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A QUESTÃO COLONIAL DURANTE A CONJUNTURA CRÍTICA DO MUNDO LUSOBRASILEIRO NO INÍCIO DO SÉCULO XVIII1 1 Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e a bibliografia utilizadas são referenciadas. Vários colegas contribuíram com críticas e sugestões, porém, na impossibilidade de citar todos, gostaria de agradecer em especial ao professor Thiago Nascimento Krause. Também gostaria de agradecer àqueles que contribuíram no processo de preparação dos originais: Natalia Tammone, Gilberto dos Santos, Guilherme da Rocha Freitas e Neusa Monteferrante.

THE COLONIAL ISSUE DURING THE CRITICAL CONJUNCTURE OF THE LUSO-BRAZILIAN WORLD AT THE BEGINNING OF THE 18TH CENTURY

Resumo

O início do século XVIII é marcado por tensões e ameaças internas e externas para Portugal, tanto na metrópole como nas áreas coloniais, momento da chamada conjuntura crítica do mundo luso-brasileiro. Nesse contexto se desenvolveram reflexões a respeito das dinâmicas do império e das propostas de enfrentamento das dificuldades, resultando em uma série de debates. O presente artigo busca acompanhar as propostas e as discussões da época, de modo a identificar as ideias presentes e a reflexão sobre a questão colonial produzidas por agentes da administração régia dos dois lados do oceano Atlântico e ainda por agentes mercantis, que, partindo da ideia de que a crescente riqueza do Brasil poderia trazer riscos aos interesses do Reino, desenvolveram a compreensão de que tais riquezas deveriam ser revertidas em favor de Portugal e em benefício dos vassalos do Reino.

Palavras-chave
Brasil colonial; sistema colonial; exclusivo metropolitano; administração colonial; economia colonial

Abstract

The beginning of the 18th century is marked by internal and external threats and tensions to Portugal, both in the metropolis and in the colonial areas, a moment of the so-called critical conjuncture of the Luso-Brazilian world. In this context, reflections were developed regarding the dynamics of the empire and proposals for facing difficulties, resulting in a series of debates. This article intend to follow the proposals and discussions of the time, in order to identify the ideas and discussions on the colonial issue produced by agents of the royal administration on both sides of the ocean and also by mercantile agents, who, starting from the idea that Brazil’s growing wealth could bring risks to Portugal’s interests, developed the understanding that such riches should benefit Portugal and his vassals in the Kingdom.

Keywords
colonial Brazil; colonial system; metropolitan exclusive; colonial administration; colonial economy

Em 17 de julho de 1709, o Conselho Ultramarino remetia ao Rei de Portugal, D. João V, uma importante consulta, especialmente longa, sobre “os papéis que se oferecem de arbítrios acerca das minas para com eles se segurarem os interesses da Fazenda Real e se pôr em melhor formar o governo daquelas terras”3 3 “Sobre os papéis que se ofereceram de arbítrios acerca das minas para com eles se segurarem os interesses da Fazenda real e se pôr em melhor forma o governo daquelas terras”, de 17 de julho de 1709. AHU-MG, Cx. 1, Doc. 13. Publicada com pequenas alterações em BN. Documentos Históricos, 1951, v. 93, p. 219. . As propostas apresentadas ao Monarca procuravam dar conta da organização do governo nas áreas mineradoras, já afetadas pelo conflito entre paulistas e reinóis, no episódio posteriormente conhecido como Guerra dos Emboabas4 4 Sobre o tema, ver Adriana Romeiro (2008) e, numa perspectiva mais alargada, Laura de Mello e Souza (1986). .

A Guerra dos Emboabas, contudo, seria apenas o início do período mais dramático da “conjuntura crítica no mundo luso-brasileiro de inícios do século XVIII”, como bem apontou Laura de Mello e Souza (2006)SOUZA, Laura de Mello e. >A conjuntura crítica no mundo luso-brasileiro de inícios do século XVIII. In: . sol e a sombra: política e administração na América portuguesa do século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., momento em que as ameaças internas e externas se combinaram como nunca. Na fase final da guerra da Sucessão Espanhola5 5 A Guerra da Sucessão Espanhola, incluindo as negociações diplomáticas anteriores e posteriores, que redundaram na Paz de Utrecht, tem vasta bibliografia. Indicamos aqui apenas o livro de José Luis Cardoso (2003), que aborda vários aspectos do envolvimento de Portugal no Conflito. Para uma visão de conjunto, veja-se Joaquim Albareda Salvadó (2014). , os motins e as revoltas iam se sucedendo por todas as partes do Brasil, e os franceses, depois de um ataque fracassado em 1710, conquistaram o Rio de Janeiro no ano seguinte. Tal situação provocou enorme apreensão entre os conselheiros ultramarinos. Era, na feliz expressão de Luciano de Figueiredo (2001)FIGUEIREDO, Luciano. O Império em apuros: notas para o estudo das alterações ultramarinas e das práticas políticas no império colonial português, séculos XVII e XVIII. In: FURTADO, Júnia (org.). Diálogos oceânicos: Minas Gerais e as novas abordagens para uma história do império ultramarino português. >Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001, >p. 197-254., o “Império em apuros”6 6 Ambos os textos têm o grande mérito de tentar pensar as revoltas do período em conjunto, abrindo novas perspectivas de análise. .

Em tal contexto de tensão, os pareceres do Conselho Ultramarino são uma importante fonte para entendermos a compreensão dos agentes históricos sobre a dinâmica colonial, e, nessa perspectiva, as fontes consultadas têm sido aproveitadas em diversos trabalhos historiográficos. Ao fim e ao cabo, seria nesses momentos de crise ou de tensão que a análise crítica da conjuntura permitiria a observadores bem situados ampliar a compreensão da realidade, superando a fragmentação dos vários eventos e avançando para uma visão de conjunto superior.

Nesse sentido, para Laura de Mello e Souza (2006, p. 102)SOUZA, Laura de Mello e. >A conjuntura crítica no mundo luso-brasileiro de inícios do século XVIII. In: . sol e a sombra: política e administração na América portuguesa do século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., aproveitando-se da referida citação de Luciano Figueiredo, o Conselho Ultramarino “guiado pelo pragmatismo (...), valeu-se com proveito das contestações ultramarinas: “o império proporcionava um verdadeiro aprendizado’ e nas primeiras décadas do século XVIII os vassalos começaram a ser temidos”. Ainda nas palavras da autora, “da sedição surgia a unidade” da América Portuguesa, pelo menos para os olhos dos agentes metropolitanos. Além disso, também nesse contexto, segundo Evaldo Cabral de Mello (2002, p. 36)MELLO, Evaldo Cabral de. Um imenso Portugal: história e historiografia. São Paulo, SP Brasil: Editora 34, 2002., “agora tratava-se de instrumentalizar as colônias para reforçar a posição europeia de Portugal”, diante do embate das grandes potências.

Nessa perspectiva de análise da produção do Conselho Ultramarino nas primeiras décadas do século XVIII, sobreleva-se a figura do conselheiro Antonio Rodrigues da Costa, com seus inúmeros pareceres e, especialmente, na famosa “consulta-testamento” de 17327 7 “Do Conselho Ultramarino a S. M., no ano de 1732, feita pelo conselheiro Antonio Rodrigues da Costa”. Revista do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, 3. ed., Rio de Janeiro, 1931[1845], T. VII, p. 475. . Jaime Cortesão (1952, p. 193)CORTESÃO, Jaime. Alexandre de Gusmão e o Tratado de Madrid. Rio de Janeiro: Instituto Rio Branco, 1952. 9 v. avaliava-o “como o mais lúcido e eficaz” entre os membros do Conselho. Evaldo Cabral de Mello (1995, p. 316)MELLO, Evaldo Cabral de. A fronda dos mazombos: nobres contra mascates, Pernambuco, 1666-1715. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. opinava que ele “era tido então pelos seus pares como o principal perito em questões brasileiras” e teria influência só inferior à que tivera Salvador Correia de Sá no Conselho no século XVII. Laura de Mello e Souza e Luciano Figueiredo, nos trabalhos citados, analisam suas ideias largamente8 8 Registro ainda, entre outras, a obra de Miguel Dantas da Cruz (2015), na qual também se destaca a figura de Antonio Rodrigues da Costa, sendo, ao mesmo tempo, uma referência para a própria história do Conselho Ultramarino. .

Isso posto, podemos retornar à consulta do Conselho Ultramarino de 1709, já citada acima. Convém, contudo, lembrar que, na altura, Antonio Rodrigues da Costa era um recém-chegado ao Conselho9 9 Dessa época, veja-se, por exemplo, o parecer de sua autoria sobre as alianças preliminares à Guerra da Sucessão Espanhola. “Parecer de Antonio Rodrigues da Costa, oficial-maior da Secretária de Estado, ano de 1701”. BA, Cód. 51 – VI – 34, fl. 95. , ainda que tivesse já uma larga experiência política, tendo sido oficial-maior na Secretaria de Estado desde 168410 10 Recebeu o “lugar de conselheiro ultramarino de capa e espada” em 1707, mas só assumiu o posto em 15 de fevereiro de 1709, quando de seu retorno da embaixada à Áustria. Cf. Registro Geral de Mercês, D. João V. ANTT, L. 1, fl. 250. e participado como secretário de duas embaixadas, uma junto ao Príncipe Filipe Guilherme, Conde Palatino do Reno em 1686 e outra junto ao Imperador do Sacro Império em 1707, ambas, curiosamente, destinadas à realização dos matrimônios dos reis D. Pedro II e D. João V, entre outros cargos11 11 A melhor biografia de Antonio Rodrigues da Costa nos é dada por Diogo Barbosa Machado (1965 [1741]). Veja-se também o relato de Antonio Rodrigues da Costa sobre a primeira missão: Embaixada que fez o excelentíssimo Senhor Conde de Villar-Maior… Lisboa: Miguel Manescal, 1694. .

