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CULTURAS DE MERCADO: A TRADIÇÃO DO COMÉRCIO NA FRONTEIRA AMAZÔNICA

MARKET CULTURES: THE TRADITION OF COMMERCE ON THE AMAZON FRONTIER

CULTURAS DE MERCADO: LA TRADICIÓN DEL COMERCIO EN LA FRONTERA AMAZÓNICA

RESUMO

No Alto Solimões, o Brasil faz fronteira com o Peru e com a Colômbia, onde existe uma área de livre comércio e um comércio livre sem fronteiras. O objetivo deste artigo é propor a tradição como um conceito sociomaterial da cultura de mercado, desvelando o protagonismo do comerciante no teatro do comércio. Pretende-se descrever a cultura de mercado de Benjamin/BR, de Islândia/PE e de Letícia/CO; e interpretar a tradição do comércio na fronteira amazônica. Dando voz aos atores do mercado, apresento uma pesquisa qualitativa com observações e entrevistas. Este estudo contribui com o desenvolvimento da Consumer Culture Theory ao desenvolver o tema: culturas de mercado. Versando sobre as práticas de comerciantes e consumidores, gizo um retrato do varejo e do consumo no extremo do Amazonas. Entre benjaminenses, islandenses e leticianos existe uma relação de dependência de produtos, uma tradição em que as pessoas trocam mercadorias, crenças e costumes. A cultura de consumo local é influenciada pela cultura de consumo global. Em reflexo, o consumo de massa é influenciado pelo consumo regional.

Palavras-chave:
Varejo; Culturas de mercado; Fronteira amazônica.

In Alto Solimões, Brazil borders Peru and Colombia, where there is a free trade area and free trade without borders. The aim of this article is to propose tradition as a socio-material concept of market culture, revealing the protagonism of the merchant in the theater of commerce. It is intended to describe the market culture of Benjamin/BR, Iceland/PE and Letícia/CO; and interpret the tradition of trade on the Amazon frontier. Giving voice to market actors, I present a qualitative research with observations and interviews. This study contributes to the development of the Consumer Culture Theory by developing the theme: market cultures. Dealing with the practices of merchants and consumers, I sketch a portrait of retail and consumption in the extreme Amazon. Among Benjaminians, Icelanders and Leticians there is a relationship of dependence on products, a tradition in which people exchange goods, beliefs and customs. Local consumer culture is influenced by global consumer culture. Reflectively, mass consumption is influenced by regional consumption.

Keywords:
Retail; Market cultures; Amazon frontier.


En Alto Solimões, Brasil limita con Perú y Colombia, donde existe una zona de libre comercio y libre comercio sin fronteras. El propósito de este artículo es proponer la tradición como concepto sociomaterial de la cultura de mercado, revelando el papel del comerciante en el teatro del comercio. Se pretende describir la cultura de mercado de Benjamin/BR, Islandia/PE y Letícia/CO; e interpretar la tradición del comercio en la frontera amazónica. Dando voz a los actores del mercado, presento una investigación cualitativa con observaciones y entrevistas. Este estudio contribuye al desarrollo de la Teoría de la Cultura del Consumidor al desarrollar el tema: las culturas de mercado. Abordando las prácticas de comerciantes y consumidores, esbozo un retrato del comercio minorista y el consumo en la Amazonía extrema. Entre benjaminianos, islandeses y leticianos existe una relación de dependencia de productos, una tradición en la que las personas intercambian bienes, creencias y costumbres. La cultura de consumo local está influenciada por la cultura de consumo global. Reflexivamente, el consumo masivo está influenciado por el consumo regional.

Palabras clave:
Retail; Culturas de mercado; Frontera amazónica.


INTRODUÇÃO

No mundo dos negócios, conhecer “o mercado, as ações do consumidor e os significados culturais” (ARNOULD; THOMPSON, 2005ARNOULD, E. J.; THOMPSON, C. J. Consumer culture theory (CCT): twenty years of research. Journal of Consumer Research, v. 31, n. 4, p. 868-882, 2005., p. 868), especialmente mercados emergentes (SHETH, 2011SHETH, J. N. Impact of emerging markets on marketing: rethinking existing perspectives and practices. Journal of Marketing, v. 75, p. 166-182, 2011.) e consumidores de baixa renda (BARKI; BOTELHO; PARENTE, 2013BARKI, E.; BOTELHO, D.; PARENTE, J. Varejo: desafios e oportunidades em mercados emergentes. Revista de Administração de Empresas, v. 53, n. 6, p. 534-538, 2013.), tem importância capital para as organizações, sejam empresas públicas ou privadas. O modo de vida de uma região, suas necessidades, capacidade de compra e acesso aos produtos de primeira, segunda e terceira necessidades, são padrões de consumo que interessam à pesquisa de Marketing. Vera, Gosling e Shigaki (2019)VERA, L. A. R.; GOSLING, M. de S.; SHIGAKI, H. Teoria da cultura do consumo: possibilidades, limitações e caminhos em estudos de marketing no Brasil. Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa/FGV, v. 18, n. 1, p. 15-32, 2019. disseram que é oportuno desenvolver estudos sobre as culturas de consumo existentes no Brasil, considerando sua história e diversidade sociocultural.

Na CCT, as culturas de mercado são explicadas pelas comunidades de consumo (GAIÃO; SOUZA; LEÃO, 2012GAIÃO, B. F. da S.; SOUZA, I. L. de; LEÃO, A. L. M. de S. Consumer culture theory (CCT): já é uma escola de pensamento em marketing? Revista de Administração de Empresas, v. 52, n. 3, p. 330-344, 2012.). Porém, a tradição do comércio é um fenômeno que não pode ser ignorado, o outro lado da moeda. Dalmoro e Nique (2017DALMORO, M.; NIQUE, W. M. Tradição mercantilizada: construção de mercados baseados na tradição. Revista de Administração Contemporânea, v. 21, n. 3, p. 327-346, 2017., p. 330) propuseram “a tradição como uma abordagem emergente na compreensão do mercado”. Eles reconheceram a importância dos atores na construção social do mercado. Belk e Sobh (2019BELK, R.; SOBH, R. No assemblage required: on pursuing original consumer culture theory. Marketing Theory, v. 19, n. 4, p. 489-507, 2019., p. 493) exaram: “enquadrando nossas pesquisas em teorias reconhecíveis, ignoramos outras lentes teóricas potencialmente mais adequadas […], devemos tentar cultivar nossas próprias teorias”. Neste artigo, a dinâmica de mercado (CASTILHO, 2015) e as práticas de comerciantes e de consumidores são observadas, descritas e interpretadas, desvelando seus protagonismos.

O varejo é um espaço de trocas, onde as relações entre comerciantes e consumidores se estabelecem, se mantém e se transformam, assim como os signos do consumo. Assembleia solene das prestações e contraprestações, na qual a trama de ritos comercial e cultural se desenvolve (MAUSS, 2003MAUSS, M. Sociologia e antropologia. Tradução: Paulo Neves. São Paulo: Cosac Naify, 2003.). A cultura de mercado é um assunto que merece atenção dos pesquisadores de marketing (FARIAS et al., 2019FARIAS, M. L. et al. Compreendendo o domínio “projetos de identidade do consumidor”: revisão de literatura considerando a produção científica brasileira. Consumer Behavior Review, v. 3, n. 2, p. 85-98, 2019.), pois o comércio reflete as mudanças socioeconômicas do país (VAROTTO, 2018VAROTTO, L. F. Varejo no Brasil: resgate histórico e tendências. Brazilian Journal of Marketing, v. 17, n. 3, p. 429-443, 2018.).

No Alto Solimões/AM, as cidades têm como referência seus portos, de onde chegam e saem pessoas e mercadorias. O comércio de produtos nacionais e importados na fronteira amazônica supre a população de Benjamin Constant/BR, Islândia/PE e Letícia/CO. Mas a fronteira não é o limite, as transações comerciais vão além das divisas nacionais, criando um território mais amplo, trata-se de uma “sociedade transfronteiriça” (BOTÍA, 2008BOTÍA, C. G. Z. Silvículas, siringueros y agentes estatales: el surgimiento de una sociedad transfronteriza en la Amazonia de Brasil, Perú e Colombia 1880-1932. Letícia: IMANI-UM, 2008.), formada e mantida pelos atores do mercado.

O objetivo desta pesquisa é descrever e interpretar a tradição do comércio na fronteia amazônica, visando mapear o consumo da região (VERA; GOSLING; SHIGAKI, 2019VERA, L. A. R.; GOSLING, M. de S.; SHIGAKI, H. Teoria da cultura do consumo: possibilidades, limitações e caminhos em estudos de marketing no Brasil. Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa/FGV, v. 18, n. 1, p. 15-32, 2019.) baseado no conceito da CCT: “culturas de mercado”, uma vez que a vida nessas paragens é um mix de culturas e relações complexas (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019.). Inclusive, Bispo (2022BISPO, M. de S. Em defesa da teoria e da contribuição teórica original em administração. Revista de Administração Contemporânea, v. 26, n. 6, p. 1-7, 2022., p. 3) faz uma pergunta importante: “Quantos dos nossos trabalhos refletem realmente a diversidade cultural e os modos de vida brasileiros?”, contestando o império científico “eurocêntrico”.

Este artigo teórico-empírico, de natureza qualitativa, deriva da minha dissertação de mestrado. Observando e entrevistando pessoas no varejo e vivenciando experiências de compra pude conhecer a tradição do comércio na fronteira amazônica. A dinâmica do rio impacta no comércio das cidades amazônicas. Em 2015, o rio Javari transbordou, inundando a área comercial de Benjamin, criando o cenário descrito nos resultados da pesquisa. Este fenômeno faz parte da cultura de mercado da região, uma característica da cidade que pode ser observada de tempos em tempos, mas é imprevisível. Por isso, a publicação deste artigo é importante: tal evento ainda não se repetiu, o que seria uma contribuição à sociedade.

