia 355 usinas nas mesmas condições. Para mais informações, ver Initiative for the Integration of Regional... (s.d.). grandes Usinas Hidrelétricas na Amazônia (Fearnside, 2015FEARNSIDE, Philip M. Hidrelétricas na Amazônia: impactos ambientais e sociais na tomada de decisões sobre grandes obras. Vol. 01. Manaus: Editora do INPA, 2015.) por consórcios privados ou públicos-privados, a maior parte deles com financiamento do BNDES12 12 Exemplo de parceria público-privada foi o Consórcio Norte Energia, que construiu Belo Monte. A Norte Energia resultou da sociedade entre Eletrobrás, Vale S. A., além de outros investidores privados. A obra foi financiada pelo BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Em setembro desse ano, estava operando com 2,67% de sua capacidade. Para mais informações, ver Pereira (2021). . Depois do Golpe em 2016, nos governos Temer e Bolsonaro, esse processo se completou pela privatização do saneamento básico por meio da Lei n 14.026/2020 e da privatização da Eletrobrás, no primeiro semestre de 2022 - que é a maior companhia do setor elétrico da América Latina e responsável por quase um terço da energia elétrica do Brasil. Além desse marco legal, está tramitando, desde 2017, o Projeto de Lei n. 495, de 2017, que propõe alterar a Lei n. 9.433, de 8 de janeiro de 1997, para introduzir os mercados de água como instrumentos destinados a promover a alocação mais eficiente dos recursos hídricos. O projeto está assinado pelo Senador Tasso Jereissati (PSDB/CE)13 13 A decisão do Comitê de Bacia do Rio São Francisco por mercantilizar a água mostra que a hipótese levantada pelos movimentos há cerca de 20 anos é, no mínimo, um interessante ponto de partida. Conferir A cobrança pelo uso da água... (s.d.). . Esses acontecimentos mostram que os intelectuais públicos deveriam estar, há mais tempo, discutindo essa hipótese e, também, tomando parte em ações práticas-políticas de resistência a isso. A diferença entre a privatização da Companhia Vale do Rio Doce em 1997 e da Eletrobrás em 2022 mostra que o consenso - dentro da direita e da esquerda - formado em torno dessa questão mostrou-se tão forte a ponto de praticamente não ter havido, mesmo dentro dos movimentos sociais, resistência. Também não houve debates entre historiadores.

