Acessibilidade / Reportar erro

Prevalência e perfil de suscetibilidade da colonização por Streptococcus do grupo B em gestantes da Amazônia Brasileira

Resumo

Objetivos:

avaliar a prevalência e os fatores epidemiológicos associados à colonização por Streptococcus do grupo B (GBS) em gestantes na cidade de Porto Velho, Rondônia.

Métodos:

GBS foi identificado e isolado por métodos genotípicos e microbiológicos a partir de amostras retovaginais de grávidas com 35-37 semanas de gestação. Os dados epidemiológicos foram coletados através de questionários e sua correlação com a presença de colonização foi avaliada. O perfil de susceptibilidade antimicrobiana foi determinado pelo método de disco-difusão.

Resultado:

um total de 22.5% (102/453) gestantes foram colonizadas por GBS. Um nível mais alto de colonização foi observado no sítio vaginal (17.6%) em comparação ao sítio retal. Não encontramos nenhum fator sociodemográfico ou obstétrico associado a um risco aumentado de colonização por GBS. Todas as amostras foram suscetíveis aos antibióticos penicilina, ampicilina, cefazolina e ceftriaxona. Em contraste, as taxas de resistência à tetraciclina (74.1%), eritromicina (14.1%) e clindamicina (3.5%) foram observadas.

Conclusões:

a prevalência de GBS, bem como a ausência de preditores de colonização, demonstraram a necessidade de triagem universal para GBS em todas as gestantes da região. Além disso, mostramos que os antimicrobianos de primeira linha recomendados para profilaxia são boas opções para a prevenção da doença GBS neonatal na região.

Palavras-chave:
Resistência a antibióticos; Doenças neonatais; Profilaxia por antibióticos; Vigilância em saúde; Gestantes

Abstract

Objectives:

to assess the prevalence and epidemiological factors associated with group B Streptococcus (GBS) colonization in pregnant women in Porto Velho City, Rondônia.

Methods:

GBS was identified and isolated by genotypic and microbiological methods from rectovaginal samples of pregnant women between 35 and 37 weeks of gestation. Epidemiological data were collected using questionnaires and their correlation with colonization was assessed. The antimicrobial susceptibility profile was determined by disk diffusion method.

Results:

a total of 22.5% (102/453) pregnant women were colonized with GBS. A higher level of colonization was observed at the vaginal tract (17.6%), compared to the rectal area. We did not find any sociodemographic or obstetric factors associated with an increased risk of GBS colonization. All strains were susceptible to antibiotics penicillin, ampicillin, cefazolin, and ceftriaxone. In contrast, the rates of resistance to tetracycline (74.1%), erythromycin (14.1%), and clindamycin (3.5%) were observed.

Conclusion:

the prevalence of GBS as well as the absence of predictors of colonization demonstrated the need for universal screening for GBS in all pregnant women in the region. In addition, we showed that the first-line antibiotics recommended for prophylaxis are still good options for the prevention of neonatal GBS disease in the region.

Key words:
Antibiotic resistance; Neonatal diseases; Antibiotic prophylaxis; Public health surveillance; Pregnant women

Introdução

Streptococcus do grupo B ou Streptococcus agalactiae (GBS) é o principal agente etiológico de infecções neonatais.11 Russell NJ, Seale AC, O’Driscoll M, O’Sullivan C, Bianchi-Jassir F, Gonzalez-Guarin J, et al.; GBS Maternal Colonization Investigator Group. Maternal colonization with group B Streptococcus and serotype distribution worldwide: systematic review and meta-analyses. Clin Infect Dis. 2017 Nov; 65 (Suppl. 2): S100-11. GBS coloniza principalmente os tratos geniturinário e gastrointestinal dos seres humanos, no entanto, a colonização nos sítios vaginais e retais de gestantes representa um risco para a saúde dos recém-nascidos, uma vez que o GBS pode ser transmitido verticalmente antes, durante e após o parto. Consequentemente, GBS pode causar uma vasta gama de quadros clínicos nos recém-nascidos, tais como sepse, meningite e pneumonia.11 Russell NJ, Seale AC, O’Driscoll M, O’Sullivan C, Bianchi-Jassir F, Gonzalez-Guarin J, et al.; GBS Maternal Colonization Investigator Group. Maternal colonization with group B Streptococcus and serotype distribution worldwide: systematic review and meta-analyses. Clin Infect Dis. 2017 Nov; 65 (Suppl. 2): S100-11.

A patologia da GBS pode ser classificada com base quando os sintomas da doença aparecem pela primeira vez. A doença de início precoce descreve o aparecimento de sintomas nos primeiros sete dias de vida do recém-nascido e resulta da disseminação do GBS através da via ascendente do útero ou durante o parto. As infecções graves apresentam-se frequentemente como sepse, pneumonia, instabilidade cardiovascular ou, menos frequentemente, meningite, e caracterizam-se por uma evolução clínica adversa.22 Bartlett AW, Smith B, George CR, McMullan B, Kesson A, Lahra MM, et al. Epidemiology of Late and Very Late Onset Group B Streptococcal Disease: Fifteen-Year Experience From Two Australian Tertiary Pediatric Facilities. Pediatr Infect Dis J. 2017 Jan; 36 (1): 20-4. A doença de início tardio caracteriza-se pelo aparecimento de sintomas entre o oitavo dia de vida e os três meses e pode também estar associada a outros microrganismos para além do GBS, incluindo estafilococos coagulase-negativos, Escherichia coli e outras bactérias gram-negativas.22 Bartlett AW, Smith B, George CR, McMullan B, Kesson A, Lahra MM, et al. Epidemiology of Late and Very Late Onset Group B Streptococcal Disease: Fifteen-Year Experience From Two Australian Tertiary Pediatric Facilities. Pediatr Infect Dis J. 2017 Jan; 36 (1): 20-4. A doença de início tardio está principalmente associada à meningite, que pode levar a sequelas cognitivas e neurológicas.33 Kohli-Lynch M, Russell NJ, Seale AC, Dangor Z, Tann CJ, Baker CJ, Bartlett L, et al. Neurodevelopmental Impairment in Children After Group B Streptococcal Disease Worldwide: Systematic Review and Meta-analyses. Clin Infect Dis. 2017 Nov; 65 (Suppl. 2): S190-9. As doenças invasivas causadas pelo GBS são responsáveis por 5-20% da mortalidade em recém-nascidos prematuros e 1-8,4% da mortalidade em recém-nascidos de termo.44 Madrid L, Seale AC, Kohli-Lynch M, Edmond KM, Lawn JE, Heath PT, et al.; Infant GBS Disease Investigator Group. Infant group B Streptococcal disease incidence and serotypes worldwide: systematic review and meta-analyses. Clin Infect Dis. 2017 Nov; 65 (Suppl. 2): S160-72.