Os resultados mostram a importância do comércio varejista do Alto Solimões para o comércio atacadista de outras regiões brasileiras. Esta pesquisa contribui com o desenvolvimento da CCT, ao analisar culturas de mercado no extremo do Amazonas, onde os consumidores vivenciam experiências de consumo no comércio brasileiro (Benjamin), peruano (Islândia) e colombiano (Letícia). As trocas (compra e venda) são motivadas pela ideia de livre comércio, trocando mercadorias, crenças e costumes (MAUSS, 2003MAUSS, M. Sociologia e antropologia. Tradução: Paulo Neves. São Paulo: Cosac Naify, 2003.; BATISTA, 2007BATISTA, D. O complexo da Amazônia: análise do processo de desenvolvimento. 2. ed. Manaus: Valer, EDUA e INPA, 2007.; STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.).

O artigo está estruturado em capítulos. Nesta introdução, são delineados o problema, o objetivo e a justificativa do estudo. No referencial teórico, apresento conceitos da CCT, mercado, trocas, varejo e baixa renda. Na metodologia, descrevo o método, as técnicas e os procedimentos adotados na pesquisa. Nos resultados, os dados empíricos são organizados e analisados com base na pesquisa bibliográfica. E nas considerações finais, sintetizo os resultados do estudo, indicando novas pesquisas.

1 REFERENCIAL TEÓRICO

O mercado é um espaço de trocas, que pode ser comparado a um teatro. No palco, se encontram comerciantes e consumidores, atores de uma sociedade. Pessoas jurídicas e físicas que oferecem e procuram produtos para atender expectativas. Santos (2002SANTOS, M. Por uma outra globalização. 9. ed. Rio de Janeiro: Record, 2002., p. 91) sintetiza: “Sem dúvida, os diversos atores têm interesses diferentes, às vezes convergentes, certamente complementares. São visões do mundo, do país e do lugar, elaboradas na cooperação e no conflito”. Nos bastidores, uma rede de empresas dá suporte à comercialização (KOTLER; ARMSTRONG, 2007KOTLER, P.; ARMSTRONG, G. Princípios de marketing. Tradução: Cristina Yamagami. 12. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.).

Consumer Culture Theory é uma tradição teórica que analisa as manifestações da cultura do consumidor em mercados (ARNOULD; THOMPSON, 2005ARNOULD, E. J.; THOMPSON, C. J. Consumer culture theory (CCT): twenty years of research. Journal of Consumer Research, v. 31, n. 4, p. 868-882, 2005.), que explora questões como cultura de mercado, comunidade de consumo e experiência de consumo. A compra/venda é uma experiência de consumo fascinante (HÖPNER et al., 2015HÖPNER, A. et al. Experiência do consumidor no varejo: um estudo bibliométrico. Brazilian Journal of Marketing, v. 14, n. 4, p. 513-528, 2015.), pois a troca é um momento mágico (MAUSS, 2003MAUSS, M. Sociologia e antropologia. Tradução: Paulo Neves. São Paulo: Cosac Naify, 2003.) de significados mil para o consumidor e o comerciante. Estes conceitos traduzem discursos e práticas na sociedade de consumo.

Culturas de mercado é um tema de pesquisa CCT que descreve os espaços e os processos em que a cultura de consumo é formada. Interpretando como os atores do mercado, comerciantes e consumidores estabelecem relações e constroem mundos distintos por meio de interesses pessoais e coletivos (ARNOULD; THOMPSON, 2005ARNOULD, E. J.; THOMPSON, C. J. Consumer culture theory (CCT): twenty years of research. Journal of Consumer Research, v. 31, n. 4, p. 868-882, 2005.). A sociedade é compreendida como uma rede de atores que compartilham experiências de consumo (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019.).

As comunidades de consumo “definem seus limites simbólicos por meio de uma oposição contínua às normas de estilo de vida dominantes” (ARNOULD; THOMPSON, 2005ARNOULD, E. J.; THOMPSON, C. J. Consumer culture theory (CCT): twenty years of research. Journal of Consumer Research, v. 31, n. 4, p. 868-882, 2005., p. 874). Por outro lado, o indivíduo segue as crenças de seu grupo e ancora suas expectativas nos significados dos produtos, evitando o “consumo monolítico”. O consumidor compra para satisfazer necessidades ou pelo desejo formado nas interações sociais de sua comunidade (ALMEIDA et al., 2016ALMEIDA, S. O. et al. O contínuo experiencial do varejo: valor utilitário versus valor hedônico no mix de marketing varejista. Teoria e Prática em Administração, v. 6, n. 1, p. 97-128, 2016.).

A experiência de consumo tem duas dimensões, empresa (comerciante) e cliente (consumidor), distintas e complementares. O termo experiência do consumidor conota uma experiência subjetiva somente de um desses atores, o consumidor. No entanto, os comerciantes também são protagonistas do mercado (ALMEIDA et al., 2016ALMEIDA, S. O. et al. O contínuo experiencial do varejo: valor utilitário versus valor hedônico no mix de marketing varejista. Teoria e Prática em Administração, v. 6, n. 1, p. 97-128, 2016.), mas sua atuação é descrita, na maioria dos casos, como um trabalho nos bastidores do comércio, elaborando cenários e assistindo à dramatização (HÖPNER et al., 2015HÖPNER, A. et al. Experiência do consumidor no varejo: um estudo bibliométrico. Brazilian Journal of Marketing, v. 14, n. 4, p. 513-528, 2015.).

Mercado e comunidade são expressões recorrentes da pesquisa CCT, conceitos da cultura de mercado que abordam os interesses e recursos compartilhados pelos consumidores na organização de sistemas de significados, considerando o jogo de compra e venda e a liberdade de consumo. Comércio e tradição são expressões soltas usadas na pesquisa sobre o consumo, conceitos que podem ser agrupados para medrar o tema culturas de mercado no mapa conceitual da CCT, evitando um discurso científico ortodoxo, “representando melhor a heterogeneidade teórica, ontológica e epistemológica” da cultura do consumidor (ARNOULD; THOMPSON, 2007ARNOULD, E. J.; THOMPSON, C. J. Consumer culture theory (and we really mean theoretics): dilemmas and opportunities posed by an academic branding strategy. Research in Consumer Behavior, v. 11, p. 3-22, 2007., p. 5).

Tradição do comércio é um aspecto da cultura do consumidor que emerge das crenças e costumes de comerciantes e consumidores. Uma representação sociomaterial que conecta o passado e o presente simbolicamente. “A visão contemporânea de tradição reconhece que esta não é necessariamente algo sólido, mas uma invenção do passado perpetuado pela repetição. A tradição serve como um elemento de coesão cultural em diferentes grupos sociais” (DALMORO; NIQUE, 2017DALMORO, M.; NIQUE, W. M. Tradição mercantilizada: construção de mercados baseados na tradição. Revista de Administração Contemporânea, v. 21, n. 3, p. 327-346, 2017., p. 331). Estes autores apontaram três praxes da dinâmica de mercado: troca, representação e normatização, destacando o papel dos atores do mercado nas mudanças socioeconômicas.

O esoterismo da cultura do consumidor é um problema de pesquisa CCT que mantém a primazia da escola de negócios. Na prática, “a CCT sinalizou que essa tradição de pesquisa investigava as complexidades da cultura de consumo de maneira que contribuíam para uma conversação teórica mais ampla, em vez de constituir uma série de estudos de caso pontuais”, olhando somente para as práticas do consumidor. Felizmente a CCT é um “campo heterodoxo e conceitualmente dinâmico que abrange uma multiplicidade de abordagens teóricas […] no reino do marketing” (ARNOULD; THOMPSON, 2015ARNOULD, E. J.; THOMPSON, C. J. Consumer culture theory introduction: consumer culture theory: ten years gone (and beyond). Research in Consumer Behavior, v. 17, p. 1-21, 2015., p. 3 e 4), olhando também para as práticas do comerciante.

Nas trocas, comerciantes e consumidores constroem “mundos fragmentados” - em culturas de consumo - e transitórios, estilos de vida representados pelas “tribos urbanas”. Os atores do mercado são produtores de cultura, reconfigurando “projetos culturais” (ARNOULD; THOMPSON, 2005ARNOULD, E. J.; THOMPSON, C. J. Consumer culture theory (CCT): twenty years of research. Journal of Consumer Research, v. 31, n. 4, p. 868-882, 2005.). Uma tendência de pesquisa CCT é a cultura de consumo regional (VERA; GOSLING; SHIGAKI, 2019VERA, L. A. R.; GOSLING, M. de S.; SHIGAKI, H. Teoria da cultura do consumo: possibilidades, limitações e caminhos em estudos de marketing no Brasil. Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa/FGV, v. 18, n. 1, p. 15-32, 2019.), que emerge da cultura de mercado (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019.).

Na “teia do comércio”, cada cidade se conecta a outras cidades através de um fluxo de produtos, a globalização (GIDDENS, 1991GIDDENS, A. As consequências da modernidade. Tradução: Raul Fiker. São Paulo: Editora UNESP, 1991.). O consumo regional é influenciado pelo consumo de massa. Em reflexo, o consumo de massa é influenciado pelo consumo regional. Na interação social, quando as pessoas trocam objetos, crenças e costumes, ocorre a mudança cultural (STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.).

O comércio varejista é uma “plataforma socioeconômica” que congrega a cultura de consumo local e a cultura de consumo global (STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.). Neste espaço, o consumo é orientado pela moda (tendências), onde a paixão pelos bens e serviços é modelada (FINOTI et al., 2019FINOTI, L. L. et al. Processo de estratégia de marketing: analisando as relações sequenciais entre suas atividades estratégicas. RBGN, v. 21, n. 5, p. 767-787, 2019.). Assim, as tendências são como as folhas de outono e as flores da primavera que indicam a mudança de estação.

O varejo teve início na feira, onde os comerciantes locais e estrangeiros negociavam suas mercadorias e os consumidores podiam comprar produtos nacionais e importados, onde se praticava o livre comércio (WEBER, 2006bWEBER, M. História geral da economia. Tradução: Klaus Von Puschen. São Paulo: Centauro, 2006b.). O varejo se tornou referência na arquitetura das cidades, os armazéns transformaram-se em estabelecimentos comerciais decorados e interessantes, iniciando uma revolução na experiência de compra (VAROTTO, 2018VAROTTO, L. F. Varejo no Brasil: resgate histórico e tendências. Brazilian Journal of Marketing, v. 17, n. 3, p. 429-443, 2018.). “A preocupação dos varejistas com a experiência do consumidor no ambiente da loja evidencia o emprego de técnicas sempre mais avançadas” (HÖPNER et al., 2015HÖPNER, A. et al. Experiência do consumidor no varejo: um estudo bibliométrico. Brazilian Journal of Marketing, v. 14, n. 4, p. 513-528, 2015., p. 514). Os centros comerciais e as lojas, instalados nos bairros mais movimentados; e as mercearias da periferia, suprem classes de consumidores.

