Open-access Cultura de segurança do paciente no serviço de atenção domiciliar*

Resumo

OBJETIVO  Verificar as percepções da equipe de saúde sobre a cultura de segurança do paciente na atenção domiciliar em um município de grande porte na região Centro-Oeste do Brasil.

MÉTODO  Estudo tipo Survey, com aplicação do Questionário de Atitudes de Segurança e perfil profissional.

RESULTADOS  Dos 37 profissionais, a maioria era do sexo feminino (n=32, 86,5%), vivia com cônjuge (n=25, 67,6%), trabalhava em regime de trabalho estatutário (n=29; 78,4%) e tinha vínculo empregatício (n=23; 62,2%). Verificaram-se maior escore mediano para satisfação no trabalho (80,0) e menor para percepção da gerência (31,8). Houve uma correlação negativa entre a carga horária semanal e o trabalho em equipe (p=0,02). O clima de segurança foi significativamente maior entre profissionais celetistas nos domínios clima de segurança (p=0,001) e global (p=0,005). Os médicos apresentaram maior percepção do clima no domínio segurança quando comparados aos profissionais de outras categorias (p=0,005). A idade foi positivamente associada ao clima nos domínios de segurança (p=0,002), condições de trabalho (p=0,03) e global (p=0,04).

CONCLUSÃO   O trabalho em equipe e a satisfação no trabalho foram pontuados como positivos e as ações gerenciais, consideradas as principais fragilidades da cultura de segurança.

Descritores: Segurança do Paciente; Serviços de Assistência Domiciliar; Cultura Organizacional; Gestão da Segurança; Qualidade da Assistência à Saúde

Abstract

OBJECTIVE   Verify perceptions of the health team about patient safety culture in home care in a large city in Brazilian Midwest region.

METHOD   A survey study involving Safety Attitudes Questionnaire and professional profile inventory. Results: From the 37 professionals, most were female (n = 32, 86.5%), lived with their spouse (n = 25, 67.6%), worked in a statutory work regime (n = 29; 78.4%) and have only one job (n = 23; 62.2%). A higher median score for job satisfaction (80.0) and a lower score for management perception (31.8) were found. There was a negative correlation between weekly workload and teamwork (p = 0.02). Safety climate was significantly higher among consolidated (Consolidação das Leis do Trabalho - CLT) professionals in the safety climate (p = 0.001) and overall (p = 0.005) domains. Physicians had a higher perception of the safety climate domain when compared to professionals in other categories (p = 0.005). Age was positively associated to the climate in the safety (p = 0.002), working conditions (p = 0.03) and overall (p = 0.04) domains.

CONCLUSION  Teamwork and job satisfaction were scored as positive and management actions were considered the main weakness of the safety culture.

Descriptors: Patient Safety; Home Care Services; Organizational Culture; Safety Management; Quality of Health Care

Resumen

OBJETIVO  Verificar las percepciones del equipo de salud sobre la cultura de seguridad del paciente en la atención domiciliar en un municipio de grande porte en la región Centro-Oeste del Brasil.

MÉTODO  Estudio tipo Survey, con aplicación del Cuestionario de Actitudes de Seguridad y perfil profesional.

RESULTADOS  De los 37 profesionales, la mayoría era del sexo femenino (n=32, 86,5%), vivía con su cónyuge (n=25, 67,6%), laboraba en régimen de trabajo supeditado al código de los funcionarios públicos (n=29; 78,4%) y tenía vínculo laboral (n=23; 62,2%). Se han verificado mayor puntaje mediano para satisfacción en el trabajo (80,0) y menor para percepción de la gerencia (31,8). Hubo una correlación negativa entre la carga horaria semanal y el trabajo en equipo (p=0,02). El clima de seguridad fue significativamente mayor entre profesionales supeditados a la Consolidación de Leyes Laborales en los dominios: clima de seguridad (p=0,001) y global (p=0,005). Los médicos presentaron mayor percepción del clima en el dominio seguridad cuando comparados a los profesionales de otras categorías (p=0,005). La edad fue positivamente asociada al clima en los dominios de seguridad (p=0,002), condiciones de trabajo (p=0,03) y global (p=0,04).

