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CONTROLE BACTERIOLÓGICO DA TÉCNICA DE PREPARO DA PELE DE PACIENTES SUBMETIDOS A ARTROPLASTIA DE QUADRIL DURANTE O PRÉ-TRANS E O PÓS-OPERATÓRIO

Um dos fatores de grande importância para o sucesso de qualquer procedimento cirúrgico é a profilaxia da infecção pós-operatória da ferida cirúrgica.

A assistência de enfermagem ao paciente proporciona segurança, no trabalho da equipe cirúrgica, refletindo um clima de bem estar junto ao paciente e sua família, tranquilizando-os.

A profilaxia da infecção cirúrgica está diretamente ligada ao controle da assepsia utilizada pela equipe médica e de enfermagem concomitante com os cuidados dedicados ao ambiente e equipamentos hospitalares.

Neste trabalho, consideramos apenas os fatos importantes em relação ao preparo da pele de pacientes submetidos ao ato cirúrgico.

Preparar a pele de pacientes submetidos a artroplastia de quadril, no pré, trans e pós-operatório constitui, entre outros, fator preponderante para prevenir a infecção da ferida cirúrgica, principalmente considerando o local da incisão.

A antissepsia cuidadosa da pele é fundamental na apresentação do paciente, na sala de operação, pois, do contrário todos os requintes empregados na assepsia cirúrgica do ato operatório deixam de ter valor diante de qualquer ponto da pele que poderá iniciar a infecção pós-operatória.

A utilização de antissépticos para degermação* * Degermação - Termo usado por Price (1938) para caracterizar a redução do número de microrganismo patogênicos ou não, da pele, por qualquer método. da pele exige cuidados especiais como demonstrou Price (1938)5 PRICE, P. B.; - New studies in surgical bacteriology and surgical technic with special reference to desinfection of the skin. J. Am. Med. Assoc. 111; 1993-1996, 1938a. o primeiro investigador a introduzir testes quantitativos e qualitativos para avaliar os efeitos de qualquer método de antissepsia da pele. Dunn (1938)2 DUNN, C. O.; - A comparative study of some antisepticos and germicids with special reference to alkyl-dlmenthyl-benzyl-amoniumachlorides - Amer. J. Surg., 41:268-271, 1938. demonstrou que o efeito germicida dos compostos quaternários de amônio não fica reduzida em presença de matéria orgânica contra o Staphylococcus aureus.

Miller e colaboradores (1943)4 MILLER, B. F.; ABRAMS, R.; HUBER, D. A.; KLEIN, M. - Formation of invisible, non-perceptible films on hands by catiomc Soaps. Proc. Soc. Ezp. Biol. & Med., 54:174-176, 1943. demonstraram que mãos escovadas ou submetidas à imersão em um composto quaternário de amônio a 1%, durante um a três minutos, davam culturas negativas. Os autores afirmaram ainda que os compostos quaternários de amônio formam uma película invisível, na superfície cutânea, a qual resiste a traumas mecânicos e a exposição à matéria orgânica e a breves imersões em água ou sangue, mas desintegra-se por contínuas exposições a golpes de água corrente por 15 a 30 segundos, em presença de sabões ou álcool concentrado.

Gibertoni (1972)3 GILBERTONI, J.; - Avaliação de um método de antissepsia da pele de mãos e antebraços de equipes cirúrgicas, com um composto quaternário de amônio, sem uso prévio de escova e sabão. São Paulo, 1972. (Tese de Doutoramento). e Cunha (1975)1 CUNHA, A. M. P.; - A avaliação de degermação das mãos com hexaclorofeno, composto quaternário de amônio e sabão comum. Rio de Janeiro, 1975. (Dissertação de Mestrado). demonstraram que os compostos quaternários de amônio usados como antissépticos de pele exibem ótima ação contra os microorganismos.

O desaparecimento total dos microrganismos da pele nem sempre é possível, pois, outros fatores ambientais entram em contato com a pele alterando a sua população bacteriana.

A artroplastia de quadril ou a prótese total do quadril é a substituição da cabeça femural e do acetábulo por elementos artificiais.

Vários estudiosos têm enfatizado a importância da assepsia que deve ser metodicamente seguida para poder realizar esta cirurgia.