Investigações epidemiológicas demonstraram que aproximadamente 18% das mulheres em todo o mundo são colonizadas por GBS durante a gravidez, embora a incidência varie entre 11% e 35% consoante a região11 Russell NJ, Seale AC, O’Driscoll M, O’Sullivan C, Bianchi-Jassir F, Gonzalez-Guarin J, et al.; GBS Maternal Colonization Investigator Group. Maternal colonization with group B Streptococcus and serotype distribution worldwide: systematic review and meta-analyses. Clin Infect Dis. 2017 Nov; 65 (Suppl. 2): S100-11.. GBS está associado a 518.000 nascimentos pré-termo, 392.000 infecções neonatais e 91.000 mortes neonatais anualmente em todo o mundo.55 World Health Organization (WHO). Group B streptococcus full value of vaccine assessment. Geneva: WHO; 2021. [access in 2022 Nov 18]. Available from: https://www.who.int/teams/immunization-vaccines-andbiologicals/immunizationanalysis-and-insights/vaccine-impact-value/group-bstreptococcus-full-value-of-vaccineassessment
https://www.who.int/teams/immunization-v...
Estudos sobre a prevalência de colonização em mulheres grávidas no Brasil mostraram taxas heterogéneas de 4,2-28,4%.66 Nascimento CS, Santos NFB, Ferreira RCC, Taddei CR. Streptococcus agalactiae in pregnant women in Brazil: prevalence, serotypes, and antibiotic resistance. Braz J Microbiol. 2019; 50 (4): 943-52. Preocupantemente, os países de baixa renda são mais suscetíveis a altas taxas de morbidade e mortalidade devido ao GBS do que os países de alta renda, o que está associado à falta de medidas sistemáticas de profilaxia, entre outros fatores.77 Schrag SJ, Zell ER, Lynfield R, Roome A, Arnold KE, Craig AS, et al; Active Bacterial Core Surveillance Team. A population-based comparison of strategies to prevent early-onset group B streptococcal disease in neonates. N Engl J Med. 2002 Jul; 347 (4): 233-9.

As diretrizes para a profilaxia de GBS foram atualizadas em 2020 pelo American College of Obstetricians and Gynecologists (Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas). O rastreio universal de GBS envolve a detecção da colonização materna através de culturas retais e vaginais coletadas entre 36-37 semanas gestacionais. Os resultados positivos são então tratados com profilaxia antimicrobiana intraparto (IAP). A penicilina G é o antibiótico de primeira escolha para o tratamento destes casos. Em mulheres grávidas alérgicas à penicilina, são utilizados medicamentos alternativos, como a clindamicina e a cefazolina. A maioria das amostras de GBS permanecem suscetíveis à penicilina e a outros β-lactâmicos, entretanto, a resistência a agentes antimicrobianos usados como terapias alternativas, principalmente lincosamidas, já foi descrita anteriormente.88 Prevention of Group B Streptococcal Early-Onset Disease in Newborns: ACOG Committee Opinion, Number 797. Obstet Gynecol. 2020 Feb; 135 (2): e51-e72. Erratum in: Obstet Gynecol. 2020 Apr; 135 (4): 978-9.

No Brasil, GBS não tem sido reconhecido como agente causador de processos infecciosos subjacentes em recém-nascidos e gestantes, devido ao não isolamento do microrganismo e/ou à subnotificação. Essa falta de reconhecimento ocorre apesar da gravidade da infeção pelo GBS e do fato de que a população tem grandes chances de se beneficiar da profilaxia. No Brasil, não há recomendação das autoridades sanitárias nacionais para o rastreamento do GBS em gestantes de baixo risco, o que se justifica pela escassez de pesquisas nacionais que fundamentem a elaboração de diretrizes que recomendem a prestação de cuidados às portadoras de GBS.99 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica Cadernos de atenção Básica: Atenção ao Pré-Natal de Baixo Risco. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2023. [access in 2024 May 16]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/atencao_pre_natal_baixo_risco.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...

Na Amazônia brasileira, particularmente no estado de Rondônia, há uma falta de dados epidemiológicos sobre várias doenças infecciosas importantes, incluindo GBS, o que contrasta com o sudeste do Brasil.66 Nascimento CS, Santos NFB, Ferreira RCC, Taddei CR. Streptococcus agalactiae in pregnant women in Brazil: prevalence, serotypes, and antibiotic resistance. Braz J Microbiol. 2019; 50 (4): 943-52. A Amazônia brasileira cobre mais de 6,3 milhões de km2 e tem uma população de cerca de 29,6 milhões de pessoas, e há uma variação substancial em muitos fatores de estilo de vida na região.1010 Brazilian Institute of Geography and Statistics (IBGE). Census. 2010 [access in 2022 January 24]. Available from: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/default.shtm
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
Há uma necessidade premente de pesquisa médica sobre tópicos como bacteriologia em mulheres grávidas na Amazônia. Essa investigação poderia ajudar a melhorar as políticas médicas e sociais que afetam tanto a mãe como a criança e, assim, conduzir a uma diminuição da mortalidade infantil na Amazônia. Diante da importância clínica desse agente patogênico e da escassez de pesquisas sobre a prevalência de GBS na região Norte do Brasil, este estudo teve como objetivo avaliar a prevalência de colonização por GBS e as características sociodemográficas e clínicas associadas em gestantes atendidas na Rede Pública de Saúde do Município de Porto Velho, Estado de Rondônia, Brasil.

Métodos

Foi realizado um estudo prospetivo e transversal, no período de abril de 2018 a março de 2020, na cidade de Porto Velho, capital do estado de Rondônia, que se localiza na parte ocidental da Região Norte do Brasil, na Amazônia Ocidental, e possui uma população estimada de 548.952 habitantes.

A população do estudo é composta por gestantes amostradas aleatoriamente entre 35 a 37 semanas de gestação, de acordo com a versão 2010 das diretrizes perinatais de GBS do CDC,1111 Verani JR, McGee L, Schrag SJ; Division of Bacterial Diseases, National Center for Immunization and Respiratory Diseases, Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Prevention of perinatal group B streptococcal disease--revised guidelines from CDC, 2010. MMWR Recomm Rep. 2010 Nov; 59 (RR-10): 1-36. que foram avaliadas no Centro Integrado Materno Infantil, bem como gestantes de baixo risco avaliadas em onze Unidades Básicas de Saúde do município de Porto Velho. Foram excluídas do estudo as gestantes em tratamento com antibiótico oral ou intravaginal ou em fase tardia do parto. Com base em uma prevalência de 20% de GBS em gestantes e utilizando um erro amostral de 5% e nível de confiança de 95%, calculamos o tamanho ideal da amostra em 477 indivíduos.