Era, portanto, com o voto de Antonio Rodrigues da Costa, por ser o conselheiro mais “moderno”, que começava a consulta12 12 Veja-se o regimento do Conselho, publicado por Marcelo Caetano (1969, p. 65). Na listagem dos conselheiros, apresentada na obra, a data do ingresso, 5 de janeiro de 1707, é a que corresponde à nomeação e não ao exercício efetivo do posto. . Em seu longo parecer, quase metade da consulta, sintetizava inicialmente a questão em três partes: a defesa do Rio de Janeiro, o governo político das “minas do ouro” e o problema da arrecadação dos quintos.

Quanto à primeira parte, Antonio Rodrigues da Costa, ponderava que as minas eram estimadas na Europa, “não sem justo fundamento, pelas mais ricas, que nunca se viram e certamente hão de despertar a inveja e ambição das suas nações”; e, dado que algumas dessas são, “com grande excesso, mais poderosas no mar que esta Coroa”, não tem o Rio de Janeiro as forças “que bastem para sua defesa”, propondo então uma série de medidas que não seriam suficientes, contudo, para impedir a conquista do Rio de Janeiro pelos franceses em 1711, em plena guerra da Sucessão Espanhola, concretizando assim a sua própria previsão13 13 “Sobre os papéis que se ofereceram de arbítrios acerca das minas para com eles se segurarem os interesses da Fazenda real e se pôr em melhor forma o governo daquelas terras”, de 17 de julho de 1709. BN, Documentos Históricos, 1951, v. 93, p. 219. .

Com relação à segunda parte, ponderava o conselheiro que o “bom governo político” da grande quantidade de gente que tinha ido para as minas era “o último fim de todas as repúblicas e a principal obrigação dos príncipes, sendo essa a causa final para que foram constituídos por Deus e pelos povos”. Tal gente que vivia na região das minas, porém, era “governada somente pela insociável cobiça do ouro”, e dessa “multidão de gente confusa, sem lei, sem ordem, sem obediência, sem temor dos magistrados, sem receio do castigo e sem esperança de prêmio”, não poderia esperar o Rei tirar dela tributo ou conveniência alguma, mas antes desobediências e desatinos”.

Cabia, portanto, ao monarca remediar tal situação, evitando dessa forma “a indignação divina, que em nenhuma coisa é tão pronta e evidente como nas faltas de justiça, pelas quais promete Deus destruir os reinos e monarquias”. Para “remediar esta grande desordem e reduzir aquela gente a governo cristão e político”, apresenta a proposta do envio de três pessoas para execução dessa tarefa: um eclesiástico, um militar e um desembargador. Ponderava ainda que todas fossem de um “desinteresse e limpeza muito provada”, pois a tentação seria enorme, afinal “são poucos os homens que podem resistir à ambição do ouro”. Assim, “posta em ordem a confusão daquela gente com o estabelecimento do governo, cristão e político”, poderia o governo organizar a arrecadação dos quintos do ouro, a terceira parte, para a qual faz uma série de propostas14 14 Ibid., p. 221-222. .

A ideia da junção entre as ameaças externas e internas, tão cara a Antonio Rodrigues da Costa, apareceria novamente, agora assumida pelo próprio Conselho em consulta sobre carta do governador-geral do Estado do Brasil de 1712. Nela o Conselho Ultramarino ponderava sobre a necessidade de uma devassa sobre a entrega do Rio de Janeiro aos franceses, pois, com a demora “que tem havido nesta matéria, se vão aumentando as perturbações e inobediências naqueles povos cada dia mais”, expondo-se ao “perigo” daquele Estado “se perder, não só externamente com a invasão dos inimigos exteriores, mas internamente com as sedições e tumultos daqueles vassalos”15 15 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 9 de dezembro de 1712. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 87. .

As revoltas e os motins, porém, espalhavam-se, provocando certa perplexidade no Conselho Ultramarino, que em suas reuniões procura compreender as causas do alastramento da insubordinação dos povos. Avaliando a situação, o conselheiro José Carvalho e Abreu, em consulta sobre a revolta ocorrida em Salvador contra os novos tributos em 1711, sentenciava “os moradores do Brasil vão introduzindo por moda o tumultuar e fazer do próprio delito merecimento, constrangendo aos governadores a que lhes deem perdão”; e dessa forma “se vai difundido... este pernicioso exemplo”, que até os moradores de Camamu, na Bahia, “tumultuaram e obrigaram” o governador a “conceder-lhes o mesmo indulto”. Em Pernambuco, explicava: “se fomentava o terceiro levantamento como pretexto de se conseguir com ele o perdão do segundo” e concluía: “se essa ousadia não se castigar ficará sendo precário o governo daquele estado e à cortesia dos seus moradores executarem ou não as resoluções que Vossa Majestade for servido tomar” 16 16 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 27 de março de 1713. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 41; as citações estão na página 51. .

Ainda na mesma consulta, o procurador da Coroa avançava em uma análise sobre o perdão concedido às várias revoltas. Na opinião desse ministro, como “viram os moradores da Bahia que os levantamentos das Minas, os dois de Pernambuco e de Sergipe de El-Rei e do Rio de São Francisco” não foram castigados, nem mesmo suas lideranças, mas perdoados, eles teriam se animado “a fazer outro [levantamento] que ao seu parecer ofendera mais a Vossa Majestade”, porque se os primeiros “tiveram principal fim nas vinganças particulares e nas ofensas de parcialidades”, este diretamente se opunha com “armas na mão a execução das ordens de Vossa Majestade e se se perdoar com os outros não haverá povo algum no Brasil que não tumultue e se oponha contra as resoluções de Vossa Majestade”17 17 Ibid., p. 42. .

Diante de tal situação, o Conselho Ultramarino se posicionava contrário à concessão do perdão, pois, ainda nas palavras do procurador da Coroa, “grande virtude é a da clemência, principalmente nos príncipes, mas é de tal natureza que se exercita repetidas vezes, e de ordinário, degenera em vício porque convida a delinquir”18 18 Ibidem. .

O próprio Conselho, entretanto, era muitas vezes obrigado a reconhecer a necessidade de contemporizar. Em consulta de 1711 sobre o tabaco, avaliava-se que “não sendo este o tempo em que se dê aos vassalos de Vassalos de Vossa Majestade assistentes nelas [nas conquistas] motivos para que se desgostem”; ou ainda outra de 1714, analisando por que não se tinham efetivado certas medidas quanto à arrecadação da Fazenda Real, explicava que estas não se executaram “porque a perturbação em que se achava o Brasil aconselhava que se dissimulasse por algum tempo esta diligência”19 19 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 15 de abril de 1711 e outra de 15 de dezembro de 1714. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 17 e 142. .

Outra reflexão emanada do Conselho, na tentativa de entender a situação, aparece em consulta sobre um conflito de jurisdição entre o Conselho Ultramarino e o vice-rei, Marquês de Angeja, sobre o uso dos recursos da dízima da alfândega para construção de navios guarda-costas e para o envio de madeira para o Reino. Segundo os conselheiros, a harmonia daquele governo era a “base mais firme de conservação dos estados e especialmente necessária para aquele do Brasil”, pois este estava “tão distante da cabeça e coração da monarquia” e por “se achar tão opulento e por se saber e ter experimentado proximamente em quase todos os governos [capitanias] a pouca sujeição e obediência dos seus moradores às ordens reais”, demonstrando assim “a grande desafeição que tem ao Reino e às disposições que lhe vão dele”.

Interessante também é perceber a extrema prudência do Conselho no que toca ao mérito do tema da referida consulta, pois, para esse órgão, a dízima da Alfândega tinha sido instituída, como declarara o rei às câmaras, para fortificação e guarda-costas do litoral do Brasil, e assim desviar parte “do rendimento daqueles direitos em benefício das armadas do Reino”, não deveria ser feito naquele momento “em que os povos estão tão mal satisfeitos de lhos imporem” tributos e os tendo aceito “com muita violência”, ponderavam ainda que vendo os povos que se desvia o destino dos tributos para “outro fim, diferente daquele para que lhos pediram e eles o deram, terão por dolosa a proposição e conceberão grande ódio contra o governo”20 20 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 2 de maio de 1716. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 231. .

A Guerra dos Mascates em Pernambuco, provavelmente o episódio mais emblemático da chamada conjuntura crítica, também rendera ao Conselho uma série de discussões, já há muito conhecidas21 21 Cf. “Consulta do Conselho Ultramarino” de 17 de dezembro de 1712. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 98, p. 123 et seq. . Como bem ponderou Antonio Rodrigues da Costa, o conflito apresentava um potencial muito mais perigoso para a Coroa do que os diversos motins do período, exatamente por ser liderada pela camada senhorial da capitania22 22 Sobre a Guerra dos Mascates, além da clássica obra de Evaldo Cabral de Mello (1995) e dos trabalhos citados de Laura de Mello e Souza, gostaríamos de indicar Rodrigo Bentes Monteiro (2002) e Breno Lisboa (2016); destaque-se que o título desta última obra é uma frase de Antonio Rodrigues da Costa. .