Com bases nestas informações decidiu-se proteger a pele e a incisão cirúrgica, utilizando um antisséptico composto quaternário de amônio a 0,2% com o objetivo de reduzir ao máximo a flora bacteriana da pele corporal e avaliar periodicamente estes cuidados através de culturas laboratoriais de material colhido da pele.

MATERIAL E MÉTODO

Solução Antisséptico, usada na pele

Fórmula: Cloreto de Benzildimetil 2 (2.p.1.1.3.3. tetrametil - butil-fenoxi-etoxi) etil amônio: 0,2 g.; Propilene Glicol: 0,6 g.: Aquilaril Polietilene Glicol éter: 0,4 g. Veículo aquoso indicador q.s.p. 100 ml* * Germ-Hand-Darrow Laboratórios S. A. Divisão de Antissépticos. Marca Registrada - Rio de Janeiro. Estado do Rio de Janeiro. .

Técnica de Aplicação do Antisséptico

A solução foi aplicada com compressa cirúrgica estéril em toda extensão da pele a qual foi dividida em dez regiões. Após calçar um par de luvas estéril, cada região foi friccionada vinte e cinco vezes com uma compressa embebida de antisséptico em movimentos semelhantes a um banho. As dez regiões consideradas foram: face e pescoço, tórax (face anterior), membro superior direito, membro superior esquerdo, abdômen, tórax (face posterior), região glútea, membro inferior direito, membro inferior esquerdo e períneo.

Esta antissepsia foi realizada nas seguintes fases: 1) Internação do paciente (após tricotomia do abdomem, coxas e períneo); 2) Véspera da cirurgia (12 horas antes e após revisão da tricotomia); 3) Antes da incisão cirúrgica (na sala de operação); 4) Quarto dia de pós-operatório; 5) Oitavo dia de pós-operatório; 6) Décimo segundo dia de pós-operatório. Após a antissepsia da internação e véspera da cirurgia o paciente foi levado ao chuveiro para enxaguar-se e lavar a cabeça com o antisséptico abundantemente.

Na véspera da cirurgia, após o banho geral, o antisséptico era aplicado outra vez na pele das regiões consideradas como campo operatório (abdomem, coxa e períneo), sendo a seguir enfaixados com ataduras de crepe estéril.

Diariamente, com exceção dos dias citados, aplicava-se uma vez o antisséptico em todas as regiões, em substituição do banho tradicional.

Material para Colheita

Foram utilizadas placas Rodac* * Rodac plates 15 mm Style, 6 cm de diâmetro. Falcon plastics Division of B-D Laboratories Inc. - Los Angeles - Califórnia. Sua conformação permite que as tampas das mesmas formem um encaixe, não tocando na superfície do Agar. São recuperadas por lavagem e desinfecção química a frio (detergente, glutaraldeído 2% e álcool etílico 70%). com meios de cultura para colheita de material da pele e roupas.

Os meios de cultura colocadas nas placas foram:

1) Agar-infusão-sangue (coelho)

2) Chapman-meio seletivo para crescimento de Staphylococcus aureus.

3) Teague-meio seletivo para crescimento de bastonetes gram-negativo.

Para neutralizar o efeito bacteriostá-tico-bactericida dos resíduos do deger-mante, adicionamos aos meios de cultura: Tween 80 a 1% em todos os meios; gema de ovo a 0,5% nos meios de Teague e Agar-sangue; gema de ovo a 0,8% no meio de Chapman.

Após a colheita do material, as placas com Teague e Agar-sangue foram incubadas em estufa a 35º C por 24 horas e as placas com Chapman em estufa a 42º C por 48 horas, após este tempo foi realizada a leitura das placas contando-se o número de colônias crescidas nas superfícies dos meios.

Colhemos também, zaragatoas do nariz e garganta para cultura, nos pacientes observados.

Técnica para colheita do material

Colhemos material dos pacientes nas seguintes fases:

1) Internação do paciente (3 a 4 dias antes da cirurgia)

2) Véspera da Cirurgia (12 horas antes, paciente já preparado)

3) Quarto dia do pós-operatório.

4) Oitavo dia do pós-operatório

5) Décimo segundo dia do pós-operatório.