As amostras de secreção retal e vaginal foram coletadas por profissionais de saúde durante consultas ambulatoriais pré-natais de rotina. As amostras vaginais foram coletadas com um swab estéril que foi introduzido na vagina até o seu terço distal sem higienização prévia ou uso de espéculo. Após uma rotação suave, o swab foi removido e imediatamente imerso no meio de transporte Stuart (CRAL, São Paulo, Brasil). Para amostras retais, um swab estéril foi introduzido no orifício anal até a parede distal do reto e um movimento de rotação suave foi usado. O swab foi imediatamente imerso em um meio de transporte (CRAL). Posteriormente, as amostras foram enviadas ao Laboratório de Microbiologia da Fundação Oswaldo Cruz de Rondônia e processadas em até 24 horas após a coleta, conforme recomendado pelo Center for Disease Control and Prevention (CDC).1111 Verani JR, McGee L, Schrag SJ; Division of Bacterial Diseases, National Center for Immunization and Respiratory Diseases, Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Prevention of perinatal group B streptococcal disease--revised guidelines from CDC, 2010. MMWR Recomm Rep. 2010 Nov; 59 (RR-10): 1-36. Além disso, foram coletados dados sobre idade, estado civil, grupo étnico, nível de escolaridade, ocupação, histórico obstétrico e atividade sexual de cada paciente, entre outras variáveis, por meio de questionários.

Os swabs foram removidos do meio de transporte e inoculados em tubos preenchidos com 4 mL de caldo Todd-Hewitt (THB; KASVI, Paraná, Brasil) suplementado com gentamicina (8 µg/mL; Interlab, São Paulo, Brasil) e ácido nalidíxico (15 µg/mL; Sigma-Aldrich, Missouri, EUA). Posteriormente, as amostras foram incubadas em 5% de CO2 a 37°C por 24 h. O DNA bacteriano foi extraído da cultura usando o método fenol-clorofórmio.1212 Sambrook J, Fritsch EF, Maniatis T. Molecular cloning: a laboratory manual. New York: Cold Spring Harbor Laboratory; 1989. Outros 0,09 mL de caldo foram transferidos para criotubos de 2 mL com 0,06 mL de glicerol (50%; Thermo Fisher Scientific, Massachusetts, EUA) e armazenados em um freezer a -80 °C para testes bacteriológicos adicionais. A PCR para detecção do GBS foi realizada de acordo com o método descritos por Ke et al.1313 Ke D, Ménard C, Picard FJ, Boissinot M, Ouellette M, Roy PH, et al. Development of conventional and real-time PCR assays for the rapid detection of group B streptococci. Clin Chem. 2000; 46 (3): 324-31. usando S. agalactiae ATCC 27956 como controle positivo.

As amostras criopreservadas foram inoculadas em caldo THB e incubadas em 5% de CO2 a 37°C por 24 h. Em seguida, as culturas foram semeadas em placas de ágar sangue Columbia (BIOLOG, Califórnia, EUA) suplementadas com 5% de sangue de carneiro desfibrinado (EBE FARMA, Rio de Janeiro, Brasil) e incubadas nas condições mencionadas acima.1111 Verani JR, McGee L, Schrag SJ; Division of Bacterial Diseases, National Center for Immunization and Respiratory Diseases, Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Prevention of perinatal group B streptococcal disease--revised guidelines from CDC, 2010. MMWR Recomm Rep. 2010 Nov; 59 (RR-10): 1-36. As placas foram avaliadas após 24 horas para verificar a presença de colônias indicativas de GBS, ou seja, colônias pequenas (0,5-1 mm) e transparentes com hemólise beta discreta. As colônias que apresentavam essas características morfológicas e hemolíticas foram submetidas a testes de identificação presuntiva para produção de CAMP (Christie-Atkins-Munch-Peterson), atividade de catalase e coloração de Gram. Após o isolamento das bactérias, as amostras foram armazenadas em criotubos e criopreservadas em glicerol a −80°C.22 Bartlett AW, Smith B, George CR, McMullan B, Kesson A, Lahra MM, et al. Epidemiology of Late and Very Late Onset Group B Streptococcal Disease: Fifteen-Year Experience From Two Australian Tertiary Pediatric Facilities. Pediatr Infect Dis J. 2017 Jan; 36 (1): 20-4.

Os isolados foram testados quanto à suscetibilidade aos seguintes agentes antimicrobianos: penicilina G (10µg), ampicilina (10µg), clindamicina (2µg), cefazolina (30µg), ceftriaxona (30µg), eritromicina (15µg) e tetraciclina (30µg) (CECON, São Paulo, Brasil) usando o método de disco-difusão de Kirby-Bauer, conforme recomendado pelo European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing (EUCAST). Os resultados foram interpretados de acordo com o BrCast/EUCAST.1414 European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing (EUCAST). Breakpoint tables for interpretation of MICs and zone diameters European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing. Version 11.0. 2021. [access in 2022 Jan 20]. Available from: https://www.eucast.org/fileadmin/src/media/PDFs/EUCAST_files/Breakpoint_tables/v_11.0_Breakpoint_Tables.pdf
https://www.eucast.org/fileadmin/src/med...

As informações dos questionários foram agrupadas usando o Excel 2016 (Microsoft, Washington, EUA). Estatísticas descritivas foram usadas para resumir os dados dos participantes. Os dados foram organizados em uma tabela de contingência e analisados utilizando o teste exato de Fisher. Valores de p≤0,05 foram considerados significativos, e intervalos de confiança de 95% foram considerados.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Pesquisa em Medicina Tropical CEP/CEPEM n. 76.812-329.

Resultados

De abril de 2018 a março de 2020, 453 gestantes foram examinadas quanto à colonização por GBS com base nos critérios de elegibilidade. A presença de colonização por GBS foi identificada em pelo menos uma das amostras (vaginal e/ou retal) em 102 casos, resultando em uma prevalência de 22,5% (IC95% = 19%-26%). Não foram observadas flutuações significativas nas taxas de colonização durante o período do estudo (Figura 1A). Entretanto, quando a taxa de colonização foi estratificada por local de coleta, observamos um crescimento acentuado na taxa de colonização vaginal e uma leve diminuição na colonização retal durante o período do estudo (Figura 1B).

Figura 1
Porcentagens de colonização por Streptococcus do Grupo B (GBS) entre 453 gestantes residentes em Porto Velho, Brasil, de abril de 2018 a março de 2020.

A Tabela 1 descreve as características sociodemográficas com base na presença ou ausência de colonização por GBS. Das 453 gestantes examinadas, 54,3% (246/453) tinham entre 20 e 30 anos, 71,7% (325/453) eram casadas, 54,5% (247/453) eram donas de casa, 61,4% (278/453) tinham ensino médio completo, 71,1% (322/453) se autodeclaravam pardas e 92,3% (418/453) moravam na zona urbana. As taxas de colonização por GBS nessas gestantes foram as seguintes: idade entre 20 e 30 anos (47,1%), casadas (71,6%), autodeclaradas “pardas” (73,5%), com ensino médio completo (62,7%), donas de casa (47,1%) e residentes em zonas urbanas (93,1%). Entretanto, não houve diferenças significativas na presença ou ausência de colonização por GBS nas pacientes com base nas características demográficas. As gestantes com menos de 20 anos apresentaram uma tendência maior de colonização por GBS do que as mulheres de outras faixas etárias (odds ratio = 1,648 [IC = 0,9661-2,813]).