Ainda que as propostas de buscar a proteção de outro monarca ou da constituição de uma república nos pareçam sobrelevadas, a exigência de pactos ou negociações colocava em questão o poder monárquico23 23 Dentre os papéis de Felix Machado, governador de Pernambuco, encarregado de restabelecer o controle da situação, encontra-se a cópia de uma carta, infelizmente sem autor e data, mas que expressa a difusão da ideia de um possível acordo com à França. O autor avaliava que os responsáveis seriam “dez ou até doze homens que hão de ser dos menos afazendados e dos que se acham maiores dívidas aos mercadores” do Recife e que para se “livrarem dos seus credores, procurando juntamente melhorar de fortuna, são mais capazes de concorrer para qualquer traição e de oferecerem a França aquelas capitanias, sem que nisso tenha parte a mais nobreza e povo”. No mesmo códice, sobre a exigência de pactos, vejam-se as anotações de Felix Machado feitas ainda em Portugal, nas quais ele registrava a dúvida: “Se não me quiserem receber senão com algumas capitulações, se hás hei de conceder e quais serão as mais largas que se lhe podem permitir”. BNP, Coleção Pombalina, 526, fls. 220 e 233 respectivamente. , então em franco processo de fortalecimento, e o próprio sistema colonial. Seria, portanto, dentro da lógica do Conselho, inaceitável. Daí a receita, por parte de Antonio Rodrigues da Costa, de “remédios fortes”, a fim de evitar que o domínio da Coroa ficasse “naqueles povos precário” e a obediência “às reais ordens conforme o seu antojo”24 24 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 11 de dezembro de 1714. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 98, p. 222; a citação encontra-se na página 231. .

Por isso, como bem observou Laura de Mello e Souza (2006, p. 89)SOUZA, Laura de Mello e. >A conjuntura crítica no mundo luso-brasileiro de inícios do século XVIII. In: . sol e a sombra: política e administração na América portuguesa do século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., os vassalos agora temidos precisavam ser controlados, daí a preocupação de que tropas também servissem para conter as ameaças internas, pois, como disse o procurador da Fazenda Real, “as praças não se conservam nem se defendem sem soldados, e que deles necessita mais o ultramar pois ainda para conservar na obediência os naturais era necessário gente armada” 25 25 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 26 de abril de 1714. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 98, p. 216. . Ou a preocupação de Antonio Rodrigues da Costa, ao lembrar que “a máxima infalível que milícia é de quem a paga e nas dissenções segue sempre o partido de quem recebe os soldos”26 26 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 12 de maio de 1713. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 98, p. 194; a citação encontra-se na página 196. , para justificar a transferência da administração dos tributos que serviam ao pagamento das tropas da Câmara de Olinda para a Fazenda Real – processo, aliás, que não ficaria restrito à capitania de Pernambuco.

Na chamada “consulta-testamento”, ao advogar o aumento do poder naval como única medida capaz de proteger o Brasil, Antonio Rodrigues da Costa avaliava que as cidadelas teriam pouca utilidade para a defesa do território, pois “só poderão ter alguma utilidade para refrear o orgulho dos moradores” e “este é o fim principal das cidadelas”27 27 “Do Conselho Ultramarino a S. M., no ano de 1732, feita pelo conselheiro Antonio Rodrigues da Costa”. RIHGB, 3ª ed., Rio de Janeiro, 1931[1845], T. VII, p. 477. . Contraponto interessante a essa opinião aparece em carta de 1716, possivelmente escrita na época desse debate, pelo vice-rei Marquês de Angeja, que, como veremos, era um crítico dos conselheiros ultramarinos.

Angeja expunha sua opinião, “de Portugal se fala muito em cidadelas para todas as praças” [do Brasil], reconhecia sua utilidade, mas se colocava contra a finalidade pretendida pelos conselheiros para preferirem “as cidadelas às mais fortificações”, porque entendia “que todo benefício que lhe supõem é para sujeição dos povos, tendo por suspeito o deste Brasil”. No entanto, para ele não se deveria “reputar por tal, senão por colônia”, pois lhe parecia “que o primeiro cuidado é o inimigo estrangeiro, sem entrar em desconfiança do natural e próprio dos vassalos”28 28 “Carta do Marquês de Angeja para D. Lourenço de Almeida, governador de Pernambuco” de 24 de setembro de 1716. BN, Documentos Históricos, 1938, v. 40, p. 88. .

Após esse percurso, em que destacamos o pensamento de Antonio Rodrigues da Costa, fica claro que as ideias centrais da chamada “consulta-testamento” já estavam presentes nas suas primeiras manifestações, notadamente a ideia das ameaças externas e internas. Apontava também outros elementos fundamentais para a garantia do domínio sobre a colônia que precisavam ser vistos com ponderação, tais como “injurias e violências com que são tratados pelos governantes, da iniquidade com que são julgadas as suas causas pelos ministros da justiça”, a dificuldade do recurso à Corte, e de seus prêmios, e ainda a enorme tributação, item de que trata longamente.

Daí a necessidade de a Coroa procurar garantir um bom governo das colônias, com o “bom regime dos vassalos e reta administração da justiça”, além, é claro, da confiança que a “real grandeza” do monarca daria “o prêmio e remuneração” dos serviços dos vassalos29 29 “Do Conselho Ultramarino a S. M., no ano de 1732, feita pelo conselheiro Antonio Rodrigues da Costa”. RIHGB, 3ª ed., Rio de Janeiro, 1931[1845], T. VII, p. 477. . Apontava, como conclusão, os perigos das grandes riquezas do Brasil e o risco de que os moradores do Reino, atraídos pelas riquezas, despovoassem Portugal. Assim, numa passagem muito conhecida, “em poucos anos virá a ter o Brasil tantos vassalos brancos como tem o mesmo Reino” e dessa forma “posto em uma balança o Brasil e na outra o Reino, há de pesar com grande excesso mais aquela que esta” e, consequentemente, “a maior parte e mais rica não sofrerá ser dominada pela menor, mais pobre, nem a este inconveniente se lhe poderá achar fácil remédio”30 30 Ibidem, p. 482. Ideias que lembram muito a também conhecida passagem sobre uma possível ida da Corte de Portugal para o Brasil de D. Luís da Cunha (2001 [Século XVIII], p. 371). Registre-se também o interessante comentário sobre o tema feito por Adriana Romeiro (2001, p. 160). .

De acordo com Laura de Mello e Souza (2006, p. 104)SOUZA, Laura de Mello e. >A conjuntura crítica no mundo luso-brasileiro de inícios do século XVIII. In: . sol e a sombra: política e administração na América portuguesa do século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., “naqueles anos, no âmbito do Conselho, foi se gestando uma ideia de Brasil” e como isso colocava a questão da unidade do território, bem como os efeitos da conjuntura crítica na compreensão dos agentes históricos, em especial dos metropolitanos, sobre a dinâmica colonial, notadamente em seus aspectos políticos. Pretendemos aqui, e esse é o centro deste trabalho, avançar em um ponto dessa percepção que nos parece ainda pouco explorado: a compreensão acerca do Antigo Sistema Colonial e das relações econômicas entre a metrópole e sua colônia.

Retornemos então, mais uma vez, ao voto de Antonio Rodrigues da Costa na Consulta do Conselho Ultramarino sobre o governo das minas de 1709. Após apresentar suas considerações quanto à questão da defesa do Rio de Janeiro, do governo das minas e da arrecadação do quinto, o conselheiro introduziu uma nova questão: “por que todas estas disposições e cautelas serão inúteis” para o enriquecimento do Reino, com “os grandes tesouros, que Deus nosso Senhor nos tem descoberto e virá a ser toda esta riqueza para as nações estranhas e todo nosso trabalho e desvelo será em benefício alheio”, caso não se emendasse “o estado em que se acha nosso comércio e as prejudiciais disposições em que a indústria dos ingleses e holandeses o vão pondo”.

Como estes pretendiam ir “aquelas partes negociar e assentar casas de comércio”, era, portanto, necessário “restringir-lhes esta liberdade ao rigor dos tratados [diplomáticos] e pôr-lhes tais cautelas que o não possam exceder”. Não se deveria portanto permitir tal comércio “tão livremente como eles o intentam fazer”, com o estabelecimento de casas de comércio ou ainda que enviassem, “por mão de seus comissários” ou mandando em seus navios, suas mercadorias, pois, dado que a maioria delas eram de “suas fábricas, as hão de vender por preços mais acomodados que os nossos mercadores, os quais por este modo não poderão vender os [gêneros] que levarem, ou mandarem” e consequentemente, sentenciava Antonio Rodrigues da Costa: “tirarão os estrangeiros o comércio das mãos dos portugueses e o porão em si”.

Segundo Antonio Rodrigues da Costa, o comércio ou “negócio de Portugal para o Brasil e do Brasil para Portugal” era o único que os portugueses tinham e que lhes trazia “algum lucro”, assim, se os estrangeiros ocupassem o lugar dos portugueses nesse comércio, ficaria “este Reino [Portugal] e o Brasil reduzido por este modo a última ruína” e os mercadores estrangeiros levariam embora todo o ouro “que tirarmos das minas”, arruinando ainda consequentemente a marinha portuguesa.

O conselheiro procurava ainda entender as causas de tal situação. Para ele fora o tratado de Portugal com a República da Inglaterra de Cromwell de 1654 que tinha destruído o comércio português, colocando-o nas mãos dos ingleses e depois também nas dos holandeses e franceses, “pela participação nos privilégios”, que permitia a estas nações “comerciar no Brasil e mais conquistas deste reino, indo a elas os mesmos ingleses, holandeses e franceses”, o que anteriormente era proibido, com graves penas, mas que após os tratados passaram a poder “ir ou nos nossos navios ou nos seus”, contanto que fossem “deste porto [Lisboa] e hajam de voltar a ele no corpo da frota”, e ainda pelo tratado com a Inglaterra de 1661 “se lhes concedeu” ainda “a liberdade de poderem assentar casas de comércio nas ditas conquistas”.