Nos períodos referidos, colhemos material, batendo como carimbo as placas rodac sobre os seguintes locais:

1) Pele próxima à região da ferida cirúrgica.

2) Genitais do Paciente.

3) Vestuário em contato com a pele.

Para cada local acima referido, batemos em áreas contíguas, 3 placas, uma com agar-sangue, outra com Chapman e outra com Teague.

Controle de reprodutibilidade do resultado

Para assegurar confiabilidade ao método, a rotina adotada para degermar a pele dos pacientes foi testada exaustivamente por três vezes, com repetição de todo o controle microbiológico, conseguindo-se obter sempre o mesmo resultado.

RESULTADOS

Os resultados referem-se aos primeiros 10 pacientes observados no pré e pós-operatório, durante 7 meses consecutivos, dando-lhes assistência médica e de enfermagem diariamente. Com esta observação procuramos sistematizar e padronizar a antissepsia de pele dos pacientes para evitar a infecção hospitalar.

Apresentaremos um caso como ilustração dos dados (Tabela I).

TABELA I
CONTROLE BACTERIOLÓGICO DO PACIENTE CASO Nº 8

DISCUSSÃO

Analizando a tabela demonstrada observamos que o paciente apresenta-se ao hospital para a internação com a pele contaminada com Staphylococcus não patogênico, mas com uma população bacteriana muito grande, isto é, variou de 25 colônias até número incontável de colônias crescidas nas placas.

Não encontramos bastonetes Gram-negativos na pele, consideramos este fato relacionado ao tipo de higiene que cada paciente mantém normalmente.

O períneo mostrou-se sempre com contaminação muito grande e bastante superior a da pele mais contaminada. Sempre tivemos de classificá-lo com número de colônias incontáveis para Staphylococcus, bastonetes Gram-negativo.

O períneo muito contaminado preocupou-nos bastante devido a proximidade deste com o local da incisão cirúrgica que precisa ter assepsia rigorosa.

A roupa com a qual o paciente chegou ao hospital mostrou-se bastante contaminada, não tanto quanto o períneo, mas com maior contaminação do que a pele. Aquele vestuário que apresentavam limpos, aos olhos do observador, diminuíam ligeiramente o número de colônias das placas.

Realmente, com base nestes dados tornou-se cada vez mais importante o preparo pré-opreratório dos pacientes, pois, do contrário a contaminação da ferida cirúrgica é bastante facilitada.

Esta contaminação que o paciente traz ao hospital tem que ser reduzida através de um método eficiente e por profisisonal de enfermagem para surtir efeito, do contrário o risco de contaminação da ferida cirúrgica é muito grande.

Após a degermação do paciente para a cirurgia foram avaliadas as condições bacteriológicas da pele, períneo e roupa limpa do paciente para ser enviado à sala de operação.

Uma redução bacteriana marcante assinalou os resultados obtidos.

A pele não apresentou colônias bacterianas crescidas na placa com agar-sangue, chapman e teague. O períneo apenas 18 colônias de Staphylococcus não patogênicos na placa com agar-sangue e não cresceu colônias nas placas de chapman e teague. A roupa limpa que envolveu o paciente apresentou apenas 3 colônias de Staphylococcus não patogênicos na placa com agar-sangue e não cresceu colônias nos meios de chapman e teague.

Estes resultados demonstraram excelente preparo do paciente para o ato cirúrgico como também a eficácia do método e do antisséptico empregado, contribuindo sem dúvida para a prevenção da infecção da ferida cirúrgica.

No pós-operatório preocupamo-nos em manter a flora bacteriana em baixos níveis como já tínhamos conseguido até a completa cicatrização da ferida cirúrgica.

O 4.º dia de pós-operatório também apresentou resultados muito bons como demonstrou a tabela, ou seja, ausência de colônias, na pele, nos três meios de cultura. Uma colônia de Staphylococcus apareceu no meio de agar-sangue, mas nas placas com meio de chapman e teague não houve crescimento bacteriano demonstrando ótimo preparo para períneo. A roupa apresentou no meio de agar-sangue uma colônia de Staphylococcus e três colônias de Streptococcus, enquanto que as placas com chapman e teague apresentaram uma colônia de Staphylococcus, e uma colônia de Pseu-domona respectivamente, índices baixos tratando-se de vestuário.