O papel do varejo é atender os consumidores finais (OLIVEIRA; MORETTI; SILVA, 2017OLIVEIRA, S. L. I. de; MORETTI, S. L. A.; SILVA, L. A. Os primeiros estudos em marketing: a influência da filosofia e das ciências nos primeiros estudos em marketing - uma análise da obra Marketing Problems de Melvin T. Copeland. Revista Brasileira de Marketing, v. 16, n. 4, p. 502-519, 2017.). Os varejistas compram dos atacadistas, em grande quantidade, para vender aos consumidores, em pequenas quantidades, mantendo estoque e praticando economia de escala. Barki, Botelho e Parente (2013BARKI, E.; BOTELHO, D.; PARENTE, J. Varejo: desafios e oportunidades em mercados emergentes. Revista de Administração de Empresas, v. 53, n. 6, p. 534-538, 2013., p. 535) argumentam: “O varejo desempenha um papel de grande relevância nesse contexto, por ser um dos setores da economia que melhor consegue adaptar-se às necessidades de cada localidade”. O varejista se posiciona entre a indústria e a sociedade.

No mercado brasileiro, a densidade populacional e a distribuição de renda são fatores que definem ideologias de mercado como “diferenciação” (alta renda) e “inclusão” (baixa renda). Os consumidores escolhem o estabelecimento com base em produto, preço, atendimento e cenário da loja (BARKI; PARENTE, 2010BARKI, E.; PARENTE, J. Consumer Behaviour of the base of the pyramid market in Brazil. Greener Management International/FGV, v. 56, p. 11-23, 2010.). Para o consumidor de baixa renda, fazer compras é uma necessidade, um status social, uma identidade ou, quem sabe, uma ostentação.

Na baixa renda, as condições da comunidade onde vivem e as expectativas com o serviço público produzem uma experiência negativa que lhes infunde um sentimento de inferioridade (BARKI; PARENTE, 2010BARKI, E.; PARENTE, J. Consumer Behaviour of the base of the pyramid market in Brazil. Greener Management International/FGV, v. 56, p. 11-23, 2010.). Apesar disso, os consumidores encontram dignidade e realização pessoal nas relações comerciais de seu bairro ou cidade (QUINTÃO; PEREIRA; BAÊTA, 2019QUINTÃO, R. T.; PEREIRA, V. F.; BAÊTA, R. A. S. Consumo mágico: um estudo no contexto de torcedores de futebol. Revista Brasileira de Marketing, v. 18, n. 1, p. 7-28, 2019.).

Os consumidores de baixa renda são clientes insignes dos comerciantes de pequeno e médio porte, cujas principais estratégias de vendas são preço baixo e proximidade do cliente (PARENTE; BARKI, 2006PARENTE, J. G.; BARKI, E. Varejo na baixa renda. Revista de Administração de Empresas, v. 5, n. 1, p. 39-43, 2006.). Este segmento não tem acesso a todos os produtos que são oferecidos no mercado (SHETH, 2011SHETH, J. N. Impact of emerging markets on marketing: rethinking existing perspectives and practices. Journal of Marketing, v. 75, p. 166-182, 2011.), mas o consumo representa muito para eles e para as organizações (ANDREOLI; LIMA; MINCIOTTI, 2018ANDREOLI, T. P.; LIMA, V. A.; MINCIOTTI, S. A. Marketing social e marketing societal: uma confusão teórica. CONTEXTUS - Revista Contemporânea de Economia e Gestão, v. 16, n. 2, p. 90-112, 2018.).

Os mercados emergentes têm desafios e oportunidades (SHETH, 2011SHETH, J. N. Impact of emerging markets on marketing: rethinking existing perspectives and practices. Journal of Marketing, v. 75, p. 166-182, 2011.). Barki, Botelho e Parente (2013)BARKI, E.; BOTELHO, D.; PARENTE, J. Varejo: desafios e oportunidades em mercados emergentes. Revista de Administração de Empresas, v. 53, n. 6, p. 534-538, 2013. apontaram os desafios no varejo: concorrência entre empresas locais e globais, acesso limitado às comunidades de consumidores e heterogeneidade de consumo. Eles também vislumbraram as oportunidades na baixa renda: conhecimento sobre os consumidores e suas expectativas; e parcerias entre comerciantes e fornecedores.

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Neste estudo teórico-empírico, de natureza qualitativa, com método de pesquisa participante, foram feitas observações e entrevistas. Elegi teorias de pensadores clássicos e contemporâneos para desenvolver o tema, culturas de mercado/tradição do comércio, visando conhecer uma realidade por meio de teoria, método e evidências. “Procuramos compreender a realidade da vida que nos rodeia, e na qual nos encontramos situados, naquilo que tem de específico; por um lado, as conexões e a significação cultural de suas diversas manifestações em sua configuração atual e, por outro, as causas pelas quais se desenvolveu historicamente” (WEBER, 2006aWEBER, M. A “objetividade” do conhecimento nas ciências sociais. Tradução: Gabriel Cohn. São Paulo: Ática, 2006a., p. 44).

A pesquisa participante é um método usado no paradigma interpretativista (SACCOL, 2009SACCOL, A. Z. Um retorno ao básico: compreendendo os paradigmas de pesquisa e sua aplicação na pesquisa em administração. Revista Administração/UFSM, v. 2, n. 2, p. 250-269, 2009.), que “contempla a visão de mundo dos sujeitos” (VERGARA; CALDAS, 2005VERGARA, S. C.; CALDAS, M. P. Paradigma interpretacionista: a busca da superação do objetivismo funcionalista nos anos 1980 e 1990. Revista de Administração de Empresas, v. 45, n. 4, p. 66-72, 2005., p. 68). Este método possibilita uma reflexão epistemológica da pesquisa e uma crítica das implicações políticas do trabalho de campo, pois a adoção de “protocolos consagrados” tende a vexar a compreensão do outro e a integração de teoria e método. E ainda, o “setting de diálogo” na interpretação das crenças e costumes dos atores sociais acontece em discurso hermenêutico, contribuindo com a “democratização do saber” na complexa relação pesquisador-pesquisado (SCHMIDT, 2006SCHMIDT, M. L. S. Pesquisa participante: alteridade e comunidades interpretativas. Psicologia USP, v. 17, n. 2, p. 11-41, 2006.).

No campo, observei o comércio das cidades Benjamin/BR, Islândia/PE e Letícia/CO, vivenciando experiências de compra no período de um ano (2015), “ao privilegiar a busca de significados sociais pela observação direta dos fenômenos humanos” (ROCHA; BARROS; PEREIRA, 2005ROCHA, E.; BARROS, C.; PEREIRA, C. Perspectivas do método etnográfico em marketing: consumo, comunicação e netnografia. EnANPAD, n. 29, 2005, Brasília. Disponível em: http://www.anpad.org.br/admin/pdf/enanpad2005-mkta-2861.pdf. Acessado em 2020.
http://www.anpad.org.br/admin/pdf/enanpa...
), inclusive registrando em fotografias. Segundo Bateson (2006BATESON, G. Naven: um esboço dos problemas sugeridos por um retrato compósito, realizado a partir de três perspectivas, da cultura de uma tribo da Nova Guiné. Tradução: Magda Lopes. São Paulo: USP, 2006., p. 69), “se fosse possível apresentar de forma adequada os aspectos de uma cultura exatamente como são, nenhum detalhe isolado pareceria bizarro, ao contrário, os detalhes pareceriam todos naturais e razoáveis”. Observando e participando de atividades da comunidade, o pesquisador coleta dados e apreende discursos e práticas dos nativos/citadinos (MARIETTO, 2018MARIETTO, M. L. Observação participante e não participante: contextualização teórica e sugestão de roteiro para aplicação dos métodos. Revista Ibero-Americana de Estratégia, v. 17, n. 4, p. 5-18, 2018.).

Porém, a cidade em sua totalidade não pode ser tomada como objeto de estudo antropológico (MAGNANI, 2016MAGNANI, J. G. C. Antropologia urbana: desafios e perspectivas. Revista Antropologia/USP, v. 59, n. 3, p. 174-203, 2016.), mas sim, como o recorte do espaço urbano, onde uma cultura se desenvolve, o comércio. No varejo, foram entrevistados comerciantes e consumidores, usando roteiro semiestruturado. “Um roteiro previamente elaborado” (SILVA; SEGGER; RUSSO, 2019SILVA, L. F.; SEGGER, R. de F.; RUSSO, M. Aplicação de entrevistas em pesquisa qualitativa. Revista de Gestão e Projetos, v. 10, n. 1, p. 1-6, 2019.), cujas questões são baseadas em características do comércio como cidade (espaço urbano), loja (estrutura), comerciante (varejo), produto (acesso), consumidor (baixa renda), ideologia de mercado (livre comércio/concorrência) e entidade reguladora, aplicado em cidades da fronteira. Os dados obtidos foram organizados por cidade/respostas dos atores do mercado. Em seguida, foram analisados os padrões e variações do comércio, comparando os discursos das entrevistas com as práticas observadas. A entrevista qualitativa exige escuta ativa e a simpatia do pesquisador-jornalista (SILVA; SEGGER; RUSSO, 2019SILVA, L. F.; SEGGER, R. de F.; RUSSO, M. Aplicação de entrevistas em pesquisa qualitativa. Revista de Gestão e Projetos, v. 10, n. 1, p. 1-6, 2019.).