Dessa maneira, estando os tratados diplomáticos em vigor, não se poderia “impedir o uso destes privilégios do comércio”, mas que deveriam ser aproveitados apenas “como se lhes concederam”. Assim, a Coroa deveria procurar garantir o pagamento dos direitos, pagos nos portos metropolitanos tanto na ida como na volta, e, para tanto, ponderava que o monarca poderia “sem a mais leve ofensa dos tratados pôr todas as cautelas que lhe parecerem necessárias e eficazes para que se não possa fazer alguma fraude aos seus direitos nem exceder-se a liberdade permitida”.

Propunha assim algumas medidas de controle desse comércio, para que, desse modo, os ingleses e os holandeses achassem “tais dificuldades em conseguir o comércio do Brasil na forma que novamente o pretendem” para que se dessem “por contentes em conservar o que até agora tinham”; e, quando tentassem prosseguir nesse comércio, deveriam “ser obrigados a trazerem os frutos do Brasil a este porto [Lisboa] e pagar deles os direitos e logo sem os desembarcarem dos seus navios sacá-los para fora do Reino” por ser apenas isso o que era permitido pelos tratados. “Desta sorte viremos a conseguir que nos não saquem o ouro que nos é de tanto prejuízo, mas que nos tirem os frutos, que é o que devemos procurar para melhorar nosso comércio”.

Por fim, apontava ainda que era preciso “moderar” o “excessivo luxo do Brasil”, então ampliado com o resultado das minas, proibindo-se com uma “pragmática” aos moradores do Brasil “gêneros e fazendas estrangeiras”, especialmente de maior valor, “sem as quais podem passar sem descômodo”. Contudo, observava: “mas porque também convém que não deixe de vir o ouro do Brasil para este reino se lhes devem permitir todos os frutos nascidos no reino e todos os gêneros fabricados neles”, ainda que fossem semelhantes aos gêneros estrangeiros proibidos, e “isto mesmo poderá ser o meio para se introduzirem estas fábricas no reino”31 31 “Sobre os papéis que se ofereceram de arbítrios acerca das minas para com eles se segurarem os interesses da Fazenda real e se pôr em melhor forma o governo daquelas terras”, de 17 de julho de 1709. BN, Documentos Históricos, 1951, v. 93; todas as citações dos parágrafos anteriores estão entre as páginas 225 e 228. .

Como avaliar as ideias econômicas de Antonio Rodrigues da Costa? Tais ideias refletiam os elementos fundamentais da doutrina mercantilista32 32 Sobre o tema, veja-se o clássico de Eli Heckscher (1943) e o trabalho de Steve Pincus (2012). , não se tratando evidentemente de uma contribuição original. Parece-nos, contudo, importante destacar em primeiro lugar que, no âmbito do Conselho Ultramarino, se trata de um caso raro, em que se apresenta, dentro de uma consulta, uma reflexão mais abrangente sobre a questão colonial do ponto de vista econômico e, salvo engano, seria ainda das mais precoces. É também digno de menção o contexto da consulta, pois Antonio Rodrigues da Costa associava a questão das alterações nas minas e a necessidade de estabelecer o poder real na região com uma reflexão mais estratégica sobre o papel das colônias33 33 Curiosamente na famosa “consulta-testamento”, já citada, o autor não trata das questões econômicas aqui analisadas. .

Vale ainda apontar que, mesmo dentro do “pensamento econômico” português do período, tal reflexão pode ser considerada como um exemplo da tomada de consciência do problema colonial, porquanto até então poucos foram os autores portugueses que expressaram de forma tão evidente o papel da colônia no desenvolvimento da economia metropolitana, notadamente no que toca à articulação das manufaturas do Reino com o mercado colonial. De maneira geral, tanto para os diplomatas portugueses que negociaram os tratados com a Inglaterra e com a Holanda no pós-Restauração, como para a maioria dos escritores portugueses que abordaram questões econômicas anteriores à referida consulta, a questão da defesa do exclusivo do comércio colonial esteve sempre mais articulada com o comércio e com a arrecadação de tributos, com exceção ao trabalho de Duarte Ribeiro de Macedo34 34 José Calvet de Magalhães (1967), José Luís Cardoso (2003) e António Sérgio (1974). .

Duarte Ribeiro de Macedo, na sua Sobre a Introdução das Artes de fins do século XVII, dedica uma pequena parte às colônias, mas de grande importância. Referindo-se especialmente ao Brasil, Macedo explicava que o crescente número de moradores necessitava de “roupas e manufaturas da Europa”, dando em troca seus produtos, mas, ponderava: “se as obras de que necessitarem forem estrangeiras, será dos estrangeiros a utilidade que a nossa indústria descobriu nelas e o nosso trabalho cultivou e viremos a ser no Brasil uns feitores das nações da Europa”35 35 O texto foi publicado tardiamente, aparecendo pela primeira vez em de Duarte Ribeiro de Macedo (1817) e posteriormente por António Sérgio (1974). A citação encontra-se respectivamente nas páginas 92 e 223 com ligeiras diferenças. .

Antonio Rodrigues da Costa provavelmente conheceria a obra de Macedo e, sem dúvida nenhuma, acompanhou o esforço de desenvolvimento manufatureiro promovido pelo Conde da Ericeira e a assinatura do Tratado de Methuen de 1703, a que curiosamente não faz referência, mas a que, pelas ideias expressas, deveria ser crítico36 36 Dados os limites deste trabalho, indico apenas Carl Hanson (1986) e José Luis Cardoso et al. (2003). .

Não pretendemos entrar aqui na discussão sobre o famoso tratado de comércio entre Portugal e Inglaterra, porém, se naquele momento não era possível retomar uma política de fomento manufatureiro, cabia ao menos a defesa da condição de “feitores” do comércio colonial, defendendo o exclusivo metropolitano e impedindo, o máximo possível, a ação do comércio estrangeiro no Brasil. Era isso o que Antonio Rodrigues da Costa defendia, como vimos, no seu voto, ainda que deixasse registrada também sua opinião sobre as manufaturas37 37 Novamente é possível perceber a confluência de ideias com D. Luís da Cunha (2001 [século XVIII], p. 295). .

Ainda que a resposta de D. João V à consulta acerca das minas de 17 de julho não tenha tratado das questões econômicas apontadas por Antonio Rodrigues da Costa38 38 “Resposta do Rei” de 7 de novembro de 1709. AHU-MG, Cx. 1, Doc. 14. , é possível perceber que as preocupações do conselheiro foram, como veremos, de alguma maneira, contempladas tanto no campo diplomático, como na legislação e nas instruções para o governo do Brasil.

Independentemente das brechas legais ou ilegais, o comércio direto entre o Brasil e o estrangeiro permanecia legalmente proibido39 39 O navegante inglês Dampier de passagem por Salvador em 1699 é testemunha desse quadro: “são raríssimos os navios ingleses que aportam aqui – antes de nós, havia 11 ou 12 anos que não ancorava um só navio inglês no porto” (DAMPIER, 2006 [1703], p. 67) e um ou dois comerciantes franceses e outro holandês que lá encontrara tinham ido ao Brasil em navios portugueses. O relato sobre o Brasil pode ser visto ainda em Jean Marcel França (2012, p. 460) de que extraímos a tradução. Charles Boxer, em artigo sobre o comércio inglês com Portugal na primeira metade do século XVIII, corrobora tal apreciação, fornecendo vários testemunhos ingleses, tanto para a importância do comércio via Portugal como para as dificuldades colocadas para o contato direto com o Brasil. Bom exemplo dessa situação é o relato de Lumley, enviado britânico em Lisboa, para o secretário de Estado, Lord Carteret, em 1723, no qual afirmava, com algum exagero: “I can venture to assure your lordship that in all Brazil there is not above one British house established”, salvo alguns ingleses e irlandeses católicos “as such, who are of no consideration, and may be placed there to evade our Treaty and to prevent any of His Majesty’s Protestant subjects and substantial traders, from reaping the benefit of it” (apud BOXER, 1969, p. 463). Ver ainda Carlos Gabriel Guimarães (2017) e Rodrigo Ricupero (2017). . Era preciso, contudo, garantir na prática o monopólio português em razão das pressões estrangeiras. Em representação da Mesa do Bem Comum do Comércio de 1715, que analisaremos mais adiante, os comerciantes portugueses explicavam: “é sem dúvida que, enquanto no Brasil houve somente açúcar e tabaco, se passavam anos (e não poucos) que naqueles portos” não iam “arribados navios estrangeiros e somente muito acaso alguma nau com prolongada viagem das Índias Orientais para se refazer de água e mantimentos”40 40 “Representação da Mesa do Bem Comum do Comércio” de 4 de julho de 1715. Documento anexo da “Consulta do Conselho Ultramarino ao rei D. João V sobre o que informa o vice-rei e governador-geral, Marquês de Angeja, acerca da introdução do comércio dos estrangeiros nas conquistas” de 17 de julho de 1715. AHU-BA, Cx. 10, Doc. 797. A consulta sem os anexos encontra-se nos BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 175. . Contudo, como apontam, após os descobrimentos auríferos, a situação tinha se alterado. Indicavam também que a maior dificuldade de conseguir embarcar nos navios portugueses que demandavam o Brasil teria incentivado os estrangeiros, “ambiciosamente inquietos e naturalmente astuciosos para o exercício mercantil”, a lançarem mão do recurso da navegação direta.

Era exatamente essa a preocupação de Antonio Rodrigues da Costa quando, como vimos, propunha uma série de medidas que, sem ferir os tratados diplomáticos, colocassem “dificuldades” ao comércio estrangeiro no Brasil, para que estes se dessem “por contentes em conservar o que até agora tinham” 41 41 “Sobre os papéis que se ofereceram de arbítrios acerca das minas para com eles se segurarem os interesses da Fazenda real e se pôr em melhor forma o governo daquelas terras”, de 17 de julho de 1709. BN, Documentos Históricos, 1951, v. 93, p. 227. .