No 8.º dia de pós-operatório somente as placas com agar-sangue apresentaram colônias bacterianas crescidas. Na pele, três colônias de Streptococcus e uma colônia de Staphylococcus; no períneo, quatro colônias de Staphylococcus e uma colônia de bacillus; na roupa, uma colônia de bacillus. As placas com meios de cultura Chapman e Teague não apresentaram colônias bacterianas crescidas em nenhum local observado.

No 12.º dia de pós-operatório ainda estavam reduzidos os níveis de colônias bacterianas. Na pele, o meio de agar-sangue apresentou duas colônias de Staphylococcus e uma colônia de bacillus, no meio de Chapman quatro colônias de Staphylococcus, no meio de Teague não houve crescimento bacteriano. No períneo, o meio de agar-sangue apresentou dezessete colônias de Staphylococcus e cinqüenta colônias de Klebsiellas, não houve crescimento bacteriano nas placas com meios de chapman e teague. A roupa apresentou duas colônias de Staphylococcus no meio de Chapman e culturas negativas para os meios de Agar-Sangue e Teague.

Analizando a tabela como um todo verificamos que o paciente chegou ao hospital com uma contaminação muito grande e com a degermação que recebeu reduziu eficientemente a flora bacteriana.

CONCLUSÕES

1) Os pacientes apresentaram-se ao hospital, para internação bastante contaminados. Esta contaminação foi acentuada no períneo.

2) Os hábitos higiênicos cotidianos do paciente influíram para que a contaminação fosse maior ou menor dentro de altos índices.

3) É imprescindível degermar o paciente no pré-operatório e no pós-operatório até a completa cicatrização da ferida cirúrgica.

4) O método de antissepsia e o próprio antisséptico foram eficientes conforme demonstrou o estudo realizado.

  • CUNHA, A.M.P. e colaboradores - Controle bacteriológico da técnica de preparo da pele de pacientes submetidos a artroplastia de quadril durante o pré-trans e pós-operatório. Rev. Bras. Enf.; DF, 29:60-65, 1976.
  • *
    Degermação - Termo usado por Price (1938) para caracterizar a redução do número de microrganismo patogênicos ou não, da pele, por qualquer método.
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    Germ-Hand-Darrow Laboratórios S. A. Divisão de Antissépticos. Marca Registrada - Rio de Janeiro. Estado do Rio de Janeiro.
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    Rodac plates 15 mm Style, 6 cm de diâmetro. Falcon plastics Division of B-D Laboratories Inc. - Los Angeles - Califórnia. Sua conformação permite que as tampas das mesmas formem um encaixe, não tocando na superfície do Agar. São recuperadas por lavagem e desinfecção química a frio (detergente, glutaraldeído 2% e álcool etílico 70%).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

  • 1
    CUNHA, A. M. P.; - A avaliação de degermação das mãos com hexaclorofeno, composto quaternário de amônio e sabão comum. Rio de Janeiro, 1975. (Dissertação de Mestrado).
  • 2
    DUNN, C. O.; - A comparative study of some antisepticos and germicids with special reference to alkyl-dlmenthyl-benzyl-amoniumachlorides - Amer. J. Surg., 41:268-271, 1938.
  • 3
    GILBERTONI, J.; - Avaliação de um método de antissepsia da pele de mãos e antebraços de equipes cirúrgicas, com um composto quaternário de amônio, sem uso prévio de escova e sabão. São Paulo, 1972. (Tese de Doutoramento).
  • 4
    MILLER, B. F.; ABRAMS, R.; HUBER, D. A.; KLEIN, M. - Formation of invisible, non-perceptible films on hands by catiomc Soaps. Proc. Soc. Ezp. Biol. & Med., 54:174-176, 1943.
  • 5
    PRICE, P. B.; - New studies in surgical bacteriology and surgical technic with special reference to desinfection of the skin. J. Am. Med. Assoc. 111; 1993-1996, 1938a.
  • 6
    PRICE, P. B.; - The bacteriology of normal skin a new quantitative test applied to a study of the bacterial flora and the desinfectant action of mechanical cleaning. J. Infect. Dis., 63:301-318, 1938b.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 1976
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