OBITUÁRIO DAS ÁGUAS

A mercantilização das águas não é um movimento isolado. É preciso inseri-lo dentro de contextos históricos que falam da construção de consenso em torno da mercantilização dos recursos naturais na América Latina. Maristela Svampa (2013VAMPA, Maristela Svampa. “Consenso de los Commodities” y lenguajes de valoración en América Latina. Nueva Sociedad, n. 244, mar.-abr. 2013. ) usa o termo “consenso das commodities” para nomear o modelo de desenvolvimento construído a partir dos anos 2000 na América Latina, baseado na mercantilização dos recursos e na transformação de países como o Brasil e Argentina em, prioritariamente, exportadores de commodities agrícolas e minerais. Talvez fosse importante fazer um reparo na tese da autora. Mais que consenso dos commodities, construiu-se um consenso em torno da “commodification” dos recursos naturais (da vida e dos corpos)14 14 Se movimento como o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) começa a dizer que “Água não é mercadoria”, com o passar do tempo aprimora-se a compreensão da dimensão do consenso em torno da mercantilização, discutindo-se, principalmente a partir do momento em que o movimento se abre à participação mais efetiva das mulheres, que “Mulher, água e energia não são mercadorias.”. Conferir Mulher, água e energia... (s.d.). . Vejamos o exemplo da principal commodity que o Brasil exporta hoje: a soja. Nos últimos 30 anos, o grande espaço de expansão da produção de soja foi o Cerrado. Em 43 anos, a produção brasileira de soja foi ampliada 10 vezes, saltando de 12 milhões de toneladas (na safra 1976/77) para 124,8 milhões de toneladas (na safra 2019/20). Essa expansão está intimamente conectada a práticas como violência, grilagem, expulsão de comunidades, desmatamento, fogo. Fogo que tem sido usado como uma arma contra comunidades cerradeiras, e, durante a Pandemia do novo coronavírus, isso foi intensificado15 15 Para mais informações, ver a plataforma Agro é fogo (s.d.). . É importante lembrar que, durante o período referido, o espaço de expansão da soja foi o Cerrado, bioma que movimentos, comunidades, organizações e cientistas nomeiam de berço das águas. Nele nascem 4 das 12 das maiores bacias hidrográficas do país: Xingu, Araguaia e Tocantins, São Francisco e Tapajós. Mas, como afirmam esses sujeitos coletivos, a água está desaparecendo16 16 Informação corroborada pela MapBiomas. Para mais informações, ver Método Mapbiomas Água (s.d.). . Essas denúncias de estresse hídrico relacionam-se ao fato de que quase metade do bioma foi destruído e, entre os anos de 2020 e 2021, houve um incremento de 20% de área desmatada, o que está diretamente conectado ao desaparecimento de centenas de veios de água. Na sessão do Tribunal Permanente dos Povos do CerradoTRIBUNAL PERMANENTE DOS POVOS. 49ª Sessão em defesa dos territórios do Cerrado (2019-2022). s.d. Disponível em: Disponível em: https://tribunaldocerrado.org.br/ . Acesso em: 17 de dez. 2022.
https://tribunaldocerrado.org.br/...
17 17 Para mais informações, ver o site Tribunal do Cerrado (s.d.). de 2022 falou-se, por esse motivo, em “obituário das águas”, ecocídio e epistemicídio do Cerrado e dos saberes a ele associados e relacionados aos modos de vida das populações tradicionais. O Brasil perdeu 15,7% da superfície de água nos últimos 30 anos18 18 Para mais detalhes e acesso à base de dados, ver Método Mapbiomas Água (s.d.). Um resumo jornalístico da situação poder ser encontrado em Freitas (2021). . O Cerrado, por outro lado, perdeu 1,3% (cf. Anexo III ANEXO III - ANTROPIZAÇÃO DAS ÁGUAS NO CERRADO ENTRE 1990 E 2020 Imagem 3 Mapa Fonte: Justino (2021). Esse mapa mostra a antropização das águas no Cerrado. A tendência de queda da superfície de água no Cerrado era acentuada na década de 1990, com a forte expansão da fronteira agrícola. Mas essa tendência sofreu retrocesso entre 2000 e 2010, justo no momento em que são inauguradas algumas das maiores usinas hidroelétricas no Cerrado. Apenas no rio Tocantins, entre 1998 e 2010, foram acrescidos 355 mil hectares de superfície aquática nas 6 grandes usinas construídas no rio: Serra da Mesa, 1998; Luís Eduardo Magalhães, 2003, Peixe Angical, 2002; São Salvador, 2009, e Estreito, 2010. Como no Cerrado nascem alguns dos maiores rios do país, a exemplo do São Francisco, é possível relacionar a área de expansão da fronteira agrícola e a perda de cerca de 10% de água de sua superfície pelo Velho Chico entre 1990 e 2020. A área do MATOPIBA, principal espaço de expansão da fronteira agrícola no Brasil nas últimas décadas, localiza-se entre as bacias do Araguaia/Tocantins e do São Francisco. No centro do MATOPIBA está a bacia do rio Parnaíba, a mais afetada pela expansão da soja na região. ), o que poderia parecer pouco. Mas o que se observa é a substituição da água natural pela água antrópica, o que se liga de modo especial às centenas de barramentos para a construção de reservatórios de usinas hidrelétricas, pequenas centrais hidrelétricas e represas para irrigação.