CONCLUSIÓN  El trabajo en equipo y la satisfacción en el trabajo fueron puntuados como positivos y las acciones gerenciales, consideradas las principales fragilidades de la cultura de seguridad.

Descriptores: Seguridad del Paciente; Servicios de Atención de la Salud a Domicilio Cultura Organizacional; Servicios de Atención de la Salud a Domicilio; Administración de la Seguridad; Calidad de la Atención de Salud

INTRODUÇÃO

A cultura de uma organização consiste no compartilhamento de normas, valores, padrões de comportamento, rituais e tradições de seus funcionários1. Especificamente, a cultura de segurança refere-se ao valor que uma organização atribui à segurança e à saúde de sua força de trabalho por meio de suas políticas, procedimentos e práticas, bem como do compromisso em fornecer os recursos necessários para tratar adequadamente as preocupações de segurança2-3. A cultura de segurança nos serviços de saúde reconhece a inevitabilidade do erro e a incorporação de um sistema não punitivo para o relato e a análi se de eventos adversos, substituindo a culpa e a punição pela oportunidade de aprender com as falhas e melhorar a atenção à saúde4. Ainda, nos ambientes assistenciais, a cultura de segurança do paciente está associada à redução do risco de incidentes1,5-6.

A avaliação da cultura de segurança do paciente é o primeiro passo para a sua implantação7, no sentido da melhoria da assistência6) e do subsídio da gestão do serviço por meio de seu monitoramento, influenciando, assim, mudanças organizacionais3. Inicialmente, tal avaliação ocorria apenas no ambiente hospitalar1,8-9, mas, nos últimos anos, tem sido crescente sua utilização em instituições de longa permanência8,10, casas de idosos9, atenção primária1, por se entender que os riscos estão presentes em todas as esferas de assistência à saúde11.

No âmbito da atenção domiciliar, nota-se escassez de estudos que abordem a cultura de segurança do paciente. Apenas um estudo, de abordagem qualitativa, foi encontrado em bases de dados nacionais e internacionais12.

Em franca expansão em todo o mundo, inclusive no Brasil13-14, a atenção domiciliar insere-se em um contexto complexo, uma vez que os pacientes atendidos nesse ambiente tendem a apresentar idade mais avançada, maior número de comorbidades e incapacidades e diversas prescrições médicas, o que fragmenta o cuidado. Ainda, tal contexto de cuidado requer o uso crescente de tecnologias até então de uso hospitalar, o que está associado a um maior risco de erros e eventos adversos11,13,15.

Nesta perspectiva, a seguinte questão norteadora foi proposta: Qual é a cultura de segurança do paciente na atenção domiciliar na perspectiva da equipe de saúde? O objetivo deste estudo foi verificar as percepções da equipe de saúde sobre a cultura de segurança do paciente na atenção domiciliar em um município de grande porte na região Centro-Oeste do Brasil.

MÉTODO

Tipo de estudo

Estudo descritivo, transversal, tipo Survey.

Cenário

Desenvolvido no Serviço de Atenção Domiciliar (SAD), o qual atende usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) de um município de grande porte do Centro-Oeste do Brasil.

O município foi habilitado no Programa Melhor em Casa, do Ministério da Saúde, em 2012, e presta assistência aos pacientes que necessitam de cuidado multiprofissional, prezando a racionalidade de recursos e a desospitalização16.

População

A população engloba um grupo multiprofissional de 38 profissionais de saúde, selecionados a partir dos seguintes critérios de inclusão: profissionais de saúde de ambos os sexos que atuam no SAD do município em questão, com tempo de atuação no serviço há pelo menos 6 meses. Foram excluídos: profissionais afastados do trabalho por motivos de férias, licença, tratamento de saúde, afastamento do serviço ou recusa em participar. Dos 38 profissionais elegíveis, apenas um se recusou a participar. Assim, a amostra foi composta de 37 profissionais que atuam no SAD sob a gestão da Secretaria Municipal de Saúde do município estudado.