Em Benjamin, foram entrevistados comerciantes e consumidores. Os comerciantes entrevistados trabalham no varejo há mais de dez anos. Os estabelecimentos visitados: mercadinho, açougue, panificadora, drogaria, loja de roupas, loja de brinquedos e moto peças. Em Islândia, foram entrevistados somente comerciantes peruanos. As pessoas entrevistadas trabalham no comércio de Islândia há mais de cinco anos. Os estabelecimentos visitados: mercadinho, panificadora, loja de utilidades domésticas, loja de ferramentas e loja de materiais de construção. Em Letícia, foram entrevistados somente comerciantes colombianos. As pessoas entrevistadas trabalham no comércio de Letícia há mais de dez anos. Os estabelecimentos visitados: supermercado, drogaria, loja de roupas, loja de eletroeletrônicos, loja de perfumes, loja de brinquedos e loja de motos/peças.

Nos resultados, descrevi e interpretei culturas de mercado, analisando o protagonismo do comerciante. A abordagem construtivista (SACCOL, 2009SACCOL, A. Z. Um retorno ao básico: compreendendo os paradigmas de pesquisa e sua aplicação na pesquisa em administração. Revista Administração/UFSM, v. 2, n. 2, p. 250-269, 2009.) possibilita uma leitura objetivo-subjetiva, deslocando a ênfase da CCT do consumidor para o contexto do consumo (BELK; CASOTTI, 2014BELK, R.; CASOTTI, L. M. Pesquisa etnográfica em marketing: passado, presente e futuros possíveis. Brazilian Journal of Marketing, v. 13, n. 6, p. 1-17, 2014.). As entrevistas foram integradas ao texto como em Arnould et al. (2019)ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019., citando perguntas e respostas dos diálogos entre pesquisador e pesquisados, visto que na linguagem desta região, as falas são curtas e muitas expressões são subentendidas (FOUCAULT, 2000FOUCAULT, M. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. Tradução: Salma Tannus Muchail. 8. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000.). “Os analistas de discurso, ao mesmo tempo em que examinam a maneira como a linguagem é empregada, devem também estar sensíveis àquilo que não é dito - aos silêncios” (GILL, 2008GILL, R. Análise de discurso. In: BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 2008., p. 255). E ainda, “a inserção de trechos das falas dos observados (colhidas durante o trabalho de campo) no texto etnográfico é um recurso largamente utilizado na antropologia e vem sendo também empregado em textos de estudos organizacionais” (ANDION; SERVA, 2006ANDION, C.; SERVA, M. A etnografia e os estudos organizacionais. In: Godoi, C.; Bandeira-de-Mello, R.; Silva, A. (Orgs.). Pesquisa qualitativa em estudos organizacionais: paradigmas, estratégias e métodos. São Paulo: Saraiva, 2006., p. 12).

As categorias de análise das culturas de mercado são: espaço (cidade/loja), atores (comerciante/consumidor), objetos (produtos/mercadorias), trocas (compra/venda), ideologia de mercado (livre comércio) e entidade reguladora, que representam a tradição do comércio. “As pessoas usam estratégias para codificar, e cada pesquisador deve desenvolver a sua, mas essencialmente a codificação é uma maneira de organizar as categorias de interesse” (GILL, 2008GILL, R. Análise de discurso. In: BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 2008., p. 254). Essas proposições emanaram da teoria e das práticas dos atores do mercado, numa dinâmica teórico-empírica.

A análise dos discursos foi baseada na noção de “contexto interpretativo” (GILL, 2008GILL, R. Análise de discurso. In: BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 2008.). Assimilando esse modelo, os atores sociais interpretam o contexto do comércio e constroem seus discursos para interagir no mercado, assim orientam suas ações. Texto e fala “são práticas sociais” (idem) que dependem das pessoas e do ambiente, descrevem atividades e expressam interesses.

Os textos são “organizados retoricamente”, o exemplo dado por Gill (2008GILL, R. Análise de discurso. In: BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 2008., p. 250) é interessante: políticos estão tentando convencer sobre seus ideais e “publicitários estão tentando vender seus produtos”, mas o consumidor tenta persuadir com seu estilo de vida. Então, a “linguagem é construtiva”, a troca (compra e venda) tem um dialeto do comércio em cada cidade ou cultura de consumo.

A análise de discurso, “sempre indefinível, nunca pode ser captada por descrições de esquemas de codificação […]. Exatamente porque as habilidades dos analistas de discursos não se prestam a descrições de procedimentos, não há necessidade de serem mistificadas e colocadas acima do alcance de todos” (GILL, 2008GILL, R. Análise de discurso. In: BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto e imagem: um manual prático. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 2008., p. 250). Assim, o mercado, seus atores e o consumo são interpretados através das lentes da CCT, em uma teorização heterodoxa (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019.; BELK; SOBH, 2019BELK, R.; SOBH, R. No assemblage required: on pursuing original consumer culture theory. Marketing Theory, v. 19, n. 4, p. 489-507, 2019.).

3 RESULTADOS

No Amazonas, o acesso às cidades é basicamente pelos rios. Isto porque as cidades-sede dos municípios do Estado, em sua maioria, foram construídas nas margens dos rios: Negro, Solimões, Madeira, Amazonas e seus afluentes (inclusive a capital Manaus), herança da “colonização”. Quando se viaja para o Alto Solimões, faz-se uma viagem no tempo, voltando ao passado (literalmente de 1h, em relação à Manaus). Nesta região, você pode conviver com povos tradicionais que ainda acreditam nas lendas amazônicas (BATISTA, 2007BATISTA, D. O complexo da Amazônia: análise do processo de desenvolvimento. 2. ed. Manaus: Valer, EDUA e INPA, 2007.). A seguir, descrevo características da cultura de mercado em três cidades da fronteira amazônica: Benjamin/BR, Islândia/PE e Letícia/CO.

3.1 O comércio em Benjamin/Brasil

Benjamin Constant é uma cidade do Alto Solimões, situada na fronteira Brasil/Peru, que como dizem na região: “É onde começa o Brasil”, talvez por isso era chamada de “Vila Esperança”. O município foi fundado em 29 de janeiro de 1898 (Lei Estadual nº 191). Sua população é de 44.873 habitantes (IBGE, 2021IBGE-Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Cidades Brasileiras. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/am/benjamin-constant/panorama. Acessado em: 2021.
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/am/be...
). Dista da capital do estado a 1.574 km por via fluvial e a 1.119 km por via aérea3 3 DC - Distância entre Cidades. Manaus a Benjamin Constant. Disponível em: http://www.distanciasentrecidades.com/distancia-manaus-a-benjamin-constant. Acesso em: 2015. (DC, 2018), sendo o transporte fluvial o mais utilizado pelos comerciantes por ser mais barato que o transporte aéreo. O espaço urbano é o “pano de fundo” das trocas no varejo (CASTILHOS, 2015CASTILHOS, R. Dinâmicas de mercado no espaço urbano: lógica teórica e agenda de pesquisa. Revista Brasileira de Marketing, v. 14, n. 2, 154-165, 2015.).

Observando o comércio da cidade, registro que o varejo é constituído por lojas diversas, estabelecimentos comerciais que vendem produtos nacionais e importados para suprir a população urbana e rural. Os consumidores também compram produtos importados em Islândia/PE e em Letícia/CO por serem mais baratos que os nacionais. As trocas comerciais e simbólicas na fronteira amazônica resultam em mudança de crenças e costumes (STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.).

A concorrência é pouco sentida pelos comerciantes, pois a demanda é maior que a oferta, isso explica a ausência de promoções nas lojas, o que se vê são ensaios de promoções, como o desconto em produtos que estão vencendo, mas muito raramente. Os comerciantes peruanos são concorrentes dos comerciantes brasileiros por dois motivos: preço baixo e proximidade do consumidor. De acordo com Barki e Parente (2010)BARKI, E.; PARENTE, J. Consumer Behaviour of the base of the pyramid market in Brazil. Greener Management International/FGV, v. 56, p. 11-23, 2010., comerciantes de pequeno porte se posicionam perto do consumidor.

Os comerciantes se concentram no porto da cidade, mas a enchente e a vazante do rio impactam no comércio. O proprietário de uma loja de roupas disse: “Quando o rio Javari seca muito [vazante], os barcos não vêm para Benjamin. Aí, temos que contratar canoas grandes para trazer a mercadoria de Tabatinga até aqui”. Porém, quando o rio enche muito, os comerciantes peruanos, instalados nos bairros, ganham em vendas. O dono de um açougue disse que na alagação as vendas diminuem 30%, em média. “Os consumidores de baixa renda costumam comprar nos varejista de rua, em diferentes níveis de modernização” (BARKI; BOTELHO; PARENTE, 2013BARKI, E.; BOTELHO, D.; PARENTE, J. Varejo: desafios e oportunidades em mercados emergentes. Revista de Administração de Empresas, v. 53, n. 6, p. 534-538, 2013.).

Em 2015, a área comercial de Benjamin foi tomada pelas águas do Javari por três meses. Nesse período, a prefeitura constrói pontes de madeira para que os consumidores possam chegar às lojas do varejo. Um tempo de alegria, em que as pessoas andavam sobre as pontes e se encontravam no comércio. Naquelas manhãs iluminadas, as mulheres desfilavam com seus figurinos e as crianças transitavam com seus pirulitos. Assim, a vida urbana ganhava outro sentido, ainda que passageiro. Ir ao comércio é mais que uma necessidade física, é também uma necessidade social.

Entrevistando comerciantes, perguntei de onde vêm os produtos vendidos nas lojas, um deles respondeu: “A maioria de Manaus e pouca coisa do Sul”. Os amazonenses usam a expressão “Sul” porque são nortistas, mas na maioria das vezes estão se referindo ao Sudeste. Os comerciantes brasileiros compram mercadorias de atacadistas e fabricantes de Manaus/BR e de outras regiões do país (SP, CE, MG, SC e RS). Os comerciantes peruanos compram produtos de atacadistas e fabricantes de Iquitos/PE, que por sua vez importam do Panamá.

Figura 1
Centro de Benjamin alagado

Um comerciante brasileiro explicou o processo de aquisição de mercadorias do seu mercadinho. Ele disse: “O vendedor visita o estabelecimento ou fazemos o pedido pelo telefone. Depois disso, os fornecedores entregam as mercadorias no porto de Manaus e o barco traz até Benjamin”. Segundo Sheth (2011)SHETH, J. N. Impact of emerging markets on marketing: rethinking existing perspectives and practices. Journal of Marketing, v. 75, p. 166-182, 2011., a disposição das mercadorias é um dos fatores críticos dos mercados emergentes.