A expansão das commodities não apenas destrói veios e antropiza as águas, também leva à sua “exportação” e poluição. Por exportação das águas nomeamos “água virtual”, agregada à soja, à carne e aos minerais exportados para os países do Norte Global e da Ásia como “mochila hídrica”19 19 Para mais detalhes sobre o conceito de água virtual e de pegada (e mochila) hídrica, ver Trilho Ambiental (s.d.) e Water Footprint Network (s.d.). . A destruição ambiental ocasionada pela transferência dos impactos ambientais para os países do sul está ligada à ruína de ecossistemas e à inviabilidade de sistemas agrícolas de povos e comunidades tradicionais, mas também à contaminação de lençóis freáticos e das águas que são consumidas nas cidades. Em 121 dos 129 municípios do Estado do Tocantins, as águas consumidas pela população urbana possuem resíduos de até 27 agrotóxicos20 20 Conferir dados da pesquisa em Cunha (2019). . Por esse motivo, o Tribunal do Cerrado condenou o governo brasileiro, a União Europeia, outros países e várias empresas de ecocídio e genocídio. A categoria “obituário das águas”, assim, ajuda a compreender que a problemática da sustentabilidade dos recursos hídricos conecta-se, por um lado, à mercantilização desses recursos, à destruição da água natural (e à sua escassez nas regiões de fronteiras agrícolas e minerais) e à sua exportação pela economia dos commodities e da contaminação das águas subterrâneas.

DESLOCANDO A CRISE (ENERGÉTICA)

A crise energética de 1973, chamada de Crise do petróleo, elevou, internacionalmente, o preço da energia. Parte da solução encontrada foi deslocar, para o Sul global, partes das cadeias industriais responsáveis pela maior parte do consumo de energia, como a siderurgia. Neste contexto, usinas como a de Tucuruí, no rio Tocantins, foram construídas tendo-se em vista a instalação dos polos industriais do alumínio no município de Barcarena, no Pará (Fearnside, 2015FEARNSIDE, Philip M. Hidrelétricas na Amazônia: impactos ambientais e sociais na tomada de decisões sobre grandes obras. Vol. 01. Manaus: Editora do INPA, 2015.). Esse deslocamento das crises para os países do Sul global também é do conhecimento de comunidades, movimentos sociais e organizações, e foi sistematizado por David Harvey (2010HARVEY, David. The crisis of Capitalism. 26 abr. 2010. Disponível em: Disponível em: https:// www.thersa.org/globalassets/pdfs/blogs/rsa-lecture-david-harvey-transcript.pdf . Acesso em: 12 dez. 2022.
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), que afirma: o capitalismo não resolve suas crises, desloca-as geograficamente. Parece não ser diferente no caso da crise energética atual, potencializada pela guerra na Ucrânia. A alternativa proposta ao diesel são os agrocombustíveis (como o biodiesel) feitos a partir da soja, que contribui com 26% do biodiesel no mundo. No caso da Espanha, em 2016, 77% do biodiesel tinha como fonte o óleo de dendê21 21 Esse produto tem origem em regiões tropicais como Malásia, Indonésia, Amazônia, Pacífico Colombiano, etc. Para mais informações sobre a produção mundial de azeite de dendê, ver McCarthy (2020). , mas tal porcentagem começou a cair quando a soja surgiu como alternativa, ao ponto de, em 2019, 28% do biodiesel espanhol ser feito com soja, enquanto o dendê passou a significar cerca de 11%22 22 No Brasil, um dos grandes consumidores de energia do mundo, a soja já chegou a participar da produção de agrocombustíveis, com cerca de 82% em 2019, e 75% em 2021. deste montante (Villadiego; Castro, 2020VILLADIEGO, Laura; CASTRO, Nazaret. Soja: ¿la nueva palma de los biocombustibles? Los impactos socioambientales del monocultivo sojero para dar respuesta a la demanda de biocombustibles en Europa. Madri: Ecologistas en Acción, 2020. ). Organizações ambientais como Ecologistas em acción, da Espanha, pressionam para que a soja seja banida, assim como o óleo de dendê, da composição dos agrocombustíveis. O debate continua aberto. Porém, o fato de a normativa europeia de combate à importação de desmatamento (Azevedo et al., 2022AZEVEDO, Tasso. et al. Technical Note Potential Impacts of Due Diligence Criteria on the Protection of Threatened South American Non-forest Natural Ecosystems. jul. 2022. Disponível em: Disponível em: https://mapbiomas-br-site.s3.amazonaws.com/Nota%20T%C3%A9cnica/Nota_T%C3%A9cnica_UE_07.07.2022.pdf . Acesso em: 13 set. 2022.
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) usar uma definição de floresta e desmatamento que exclui 70% do Cerrado, do Pantanal, dos Pampas e de biomas sul-americanos - que se tornaram fronteiras para a expansão da produção de soja - parece indicar que os agrocombustíveis continuam sendo pensados, ao menos a curto prazo, como uma solução para a crise energética. Essas normativas (a de biocombustível e a de importação de desmatamento), apesar de serem consideradas um grande avanço, não protegem biomas e populações impactadas pela sua produção. O que esperar? A Europa parece disposta a resolver seus problemas internos de abastecimento e, para cumprir com seus compromissos climáticos, a sacrificar ecossistemas com menos marketing internacional, como o Cerrado, e suas populações tradicionais. Além disso, é necessário associar a necessária expansão da área plantada com o fato de que a agricultura, sozinha, corresponde a cerca de 70% do uso mundial de água (ONU, 2021), sem mencionar a poluição gerada pela atividade. O relatório Valor da água, da Organização das Nações Unidas, publicado em 2021, afirma ainda que 95% do gasto de água, no mundo, relaciona-se a três atividades: agricultura, pecuária e aquicultura (ONU, 2021). Parte da solução para a crise energética, de acordo com os eurodeputados, conecta-se à soja, considerada ambientalmente menos impactante que o dendê. Durante a audiência pública no Parlamento Europeu sobre o “impacto do cultivo de soja nas comunidades locais no Brasil e o papel das políticas de biocombustíveis da EU”, realizada em 12 de maio de 2022, a pressão feita por comunidades, organizações e movimentos sociais era contraposta: quais alternativas existiriam? Como disse a liderança indígena Jabson Nagelo Macuxi, de Roraima, presente na sessão: resolvam o problema de vocês sem transferi-lo para o nosso território. Claro está que as diretivas europeias contra a importação do desmatamento e das energias renováveis são instrumentos importantes na proteção das florestas tropicais. No entanto, parte da tentativa de solucionar a crise energética atual passa pela produção de agrocombustíveis. Esse critério duplo, que protege certas áreas (a Amazônia) e parece eleger outras (Cerrado, Pampas, Pantanal, etc.) como zonas de sacrifício, mostra o quanto os países centrais continuam reproduzindo práticas coloniais em regiões como a América Latina. De novo, a saída que encontram na Europa é deslocar a crise para os territórios do Sul.