É difícil, contudo, precisar o tamanho tanto da presença dos mercadores ingleses por dentro do sistema colonial português42 42 Ver Charles Boxer (1969), Carlos Gabriel Guimarães (2017) e Maria Julia de Oliveira Silva (1992). , como o do contrabando43 43 Sobre o contrabando no período, ver Paulo Cavalcante (2006) e Ernst Pijning (1997a; 1997b). . De toda forma, tanto um como outro não alteravam a essência do sistema, pois, na prática, transferiam as vantagens do comércio colonial, seja para os agentes externos ou internos, que se beneficiavam dos preços coloniais e da fuga do pagamento das tarifas aduaneiras, sem criar, contudo, um verdadeiro mercado de livre concorrência no espaço colonial44 44 Sobre o contrabando num plano mais teórico dentro da discussão do Sistema Colonial, ver Fernando Novais. (1995 [1979], p. 84 e 91). Gustavo Acioli Lopes (2018, p. 158) lembra que o contrabando “tornava-se atraente, porque lucrativo, devido à intensificação do exclusivo metropolitano”. . Afinal, o contrabando feito em grande escala só poderia ser operacionalizado pelos próprios agentes mercantis que atuavam na colônia e que evidentemente não iriam transferir as vantagens auferidas pelo comércio ilícito para os consumidores.

Ainda que preocupações sobre o comércio colonial de Antonio Rodrigues da Costa, expressas na consulta de 17 de julho de 1709, não tenham sido mencionadas pelo monarca na sua resposta, não deixa de ser sintomático que uma semana de depois, no dia 24 de julho, D. João V assinava uma ordem para Luís César de Meneses, governador-geral do Brasil, orientando o confisco de produtos estrangeiros ou ainda portugueses que chegassem ao Brasil, vindo dos Açores ou da Ilha da Madeira sem terem sido despachados nas alfândegas de Portugal.

Pouco depois, em 8 de fevereiro de 1711, a Coroa publicou uma lei geral sobre o comércio com os navios arribados no Brasil, dando início, aliás, a uma profusão de ordens sobre o tema. A legislação sobre o controle do comércio acabaria coligida em coleções que eram de tempos e tempos enviadas para as autoridades coloniais. Tais coleções nos ajudam a perceber a preocupação com o tema na segunda década do XVIII, quando foram emitidos 14 documentos, contra 1 na terceira década e 2 na quarta45 45 Tais dados foram coligidos da “Coleção das leis e ordens que proíbem os navios estrangeiros, assim os de guerra, como os mercantes nos portos do Brasil”, provavelmente organizada na década de 1760. AHU, Cód. 1193. A coleção enviada pelo Marquês de Pombal, então Conde de Oeiras, para o Marquês do Lavradio em 1769, na altura de sua nomeação para o Vice-Reinado, indicaria outros números, mas sem alterar a preponderância de ordens da segunda década; veja-se Marcos Carneiro de Mendonça (1960, p. 82). Outra “coleção de leis” sobre o tema, possivelmente organizado localmente, encontra-se no Códice “Informação geral da Capitania de Pernambuco” de 1749, publicado no volume 28 dos Anais da Biblioteca Nacional. BN, 1908, v. XXX, p. 216 et seq., cujo original ou outra cópia podem ser vistos em ANTT, Manuscritos do Brasil, v. 43. . No entanto, os dois mais importantes eram o já citado de 8 de fevereiro de 1711 e o de 5 de outubro de 1715, que explicavam “a forma como se devia observar” a Lei de 1711; e que se mantiveram em vigor até a abertura dos portos em 1808, tendo sido, por exemplo, base para a apreensão da escuna norte-americana “Pelegrim” no Rio de Janeiro em 180246 46 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 22 de dezembro de 1802. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 95, p. 168. .

Paralelamente aos dispositivos legais enviados para o Brasil, a Coroa portuguesa iria incluir a questão da proibição do comércio estrangeiro nos tratados diplomáticos da paz de Utrecht. No tratado com a França de 1713, explicitamente se vedava o comércio entre a Guiana Francesa e a região Norte da colônia. A questão recebeu um tratamento mais abrangente, contudo, no tratado assinado com a Espanha em 1715, que, no artigo que trata da reabertura do comércio entre as duas nações, explicava que este comércio era restrito aos domínios europeus, “por estar unicamente reservada a navegação e comércio das Índias às duas nações nos seus domínios respectivos da América”, salvo o “asiento” dos escravos negociado pela Espanha com a Inglaterra47 47 Ver no volume 2, p. 251, 269 e 275. Visconde de Borges de Castro. Collecção dos Tratados, Convenções, Contratos e Actos Públicos celebrados entre a Corôa de Portugal e as mais potências desde 1640, 8 v. Lisboa: Imprensa Nacional, 1856-8, continuada por Julio Biker, Suplemento à Collecção dos Tratados..., 24 v. Lisboa: Imprensa Nacional, 1872-80. .

Possivelmente tais artigos tenham justificado a ideia de José da Silva Lisboa, o futuro Visconde de Cairu, de que a abertura dos portos era contrária “ao acordo das potências, que, no Congresso de Utrecht [1713-1715], haviam firmado o Sistema Colonial, vedando entre si o comércio de seus Estados Ultramarinos, estabelecendo o monopólio das metrópoles” (LISBOA, 1940LISBOA, José da Silva. Memória dos benefícios políticos do governo de El-Rey Nosso Senhor D. João VI. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1940 [1818]. [1818], p. 67). De toda forma, o fato de a Inglaterra ter entrado como “garantidora” do Tratado entre Portugal e Espanha seria usado posteriormente pela diplomacia portuguesa como uma anuência dos ingleses ao comércio estrangeiro no Brasil48 48 Ver a “Nota de Robert Walpole e contra-nota [escrita pelo Marquês de Pombal], seguidas de vários documentos sobre o tema de 1772 e de anos seguintes”. BNP, Coleção Pombalina, Cód. 638 – Miscelânea, fl. 207 et seq. .

Os tratados assinados em Utrecht simplesmente referendavam as disposições então existentes sobre o comércio com as colônias, ainda que sempre que possível as potências mais fortes buscassem alguma concessão por dentro do sistema colonial da potência rival, como, por exemplo, entre a Grã-Bretanha e a Espanha49 49 Veja-se, por exemplo, Josep Maria Delgado (2015) e Fernando Novais (1995 [1979], p. 84). .

No caso de Portugal, o esforço era bloquear, na prática ou diplomaticamente, as concessões feitas nos tratados do século XVII. Umas dessas era a concessão feita aos ingleses de poderem ter quatro casas ou famílias de mercadores na Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro pelo Tratado de 1661, que depois seria estendida aos holandeses, mas aproveitada também pelos franceses. Antonio Rodrigues da Costa pensava que nesse caso “seria conveniente que [os ingleses e holandeses] desistissem, por não se conceder às outras com que tem emulação [França], manejando-se este negócio com artifício e destreza”, entendendo que se poderia conseguir a desistência da concessão “com a obrigação de se não conceder a nenhuma das nações aliadas”50 50 “Consulta do Conselho Ultramarino de 24 de julho de 1715”. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 175; as citações encontram-se na página 186. .

A tarefa foi atribuída ao grande diplomata português D. Luís da Cunha, que teria inclusive seguido a linha indicada por Antonio Rodrigues da Costa. Em carta de 1716, o embaixador conta que os ministros ingleses estariam convencidos de “que convém mais a esta nação renunciar a dita liberdade do que permitir que tenham os franceses”, contudo, o tema acabou sendo remetido para consulta aos mercadores ingleses em Portugal, e esses “salvo Golston [sic]”, teriam a mesma opinião51 51 “Carta de Ofício” de 15 de setembro de 1716, Londres. BNP, Cód. 1608 – Cartas de D. Luís da Cunha (1716-1718), fl. 121. “Golston” ou Gulston é o nome da família inglesa estudada por Carlos Gabriel Guimarães (2017, p. 93). Sobre o tema, ver também Charles Boxer (1969, p. 462). .

O balanço da negociação nos é fornecido pelo próprio D. Luís da Cunha, em carta de 1730, em que nos conta que quando estava na Inglaterra quase tinha “conseguido que os ingleses se desfizessem do privilégio de terem casas no Brasil, só para que os franceses o perdessem”, mas um mercador que tinha residido em Portugal, um “maldito” Milinas “se opôs no Conselho do Comércio”, alegando que, ainda que naquele momento “Inglaterra não tirava grande utilidade de semelhante privilégio, podia vir tempo em que lhe fosse de grande importância e assim os ingleses por tirarem um olho aos franceses não deviam arrancar-se dois a si mesmos”52 52 “Ofício de 12 de janeiro de 1730”. ANTT, Ministério dos Negócios Estrangeiros, L. 795 – Cartas de D. Luís da Cunha para a Corte e outras pessoas do serviço de SM escritas em Haia no ano de 1728, 1729 e 1730, fl. 1 do ano de 1730, a citação encontra-se na fl. 26. Registre-se que, embora o embaixador na altura negociasse com os holandeses a questão sobre o tráfico na Costa da Mina, dele não podemos tratar, dados os limites deste texto. Veja-se, sobre a questão, Pierre Verger (1988) e Gustavo Acioli Lopes (2018); destaco ainda que Lopes (2018, p. 103) apresenta a opinião de Antonio Rodrigues da Costa sobre o contrabando nessa região. .