Coleta de dados

A coleta de dados foi realizada no período de 1º de dezembro de 2017 a 31 de março de 2018, nas dependências da unidade de lotação dos profissionais do SAD, sendo previamente agendada com os participantes, sem causar prejuízo ao atendimento. Os participantes foram orientados a responder à ficha de avaliação autoaplicável, a qual continha o perfil do profissional de saúde (idade, estado civil, tipo de vínculo de trabalho, carga horária de trabalho e treinamento no trabalho) e ao Safety Attitudes Questionnaire (SAQ), e, no caso de apresentarem alguma dúvida, poderiam consultar a pesquisadora.

O instrumento SAQ é amplamente utilizado1,3,5) e foi escolhido por apresentar boas propriedades psicométricas e ser validado e adaptado culturalmente para a realidade brasileira. O SAQ é composto de questões envolvendo a percepção sobre a segurança do paciente e de dados do profissional (cargo exercido, gênero e tempo de atuação). Esse instrumento mensura a percepção dos profissionais de saúde por meio de seis domínios: Clima de Trabalho em Equipe: itens 1 a 6; Clima de Segurança: itens 7 a 13; Satisfação no Trabalho: itens 15 a 19; Percepção do Estresse: itens 20 a 23; Percepção da Gerência: itens 24 a 29; Condições de Trabalho: itens 30 a 33. Os itens 14 e 34 a 36 não fazem parte de nenhum domínio, sendo analisados isoladamente17.

A resposta de cada questão segue a escala de cinco pontos de Likert. O escore final do instrumento varia de zero a 100, em que zero corresponde à pior percepção de atitudes de segurança pelos profissionais de saúde e 100, à melhor percepção. São considerados positivos valores totais do escore iguais ou superiores a 75 pontos17.

Análise e tratamento dos dados

Os dados foram analisados no software Stata, versão 14.0 (StataCorp, 2015). Foi utilizada estatística descritiva para descrever as variáveis numéricas e nominais. Valores de p<0,05 foram considerados estatisticamente significativos. Para a análise de consistência interna, foi utilizado o coeficiente de alfa de Cronbach, com valores > 0,7 representando boa confiabilidade18.

Para verificar a associação entre as variáveis demográficas e laborais e os domínios do SAQ, foi realizada a análise bivariada, a qual foi confirmada com a análise múltipla. A correlação de Pearson testou a relação entre os escores do clima e as variáveis numéricas. O teste t de Student ou Análise de Variância (ANOVA) para amostras independentes verificaram as diferenças entre médias dos escores das variáveis nominais.

A análise de regressão linear examinou os fatores associados aos escores dos domínios do SAQ, e foram incluídas nos modelos de regressão variáveis com p-valor < 0,05 na análise bivariada de sexo e idade para ajuste dos modelos.

Aspectos éticos

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Goiás, sob o Parecer n. 2.334.607, de outubro de 2017. Atendeu os requisitos da Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, que trata de pesquisas com seres humanos.

RESULTADOS

Um total de 37 questionários, compreendendo 97,4% da população do estudo, foram respondidos. As características sociodemográficas evidenciaram uma média de idade dos profissionais de 38,92 anos (DP=9,89), variando de 25 a 65 anos; cinco (13,5%) eram do sexo masculino e 32 (86,5%) do feminino. Quanto ao estado civil, 25 participantes (67,6%) viviam com o cônjuge e 12 (32,4%) não o tinham.