Tabela 1
Associação entre fatores sociodemográficos, aspectos obstétricos e colonização por GBS entre gestantes residentes em Porto Velho, Brasil, no período de abril de 2018 a março de 2020.

As características obstétricas avaliadas neste estudo são apresentadas na Tabela 1. No total, 79,4% (81/102) das gestantes positivas para colonização por GBS tiveram relações sexuais durante a gravidez, com uma taxa razoável de infecções do trato urinário de 54,9% (56/102) e corrimento vaginal de 61,8% (63/102). Também foi observado que 5,9% (6/102) dessas mulheres tiveram parto prematuro em uma gravidez anterior e 4,9% (5/102) relataram sepse neonatal anterior. Não houve diferença significativa entre as variáveis clínico-obstétricas e a colonização por GBS. A hipertensão arterial sistêmica foi a síndrome pré-existente mais prevalente entre as pacientes investigadas.

O sítio vaginal apresentou a maior taxa de colonização por GBS, de 17,6% (80/453 [IC95% = 13,1%-22%]), enquanto o sítio retal foi colonizado em 13,8% (63/453 [IC95% = 10,8%-16,8%]) das gestantes. A estratificação do local de coleta mostrou que 4,8% (22/453) das gestantes foram positivas apenas na região retal, 8,6% (39/453) foram positivas apenas na região vaginal e 9% (41/453) apresentaram colonização em ambos os locais.

A suscetibilidade a agentes antimicrobianos foi testada em 85 dos isolados viáveis após a criopreservação em glicerol. Um total de 77,9% dos isolados investigados foi resistente a pelo menos um dos agentes antimicrobianos testados, com a tetraciclina e a eritromicina apresentando as maiores porcentagens de resistência de 74,1% (63/85) e 14,1% (12/85), respectivamente. A taxa de resistência à clindamicina foi de 3,5% (3/85), e todos os isolados foram suscetíveis à penicilina, ampicilina, cefazolina e ceftriaxona. O nível de resistência foi avaliado em intervalos durante o período do estudo. Foi observada uma taxa estável de resistência à tetraciclina, enquanto a taxa de resistência à clindamicina caiu e a resistência à eritromicina aumentou consideravelmente (Figura 2). Não houve diferença estatística nos perfis de suscetibilidade antimicrobiana entre os isolados derivados de diferentes locais de coleta anatômica.

Figura 2
Distribuição e tendência de perfis de resistência antimicrobiana entre isolados de GBS coletados em Porto Velho, Brasil, de abril de 2018 a março de 2020.

Discussão

Este estudo representa o primeiro esforço para verificar a prevalência da colonização por GBS entre gestantes em Porto Velho, Rondônia, localizada na região amazônica do Brasil. Além disso, avalia as características sociodemográficas e clínicas associadas à colonização por GBS, bem como a suscetibilidade das amostras isoladas aos antimicrobianos comumente empregados no tratamento profilático. A pesquisa sobre o GBS em mulheres grávidas é particularmente significativa devido ao fato de que a colonização vaginal e/ou retal se constitui como o principal fator de risco para a infecção neonatal pelo GBS. Os recém-nascidos, que possuem um sistema imunológico imaturo, são, consequentemente, mais vulneráveis à sepse neonatal, à pneumonia e à meningite causadas pelo GBS.1515 Steer PJ, Russell AB, Kochhar S, Cox P, Plumb J, Gopal Rao G. Group B streptococcal disease in the mother and newborn-A review. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2020 Sep; 252: 526-33.

Este estudo mostrou uma prevalência de 22,5% de colonização por GBS em mulheres entre 35-37 semanas de gestação. A taxa de colonização por GBS determinada por estudos anteriores em gestantes brasileiras foi de 4,2 a 28,4%.66 Nascimento CS, Santos NFB, Ferreira RCC, Taddei CR. Streptococcus agalactiae in pregnant women in Brazil: prevalence, serotypes, and antibiotic resistance. Braz J Microbiol. 2019; 50 (4): 943-52. A prevalência observada neste estudo estava dentro do limite superior dessa faixa. O Brasil é um país de proporções continentais e possui diferenças sociorregionais intrínsecas que podem explicar a grande variação nas taxas de colonização. Outro fator importante que provavelmente influencia essa variação é a ausência de recomendações oficiais do Sistema Único de Saúde (SUS) e de diretrizes universais para a triagem de GBS.66 Nascimento CS, Santos NFB, Ferreira RCC, Taddei CR. Streptococcus agalactiae in pregnant women in Brazil: prevalence, serotypes, and antibiotic resistance. Braz J Microbiol. 2019; 50 (4): 943-52., 99 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica Cadernos de atenção Básica: Atenção ao Pré-Natal de Baixo Risco. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2023. [access in 2024 May 16]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/atencao_pre_natal_baixo_risco.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...

O estudo indicou que as taxas de colonização por GBS materno em gestantes da Rede Pública de Saúde da cidade de Porto Velho foram maiores do que as estimativas mundiais (18% [IC95%= 17%-19%]), mas permanecem dentro das médias regionais (11%-35%). O sul da Ásia e o leste da Ásia apresentaram as menores taxas de colonização por GBS (13% e 11%, respectivamente). A prevalência neste estudo foi maior do que da América do Sul (15,9% [IC95%= 13,5%-18,2%]) e semelhante à da Austrália e Nova Zelândia (23,3%), América do Norte (23,2%), Norte da Europa (22,2%), Leste Europeu (23%) e Norte da África (22,9%).11 Russell NJ, Seale AC, O’Driscoll M, O’Sullivan C, Bianchi-Jassir F, Gonzalez-Guarin J, et al.; GBS Maternal Colonization Investigator Group. Maternal colonization with group B Streptococcus and serotype distribution worldwide: systematic review and meta-analyses. Clin Infect Dis. 2017 Nov; 65 (Suppl. 2): S100-11.

A taxa de colonização varia de acordo com a área geográfica, as diferenças genéticas na resposta do hospedeiro, as metodologias de amostragem e o protocolo de processamento adotado para o procedimento de triagem. Além disso, o tempo de coleta durante a gravidez, o uso (ou não) de meios de cultura seletivos enriquecidos e o fato de a metodologia de identificação ser baseada em sorologia, biologia molecular ou testes presuntivos também podem contribuir para a variabilidade relatada em estudos anteriores.1515 Steer PJ, Russell AB, Kochhar S, Cox P, Plumb J, Gopal Rao G. Group B streptococcal disease in the mother and newborn-A review. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2020 Sep; 252: 526-33.