TERRITORIALIZAR (A HISTÓRIA N)A VIDA

O processo de mercantilização das águas, depois de um longo período, parece se completar no país: geração de energia, saneamento, e, também, proposta de criação de mercado das águas. Esse processo, por outro lado, completa-se na matança de corpos das águas naturais e na poluição de águas subterrâneas com o agrotóxico. Como movimentos sociais, comunidades e organizações denunciam os novos cercamentos dos recursos naturais historicamente comunalizados, usamos a categoria cercamento no título deste trabalho. Esses novos cercamentos são percebidos, inclusive, na atitude dúbia de atores globais, como a União Europeia, frente às “mochilas ecológicas” dos produtos que sustentam o padrão de consumo associado ao modo de vida europeu, e mostram que eles continuam reproduzindo padrões coloniais de relação com povos e espaços naturais não europeus. A ecoeficiência, nesse contexto, é um dispositivo discursivo da greenwashing europeia. Se agrocombustíveis (de soja ou milho) são uma mostra dessa presumida capacidade de uso racional dos recursos, é preciso estar atento às injustiças ambientais geradas nos espaços do Sul global responsáveis por sua produção. Ecoeficiência , ecocídio e epistemicídio aqui. Frente a esse processo, como diria Alier (2016), os povos do Sul propõem ecojustiça ou justiça ambiental. Esse mesmo processo Enrique Leff (2016LEFF, Enrique. A aposta pela vida: imaginação sociológica e imaginários sociais nos territórios ambientais do Sul. Tradução de João Batista Kreuch. Petrópolis: Vozes. 2016. ) chama de aposta pela vida. Claro está que essa justiça e essa aposta pela vida são antissistêmicas. Não haverá justiça ambiental dentro do capitalismo - como não houve dentro do socialismo soviético. O aquecimento global e a pandemia do novo coronavírus mostram que é preciso construir alternativas. Em consonância com essa afirmação, os povos do Sul atuam em diversas frentes: na resistência à despossessão de espaços ambientais aos quais os seus modos de vidas estão intrinsecamente associados, na insurgência política, como mostram os processos de retomada territorial dos Guarani Kaiowá, nas autodemarcações territoriais de diversos povos, no aldeamento da política institucional, na produtiva, com a agroecologia e as florestas alimentares; e na frente epistemológica, no fortalecimento dos conhecimentos e na proposição de formas alternativas de lidar com essa realidade que nomeamos, a partir das epistemes ocidentais, de natureza e sociedade: buen-vivir, ubuntu, comuns, aldear a política, aquilombar a cidade, dentre muitas outras. Talvez desses lugares político-epistêmicos os/as historiadores/as poderão finalmente enunciar, no espaço público, um conhecimento com capacidade de articulação, no imaginário político, do ambiental e do histórico; e com a capacidade de remissão que é exigida do conhecimento histórico no espaço público contemporâneo.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Para mais informações, ver Comissão Nacional da Verdade (s.d.COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE. s.d. Disponível em: Disponível em: http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/...
    ).
  • 2
    A capacidade de divulgação e popularização de teses negacionistas, anticientíficas e falsificadoras do passado foi um dos grandes trunfos da direita e da extrema-direita no Brasil, pelo menos, desde 2013. Não poucas vezes, foi como reação a essas teses, nas redes sociais, que os setores progressistas exigiram mais livros de história e mandavam que as pessoas estudassem história.
  • 3
    Karen Piper (2014PIPER, Karen. The Price of Thirst: Global Water Inequality and the Coming Chaos. Minnesota: University of Minnesota Press, 2014. ) fala também sobre as guerras da água no Oriente Médio, especialmente no Egito e no Iraque.
  • 4