Após rápida passagem pelo esforço diplomático, podemos retornar às disposições legais enviadas ao Brasil. A grande quantidade de ordens emanadas na segunda década demonstra tanto a dificuldade de implementar o controle sobre os navios estrangeiros, que, para burlar a proibição, alegam como pretexto a extrema necessidade de reparos ou de reabastecimento de água e de mantimentos, como a própria mudança da situação com a divulgação crescente das riquezas dos descobrimentos auríferos no Brasil53 53 A Mesa do Bem Comum do Comércio não tinha dúvida sobre a falsa alegação da maioria dos navios arribados: “Rara vez ou nunca nau partida da Europa para as mesmas Índias [Orientais] se viu arribada em a nossa América [antes dos descobrimentos auríferos], porque as nações inglesa, holandesa ou francesa abundantes de navios, costumam fazer esta navegação com um número de gente tão proporcionado à capacidade de cada navio, que sempre superabundam os mantimentos ao necessário sustento da gente com que o navegam e mais ainda até a altura do Brasil, onde comumente chegam com breve viagem pela inalterável observância de partirem da Europa em conhecidas monções”. “Parecer do Conselho Ultramarino sobre as causas de que nascem os excessos da saca da moeda e as dificuldades de escoamento dos frutos do Reino”. AHU, Cx. 25, pasta 9, apud LOPES, 2018, p. 116. .

A leitura da correspondência do Governo-Geral com as demais capitanias e das ordens emitidas para os seus subalternos na Bahia nos permite uma aproximação sobre a fiscalização dos navios estrangeiros. É possível perceber que o governador-geral dispunha de uma série de informações sobre a chegada dos navios, mesmo em outras capitanias, e sobre os procedimentos adotados. Recebia ainda denúncias a respeito da cumplicidade de oficiais da Fazenda Real com o contrabando. Por outro lado, também é possível verificar as instruções dadas no dia a dia para a fiscalização, a apreensão de navios estrangeiros ou de bens contrabandeados, a organização de devassas e a punição de pessoas e de funcionários envolvidos54 54 Seria impossível apresentar com detalhes as informações encontradas na correspondência do Governo-Geral do período aqui abordado e publicada na já referida coleção Documentos Históricos. Rio de Janeiro: BN, 1928-1955 (série original), 121ou 111 v. (2012, v. 111). Indicamos, contudo, correspondência com as capitanias do Norte: v. 39, 40, 84, 85, 86; com as capitanias do Sul: v. 11, 70 e 71, correspondência com a própria capitania da Bahia e anexas: v. 40, 41, 42, 43, 44, 45 e 71; e, ainda, as Portarias v. 54, 55 e 70. .

Muito mais interessante para este trabalho é o debate provocado pelas propostas apresentadas pelo Marquês de Angeja, vice-rei e governador-geral do Brasil entre 1714 e 1718. Antes de examinar os termos do debate, convém lembrar que era claro o desentendimento entre o Conselho Ultramarino e o vice-rei, para os conselheiros, em consulta do começo de 1715, que acusavam o vice-rei, então com pouco mais de seis meses de exercício no governo, de ir “procedendo absolutamente no seu governo, sem reconhecimento de superior e sem atenção aos regimentos, leis e ordens de Vossa Majestade”. Algum tempo depois, os conselheiros voltavam a carga e reportavam ao monarca: “como o Conselho tem experimentado repetidas vezes que o Marquês de Angeja não dá execução às ordens de Vossa Majestade expedidas por este tribunal e replica a elas com tanta desatenção”55 55 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 19 de janeiro de 1715; “Consulta do Conselho Ultramarino” de 21 de abril de 1716. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 150 e p. 228, respectivamente. .

O vice-rei também não perdia oportunidade de criticar o Conselho Ultramarino em sua correspondência. Em carta de 1715 para Francisco de Távora, governador do Rio de Janeiro, explicava quanto era prejudicial ao serviço régio “não atender o seu tribunal de ultramar as representações que lhe fazemos” 56 56 “Carta para o governador do Rio de Janeiro, Francisco de Távora” de 3 de dezembro de 1715. BN, Documentos Históricos, 1945, v. 70, p. 267. . Em 1717, em carta ao Conde de Assumar, na qual felicitava a escolha dele para governador das Minas, ponderava: “só receio é que todo vosso zelo e cuidado, o trebuquem57 57 Do verbo “trebucar”, ou seja “emborear-se o batel, voltar-se sobre um lado e alagar-se” (SILVA, 1823). os ministros do Conselho com as impertinentes ordens que costumam passar sem atenção das pessoas que governam” 58 58 “Carta para o Conde de Assumar” de 18 de março de 1717. BN, Documentos Históricos, 1945, v. 70, p. 360. ; ou ainda quando, no mesmo ano, escrevendo para o governador de Pernambuco, Lourenço de Almeida, se queixava das “terríveis paulinas que vêm do Conselho Ultramarino”59 59 Ver “Carta de excomunhão” (SILVA, 1823). “Cartas escritas entre 1715 e 1717 para o governador Lourenço de Almeida”. BN, Documentos Históricos, 1938, v. 40, p. 27, 59, 73 e 90 e 1949, v. 85, p. 11; a citação encontra-se na última carta. . Um último e expressivo exemplo pode ser visto na carta para o desembargador Luís de Melo da Silva, chanceler da Relação, na qual, discorrendo sobre os problemas da Justiça no Brasil, sentenciava: “tudo isto têm culpa os famosos ministros do Tribunal do Conselho Ultramarino, porque todo o seu cuidado é diminuírem a jurisdição a que governa e por independentes os súditos do superior” [sic]60 60 “Carta para Luís de Melo da Silva” de 18 de abril de 1717. BN, Documentos Históricos, 1946, v. 71, p. 11. .

Foi nesse ambiente de aberta hostilidade que se colocou o problema do comércio estrangeiro. Angeja considerava as ordens recebidas sobre a fiscalização dos navios estrangeiros arribados de difícil execução, em especial a proibição de esses navios pagarem os gastos feitos em terra com gêneros, quando alegassem falta de dinheiro. Tal situação seria assim um estorvo ao governo, pois, como explicava ao governador de Pernambuco, “confesso a Vossa Senhoria que neste governo não há coisa mais pesada que a lida de navios estrangeiros” e, concluía que, se soubesse “desta lei antes de partir de Portugal, não houvera coisa que me obrigasse a passar a este Estado”61 61 “Carta para o governador Lourenço de Almeida” de 30 de maio de 1715. BN, Documentos Históricos, 1938, v. 40, p. 27. .

Incomodado com tal situação62 62 Ver “Carta do Marquês de Angeja para Diogo de Mendonça Corte Real” de 14 de janeiro de 1715 (RAU; SILVA, 1958, p.131). Nessa obra também se encontram outras cartas referentes à presença de navios estrangeiros no Brasil. , o Marquês de Angeja faria então três propostas sobre o tema em carta endereçada ao monarca no início de 1715 63 63 “Carta do Marquês de Angeja para o rei D. João V” de 5 de janeiro de 1715, anexa à “Consulta do Conselho Ultramarino ao rei D. João V sobre o que informa o vice-rei e governador geral, Marquês de Angeja, acerca da introdução do comércio dos estrangeiros nas conquistas” de 17 de julho de 1715. AHU-BA, Cx. 10, Doc. 797. A consulta sem os anexos encontra-se disponível em BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 165. Sobre o tema ver também a “Consulta” de 24 de julho de 1715, p. 175 do referido volume. . Para o vice-rei, o “permitir-se ou não comércio aos estrangeiros neste Estado e o usar com eles do aperto da lei (...) que o proíbem é um dos negócios mais delicados e da maior importância” que o monarca “tem e pode ter neste Estado do Brasil”. Angeja ponderava sobre a falta de meios para conter esse comércio, o problema do respeito aos tratados diplomáticos, e lembrava que a perda da Índia deveria servir de exemplo, pois “o aperto e estanque que fizemos daquele negócio despertou as ambições estrangeiras”. Explicava que “não será o meu parecer nunca que este se lhe conceda [tal comércio], mas sim que se busque um meio em que permitindo-se lhe no acidente de eles buscarem os nossos portos”, referindo-se ao caso das arribadas, os estrangeiros encontrem “tão pouca conveniência na venda dos gêneros que quando tornarem a buscar os mesmos portos seja por verdadeira necessidade e caso fortuito”, para tanto, e essa é a sua primeira proposta. Ao contrário da proibição do comércio nesse caso, deveria por “tais direitos” e que os governadores fizessem “tantas dilações (...) nos despachos” dos navios que “os desenganem de tornarem ao mesmo negócio”.

A segunda proposta que apresenta sumariamente era de se avaliar se “será conveniente já de agora ir interessando alguma das potências marítimas no comércio do Brasil, para que a segurança do seu interesse, nos ajude a conservação contra a ambição das outras” e assim, emendava a terceira proposta, podendo admitir para uma das potências “a liberdade de trazerem escravos ao Brasil”, ou melhor para Bahia e Pernambuco, mas “por nenhum caso” do Rio de Janeiro, para “não prejudicar o comércio de Angola”, concluindo a proposta com a consideração, talvez mais “heterodoxa”, que os escravos fossem pagos exclusivamente com ouro, mas nunca com açúcar ou tabaco, pois dessa forma não se prejudicaria o comércio português, a renda das alfândegas do Reino, o tráfico na Costa da Mina, ao contrário do ouro, que de forma realista, iria de qualquer forma para as nações estrangeiras e, portanto, tinha “por menos danoso que de aqui o levem com utilidade do mesmo Brasil, do que hajam de ter o mesmo gênero [ouro], sem lhe deixar nenhuma”64 64 Todas as citações se encontram na carta do Marquês de Angeja citada na nota anterior. .