Além da prevalência geral de colonização, também avaliamos as diferenças na presença de GBS em mulheres grávidas em relação aos locais de coleta e ao tempo de estudo. Não foram observadas flutuações significativas nas taxas gerais de colonização durante o período do estudo, conforme observado anteriormente no Brasil.1616 Botelho ACN, Oliveira JG, Damasco AP, Santos KTB, Ferreira AFM, Rocha GT, et al. Streptococcus agalactiae carriage among pregnant women living in Rio de Janeiro, Brazil, over a period of eight years. PLoS One. 2018 May; 13 (5): e0196925. Diferentemente da maioria dos estudos anteriores, que usaram uma técnica de swab combinado, este estudo usou swabs separados para determinar a colonização em diferentes locais anatômicos, permitindo que as taxas fossem estratificadas de acordo com o local de coleta. Uma taxa mais alta de colonização por GBS foi observada na região vaginal, com uma tendência de crescimento acentuado durante o período do estudo. Esses dados indicam uma maior afinidade do GBS com a região vaginal, o que corrobora as descobertas de que o GBS possui inúmeras adesinas e invasinas de superfície que interagem diretamente com o epitélio vaginal e promovem a colonização persistente nesse nicho.1717 Brokaw A, Furuta A, Dacanay M, Rajagopal L, Adams Waldorf KM. Bacterial and host determinants of group B Streptococcal vaginal colonization and ascending infection in pregnancy. Front Cell Infect Microbiol. 2021 Sep; 11: 720789. Estudos anteriores discordaram sobre a superioridade da colonização vaginal em comparação com a colonização retal, sendo essa divergência influenciada pelas características da própria população do estudo, bem como pelo método de identificação usado, citado anteriormente.1818 Dashtizade M, Zolfaghari MR, Yousefi M, Nazari-Alam A. Antibiotic susceptibility patterns and prevalence of Streptococcus agalactiae rectovaginal colonization among pregnant women in Iran. Rev Bras Ginecol Obstet. 2020 Aug; 42 (8): 454-9., 1919 Nkembe NM, Kamga HG, Baiye WA, Chafa AB, Njotang PN. Streptococcus agalactiae prevalence and antimicrobial susceptibility pattern in vaginal and anorectal swabs of pregnant women at a tertiary hospital in Cameroon. BMC Res Notes. 2018 Jul; 11 (1): 480.

O CDC dos EUA recomenda a triagem universal usando métodos baseados em cultura e o tratamento subsequente com IAP quando a colonização é detectada. Uma abordagem alternativa usa fatores de risco para tomar decisões sobre o tratamento com IAP quando o status de colonização é desconhecido.1111 Verani JR, McGee L, Schrag SJ; Division of Bacterial Diseases, National Center for Immunization and Respiratory Diseases, Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Prevention of perinatal group B streptococcal disease--revised guidelines from CDC, 2010. MMWR Recomm Rep. 2010 Nov; 59 (RR-10): 1-36. Atualmente, não há consenso internacional sobre qual dessas duas abordagens é mais eficaz. No entanto, vários estudos mostraram uma melhor cobertura profilática de recém-nascidos suscetíveis à doença por GBS usando a triagem por cultura.77 Schrag SJ, Zell ER, Lynfield R, Roome A, Arnold KE, Craig AS, et al; Active Bacterial Core Surveillance Team. A population-based comparison of strategies to prevent early-onset group B streptococcal disease in neonates. N Engl J Med. 2002 Jul; 347 (4): 233-9., 2020 Schrag SJ, Verani JR. Intrapartum antibiotic prophylaxis for the prevention of perinatal group B streptococcal disease: experience in the United States and implications for a potential group B streptococcal vaccine. Vaccine. 2013 Aug; 31 (Suppl. 4): D20-6., 2121 Homer CS, Scarf V, Catling C, Davis D. Culture-based versus risk-based screening for the prevention of group B streptococcal disease in newborns: a review of national guidelines. Women Birth. 2014 Mar; 27 (1): 46-51. Um estudo anterior mostrou uma queda significativa no risco de desenvolvimento de doença de início precoce entre os recém-nascidos de gestantes triadas em comparação com aqueles tratados de acordo com os fatores de risco.1111 Verani JR, McGee L, Schrag SJ; Division of Bacterial Diseases, National Center for Immunization and Respiratory Diseases, Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Prevention of perinatal group B streptococcal disease--revised guidelines from CDC, 2010. MMWR Recomm Rep. 2010 Nov; 59 (RR-10): 1-36. Um estudo realizado no Rio de Janeiro, Brasil, relatou que 14% das mulheres sabidamente colonizadas por GBS usando a abordagem baseada em cultura teriam sido excluídas da recomendação da IAP se apenas os fatores de risco tivessem sido considerados.1616 Botelho ACN, Oliveira JG, Damasco AP, Santos KTB, Ferreira AFM, Rocha GT, et al. Streptococcus agalactiae carriage among pregnant women living in Rio de Janeiro, Brazil, over a period of eight years. PLoS One. 2018 May; 13 (5): e0196925.

Atualmente, o Brasil não adota a triagem universal sistemática e padronizada para mulheres grávidas, apesar das evidências globais de sua eficácia. O CDC demonstrou nos EUA uma redução de 80% na doença início precoce como resultado do tratamento de profilaxia em mulheres grávidas.1111 Verani JR, McGee L, Schrag SJ; Division of Bacterial Diseases, National Center for Immunization and Respiratory Diseases, Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Prevention of perinatal group B streptococcal disease--revised guidelines from CDC, 2010. MMWR Recomm Rep. 2010 Nov; 59 (RR-10): 1-36. Em países onde não há recomendação para a IAP, há 1,1% de probabilidade de desenvolvimento de doença de início precoce devido à colonização por GBS em gestantes, enquanto em países que adotam a profilaxia o risco cai para 0,03%.2222 Cho CY, Tang YH, Chen YH, Wang SY, Yang YH, Wang TH, et al. Group B Streptococcal infection in neonates and colonization in pregnant women: An epidemiological retrospective analysis. J Microbiol Immunol Infect. 2019 Apr; 52 (2): 265-72. Entretanto, a IAP não afetou a doença causada por GBS antes do parto ou a doença de início tardio, e há preocupações sobre os efeitos na composição do microbioma neonatal e materno por meio da pressão seletiva e do desenvolvimento de resistência antimicrobiana.1515 Steer PJ, Russell AB, Kochhar S, Cox P, Plumb J, Gopal Rao G. Group B streptococcal disease in the mother and newborn-A review. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2020 Sep; 252: 526-33., 2323 Prescott S, Dreisbach C, Baumgartel K, Koerner R, Gyamfi A, Canellas M, et al. Impact of Intrapartum Antibiotic Prophylaxis on Offspring Microbiota. Front Pediatr. 2021 Dec 10; 9: 754013. Como as evidências sugerem, até que mais estratégias preventivas estejam disponíveis, como uma vacina materna contra o GBS, a triagem universal baseada em cultura em conjunto com a IAP continua sendo o protocolo mais eficaz para prevenir a doença neonatal por GBS.22 Bartlett AW, Smith B, George CR, McMullan B, Kesson A, Lahra MM, et al. Epidemiology of Late and Very Late Onset Group B Streptococcal Disease: Fifteen-Year Experience From Two Australian Tertiary Pediatric Facilities. Pediatr Infect Dis J. 2017 Jan; 36 (1): 20-4., 55 World Health Organization (WHO). Group B streptococcus full value of vaccine assessment. Geneva: WHO; 2021. [access in 2022 Nov 18]. Available from: https://www.who.int/teams/immunization-vaccines-andbiologicals/immunizationanalysis-and-insights/vaccine-impact-value/group-bstreptococcus-full-value-of-vaccineassessment
https://www.who.int/teams/immunization-v...