Os barcos que abastecem a cidade são chamados de “recreios”, chegam de Manaus (seis dias de viagem) trazendo pessoas e mercadorias e saem dos portos do Alto Solimões somente com passageiros, pois a produção local ainda é de subsistência, os produtos agrícolas e a pesca. Perguntei aos comerciantes sobre a importância dos barcos para o comércio de Benjamin. O dono de uma panificadora disse: “Sem os recreios é inviável, o transporte aéreo é muito caro”. Comparando o abastecimento de Benjamin e de Letícia, o transporte aéreo é viável para o varejo colombiano, mas inviável para o varejo brasileiro nessa região.

Figura 2
Barco no porto de Benjamin

Na tradição do comércio, as lojas de brasileiros abrem das 8h às 12h e das 14h às 19h. Mas os comerciantes peruanos não fecham para o almoço, obtendo vantagem nas vendas. E ainda, os comerciantes israelitas (peruanos) trabalham de domingo a sexta, pois guardam o sábado (Mercearia Nestor, por exemplo). Considerando as dimensões espaço/tempo, o design da loja e seu modo de operação podem ser pensados de forma flexível para acomodar uma gama de necessidades ou preferências do consumidor (HÖPNER et al., 2015HÖPNER, A. et al. Experiência do consumidor no varejo: um estudo bibliométrico. Brazilian Journal of Marketing, v. 14, n. 4, p. 513-528, 2015.).

Os comerciantes vendem à vista e a prazo. O comerciante vende para receber no final do mês (fiado) e as compras são anotadas em um caderno. Esta é uma prática que deu origem ao crediário próprio das lojas. Alguns comerciantes aceitam cartões de crédito/débito e cartões de alimentação/refeição. A maioria dos consumidores entrevistados disse que não usa cartão de crédito/débito.

Em Benjamin, o uso do dinheiro em espécie é mais frequente do que na capital. As moedas mais usadas nas transações comerciais da fronteira amazônica são o Real brasileiro, o Sol peruano e o Peso colombiano. Os brasileiros recebem o Peso para fazerem compras em Letícia e os colombianos recebem o Real para fazerem compras em Tabatinga. “As experiências dos consumidores são moldadas pelo ambiente social” (HÖPNER et al., 2015HÖPNER, A. et al. Experiência do consumidor no varejo: um estudo bibliométrico. Brazilian Journal of Marketing, v. 14, n. 4, p. 513-528, 2015., p. 515).

Os bancos que atuam no comércio de Benjamin são: Bradesco, com uma agência; Banco do Brasil, com um caixa eletrônico; e Caixa Econômica, com uma casa lotérica. No final do mês, a agência do banco e a casa lotérica recebem muitos usuários, da zona urbana e rural, ficando congestionadas. Assim como os fornecedores de mercadoria, os bancos são empresas de serviços essenciais para o comércio (SHETH, 2011SHETH, J. N. Impact of emerging markets on marketing: rethinking existing perspectives and practices. Journal of Marketing, v. 75, p. 166-182, 2011.).

No Alto Solimões, a prefeitura é a entidade reguladora do comércio mais evidente, instituição sociopolítica do mercado (SHETH, 2011SHETH, J. N. Impact of emerging markets on marketing: rethinking existing perspectives and practices. Journal of Marketing, v. 75, p. 166-182, 2011.). Observei que nos bairros afastados do centro da cidade, alguns estabelecimentos não têm alvará e muitos funcionam nas residências dos comerciantes. Por exemplo: pequenas mercearias, pessoas que vendem roupas, pão, lanche, “churrasco”, açaí e gasolina. Na baixa renda, “uma casa não é apenas uma unidade de consumo, mas também uma unidade de produção” (SHETH, 2011SHETH, J. N. Impact of emerging markets on marketing: rethinking existing perspectives and practices. Journal of Marketing, v. 75, p. 166-182, 2011., p. 169).

Um agente da prefeitura disse que os peruanos trabalham no comércio da cidade, mas “muitos não pagam imposto”. Então, perguntei sobre a importância dos consumidores peruanos para o comércio de Benjamin. Ele disse que “os consumidores peruanos são poucos”. Isto significa que os moradores de Islândia fazem compra em Benjamin eventualmente, diferente dos brasileiros que compram com frequência em Islândia. Mesmo sem saber, “todo varejista proporciona algum tipo de experiência a seus consumidores que varia em função da natureza das interações” (ALMEIDA et al., 2016ALMEIDA, S. O. et al. O contínuo experiencial do varejo: valor utilitário versus valor hedônico no mix de marketing varejista. Teoria e Prática em Administração, v. 6, n. 1, p. 97-128, 2016., p. 102) no mix de marketing.

Na conversa, perguntei se existe acordo de livre comércio entre Brasil e Peru. Sua resposta: “Que eu saiba, não”. Na entrevista com o inspetor da Receita Federal do Brasil, em Tabatinga, ele disse que não existe acordo de livre comércio nessa fronteira (Benjamin/Islândia). Mas existe uma política interna do Brasil que permite a compra de produtos importados para o consumo, no valor de até trezentos dólares, sem a cobrança do imposto de importação (Lei 7.965/1989BRASIL. Lei n. 7.965/1989. Presidência da república. Cria área de livre comércio no município de tabatinga, no estado do amazonas, e dá outras providências. Disponível em: http//www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7865.htm. Acesso em: 2023.
http//www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis...
e Decreto nº 6.759/2009BRASIL. Decreto n. 6.759/2009. Presidência da república. Regulamenta a administração das atividades aduaneiras, e a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior. Disponível em: http//www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/decreto/d6759.htm . Acesso em: 2023.
http//www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato...
).

Tabatinga é a cidade-sede do Alto Solimões, onde atuam entidades reguladoras do comércio, como Receita Federal e Polícia Federal. Na entrevista com um agente da SUFRAMA, agência de fomento que administra a Área de Livre Comércio (ALC) da região, ele explicou que os comerciantes que participam da ALC podem ter isenção de impostos, como II e ICMS, mas somente na zona urbana de Tabatinga (Lei 7.965/89BRASIL. Lei n. 7.965/1989. Presidência da república. Cria área de livre comércio no município de tabatinga, no estado do amazonas, e dá outras providências. Disponível em: http//www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7865.htm. Acesso em: 2023.
http//www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis...
).

O mapa da fronteira amazônica e o fluxo de consumidores benjaminenses, representado pelas figuras a seguir, mostram as cidades nas divisas Brasil/Peru e Brasil/Colômbia. Os consumidores saem de Benjamin para fazerem compras em Islândia ou para fazerem compras em Letícia, passando por Tabatinga. Entre Benjamin e Islândia, o percurso é de 10 minutos de catraia/rabeta; e entre Benjamin e Tabatinga, o percurso é de 30 minutos de catraia/voadeira. Para muitos consumidores essas viagens representam entretenimentos.

Figura 3
Fronteira amazônica

O Livre Comércio é o principal instrumento da política de integração de países aliados da América do Sul (MERCOSUL). No âmbito social, com o objetivo de intercâmbio cultural, o acordo possibilita a imigração entre os países membros, dando direito à residência, à formação familiar, ao trabalho, à educação, ao credo e à transferência de recursos, para cidadãos legalizados4 4 www.mercosul.gov.br.

3.2 O comércio em Islândia/Peru

Islândia é uma cidade do Peru, localizada no Departamento (Estado) de Loreto, no Distrito (Município) de Yavari. O município foi fundado em 02 de julho de 1943. Sua população é de 2.310 habitantes5 5 EL COMERCIO. Islândia peruana. Disponível em: https://elcomercio.pe/peru/loreto/islandia-peruana-conoce-localidad-ubicada-medio-amazonia-noticia-507613-noticia/. Acesso em: 2015. . A Islândia faz fronteira com o Brasil no município de Benjamin Constant. As casas e os prédios públicos foram construídos acima do nível do rio. No lugar de ruas, foram construídas passarelas de madeira e de concreto, que os moradores chamam de “pontes”. Isto para que a enchente não inunde as casas e os prédios públicos, e para que as pessoas possam transitar na cidade como se estivessem andando em vias urbanas convencionais.

O comércio de Islândia caracteriza-se por estabelecimentos comerciais sobre as águas. As lojas situam-se, pela característica das cidades ribeirinhas, na zona portuária que, em geral, também é o centro da cidade; e na margem do rio Javari, em uma faixa fluvial que vai de Islândia até Benjamin, em flutuantes que os comerciantes chamam de “balsas”. Quando um benjaminense conversa com seus conterrâneos, ele diz: “Vou à Islândia comprar peças na balsa 44”, um dialeto do comércio. Isto ocorre pela convivência na fronteira, um aculturamento do consumo (STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.).

Os islandenses têm uma relação estreita com o rio, inclusive muitas lojas são flutuantes e acompanham o movimento das águas, enchente e vazante. Em comparação com as outras cidades, Benjamin e Letícia, os comerciantes não têm os mesmos desafios da natureza. A arquitetura da loja segue a estética da cultura local, elaborada na experiência do comerciante que atua na Amazônia. Seus modos de vida e trabalho não seguem a lógica de mercado da cidade grande (BATISTA, 2007BATISTA, D. O complexo da Amazônia: análise do processo de desenvolvimento. 2. ed. Manaus: Valer, EDUA e INPA, 2007.).

Entrevistando comerciantes, a dona de uma loja flutuante/balsa disse que as mercadorias vêm “De Iquitos y de Lima” pelo rio Amazonas/Solimões até Santa Rosa/PE, na tríplice fronteira (BR/PE/CO), e depois de serem vistoriadas são levadas para a Islândia. Os produtos importados vendidos na cidade são do Panamá (USA), da China, do Brasil, da Espanha e de outras partes do mundo. A localização do comerciante e os produtos são variáveis da experiência de consumo no varejo (ALMEIDA et al., 2016ALMEIDA, S. O. et al. O contínuo experiencial do varejo: valor utilitário versus valor hedônico no mix de marketing varejista. Teoria e Prática em Administração, v. 6, n. 1, p. 97-128, 2016.).