Sobre o perfil profissional, nove (24,3%) eram técnicos em enfermagem, oito (21,6%), médicos, seis (16,2%), enfermeiros, cinco, fisioterapeutas (13,5%), quatro (10,8%), assistentes sociais, dois (5,4%), fonoaudiólogos, dois (5,4%), nutricionistas, e um, psicólogo (2,7%). O regime de trabalho da maioria dos profissionais era estatutário (n=29; 78,4%); apenas oito eram contratados (21,6%), sendo que 23 (62,2%) possuíam apenas um vínculo empregatício e os demais (n=14; 37,8%), dois empregos. Quanto ao tempo de trabalho na especialidade, observou-se que 14 (37,9%) profissionais atuavam em sua respectiva área havia menos de 5 anos, 12 (32,4%), de 5 a 10 anos e 11 (29,7%), por mais de 10 anos. A carga horária média semanal de trabalho foi de 44,9 horas (DP=11,2), variando de 30 a 70 horas. Nenhum profissional do estudo teve treinamento sobre segurança do paciente e assistência segura.

A Tabela 1 detalha as frequências das questões do SAQ, por itens da escala, com maiores percentuais de satisfação nas questões do domínio satisfação no trabalho (exemplo: 91,9% [n=34] afirmaram gostar de seu trabalho) e menores percentuais na percepção da gerência (exemplo: 13,5% [n=5] responderam que a administração está fazendo um bom trabalho).

Tabela 1
Distribuição dos números absolutos e percentuais das questões do SAQ, por domínio - Brasil, 2018.

Na Tabela 2, verificou-se maior escore mediano para satisfação no trabalho (80,0), e menor para percepção da gerência (31,8). Em relação aos valores de alfa de Cronbach, os seguintes domínios apresentaram boa confiabilidade: satisfação no trabalho (0,88); global (0,80), percepção da gerência unidade/SMS (0,79) e percepção do estresse (0,71).

Tabela 2
Análise do escore do SAQ, por domínio - Brasil, 2018.

A comparação entre os domínios de clima de segurança e as variáveis investigadas (sexo, regime de trabalho, vínculos e cargo) demonstrou diferença estatisticamente significativa entre: clima de segurança e regime de trabalho (p=0,001); clima de segurança e cargo (p=0,005); domínio global e regime de trabalho (p=0,05). O clima de segurança foi significativamente maior entre profissionais celetistas nos domínios clima de segurança e global. Os médicos apresentaram maior percepção do clima no domínio segurança quando comparados aos profissionais de outras categorias (Tabela 3).

Tabela 3
Análise bivariada dos fatores associados ao clima para os domínios - Brasil, 2018.

A Tabela 4 demonstra a correlação entre os domínios clima de segurança e idade, carga horária semanal e tempo na especialidade. Uma correlação negativa foi observada entre a carga horária semanal e o domínio trabalho em equipe (p=0,02).

Tabela 4
Correlação entre os domínios de clima de segurança e as variáveis quantitativas - Brasil, 2018.

A Tabela 5 apresenta a análise de regressão linear dos fatores associados aos domínios do clima de segurança obtidos nos modelos de regressão. Foram incluídas nos respectivos modelos dos domínios as variáveis com p-valor < 0,20 na análise bivariada e as variáveis sexo e idade para ajuste.

A carga horária semanal foi associada ao clima de trabalho em equipe (p=0,025). A idade foi positivamente associada ao clima de segurança (p=0,002), condições de trabalho (p=0,03) e global (p=0,04). O regime de trabalho demonstrou associação estatisticamente significativa com o clima de segurança (p<0,001) e o domínio global (p=0,004). O cargo foi positivamente associado ao domínio global (p=0,007). A idade e o sexo não demonstraram associação estatisticamente significativa com o domínio satisfação no trabalho (p=0,64; p=0,18, respectivamente), percepção do estresse (p=0,67; p=0,56, respectivamente) e percepção da gerência (p=0,62; p=0,92, respectivamente). O cargo e o regime de trabalho também não apresentaram associação estatisticamente significativa com a percepção da gerência (p=0,30 para equipe médica e outras; p=0,09, respectivamente).

Tabela 5
Fatores associados ao clima de segurança - Brasil, 2018.

DISCUSSÃO

A confiabilidade interna do instrumento demonstrou que os domínios satisfação no trabalho, percepção do estresse, percepção da gerência e domínio global apresentaram valores de alfa de Cronbach superiores a 0,7018, confirmando a robustez para medir a cultura de segurança na atenção domiciliar.