    Para mais informações, ver O “eu te avisei”... (2020O “EU TE AVISEI” sobre Belo Monte. 12 mai. 2020. Disponível em: Disponível em: https://www.ihu.unisinos.br/categorias/598834-o-eu-te-avisei-sobre-belo-monte . Acesso em: 27 de ago. 2022.
    https://www.ihu.unisinos.br/categorias/5...
    ).
  • 5
    Para mais informações, ver Araújo (2021ARAÚJO, Alice. Pesquisador ganhador de Prêmio Nobel sofre ataques xenófobos de bolsonarista em audiência no Amazonas. 29 set. 2021. Disponível em Disponível em https://www.opovo.com.br/noticias/politica/2021/09/29/pesquisador-ganhador-de-premio-nobel-sofre-ataques-xenofobos-de-bolsonarista-em-audiencia-no-amazonas.html . Acesso em: 27 ago. 2022.
    https://www.opovo.com.br/noticias/politi...
    ).
  • 6
    Para mais informações, ver Redação (2018REDAÇÃO. Morte de peixes paralisa turbinas de Belo Monte. 13 mar. 2018. Disponível em: Disponível em: https://www.estadao.com.br/economia/morte-de-peixes-paralisa-turbinas-de-belo-monte/ . Acesso em: 27 dez. 2022.
    https://www.estadao.com.br/economia/mort...
    ).
  • 7
    Allier (2018ALLIER, Joan Martínez. O ecologismo dos pobres. Tradução de Maurício Waldman. São Paulo: Editora Contexto, 2018.) divide o movimento ambientalista em três tendências: Culto à vida silvestre, evangelho da ecoeficiência e ecologismo dos pobres, ou movimento por justiça ambiental.
  • 8
    Para mais informações, ver Movimento dos atingidos por barragens (s.d.MOVIMENTO DOS ATINGIDOS POR BARRAGENS. s.d. Disponível em: Disponível em: https://mab.org.br/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://mab.org.br/...
    ).
  • 9
    Para mais informações, ver Movimento pela soberania popular... (s.d.MOVIMENTO PELA SOBERANIA POPULAR na mineração. s.d. Disponível em: Disponível em: https://www.mamnacional.org.br . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://www.mamnacional.org.br...
    ).
  • 10
    Para mais dados sobre conflitos pelas águas, ver Comissão Pastoral da Terra (s.d.COMISSÃO PASTORAL DA TERRA. s.d. Disponível em: Disponível em: https://www.cptnacional.org.br/downlods/category/6-conflitos-pela-agua . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://www.cptnacional.org.br/downlods/...
    ).
  • 11
    Em 2015, entre planejada, construída e em construção, havia, pelo menos, 50 usinas hidrelétricas na Amazônia Brasileira. Porém, para a Amazônia internacional havia 355 usinas nas mesmas condições. Para mais informações, ver Initiative for the Integration of Regional... (s.d.INITIATIVE FOR THE INTEGRATION OF REGIONAL Infrastructure in South America. s.d. Disponível em: Disponível em: https://archive.internationalrivers.org/campaigns/initiative-for-the-integration-of-regional-infrastructure-in-south-america#:~:text= The%20Initiative%20for%20the%20Integration,and%20energy%20and%20communications%20interconnections . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://archive.internationalrivers.org/...
    ).
  • 12
    Exemplo de parceria público-privada foi o Consórcio Norte Energia, que construiu Belo Monte. A Norte Energia resultou da sociedade entre Eletrobrás, Vale S. A., além de outros investidores privados. A obra foi financiada pelo BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Em setembro desse ano, estava operando com 2,67% de sua capacidade. Para mais informações, ver Pereira (2021PEREIRA, Renée. Sem água, Belo Monte opera com meia turbina desde o início de agosto. 21 set. 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/business/sem-agua-belo-monte-opera-com-meia-turbina-desde-o-inicio-de-agosto/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://www.cnnbrasil.com.br/business/se...
    ).
  • 13
    A decisão do Comitê de Bacia do Rio São Francisco por mercantilizar a água mostra que a hipótese levantada pelos movimentos há cerca de 20 anos é, no mínimo, um interessante ponto de partida. Conferir A cobrança pelo uso da água... (s.d.A COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA na Bacia do rio São Francisco. s.d. Disponível em: Disponível em: https://cbhsaofrancisco.org.br/a-cobranca-pelo-uso-da-agua-na-bacia-do-rio-sao-francisco/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://cbhsaofrancisco.org.br/a-cobranc...