Os produtos que os brasileiros mais compram dos comerciantes peruanos são: combustível (gasolina), materiais de construção (cimento, ferro, vidro e telha de zinco), cereais (feijão, soja, lentilha), legumes (batata, cenoura, beterraba, repolho), frutas (banana, maracujá, abacaxi, abacate, maçã, pera, uva), verduras (cebola, tomate, cheiro-verde, couve, alface, pepino), temperos (alho, pimenta-do-reino, cominho, açafrão), artigos de pesca, utensílios domésticos, cobertores e moto chinesa, que os benjaminenses chamam de “moto peruana”. Alguns produtos brasileiros vendidos em Islândia são repatriados, como o produto que comprei, da marca Tramontina, que apesar de ser produzido no Sul do Brasil, é mais barato que em Benjamin. O materialismo é um conceito da cultura e da globalização (STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.).

Na tradição do comércio, as lojas abrem das 7h às 19h, de segunda a domingo (católicos) e de domingo à sexta (israelitas). Nas trocas, os comerciantes falam ou entendem o português e os consumidores falam ou entendem o espanhol. As culturas de mercado são “arranjos socioeconômicos”, modos de vida e trabalho representados pelo comércio, os produtos e seus significados (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019.).

Os comerciantes vendem à vista e a prazo (fiado), mas não aceitam cartão de crédito/débito. O dinheiro mais usado no comércio de Islândia é o Real e o Sol, sem câmbio oficial. Em 2010, o Real valia mais que o Sol (1/1,20). Em 2014, um Real valia um Sol (1/1) ou um por um, como dizem na região. Em 2023, o Real vale menos que o Sol (1/0,90). “Aqui mais uma vez devemos reconhecer o caráter dialético da globalização e também a influência dos processos de desenvolvimento desigual” (GIDDENS, 1991GIDDENS, A. As consequências da modernidade. Tradução: Raul Fiker. São Paulo: Editora UNESP, 1991., p. 62).

Na cidade não tem banco comercial, mas existe uma agência de depósitos que transfere dinheiro para outras cidades peruanas. Se uma pessoa de Islândia ou de Benjamin quiser enviar dinheiro para outra pessoa em Iquitos ou Lima/PE, ou vice-versa, pode depositar a quantia desejada em espécie nessas agências privadas, o serviço de transferência é cobrado. Observei que brasileiros que moram em Islândia e peruanos que moram em Benjamin, têm parentes e amigos na capital peruana e costumam usar esse serviço. “Em tudo isso há uma série de direitos e deveres de consumir, como se houvesse troca constante de matéria espiritual que compreende coisas e homens” (MAUSS, 2003MAUSS, M. Sociologia e antropologia. Tradução: Paulo Neves. São Paulo: Cosac Naify, 2003., p. 202).

Entrevistando a gerente de Servicios Públicos da prefeitura, perguntei qual é o documento que autoriza o funcionamento das lojas no comércio de Islândia. Ela respondeu: “Licencia de funcionamiento”. O mesmo que alvará de funcionamento no Brasil. Então, perguntei se os brasileiros podem trabalhar no comércio da cidade. Ela disse: “Sim, mas precisam ser naturalizados e pagar os impostos”. Porém, não tem loja de brasileiro em Islândia, como tem em Benjamin. Sobre isto, um comerciante peruano explicou: “Os brasileiros não se instalam aqui porque os serviços básicos como luz elétrica, água tratada e esgoto são limitados”. A escassez de recursos é uma das características do comércio na baixa renda. Os comerciantes e consumidores não têm acesso aos serviços essenciais como energia, água, bancos e transporte (SHETH, 2011SHETH, J. N. Impact of emerging markets on marketing: rethinking existing perspectives and practices. Journal of Marketing, v. 75, p. 166-182, 2011.).

Entrevistando a gerente de Servicios Públicos da prefeitura, perguntei qual é a importância dos consumidores brasileiros para o comércio de Islândia, pelo que respondeu: “Os consumidores brasileiros são muito importantes!”. Esta resposta tem outros significados, o de respeito pela nação vizinha e, na perspectiva do comerciante, o reconhecimento dos clientes como protagonistas do mercado, sem os quais não haveria vendas e ganho econômico. Os benjaminenses fazem compras em Islândia com mais frequência no final do mês, quando recebem seus pagamentos e benefícios (salários, aposentadorias e auxílios do governo). O varejo é o “termômetro da economia” doméstica (ALMEIDA et al., 2016ALMEIDA, S. O. et al. O contínuo experiencial do varejo: valor utilitário versus valor hedônico no mix de marketing varejista. Teoria e Prática em Administração, v. 6, n. 1, p. 97-128, 2016.).

Continuando a entrevista, perguntei se existe acordo de livre comércio entre Peru e Brasil e qual é a cota de compra dos brasileiros no comércio de Islândia. Ela respondeu laconicamente: “No hay!”. Os consumidores brasileiros podem comprar qualquer quantidade de produto em Islândia, porém se a Receita Federal do Brasil estiver na divisa fiscalizando, uma compra acima de 300 dólares será apreendida como contrabando.

Uso as palavras de Foucault (2000FOUCAULT, M. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. Tradução: Salma Tannus Muchail. 8. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000., p. 20) para representar as coisas que se buscou conhecer naqueles lugares esquecidos pelo mundo urbano civilizador, o outro. “Nesse lugar preciso, mas indiferente, o que olha e o que é olhado permutam-se incessantemente. Nenhum olhar é estável, antes o sujeito e o objeto, o espectador e o modelo invertem seu papel ao infinito”.

Figura 4
Vendedora de Juane no porto de Islândia

O olhar do pesquisador pela câmara de retratos e o olhar do sujeito da pesquisa (uma elegante e educada senhora) se entrecruzam como no quadro interpretado por Foucault (2000)FOUCAULT, M. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. Tradução: Salma Tannus Muchail. 8. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. e eles formam ideais um do outro, e, ao mesmo tempo, o sujeito revela, em seu olhar, matizes de seu viver.

3.3 O comércio em Letícia/Colômbia

Letícia é uma cidade da Colômbia, localizada no Departamento do Amazonas no Distrito de Leticia. O município foi fundado em 25 de abril de 1867. Sua população é de 42.280 habitantes6 6 População de Letícia/CO. Disponível em: https://www.google.com/search?client=firefox-b-d&q=popul%C3% A7%C3%A3o+de+let%C3%ADcia+colombia. Acesso em 2019. . Letícia faz fronteira com o Brasil no município de Tabatinga, na Avenida da Amizade, do lado brasileiro, e Carrera Internacional, do lado colombiano, onde existe um comércio de produtos e um fluxo de consumidores.

O comércio de Letícia caracteriza-se por estabelecimentos comerciais localizados no centro da cidade, em ruas de sentido único, próximo do porto e da divisa com o Brasil. As cidades são descritas como “espaços de consumo” (CASTILHOS, 2015CASTILHOS, R. Dinâmicas de mercado no espaço urbano: lógica teórica e agenda de pesquisa. Revista Brasileira de Marketing, v. 14, n. 2, 154-165, 2015.), onde casas, lojas e áreas de lazer formam o relevo da modernidade.

Figura 5
Centro de Letícia

Entrevistando comerciantes, perguntei de onde vêm as mercadorias vendidas nas lojas da cidade. O gerente de uma loja de eletrônicos respondeu: “As mercadorias vêm de Bogotá/CO por via aérea”. Os produtos importados vendidos em Letícia são do Panamá (USA), da China, do Brasil, da Espanha e de outras partes do mundo. Em muitas regiões, as comunidades estão assimilando as preferências da cultura de consumo global (STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.).

Os produtos que os brasileiros mais compram em Letícia são: perfumes, cosméticos, remédios, eletrodomésticos, computadores, relógios, joias, confecções, sapatos e bijuterias; produtos de higiene (Colgate) e alimentícios (Nestlé); motores estacionários (Honda); motosserras, roçadeiras e peças de reposição (Stihl); e ferramentas (Tramontina), importados do Brasil, mais barato que em Benjamin.

Na tradição do comércio, as lojas abrem das 8h às 12h e das 14h às 18h. Em datas comemorativas, as lojas ficam abertas até às 21h. Estive na cidade na época de festa junina e observei que à noite havia muitos turistas. Nas trocas, crenças e costumes são experimentados e reforçados (QUINTÃO; PEREIRA; BAÊTA, 2019QUINTÃO, R. T.; PEREIRA, V. F.; BAÊTA, R. A. S. Consumo mágico: um estudo no contexto de torcedores de futebol. Revista Brasileira de Marketing, v. 18, n. 1, p. 7-28, 2019.).

Os comerciantes vendem à vista e a prazo, aceitam cartões de crédito/débito. Eles aceitam todas as moedas da tríplice fronteira, inclusive o dólar americano. Quando o consumidor compra com cartão de crédito, o valor é convertido e o imposto é cobrado. Quando a compra é feita com dinheiro, os lojistas seguem o câmbio da cidade, que varia de acordo com o dólar, pois os comerciantes compram mercadorias com base nessa moeda.

A enchente e a vazante do rio Amazonas/Solimões impactam no comércio de Letícia. O gerente de um supermercado disse: “A dinâmica do rio impacta no comércio de pescado”. Os comerciantes colombianos investem na pesca de bagre no Solimões, comprando peixe dos brasileiros com Real captado no comércio de Letícia, uma vez que o Real vale menos que o Peso em Letícia (1/0,75), mas em Tabatinga é um por um (1/1).

Na entrevista com o presidente da Cámara del Comercio del Amazonas (CCA), perguntei qual é o documento que autoriza o funcionamento das lojas no comércio de Letícia. Ele disse: “Registro mercantil da CCA, Licença da Prefeitura e o NIT” (CNPJ no BR). Observei que a polícia colombiana acompanha os funcionários da prefeitura nas vistorias dos estabelecimentos da cidade, onde as entidades reguladoras atuam em conjunto; mas no Alto Solimões, as instituições estão desconectadas por virtude (ou desvirtude) da legislação vigente.