As propostas do Marquês de Angeja foram discutidas pelo Conselho Ultramarino no dia 17 de julho de 1715 e tanto o procurador da Fazenda como o procurador da Coroa se opuseram a elas, valendo-se de argumentos contra o comércio estrangeiro na colônia, justificando a negativa do Conselho. O assunto, contudo, voltaria à tona na semana seguinte, quando, por incumbência dada pelo presidente em exercício, Antonio Rodrigues da Costa apresentou seu parecer que, por ser mais sofisticado, desenvolvendo as opiniões apresentadas pelos procuradores, será o único que analisaremos aqui. Para Antonio Rodrigues da Costa, “antes que as minas daquele Estado fossem tão abundantes”, não ocorriam tais arribadas dos navios estrangeiros, o que comprovava os “afetados e dolosos” pretextos que os estrangeiros se valiam para tentar estabelecer o comércio.

Se permitido ou tolerado esse comércio, isso resultaria em quatro danos. O primeiro seria a saída do ouro, “sem ao menos consentirem que nos corra pelas mãos”. O segundo era o dano ao comércio português, pois as mercadorias levadas diretamente ao Brasil, dadas as vantagens de não pagarem as taxas alfandegárias em Portugal, impediriam “totalmente a saída dos gêneros que vão deste Reino”, para o lamento dos homens de negócio, e a perda dos direitos da Fazenda Real seria o terceiro dano. O quarto dano procederia da conveniência dos vassalos do Brasil e “talvez” das pessoas incumbidas de evitar esse comércio, “porque aqueles compram as fazendas e gêneros de que necessitam por preços mais cômodos, estes por ser que achem alguma utilidade em permiti-lo”. Disso seguiria “um gravíssimo inconveniente político e totalmente oposto à união e conservação da monarquia”, pois a vantagem que os moradores teriam com esse comércio com os estrangeiros “os faz desejar que se lhes franqueiem os portos às nações estranhas e a aborrecer o governo que lho impede e a desejar outro que lhe permita”. Dessa maneira, se poderia temer “a ruína ou a divisão da monarquia”, pois não faltando “outros estímulos e motivos que têm para desejarem governar-se sem subordinação de Portugal, que já começaram a brotar em Pernambuco, se lhes acresce este que é comum a todos” os vassalos, interessados nas vantagens de comprarem por menor preço os gêneros de que precisam. Concluindo assim que seria “muito para recear que aqueles vassalos cometam o desatino de se separarem da cabeça da monarquia”, preocupação de muitos que conhecem “os ânimos daqueles vassalos”65 65 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 24 de julho de 1715. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 175, as citações encontram-se nas páginas 179 e 180. .

Reflexo da conjuntura crítica, as observações de Antonio Rodrigues da Costa desenvolvem as ideias que ele próprio já vinha expondo nos seus votos no Conselho Ultramarino. No entanto, uma ideia apresentada nessa consulta nos parece de sobremodo importante, o reconhecimento de que o mecanismo de comércio entre a metrópole e a colônia seja em desfavor dos moradores do Brasil e que tal motivo poderia servir para o questionamento dos laços entre as partes da monarquia66 66 A título de comparação, em consulta do Conselho da Fazenda de 1655 sobre o comércio estrangeiro, as justificativas da proibição eram as perdas do comércio português e da fazenda real, mas não se colocava o problema das desvantagens que os moradores do Brasil teriam em comprar mais caro e vender mais barato os seus gêneros. “Representação do Conselho da Fazenda” de 1655. ANTT, Manuscritos da Livraria, 1146, fls. 59-61. .

A Mesa do Bem Comum do Comércio, em documento já citado, também se expressava em termos semelhantes aos de Antonio Rodrigues da Costa. Preocupados não somente com a “ruína do comércio”, mas com a fidelidade dos vassalos67 67 Cf. “Representação da Mesa do Bem Comum do Comércio” de 4 de julho de 1715. AHU, Cx. 25, pasta 9, e “Carta dos deputados da Mesa [do Espírito Santo dos Homens de Negócio] ao Rei [D. João V]” de setembro de 1723. AHU, Cx. 3, Doc. 294, apud LOPES, 2018, p. 116 e 106. e as relações econômicas entre Portugal e o Brasil. Quanto a este último aspecto, destacavam-se, notadamente, três reflexões sobre a existência de casas da moeda no Brasil e suas implicações, que aqui analisaremos apenas no que concerne à dinâmica colonial mais ampla, sem entrarmos nos pormenores acerca do papel da moeda ou do impacto das casas da moeda na colônia.

A primeira delas, escrita pelo provedor da Casa da Moeda de Lisboa em 1711, na qual considerava que a abertura de uma casa da Moeda na Bahia traria prejuízos ao bem público e à Fazenda Real. Prosseguia: “Vossa Excelência melhor que ninguém sabe que todos os políticos assentam em que as conquistas” devem “vender muito e possuir pouco, tirando-se-lhe a sua riqueza para que vendo-se opulentas não entrem no intento de negarem a sujeição”; e sem dúvida, com a Casa da Moeda, ficaria “a América riquíssima com seu ouro em dinheiro corrente” em dano do comércio e do Reino. Afinal, tendo dinheiro com que pagar os gêneros que lhe são necessários” ficariam os moradores do Brasil em termos de pactuar com os mercadores [e] venderem-lhes os [gêneros] do Brasil por preços excessivos”. Teriam também vantagem no momento da compra. Para o provedor, “os estados melhor se conservam quando mutuamente se comunicam e usam os frutos uns dos outros”, portanto seria prudente evitar que “Portugal e Brasil se desunam no uso de seus frutos, ficando este com mais riqueza porque esta sempre estimulou discórdias”. Em frase que lembra muito as ideias de Antonio Rodrigues da Costa, sentencia: “os paulistas o testemunham, o intento dos franceses o confirma, pois se com a ambição do ouro investiram os primeiros as minas e os segundos o Rio de Janeiro”, concluia que seria acerto deixar as riquezas no Brasil “somente enquanto as frotas as não transportam para o reino”, porque se é arriscado deixar “crescer muito o vizinho”, não menos perigoso é permitir que os vassalos fiquem poderosos68 68 “Informe do Provedor da Casa da Moeda” de 11 de março de 1711. BNP, Cód. 9860, Doc. 28. Se o título indica uma data, ao final do texto se indica outra: “Lisboa, 19 de fevereiro de 1711”. A dissertação de Rafael da Silva Coelho (2013) corrobora a opinião de que o aumento do meio circulante favoreceria a posição dos proprietários rurais. .

O segundo documento, infelizmente de autoria e data desconhecidas, mas ao que tudo indica do período aqui tratado, também relaciona o problema da moeda com a questão colonial. Para seu autor, as Casas da Moeda seriam “contrárias às máximas das mais nações de Europa”, pois não se admitia que, nas “suas conquistas”, corressem “outro dinheiro mais do que o provincial”, de baixo valor, e tal política teria como objetivo “que os seus habitantes conservem sempre o amor as suas pátrias aonde nasceram” e fossem “sempre dela dependentes”. Portugal, portanto, deveria procurar atrair por todos os meios “a si este precioso metal, evitando a que dele se façam tesouros no Brasil”, arriscando que os moradores “se façam independentes do reino”, o que não aconteceria “não havendo moeda corrente no Brasil, porque assim todos os cabedais para ele [Reino] se remeterão e aonde a galinha tem os ovos terá os olhos”69 69 “Parecer acerca das casas da moeda nos portos do Brasil e conquistas”. BNP, Coleção Pombalina, 738, fl. 271. .

O terceiro documento, contudo, é o mais significativo, tendo sido escrito em 1716 por João e Paulo Martins, catalães radicados em Portugal, a pedido do Marquês da Fronteira, vedor da Fazenda. Foi analisado pelo Conselho Ultramarino em 1717 e, seguindo as razões dadas pelo Marquês de Angeja, foi contrário à extinção das casas da moeda da Bahia e do Rio de Janeiro, conforme sugestão dos autores70 70 “Consulta do Conselho Ultramarino” de 15 de março de 1717. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 97, p. 55. Registre-se que os autores estariam então interessados na fundação de uma companhia de comércio para o Oriente destinada ao comércio com o Brasil. Ver Virgínia Rau e Maria Fernanda Gomes da Silva (1958, p. 168, 172, 173). .

Para os autores, ainda, as conquistas ultramarinas, “valendo a razão por autoridade, são patrimônio de primeira ordem del Rei; e de segunda dos vassalos, primitivos”, ou seja, os do Reino, “é justo que de um e do outro sejam logradas”. As conquistas podem ser aproveitadas pelo monarca de várias formas, mas aos vassalos apenas pelo comércio. Tal comércio, porém, deve ser dirigido “em utilidade dos indivíduos do Reino por ser um direito adquirido sobre a coisa que o causa”.

Para tanto, segundo as máximas da política mercantil, “a condução dos gêneros das conquistas para o Reino” deveria ocorrer “na forma mais simples possível e sem mudar espécie”, logo o ouro deveria ser remetido em barra e nunca em moeda. Dessa forma se logram “duas utilidades grandes do Reino, filhas do bom governo”. A primeira, “lograr os frutos sobejos das conquistas, com a porção menor possível da substância do Reino”, e a segunda, “que as manufaturas a eles necessárias sejam ocupação do Reino e não das conquistas”. Logo, a Coroa, com base na “razão de Estado”, deveria prevenir todos os possíveis acasos.

Em passagem que lembra as considerações de Antonio Rodrigues da Costa, os autores apontam que os inimigos externos, valendo-se da força e da astúcia, “poderão também alguma vez superar no Brasil a fidelidade dos vassalos, não sendo impossível outra expedição muito mais robusta que a dos franceses no Rio de Janeiro”.

Prevenir tal situação exigiria uma política para a conservação da monarquia e “como o Brasil dá contínua riqueza a forma deve ser um continuo uso de recolher a substância das forças para o centro, que a respeito da monarquia é o reino, e a respeito do reino é a corte”. E o modo de consegui-la, “sem violência”, era através do comércio, “bastando ele para equilibrar a substância do Brasil, com a vontade Del Rei, nutrindo-se a um tempo o reino da mesma substância”.