    ).
  • 14
    Se movimento como o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens) começa a dizer que “Água não é mercadoria”, com o passar do tempo aprimora-se a compreensão da dimensão do consenso em torno da mercantilização, discutindo-se, principalmente a partir do momento em que o movimento se abre à participação mais efetiva das mulheres, que “Mulher, água e energia não são mercadorias.”. Conferir Mulher, água e energia... (s.d.MULHER, ÁGUA E ENERGIA não são mercadorias! s.d. Disponível em: Disponível em: https://mab.org.br/arpilleras-do-mab/mulher-agua-e-energia-nao-sao-mercadorias/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://mab.org.br/arpilleras-do-mab/mul...
    ).
  • 15
    Para mais informações, ver a plataforma Agro é fogo (s.d.AGRO É FOGO. s.d. Disponível em: Disponível em: https://agroefogo.org.br/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://agroefogo.org.br/...
    ).
  • 16
    Informação corroborada pela MapBiomas. Para mais informações, ver Método Mapbiomas Água (s.d.MÉTODO MAPBIOMAS ÁGUA. Disponível em: Disponível em: https://mapbiomas.org/metodo-agua . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://mapbiomas.org/metodo-agua...
    ).
  • 17
    Para mais informações, ver o site Tribunal do Cerrado (s.d.TRIBUNAL DO CERRADO. s.d. Disponível em: Disponível em: https://tribunaldocerrado.org.br/sessao-cerrado/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://tribunaldocerrado.org.br/sessao-...
    ).
  • 18
    Para mais detalhes e acesso à base de dados, ver Método Mapbiomas Água (s.d.MÉTODO MAPBIOMAS ÁGUA. Disponível em: Disponível em: https://mapbiomas.org/metodo-agua . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://mapbiomas.org/metodo-agua...
    ). Um resumo jornalístico da situação poder ser encontrado em Freitas (2021FREITAS, Adriana. Brasil perde 15% de superfície de água desde o começo dos anos 1990. 23 ago. 2021. Disponível em: Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/brasil-perde-15-de-superficie-de-agua-desde-o-comeco-dos-anos-1990/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/br...
    ).
  • 19
    Para mais detalhes sobre o conceito de água virtual e de pegada (e mochila) hídrica, ver Trilho Ambiental (s.d.TRILHO AMBIENTAL. s.d. Disponível em: Disponível em: https://www.trilhoambiental.org/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://www.trilhoambiental.org/...
    ) e Water Footprint Network (s.d.WATER FOOTPRINT NETWORK. s.d. Disponível em: Disponível em: https://www.waterfootprint.org/en/ . Acesso em: 21 jan. 2023.
    https://www.waterfootprint.org/en/...
    ).
  • 20
    Conferir dados da pesquisa em Cunha (2019CUNHA, Adenauer. Maioria dos municípios tocantinenses é abastecida com água contaminada por agrotóxicos, mostra levantamento. 16 abr. 2019. Disponível em: Disponível em: https://conexaoto.com.br/2019/04/16/maioria-dos-municipios-tocantinenses-e-abastecida-com-agua-contaminada-por-agrotoxicos-mostra-levantamento . Acesso em: 23 dez. 2022.
    https://conexaoto.com.br/2019/04/16/maio...
    ).
  • 21
    Esse produto tem origem em regiões tropicais como Malásia, Indonésia, Amazônia, Pacífico Colombiano, etc. Para mais informações sobre a produção mundial de azeite de dendê, ver McCarthy (2020MCCARTHY, Niall. 2 out. 2020. Which Countries Produce the Most Palm Oil? [Infographic]. Disponível em: Disponível em: https://www.forbes.com/sites/niallmccarthy/2020/10/02/which-countries-produce-the-most-palm-oil-infographic/?sh=59c29c941e42 . Acesso em: 23 dez. 2022.
    https://www.forbes.com/sites/niallmccart...
    ).
  • 22
    No Brasil, um dos grandes consumidores de energia do mundo, a soja já chegou a participar da produção de agrocombustíveis, com cerca de 82% em 2019, e 75% em 2021.