Conhecer a opinião dos profissionais de saúde é essencial para perceber as questões relacionadas à perda de segurança dos pacientes, pois estes estão diretamente ligados à gestão do cuidado6. A participação de 65% a 85% da população é considerada adequada para se avaliar a cultura de segurança19. Portanto, os valores apresentados nesta pesquisa expressam as percepções e atitudes sobre a cultura de segurança do paciente no serviço avaliado.

No que tange ao perfil sociodemográfico dos profissionais, a feminização entre os profissionais de saúde é confirmada como uma tendência crescente20-21. A categoria da enfermagem é predominante dentre os respondentes por ser a maioria dos profissionais nas instituições de saúde, como preconizado na normativa da atenção domiciliar SUS16.

Os resultados obtidos neste estudo apontaram que os domínios trabalho em equipe e percepção do estresse foram considerados positivos para as atitudes de segurança do paciente. No domínio trabalho em equipe, constatou-se que houve uma grande porcentagem de respondentes que afirmaram ser difícil falar abertamente quando se percebe um problema na assistência ao paciente. Existe a necessidade de melhorar a discussão entre os membros da equipe e de abertura para a discussão de erros3,22.

Estudos examinaram as barreiras que o profissional encontra quando percebe problemas relacionados ao cuidado do paciente. As dinâmicas de poder, os sentimentos de resignação, as experiências anteriores negativas ou a ineficácia de episódios relatados, o medo de prejudicar relacionamentos com colegas ou superiores e a falta de segurança psicológica foram identificados como as principais razões para a dificuldade de expressão do profissional. Conclui-se que o “clima organizacional” é um motivador explícito para o silêncio do profissional sobre questões de segurança e, por isso, são fundamentais o encorajamento, o reforço e o desenvolvimento da capacidade da equipe de ouvir e responder adequadamente às preocupações expressas22-23.

O clima de segurança referente à gerência do serviço demonstrou a pior média dos domínios. Menciona-se a estratégia de adotar uma abordagem proativa e transparente no tratamento de questões de segurança, para que os profissionais de saúde vejam que suas opiniões são valorizadas e seguidas sem a ameaça de retaliação23. Outra indicação é a necessidade de desenvolver um clima forte de segurança ou compartilhar percepções dos funcionários de que a segurança é recompensada, apoiada, valorizada e priorizada em relação a outras metas organizacionais24.

O modelo de cultura de segurança mais adequado para o cenário da saúde é de uma cultura justa, que reconheça a assistência à saúde como um empreendimento complexo e de alto risco; uma cultura de relato, em que as pessoas sejam encorajadas a falar sobre os erros; e uma cultura de aprendizagem, na qual todos estejam dispostos a aprender com os erros cometidos, fazendo alterações sistemáticas para evitar a sua recorrência1,3. Uma boa percepção do estresse é um componente importante para a melhoria da segurança do paciente5,25, assim como das condições de trabalho, com programas de treinamento para novos funcionários e contratação de pessoal suficiente26.

As menores pontuações no domínio percepção da gerência sugerem baixa aprovação das ações da gerência quanto às questões de segurança, corroborando outros estudos25,27.

Um estudo britânico revelou que o trabalho em equipe e as percepções positivas dos profissionais em relação aos gestores foram associados a ganhos significativos na segurança do paciente por meio da diminuição de complicações e mortalidade7. Os líderes devem desempenhar um papel fundamental no suporte a um sistema de aprendizado robusto, servir de guardiões do sistema de aprendizado, aplicar os conceitos de melhoria e confiabilidade e encorajar a transparência em todos os níveis da organização2, além de proporcionar um ambiente laboral de qualidade para os trabalhadores5.