Neste estudo, os fatores sociodemográficos e obstétricos não foram significativamente associados à colonização por GBS, indicando uma distribuição homogênea da colonização por GBS em gestantes da região, conforme observado em estudos anteriores realizados no Brasil e em outros países.2424 Rocha JZ, Feltraco J, Radin V, Gonçalves CV, Silva PEA, Von Groll A. Streptococcus agalactiae colonization and screening approach in high-risk pregnant women in southern Brazil. J Infect Dev Ctries. 2020; 14 (4): 332-40., 2525 Gizachew M, Tiruneh M, Moges F, Adefris M, Tigabu Z, Tessema B. Streptococcus agalactiae from Ethiopian pregnant women; Prevalence, associated factors and antimicrobial resistance: Alarming for prophylaxis. Ann Clin Microbiol Antimicrob. 2019; 18 (1): 1-9. Fatores sociodemográficos e obstétricos podem aumentar a probabilidade de colonização por GBS. Estudos anteriores demonstraram que determinados grupos étnicos, idades e condições obstétricas específicas apresentam maior risco de colonização por GBS, bem como fatores de risco associados para o desenvolvimento de doença de início precoce e cepas com perfis hipervirulentos.22 Bartlett AW, Smith B, George CR, McMullan B, Kesson A, Lahra MM, et al. Epidemiology of Late and Very Late Onset Group B Streptococcal Disease: Fifteen-Year Experience From Two Australian Tertiary Pediatric Facilities. Pediatr Infect Dis J. 2017 Jan; 36 (1): 20-4., 1616 Botelho ACN, Oliveira JG, Damasco AP, Santos KTB, Ferreira AFM, Rocha GT, et al. Streptococcus agalactiae carriage among pregnant women living in Rio de Janeiro, Brazil, over a period of eight years. PLoS One. 2018 May; 13 (5): e0196925., 2626 Zaleznik DF, Rench MA, Hillier S, Krohn MA, Platt R, Lee ML, et al. Invasive disease due to group B Streptococcus in pregnant women and neonates from diverse population groups. Clin Infect Dis. 2000 Feb; 30 (2): 276-81. Identificamos uma tendência a uma maior taxa de colonização (embora não estatisticamente significativa) em gestantes com menos de 20 anos de idade. Assim, nossos resultados demonstram a necessidade de triagem universal de mulheres grávidas devido à distribuição homogênea da colonização por GBS em características populacionais amplamente variadas. Isso destaca a importância da vigilância contínua do GBS na região, uma vez que as características associadas à colonização podem mudar com o tempo.

Embora o IAP seja a principal defesa contra a infecção precoce por GBS, foi relatada a não suscetibilidade aos agentes antimicrobianos comumente usados na profilaxia. Nossos resultados mostraram que 14,1% dos isolados eram resistentes à eritromicina e que a taxa de resistência aumentou durante o período do estudo, enquanto 3,5% eram resistentes à clindamicina. Barros2727 Barros RR. Antimicrobial resistance among beta-hemolytic streptococcus in Brazil: an overview. Antibiotics (Basel.). 2021 Aug; 10 (8): 973. destacou que a taxa de não suscetibilidade à clindamicina variou de 1,9 a 18,8% e à eritromicina variou de 4 a 25% em estudos brasileiros realizados nas últimas décadas, com um aumento significativo após 2010. Vale ressaltar que, embora o grau de suscetibilidade à eritromicina seja comumente avaliado para GBS, esse antimicrobiano não é mais usado como opção para a IAP devido às suas propriedades farmacocinéticas e ao aumento da resistência.2727 Barros RR. Antimicrobial resistance among beta-hemolytic streptococcus in Brazil: an overview. Antibiotics (Basel.). 2021 Aug; 10 (8): 973., 2828 Bulska M, Szcześniak P, Pięta-Dolińska A, Oszukowski P, Orszulak-Michalak D. The placental transfer of erythromycin in human pregnancies with group B streptococcal infection. Ginekol Pol. 2015 Jan; 86 (1): 33-9. Essas tendências temporais na suscetibilidade antimicrobiana mostram a necessidade de vigilância contínua das taxas de resistência para avaliar se esses medicamentos podem ou não ser usados na IAP no contexto local.

O agente antimicrobiano com a maior taxa de resistência observada no presente estudo foi a tetraciclina, que não é recomendada para uso na IAP. No entanto, seus níveis de resistência estão sendo monitorados. Outros estudos realizados no Brasil também relataram altas taxas de resistência a esse agente antimicrobiano.1616 Botelho ACN, Oliveira JG, Damasco AP, Santos KTB, Ferreira AFM, Rocha GT, et al. Streptococcus agalactiae carriage among pregnant women living in Rio de Janeiro, Brazil, over a period of eight years. PLoS One. 2018 May; 13 (5): e0196925., 2727 Barros RR. Antimicrobial resistance among beta-hemolytic streptococcus in Brazil: an overview. Antibiotics (Basel.). 2021 Aug; 10 (8): 973. Além disso, altas taxas de resistência (>70%) foram relatadas em outros países.2525 Gizachew M, Tiruneh M, Moges F, Adefris M, Tigabu Z, Tessema B. Streptococcus agalactiae from Ethiopian pregnant women; Prevalence, associated factors and antimicrobial resistance: Alarming for prophylaxis. Ann Clin Microbiol Antimicrob. 2019; 18 (1): 1-9., 2929 Burcham LR, Spencer BL, Keeler LR, Runft DL, Patras KA, Neely MN, et al. Determinants of Group B streptococcal virulence potential amongst vaginal clinical isolates from pregnant women. PLoS One. 2019 Dec 18; 14 (12): e0226699.