ANEXO I - FORÇA REPARADORA DA HISTÓRIA

Imagem 01
Charge

É o tipo de enunciação que parece revestir o conhecimento histórico de uma aura reparadora.

ANEXO II - HISTÓRIA, NATUREZA E CAPITALISMO

Imagem 02
Charge

Interessante, para os propósitos de nossa argumentação, a hipótese de que a história do Brasil está, ao que parece, conectada ao ecocídio e ao epistemicídio indígenas. Nesse sentido, essa charge é profundamente orgânica com as lutas e hipóteses dos movimentos socioambientais indígenas e quilombolas.

ANEXO III - ANTROPIZAÇÃO DAS ÁGUAS NO CERRADO ENTRE 1990 E 2020

Imagem 3
Mapa

Esse mapa mostra a antropização das águas no Cerrado. A tendência de queda da superfície de água no Cerrado era acentuada na década de 1990, com a forte expansão da fronteira agrícola. Mas essa tendência sofreu retrocesso entre 2000 e 2010, justo no momento em que são inauguradas algumas das maiores usinas hidroelétricas no Cerrado. Apenas no rio Tocantins, entre 1998 e 2010, foram acrescidos 355 mil hectares de superfície aquática nas 6 grandes usinas construídas no rio: Serra da Mesa, 1998; Luís Eduardo Magalhães, 2003, Peixe Angical, 2002; São Salvador, 2009, e Estreito, 2010. Como no Cerrado nascem alguns dos maiores rios do país, a exemplo do São Francisco, é possível relacionar a área de expansão da fronteira agrícola e a perda de cerca de 10% de água de sua superfície pelo Velho Chico entre 1990 e 2020. A área do MATOPIBA, principal espaço de expansão da fronteira agrícola no Brasil nas últimas décadas, localiza-se entre as bacias do Araguaia/Tocantins e do São Francisco. No centro do MATOPIBA está a bacia do rio Parnaíba, a mais afetada pela expansão da soja na região.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2023

Histórico

  • Recebido
    17 Jan 2023
  • Aceito
    19 Jan 2023
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