Continuando a entrevista, perguntei se os brasileiros podem trabalhar no comércio de Letícia. Ele respondeu: “Sim, existe um tratado de residência, trabalho e estudo entre Colômbia e Brasil”. Em 2010, os ministros de relações exteriores do Brasil e da Colômbia assinaram um acordo de permissões de residência, trabalho e estudo para brasileiros e colombianos na fronteira. Porém, os comerciantes brasileiros não podem trabalhar na cidade, a cultura de mercado e suas exigências é uma barreira comercial contra a imigração. O mercado é o “espaço em que os [comerciantes e] consumidores constroem seus projetos socioculturais, mas as tradições são tomadas como um conjunto de ações valorativas da cultura local na busca por continuidade da sociedade” (DALMORO; NIQUE, 2017DALMORO, M.; NIQUE, W. M. Tradição mercantilizada: construção de mercados baseados na tradição. Revista de Administração Contemporânea, v. 21, n. 3, p. 327-346, 2017., p. 329).

Então perguntei qual é a importância dos consumidores brasileiros para o comércio de Letícia. Ele disse que 40% dos consumidores que vão a Letícia são brasileiros. Os comerciantes também disseram que atendem consumidores de todos os municípios da mesorregião. Os consumidores do Alto Solimões têm o comércio de Letícia como referência, mais que Tabatinga, que é a capital da microrregião, ainda que lá exista uma Zona Franca.

Também perguntei se existe acordo de livre comércio entre Colômbia e Brasil. Ele disse que não, mas existe um acordo comercial (2008), baseado nos decretos: 2.685/99COLÔMBIA. Decreto n. 2.685/1999. Ministerio de hacienda y credito publico. Por el cual se modifica la legislación aduanera. Dado en Santafé de Bogotá, D.C., a 28 de diciembre de 1999. (Documento obtido em entrevista na Câmara do Comércio de Letícia). CO e 6.759/2009 BR. O acordo entre Colômbia e Brasil estabeleceu um regime especial do comércio de mercadorias na divisão Letícia/Tabatinga, mas com ordenamento jurídico não unificado, onde cada país regulamenta sua importação. Por exemplo: a cota de compra dos consumidores colombianos é de US$1.000 e a dos brasileiros é de US$300, para o consumo.

Em Letícia, existem muitos bancos comerciais, a saber: Banco da República, Banco Bogotá, Banco Colômbia, Banco Ocidente, Banco BBVA, Banco Agrário e Banco Popular. Perguntei se esses bancos atendem as demandas do comércio. Ele argumentou: “Sim, mas é necessário que os bancos da República [em Letícia] e do Brasil [em Tabatinga] atuem no comércio regional, regulando o câmbio para manter o valor das moedas em um por um [1/1000], que seria ideal para colombianos e brasileiros”. Na fronteira amazônica, “a sociedade surge, portanto, como uma rede de culturas de mercado, por meio da qual as pessoas migram e nas quais podem vivenciar fortes laços e compartilhar experiências” (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019., p. 102), modos de vida entrelaçados.

Os brasileiros compram mais em Islândia e em Letícia do que os peruanos em Benjamin e os colombianos em Tabatinga. Os brasileiros compram no varejo no Peru e na Colômbia; e os peruanos e colombianos, no atacado no Brasil. Em visita à Letícia, comprei uma caixa de bombom da marca Garoto, fabricada no Brasil, mais barato que em Benjamin, numa diferença de 20%. Atendimento e preço são variáveis do mix de marketing e da experiência de consumo (ALMEIDA et al., 2016ALMEIDA, S. O. et al. O contínuo experiencial do varejo: valor utilitário versus valor hedônico no mix de marketing varejista. Teoria e Prática em Administração, v. 6, n. 1, p. 97-128, 2016.), que atrai o consumidor de baixa renda. A compra pode ser definida como habitual em Benjamin e em busca de novidade em Islândia e Letícia (KOTLER e ARMSTRONG, 2007KOTLER, P.; ARMSTRONG, G. Princípios de marketing. Tradução: Cristina Yamagami. 12. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007.).

Na entrevista com o agente da SUFRAMA, perguntei qual era importância do comércio de Islândia e de Letícia para o Alto Solimões. Ele disse: “Existem vantagens e desvantagens”. Uma desvantagem apontada é a evasão de divisas, quando os brasileiros compram em Letícia ou em Islândia, e uma vantagem é a oferta de produtos do comércio peruano e colombiano, sem os quais o acesso aos produtos seria limitado, como acontece nos outros municípios do Alto Solimões. As trocas na fronteira criam discursos de mercado e práticas de consumo, construindo culturas de mercado, que “se manifestam por meio do consumo dentro da multiplicidade de agrupamentos sociais mediados pelo mercado” (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019.).

3.4 A tradição do comércio na fronteira amazônica

Interpretando culturas de mercado, as evidências mostram que os consumidores benjaminenses compram em Islândia e em Letícia produtos importados que são repatriados pelo comércio praticado na fronteira amazônica. Uma contradição das políticas de exportação e importação do BR, que pode ser comparada com o costume do pescador no Alto Solimões: quando pesca, ele escolhe os melhores peixes para vender e leva para casa o que sobra para alimentar sua família. E não se dá conta de que os países desenvolvidos exportam o excedente e consomem as primícias da produção nacional. Uma prática do passado, quando os camponeses plantavam e colhiam para seu sustento, trocando o que sobrava por produtos que eles não tinham, como sal ou trigo de outras regiões.

Na fronteira amazônica, o varejo é constituído por lojas diversas, estabelecimentos comerciais que vendem produtos nacionais e importados para suprir as populações dos municípios. Em Benjamin e Islândia, o abastecimento das lojas é feito pelos barcos que trazem mercadorias de Manaus para os brasileiros e de Iquitos para os peruanos, mas em Letícia o abastecimento é feito por via aérea, as mercadorias vêm de Bogotá. Vivenciando experiências de compra pude compreender culturas de mercado, “uma compreensão profunda dos lugares e perspectivas do consumo” (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019., p. 92).

Os comerciantes peruanos são concorrentes dos comerciantes brasileiros na fronteira Brasil/Peru. Assim como os comerciantes colombianos são concorrentes dos comerciantes brasileiros na fronteira Brasil/Colômbia; contudo, a demanda é maior que a oferta. Porém, o livre comércio é um mito de mercado, pois abrange tão somente o perímetro urbano de Tabatinga, mas que poderia ser um acordo comercial entre o Brasil, a Colômbia e o Peru na tríplice fronteira (Tabatinga/Letícia/Santa Rosa), extensivo às cidades fronteiriças Benjamin (Brasil) e Islândia (Peru). Uma união aduaneira para circulação de mercadorias entre esses países e a criação de entreposto para importação e exportação com regime fiscal especial regulado pela Lei 7.965/89BRASIL. Lei n. 7.965/1989. Presidência da república. Cria área de livre comércio no município de tabatinga, no estado do amazonas, e dá outras providências. Disponível em: http//www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7865.htm. Acesso em: 2023.
http//www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis...
, administrado pela SUFRAMA e fiscalizado pela Receita Federal, com o apoio da Polícia Federal, visando o desenvolvimento regional.

Identificando táticas de marketing inconscientes e práticas de consumo conscientes, mostrei as maneiras pelas quais comerciantes e consumidores dessa região participam do comércio, construindo culturas de mercado (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019., p. 92). Na prática, os comerciantes promovem experiências de consumo, baseadas em variáveis do mix de marketing e fantasias inspiradas nas culturas de povos amazônicos. Em Letícia, tem um restaurante temático, cujas cadeiras são feitas de madeira e couro rústicos e as paredes são decoradas com máscaras indígenas. Em Benjamin, tem um restaurante que lembra uma maloca da etnia Marubo, a cobertura é feita de palha retirada da floresta.

O varejo é um espaço de interação social, onde as culturas se misturam engendrando uma cultura de consumo que representa a região. Os atores do mercado trocam mercadorias, crenças e costumes (STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.). Benjamin Constant é uma cidade brasileira com matizes da cultura peruana. Os consumidores peruanos que moram em Benjamin são casados com consumidoras brasileiras e os consumidores brasileiros que moram em Islândia são casados com consumidoras peruanas. A culinária benjaminense é um exemplo de aculturação, os pratos mais comentados na cidade são ceviche, chicharrón e sancocho, comidas típicas do Peru. O comércio e a cultura fazem parte da vida urbana.

No plano de marketing, os comerciantes de Benjamin implementam estratégias de vendas assentes em suas experiências e na intuição. A ausência de planejamento e a resistência a mudança nas organizações são as principais causas dos problemas de marketing nas pequenas empresas. As estratégias de marketing idealizadas e mantidas na mente do comerciante, não documentadas, não traduzidas em ações coesas e não comunicadas aos empregados e aos clientes de forma inteligível, também não produzirão desempenho organizacional ótimo (FINOTI et al., 2019FINOTI, L. L. et al. Processo de estratégia de marketing: analisando as relações sequenciais entre suas atividades estratégicas. RBGN, v. 21, n. 5, p. 767-787, 2019.).

Em Benjamin e Islândia, as lojas (pontos de vendas) são pouco atrativas, diferente de Letícia, onde se pode ver o merchandising dos lojistas. Quanto aos produtos, os consumidores têm acesso a uma diversidade de bens nacionais e importados. No entanto, a oferta de serviços é limitada, como os serviços médico-hospitalares, água tratada, energia elétrica, transporte, telefone e internet. Por outro lado, os produtos regionais são abundantes e de baixo custo, como açaí, castanha, banana etc., que em outras regiões são muito caros. Os preços dos produtos industrializados são altos, devido a distância dos atacadistas de Manaus, de Iquitos/PE e de Bogotá/CO e o custo com transporte. As promoções são módicas e sem muito benefício para os consumidores. Apesar disso, o consumo é uma experiência imersiva e os comerciantes e consumidores são protagonista do mercado (HÖPNER et al., 2015HÖPNER, A. et al. Experiência do consumidor no varejo: um estudo bibliométrico. Brazilian Journal of Marketing, v. 14, n. 4, p. 513-528, 2015.).