Todas as amostras de GBS avaliadas foram suscetíveis aos agentes antimicrobianos de primeira escolha, penicilina e ampicilina, bem como às cefalosporinas. Apesar dos relatos de isolados com suscetibilidade reduzida à penicilina em outros países, não há relatos de GBS resistente a β-lactâmicos no Brasil até o momento, o que indica que os antibióticos de primeira linha recomendados para a IAP continuam sendo boas opções para a prevenção da doença neonatal por GBS.2424 Rocha JZ, Feltraco J, Radin V, Gonçalves CV, Silva PEA, Von Groll A. Streptococcus agalactiae colonization and screening approach in high-risk pregnant women in southern Brazil. J Infect Dev Ctries. 2020; 14 (4): 332-40., 2727 Barros RR. Antimicrobial resistance among beta-hemolytic streptococcus in Brazil: an overview. Antibiotics (Basel.). 2021 Aug; 10 (8): 973., 3030 Campo CH, Martínez MF, Otero JC, Rincón G. Vagino-rectal colonization prevalence by Streptococcus agalactiae and its susceptibility profile in pregnant women attending a third-level hospital. Biomedica. 2019; 1; 39 (4): 689-98. No entanto, essa informação pode ser subnotificada porque a suscetibilidade reduzida à penicilina não pode ser detectada por métodos de difusão em ágar, mas apenas por testes de concentração inibitória mínima (CIM).2727 Barros RR. Antimicrobial resistance among beta-hemolytic streptococcus in Brazil: an overview. Antibiotics (Basel.). 2021 Aug; 10 (8): 973.

Como limitação do presente estudo, os resultados relativos ao perfil de suscetibilidade antimicrobiana foram obtidos de 83,3% (85/102) dos isolados recuperados de gestantes. A identificação preliminar e o isolamento das amostras clínicas não foram realizados simultaneamente com a caracterização dos isolados, portanto, algumas cepas de GBS foram perdidas durante o período de armazenamento, situação já descrita.1616 Botelho ACN, Oliveira JG, Damasco AP, Santos KTB, Ferreira AFM, Rocha GT, et al. Streptococcus agalactiae carriage among pregnant women living in Rio de Janeiro, Brazil, over a period of eight years. PLoS One. 2018 May; 13 (5): e0196925. Apesar da alta sensibilidade e especificidade do ensaio de PCR usado para identificar o GBS, a falta de confirmação da cultura de todos os resultados de PCR (tanto positivos quanto negativos) e a não utilização do CIM para determinar a suscetibilidade reduzida à penicilina também são reconhecidas como possíveis limitações do estudo.

Os achados deste estudo enfatizam a importância de identificar a colonização materna por GBS na região local como um meio de diminuir os casos de infecção neonatal causada por patógenos bacterianos, devido à sua prevalência na região. Além disso, os estudos que continuam a avançar na compreensão dos fatores epidemiológicos, da virulência e da suscetibilidade antimicrobiana dos isolados de GBS de gestantes e neonatos dos estados amazônicos do Brasil são cruciais para o desenvolvimento de técnicas de vigilância e prevenção direcionadas ao GBS.

Este é o primeiro estudo a investigar a colonização por GBS nessa região. Este estudo revelou a prevalência de colonização por GBS em gestantes da Rede Pública de Saúde de Porto Velho, Rondônia, utilizando metodologias microbiológicas e moleculares. Não houve associação entre as características sociodemográficas e clínicas e a colonização, o que reforça a necessidade de exames uniformes em todas as gestantes entre a 36ª e a 37ª semanas de gestação. Além disso, embora os isolados tenham apresentado uma alta taxa de resistência à tetraciclina e à eritromicina, eles também mostraram alta suscetibilidade aos antimicrobianos de primeira linha usados na profilaxia. Considerando que o Brasil não adota uma triagem universal sistemática e padronizada, apesar das evidências globais de sua eficácia, este estudo fornece dados cruciais para a elaboração de estratégias para prevenir a infecção invasiva por GBS e, consequentemente, minimizar a mortalidade e a morbidade causadas por esse patógeno no Brasil.