Estudo baseado em dados hospitalares sugere que, para alcançar ganhos em resultados de qualidade e segurança, a gerência deve ter foco na implementação de iniciativas combinadas para a melhoria da qualidade contínua e do clima de segurança28. Conhecer as relações entre as dimensões do SAQ e como cada dimensão interage com as outras é essencial para a gestão ter parâmetros na decisão e avaliar a relação causa-efeito29. Logo, o trabalho em equipe e a gestão como apoio à segurança do paciente são duas dimensões críticas para melhorar a cultura de segurança, pois têm impactos diretos em todas as outras dimensões, exceto no reconhecimento do estresse5,29.

O presente estudo também possibilitou compreender a relação en tre os domínios do SAQ e as variáveis idade, tempo de forma ção, tempo de experiência na especialidade e tipo de vínculo de trabalho.

A idade mais avançada está associada a escores significativamente aumentados para o clima de segurança e condições de trabalho, o que pode ser explicado por um apego maior ao trabalho e sensação de confiança entre os mais velhos. Outra possível explicação seria a melhor percepção de fatores que prejudicam a segurança do paciente entre os mais jovens, em decorrência de uma formação acadêmica mais recente e focada na temática da segurança do paciente8. Esse achado é demonstrado entre profissionais de saúde da atenção primária na Holanda1.

Melhor percepção do clima de segurança do trabalho foi observada entre os profissionais médicos, que coincidentemente são os que possuem o contrato temporário como vínculo de trabalho. Essa melhor percepção pode ser explicada pelo fato de o vínculo precário e a falta de estabilidade tender a respostas mais positivas devido ao medo de retaliação25. Acredita-se, no entanto, que essa não seja a razão principal de tal percepção, e atribui-se o resultado à formação profissional do médico, mais voltada à cultura de segurança devido à invasividade dos procedimentos que realiza.

Os resultados demonstraram que, quanto maior a carga horária de trabalho, pior a percepção do clima de segurança, o que é preocupante por ser a carga horária associada com maior risco de erros na assistência6. Entende-se que os danos causados ​​por indignidades e iniquidades nos serviços de saúde são tão evitáveis ​​e tão inaceitáveis ​​quanto cirurgias incorretas e erros de medicação. Garantir a segurança do paciente é assegurar o direito de todos a uma experiência de assistência gratuita, que inclui ser tratado de forma equitativa e com dignidade2.

As peculiaridades da atenção domiciliar, com a presença da figura do cuidador e familiares que compartilham com a equipe os cuidados do paciente e o ambiente diferenciado do hospitalar, exigem uma cultura de segurança por parte dos profissionais de saúde, os quais devem apoiar, estimular e treinar os cuidadores, sendo necessária uma reflexão entre autonomia e segurança11.

O tamanho pequeno da amostra constituiu a principal limitação do estudo, associada à avaliação de um único serviço, o que limita a generalização dos resultados para outros serviços. A escassez de estudos no âmbito da atenção domiciliar torna as comparações restritas pelas diferenças no ambiente de trabalho, nível de serviço e questões relacionadas à segurança.

Nesse sentido, ressaltamos a importância dos achados nesse ambiente de trabalho. Estudos futuros devem focar a comparação do SAQ em outros serviços de atenção domiciliar, especialmente estudos longitudinais e correlacionar os resultados dos comportamentos e atitudes de segurança e a magnitude dos incidentes na assistência. Sugere-se também a inclusão da percepção dos outros atores envolvidos, ou seja, a gestão e os serviços de apoio. Do ponto de vista assistencial e gerencial, os resultados do presente estudo podem auxiliar na implementação de estratégias para a consolidação de uma cultura de segurança no serviço.

CONCLUSÃO

O trabalho em equipe e a satisfação no trabalho foram pontuados como positivos; as ações gerenciais são consideradas as principais fragilidades da cultura do paciente, representando um sinal de alerta que necessita ser trabalhado no serviço.

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  • *
    Extraído da dissertação: “Avaliação da cultura de segurança do paciente na atenção domiciliar na perspectiva da equipe de saúde”, Programa de Mestrado Profissional em Saúde Coletiva, Universidade Federal de Goiás, 2018.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Set 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    10 Set 2018
  • Aceito
    24 Set 2019
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