Em Benjamin, os comerciantes disseram que os consumidores da zona rural representam 40% das vendas nas lojas. Eles vêm à cidade para receberem seus benefícios no banco (aposentadoria, pensão, bolsa auxílio, pagamento etc.) e fazerem suas compras no comércio (mantimentos, vestuário, ferramentas etc.). No entanto, essas pessoas tão importantes para a economia local não recebem a atenção devida. Kotler e Armstrong (2007KOTLER, P.; ARMSTRONG, G. Princípios de marketing. Tradução: Cristina Yamagami. 12. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007., p. 4) preceituam: “Hoje, o marketing não deve ser entendido no velho sentido de efetuar uma venda - ‘mostrar e vender’, mas no novo sentido de satisfazer as necessidades dos clientes”. As tecnologias causam mudanças de mercado, comerciantes e consumidores estão cada vez mais distantes. Mas neste caso, os povos tradicionais da região são consumidores de baixa renda que não têm acesso à internet, a pobreza os coloca em segundo plano na expectativa do comerciante (BARKI; PARENTE, 2010BARKI, E.; PARENTE, J. Consumer Behaviour of the base of the pyramid market in Brazil. Greener Management International/FGV, v. 56, p. 11-23, 2010.).

Dizem que “o atendimento é a alma do negócio”, mas os consumidores contaram uma história intrigante. Nos anos 1990, um comerciante chamado “Gentil”, cuja atitude não fazia jus ao nome, atendia os clientes com grosseria. Se um consumidor chegasse ao seu armazém trazendo algum produto comprado de outro comerciante, ele dizia que não venderia nada para aquela pessoa e sugeria que o freguês fosse comprar o que procurava na outra mercearia. Os comerciantes conservadores não conhecem experiências de consumo como fantasia e emoções, mas as mudanças na sociedade ameaçam sua existência (HÖPNER et al., 2015HÖPNER, A. et al. Experiência do consumidor no varejo: um estudo bibliométrico. Brazilian Journal of Marketing, v. 14, n. 4, p. 513-528, 2015.).

A tradição do comércio é um sistema sociomaterial de crenças e costumes. Os produtos são objetos sagrados ou profanos que identificam as instituições e as pessoas. Mas “há muitos mais no marketing do que os consumidores podem ver. Por trás dele, há uma rede de pessoas e atividades que disputam sua atenção e seu dinheiro” (KOTLER; ARMSTRONG, 2007KOTLER, P.; ARMSTRONG, G. Princípios de marketing. Tradução: Cristina Yamagami. 12. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007., p. 4). Na fronteira amazônica, e em muitos lugares, a tradição do comércio mantém práticas que não garantem resiliência no mercado. Se a cultura de mercado é elaborada pelas pessoas de uma comunidade, então, a tradição do comércio é o espectro da cultura de mercado, pois o comerciante do varejo é agente de mudança na cultura de consumo (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019.; STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.).

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Evocando Belk e Sobh (2019)BELK, R.; SOBH, R. No assemblage required: on pursuing original consumer culture theory. Marketing Theory, v. 19, n. 4, p. 489-507, 2019., é tempo de desembrulhar o pacote de conceitos da CCT e elaborar uma teoria emergente. Mas este artigo segue o pensamento de Bispo (2022)BISPO, M. de S. Em defesa da teoria e da contribuição teórica original em administração. Revista de Administração Contemporânea, v. 26, n. 6, p. 1-7, 2022., em não reproduzir tradições teóricas, na tentativa de produzir teoria original. Visto que uma região que não produz teoria, mas importa conhecimento produzido em outra região, torna-se dependente de teorias dominantes. De acordo com Steenkamp (2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019., p. 2), “após 20 anos de pesquisa de marketing, a pesquisa existente é vasta, tratou de uma variedade de aspectos da cultura de consumo global e da cultura de consumo local, baseia-se em diferentes literaturas fundamentais e apareceu em publicações para campos que vão da antropologia ao marketing”.

A CCT pode ser considerada uma teoria que orquestra conceitos do marketing e da antropologia, tais como culturas de mercado, padrões de consumo e identidade do consumidor (ARNOULD et al., 2019ARNOULD, E. J. et al. Consumer culture theory: development, critique, application and prospects. Foundations and Trends in Marketing, v. 12, n. 2, p. 80-166, 2019.; BELK e SOBH, 2019BELK, R.; SOBH, R. No assemblage required: on pursuing original consumer culture theory. Marketing Theory, v. 19, n. 4, p. 489-507, 2019.). Tendo como objeto o mercado e o consumo, em uma abordagem interpretativista dos aspectos objetivos e subjetivos do comércio e da experiência de consumo (HÖPNER et al., 2015HÖPNER, A. et al. Experiência do consumidor no varejo: um estudo bibliométrico. Brazilian Journal of Marketing, v. 14, n. 4, p. 513-528, 2015.). Sendo o varejo um espaço socioeconômico (VAROTTO, 2018VAROTTO, L. F. Varejo no Brasil: resgate histórico e tendências. Brazilian Journal of Marketing, v. 17, n. 3, p. 429-443, 2018.), onde as trocas de objetos engendram crenças e costumes (MAUSS, 2003MAUSS, M. Sociologia e antropologia. Tradução: Paulo Neves. São Paulo: Cosac Naify, 2003.), que saem das lojas dos comerciantes, transitam pelas ruas/rios da cidade/região e chegam às casas dos consumidores (CASTILHOS, 2015CASTILHOS, R. Dinâmicas de mercado no espaço urbano: lógica teórica e agenda de pesquisa. Revista Brasileira de Marketing, v. 14, n. 2, 154-165, 2015.), e depois voltam para o comércio (SHETH, 2011SHETH, J. N. Impact of emerging markets on marketing: rethinking existing perspectives and practices. Journal of Marketing, v. 75, p. 166-182, 2011.). Modos de vida e trabalho orientados pela família, religião, política e escola, instituições da sociedade moderna (STEENKAMP, 2019STEENKAMP, J-B. E. M. Global versus local consumer culture: theory, measurement, and future research directions. Journal of International Marketing, v. 27, n. 1, p. 1-19, 2019.). E ainda, as ideologias de mercado mediadas pelo rádio e pela televisão, as redes sociais e o smartphone, tecnologias que fazem a publicidade dos produtos e das marcas (QUINTÃO; PEREIRA; BAÊTA, 2019QUINTÃO, R. T.; PEREIRA, V. F.; BAÊTA, R. A. S. Consumo mágico: um estudo no contexto de torcedores de futebol. Revista Brasileira de Marketing, v. 18, n. 1, p. 7-28, 2019.), mudando os significados dos bens e serviços incessantemente. A moda está presente em todo amanhecer e em cada anoitecer da cultua do consumidor.

O comércio, portanto, faz parte da paisagem e do cotidiano das pessoas, servido de referência sociocultural. O comerciante não é apenas um vendedor de mercadorias, os produtos não são simples provisões, a compra é mais que uma necessidade fisiológica. Mesmo em lugares longínquos, o varejo está presente e tem representações, cujos símbolos culturais dão sentido à vida (MAUSS, 2003MAUSS, M. Sociologia e antropologia. Tradução: Paulo Neves. São Paulo: Cosac Naify, 2003.; VAROTTO, 2018VAROTTO, L. F. Varejo no Brasil: resgate histórico e tendências. Brazilian Journal of Marketing, v. 17, n. 3, p. 429-443, 2018.).

Os objetivos da pesquisa, descrever e interpretar culturas de mercado, foi realizado. Uma vez que um “mapa do consumo” na fronteira amazônica foi desenhado, mas ainda com traços em preto e branco, que pode ser colorido e aperfeiçoado com novas pesquisas. Os discursos e as práticas dos atores do mercado revelam um cenário que é, ao mesmo tempo, conhecido e desconhecido, as trocas comerciais e simbólicas no varejo. E ainda, a contribuição teórica se deu ao definir a tradição do comércio como um sistema de crenças e costumes da cultura regional, situando tradição do comércio como uma dimensão da cultura de mercado, no desenvolvimento da CCT.

A cultura de mercado na fronteira amazônica tem tradições distintas, mas os comerciantes têm práticas semelhantes. Em Benjamin e Letícia, a maioria das lojas fecha para o almoço, diferente de Islândia onde as lojas não fecham para o almoço. Os comerciantes vendem à vista e a prazo, mas em Islândia não aceitam cartão de crédito/débito, devido as condições de seu comércio. O dinheiro tem dono, porém não tem pátria, seu valor depende de sua localização ou de quem o possui. No câmbio informal de Benjamin é 1/1000, mas no câmbio de Letícia é 1/750, ou seja, o Real vale menos.

Entre Benjamin e Islândia, a concorrência é baixa. Em Letícia, porém, o atendimento é a alma do negócio, a competição entre os lojistas criou uma frase de efeito: “a la ordem”, conhecida pelos consumidores brasileiros como uma frase de boas-vindas. Os estabelecimentos comerciais de Letícia são gerenciados pelos empregados, enquanto os de Benjamin e Islândia são administrados por seus proprietários, onde o consumidor é atendido pelo dono da loja.

A enchente e a vazante do rio prejudicam os comerciantes do núcleo comercial de Benjamin (centro), pois na alagação há perda de mercadoria e o acesso às lojas torna-se mais difícil, mas fazer compras é uma oportunidade de interação social (amigos e familiares). Para os benjaminenses, ir ao comércio de Islândia e de Letícia é como ir ao shopping. Quando um benjaminense não encontra um produto de que necessita ou deseja em sua cidade, ele pega uma catraia e vai até Islândia na Calle 2 de Julio ou até Letícia na Calle 8. Os consumidores de Benjamin têm estas cidades como uma extensão do comércio de onde moram.

Assim, homens da cidade e homens da floresta constroem culturas de mercado. Entre benjaminenses, islandenses e leticianos existe uma relação de dependência de bens e serviços. Este estudo tem limitações, os recursos disponíveis (humano, tecnológico, financeiro, tempo etc.) não possibilitaram pesquisar todas as dimensões da tradição do comércio na fronteira amazônica. Por oportuno, recomendo estudos sobre os consumidores de Islândia e de Letícia. Por exemplo: Qual é a importância do comércio de Benjamin Constant para os islandenses? Qual é a importância do comércio de Tabatinga para os Leticianos?

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Abr 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2023

Histórico

  • Recebido
    23 Maio 2022
  • Aceito
    16 Jan 2023
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