References

  • 1
    Russell NJ, Seale AC, O’Driscoll M, O’Sullivan C, Bianchi-Jassir F, Gonzalez-Guarin J, et al.; GBS Maternal Colonization Investigator Group. Maternal colonization with group B Streptococcus and serotype distribution worldwide: systematic review and meta-analyses. Clin Infect Dis. 2017 Nov; 65 (Suppl. 2): S100-11.
  • 2
    Bartlett AW, Smith B, George CR, McMullan B, Kesson A, Lahra MM, et al. Epidemiology of Late and Very Late Onset Group B Streptococcal Disease: Fifteen-Year Experience From Two Australian Tertiary Pediatric Facilities. Pediatr Infect Dis J. 2017 Jan; 36 (1): 20-4.
  • 3
    Kohli-Lynch M, Russell NJ, Seale AC, Dangor Z, Tann CJ, Baker CJ, Bartlett L, et al. Neurodevelopmental Impairment in Children After Group B Streptococcal Disease Worldwide: Systematic Review and Meta-analyses. Clin Infect Dis. 2017 Nov; 65 (Suppl. 2): S190-9.
  • 4
    Madrid L, Seale AC, Kohli-Lynch M, Edmond KM, Lawn JE, Heath PT, et al.; Infant GBS Disease Investigator Group. Infant group B Streptococcal disease incidence and serotypes worldwide: systematic review and meta-analyses. Clin Infect Dis. 2017 Nov; 65 (Suppl. 2): S160-72.
  • 5
    World Health Organization (WHO). Group B streptococcus full value of vaccine assessment. Geneva: WHO; 2021. [access in 2022 Nov 18]. Available from: https://www.who.int/teams/immunization-vaccines-andbiologicals/immunizationanalysis-and-insights/vaccine-impact-value/group-bstreptococcus-full-value-of-vaccineassessment
    » https://www.who.int/teams/immunization-vaccines-andbiologicals/immunizationanalysis-and-insights/vaccine-impact-value/group-bstreptococcus-full-value-of-vaccineassessment
  • 6
    Nascimento CS, Santos NFB, Ferreira RCC, Taddei CR. Streptococcus agalactiae in pregnant women in Brazil: prevalence, serotypes, and antibiotic resistance. Braz J Microbiol. 2019; 50 (4): 943-52.
  • 7
    Schrag SJ, Zell ER, Lynfield R, Roome A, Arnold KE, Craig AS, et al; Active Bacterial Core Surveillance Team. A population-based comparison of strategies to prevent early-onset group B streptococcal disease in neonates. N Engl J Med. 2002 Jul; 347 (4): 233-9.
  • 8
    Prevention of Group B Streptococcal Early-Onset Disease in Newborns: ACOG Committee Opinion, Number 797. Obstet Gynecol. 2020 Feb; 135 (2): e51-e72. Erratum in: Obstet Gynecol. 2020 Apr; 135 (4): 978-9.
  • 9
    Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica Cadernos de atenção Básica: Atenção ao Pré-Natal de Baixo Risco. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2023. [access in 2024 May 16]. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/atencao_pre_natal_baixo_risco.pdf
    » https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/atencao_pre_natal_baixo_risco.pdf
  • 10
    Brazilian Institute of Geography and Statistics (IBGE). Census. 2010 [access in 2022 January 24]. Available from: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/default.shtm
    » http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/default.shtm
  • 11
    Verani JR, McGee L, Schrag SJ; Division of Bacterial Diseases, National Center for Immunization and Respiratory Diseases, Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Prevention of perinatal group B streptococcal disease--revised guidelines from CDC, 2010. MMWR Recomm Rep. 2010 Nov; 59 (RR-10): 1-36.
  • 12
    Sambrook J, Fritsch EF, Maniatis T. Molecular cloning: a laboratory manual. New York: Cold Spring Harbor Laboratory; 1989.
  • 13
    Ke D, Ménard C, Picard FJ, Boissinot M, Ouellette M, Roy PH, et al. Development of conventional and real-time PCR assays for the rapid detection of group B streptococci. Clin Chem. 2000; 46 (3): 324-31.
  • 14
    European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing (EUCAST). Breakpoint tables for interpretation of MICs and zone diameters European Committee on Antimicrobial Susceptibility Testing. Version 11.0. 2021. [access in 2022 Jan 20]. Available from: https://www.eucast.org/fileadmin/src/media/PDFs/EUCAST_files/Breakpoint_tables/v_11.0_Breakpoint_Tables.pdf
    » https://www.eucast.org/fileadmin/src/media/PDFs/EUCAST_files/Breakpoint_tables/v_11.0_Breakpoint_Tables.pdf
  • 15
    Steer PJ, Russell AB, Kochhar S, Cox P, Plumb J, Gopal Rao G. Group B streptococcal disease in the mother and newborn-A review. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2020 Sep; 252: 526-33.
  • 16
    Botelho ACN, Oliveira JG, Damasco AP, Santos KTB, Ferreira AFM, Rocha GT, et al. Streptococcus agalactiae carriage among pregnant women living in Rio de Janeiro, Brazil, over a period of eight years. PLoS One. 2018 May; 13 (5): e0196925.
  • 17
    Brokaw A, Furuta A, Dacanay M, Rajagopal L, Adams Waldorf KM. Bacterial and host determinants of group B Streptococcal vaginal colonization and ascending infection in pregnancy. Front Cell Infect Microbiol. 2021 Sep; 11: 720789.
  • 18
    Dashtizade M, Zolfaghari MR, Yousefi M, Nazari-Alam A. Antibiotic susceptibility patterns and prevalence of Streptococcus agalactiae rectovaginal colonization among pregnant women in Iran. Rev Bras Ginecol Obstet. 2020 Aug; 42 (8): 454-9.
  • 19
    Nkembe NM, Kamga HG, Baiye WA, Chafa AB, Njotang PN. Streptococcus agalactiae prevalence and antimicrobial susceptibility pattern in vaginal and anorectal swabs of pregnant women at a tertiary hospital in Cameroon. BMC Res Notes. 2018 Jul; 11 (1): 480.
  • 20
    Schrag SJ, Verani JR. Intrapartum antibiotic prophylaxis for the prevention of perinatal group B streptococcal disease: experience in the United States and implications for a potential group B streptococcal vaccine. Vaccine. 2013 Aug; 31 (Suppl. 4): D20-6.
  • 21
    Homer CS, Scarf V, Catling C, Davis D. Culture-based versus risk-based screening for the prevention of group B streptococcal disease in newborns: a review of national guidelines. Women Birth. 2014 Mar; 27 (1): 46-51.
  • 22
    Cho CY, Tang YH, Chen YH, Wang SY, Yang YH, Wang TH, et al. Group B Streptococcal infection in neonates and colonization in pregnant women: An epidemiological retrospective analysis. J Microbiol Immunol Infect. 2019 Apr; 52 (2): 265-72.
  • 23
    Prescott S, Dreisbach C, Baumgartel K, Koerner R, Gyamfi A, Canellas M, et al. Impact of Intrapartum Antibiotic Prophylaxis on Offspring Microbiota. Front Pediatr. 2021 Dec 10; 9: 754013.
  • 24
    Rocha JZ, Feltraco J, Radin V, Gonçalves CV, Silva PEA, Von Groll A. Streptococcus agalactiae colonization and screening approach in high-risk pregnant women in southern Brazil. J Infect Dev Ctries. 2020; 14 (4): 332-40.
  • 25
    Gizachew M, Tiruneh M, Moges F, Adefris M, Tigabu Z, Tessema B. Streptococcus agalactiae from Ethiopian pregnant women; Prevalence, associated factors and antimicrobial resistance: Alarming for prophylaxis. Ann Clin Microbiol Antimicrob. 2019; 18 (1): 1-9.
  • 26
    Zaleznik DF, Rench MA, Hillier S, Krohn MA, Platt R, Lee ML, et al. Invasive disease due to group B Streptococcus in pregnant women and neonates from diverse population groups. Clin Infect Dis. 2000 Feb; 30 (2): 276-81.
  • 27
    Barros RR. Antimicrobial resistance among beta-hemolytic streptococcus in Brazil: an overview. Antibiotics (Basel.). 2021 Aug; 10 (8): 973.
  • 28
    Bulska M, Szcześniak P, Pięta-Dolińska A, Oszukowski P, Orszulak-Michalak D. The placental transfer of erythromycin in human pregnancies with group B streptococcal infection. Ginekol Pol. 2015 Jan; 86 (1): 33-9.
  • 29
    Burcham LR, Spencer BL, Keeler LR, Runft DL, Patras KA, Neely MN, et al. Determinants of Group B streptococcal virulence potential amongst vaginal clinical isolates from pregnant women. PLoS One. 2019 Dec 18; 14 (12): e0226699.
  • 30
    Campo CH, Martínez MF, Otero JC, Rincón G. Vagino-rectal colonization prevalence by Streptococcus agalactiae and its susceptibility profile in pregnant women attending a third-level hospital. Biomedica. 2019; 1; 39 (4): 689-98.
Editor Associado: Leila Katz

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    27 Fev 2023
  • Revisado
    04 Jun 2024
  • Aceito
    19 Jun 2024
Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira Rua dos Coelhos, 300. Boa Vista, 50070-550 Recife PE Brasil, Tel./Fax: +55 81 2122-4141 - Recife - PR - Brazil
E-mail: revista@imip.org.br