Dessa forma as Casas da Moeda no Brasil favoreceriam a sua riqueza, “pela lei que dão ao ouro, e pela consequência da mesma lei, que é sujeitar ao Brasil o comércio do reino, contra o direito adquirido dos vassalos do reino sobre o comércio do Brasil”. Atenuando-se o Reino e nutrindo-se o Brasil, quando o que se deveria buscar era “o efeito contrário, pela importância de recolher a substância das forças que é o sangue das minas ao coração da monarquia que é o reino”, daí, para os autores, ser conveniente “tirar as casas da moeda do Brasil e deixar o ouro comerciável, como os outros gêneros”71 71 João e Paulo Martins. “As Casas da Moeda no Brasil são o assunto deste papel...”. BN, Cód. 1552, fl. 185; Cód. 1539, fl. 219 e Cód. 9860, Doc. 24. As três cópias apresentam pequenas variações, ainda que o nome dos autores só apareça no último dos indicados. Todas as citações dos parágrafos anteriores foram retiradas da primeira das cópias .

E qual seria a visão na época dos vassalos coloniais? Laura de Mello e Souza (2006, p.102)SOUZA, Laura de Mello e. >A conjuntura crítica no mundo luso-brasileiro de inícios do século XVIII. In: . sol e a sombra: política e administração na América portuguesa do século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2006., analisando as obras de Antonil, Rocha Pita e Nuno Marques Pereira, apontou “que a ideia de unidade ganhava os discursos antes de ecoar nas práticas políticas, ainda contidas em motins circunscritos”. De toda forma, para além do problema da unidade das partes do Brasil, a conjuntura crítica não teria também permitido aos vassalos coloniais avançar na compreensão da dinâmica colonial?

A emblemática derrubada do pelourinho do Recife por “mamelucos emplumados”, durante a Guerra dos Mascates em Pernambuco, pode ser entendida como uma primeira manifestação, ainda que embrionária e regional, da consciência de uma alteridade entre os portugueses de “cá” (“da terra”) e de “lá” (“reinóis”, especialmente mercadores), que também estariam presentes na guerra dos emboabas, ainda que em sentido mais restrito, opondo paulistas de um lado e forasteiros de todas as procedências de outro72 72 Sobre a questão da identidade colonial, ver, entre outros, Stuart Schwartz (2003, p. 217) e as observações de Adriana Romeiro (2001, p. 209). .

No mesmo sentido, os “capítulos” escritos pelos senhores de engenho de Olinda, que reivindicavam que Sua Majestade concedesse “porto franco para duas naus, uma de Inglaterra, outra de Holanda, fora do corpo da frota”, além de escravos com preço limitado, moeda provincial e que as dívidas do setor produtivo não fossem executadas nos bens dos proprietários, mas apenas em parte da safra, também poderiam ser vistos como uma primeira tomada de consciência da exploração colonial. Ainda que nesse momento o alvo das críticas fosse o grupo mercantil reinol, agentes privilegiados da dinâmica colonial73 73 Os “capítulos” aparecem em duas narrativas, escritas na perspectiva dos moradores do Recife. Manuel dos Santos. Calamidades de Pernambuco [1712 e versão definitiva 1749]. Recife: Governo de Pernambuco, 1986, p. 54; e “Relação do levante que houve em Pernambuco e do que nele sucedeu depois de um tiro que deram ao governador Sebastião de Castro e Caldas” [1710] no periódico Brasília, Coimbra, IEB-FLUC, 1951, v. VI, p. 305. Sobre essas narrativas, ver Evaldo Cabral de Mello (1995, p. 455 et seq.) .

A própria experiência da conjuntura crítica entre os vassalos do Brasil teria contribuído também para a conformação a longo prazo dessa consciência, a partir das releituras daqueles eventos que marcaram época. Exemplo disso é o depoimento de Antonio Carlos na prisão após a Revolução de 1817 em Pernambuco, quando, traçando um paralelo entre os eventos, explicava que uma “nobreza numerosa e orgulhosa não podia sofrer com paciência a preferência que o antigo sistema colonial dava a homens sem nascimento, virtudes ou mérito [os mercadores] aos antigos nobres dela”, explodindo “este desgosto em guerras civis no ano de 1710 a que seguiu-se o abatimento da nobreza”74 74 “Perguntas a Antonio Carlos Ribeiro de Andrada Machado”, na prisão em Salvador em 1818. RIHGB, 1867, t. XXX, t. I, p. 113; e citação, p. 142. .

As riquezas do Brasil apresentadas por Antonil, que justificariam a supressão da obra75 75 Sobre o papel de Antonio Rodrigues da Costa na supressão da obra de Antonil, ver: Cf. ANTONIL, André João; SILVA, Andrée M. D. (ed.) (2001 [1711], p. 53); os comentários de Laura de Mello e Souza (2006, p. 98); e ainda a obra de Matteo Giuli, L’opulenza del Brasile coloniale (2021, p. 174-176). , a visão favorável aos senhores de engenhos de Rocha Pita (1976 [1730], p. 247 et seq.)PITA, Sebastião da Rocha Pita. História da América Portuguesa. Belo Horizonte: Itatiaia, 1976 [1730]. e Evaldo Cabral de Mello (1995, p. 455)MELLO, Evaldo Cabral de. A fronda dos mazombos: nobres contra mascates, Pernambuco, 1666-1715. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. ou ainda o fato de Nuno Marques Pereira (1936 [1728], p. 243)PEREIRA, Nuno Marques. Compêndio narrativo do Peregrino da América. 6. ed. completa com a 2ª parte inédita. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 1939 [1728]. v. 1. exemplificar o mandamento do “não roubarás” com um comerciante reinol em busca do enriquecimento seriam fragmentos desse longo processo de tomada de consciência da condição colonial, para o qual a conjuntura crítica teria contribuído ainda que a longo prazo.

Os eventos da conjuntura crítica do mundo luso-brasileiro foram assim uma importante lição para os agentes históricos que os presenciaram. Se entre os moradores do Brasil a percepção limitou-se à defesa dos interesses locais e, especialmente em Pernambuco, a uma primeira compreensão dos efeitos da dinâmica colonial, atribuídos à força econômica dos mercadores reinóis, foi, contudo, entre os observadores metropolitanos que, acompanhando os eventos de um ponto de observação privilegiado, a reflexão foi mais densa.

Parece-nos fundamental apontar como em Portugal, naqueles primeiros anos do século XVIII, refletindo a experiência da chamada conjuntura crítica e também apropriando-se de reflexões externas76 76 Nenhum dos textos aqui analisados indica possíveis referências teóricas, valendo-se, contudo, em alguns casos, das práticas adotadas pelas demais potências. , que ia se difundindo entre setores próximos da administração régia e ainda entre parcelas dos agentes mercantis a percepção de que a crescente riqueza do Brasil poderia trazer riscos aos interesses do Reino, seja pela ação dos moradores do Brasil, seja pela ameaça externa ou ainda pela reunião das duas, bem como se ia avançando, de uma forma até então desconhecida, a compreensão de que as tais riquezas deveriam reverter a favor de Portugal e em benefício dos vassalos do Reino, ainda que em prejuízo dos vassalos do Brasil, dados os mecanismos do comércio colonial.

  • 1
    Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e a bibliografia utilizadas são referenciadas. Vários colegas contribuíram com críticas e sugestões, porém, na impossibilidade de citar todos, gostaria de agradecer em especial ao professor Thiago Nascimento Krause. Também gostaria de agradecer àqueles que contribuíram no processo de preparação dos originais: Natalia Tammone, Gilberto dos Santos, Guilherme da Rocha Freitas e Neusa Monteferrante.
  • 3
    “Sobre os papéis que se ofereceram de arbítrios acerca das minas para com eles se segurarem os interesses da Fazenda real e se pôr em melhor forma o governo daquelas terras”, de 17 de julho de 1709. AHU-MG, Cx. 1, Doc. 13. Publicada com pequenas alterações em BN. Documentos Históricos, 1951, v. 93, p. 219.
  • 4
    Sobre o tema, ver Adriana Romeiro (2008)ROMEIRO, Adriana. Paulistas e emboabas no coração das minas. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2008. e, numa perspectiva mais alargada, Laura de Mello e Souza (1986)SOUZA, Laura de Mello e. Desclassificados do ouro: a pobreza mineira no século XVIII. 2. ed. São Paulo: Graal, 1986 [1982]..
  • 5
    A Guerra da Sucessão Espanhola, incluindo as negociações diplomáticas anteriores e posteriores, que redundaram na Paz de Utrecht, tem vasta bibliografia. Indicamos aqui apenas o livro de José Luis Cardoso (2003)CARDOSO, José Luis Cardoso et al. O Tratado de Methuen: diplomacia, guerra, política e economia. Lisboa: Livros Horizonte, 2003, que aborda vários aspectos do envolvimento de Portugal no Conflito. Para uma visão de conjunto, veja-se Joaquim Albareda Salvadó (2014)ALBAREDA I SALDÓ, Joaquim. La guerra de sucesión de España: (1700-1714). Barcelona: Crítica, 2014..
  • 6
    Ambos os textos têm o grande mérito de tentar pensar as revoltas do período em conjunto, abrindo novas perspectivas de análise.
  • 7
    “Do Conselho Ultramarino a S. M., no ano de 1732, feita pelo conselheiro Antonio Rodrigues da Costa”. Revista do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro, 3. ed., Rio de Janeiro, 1931[1845], T. VII, p. 475.
  • 8
    Registro ainda, entre outras, a obra de Miguel Dantas da Cruz (2015)CRUZ, Miguel Dantas da. Um império de conflitos: o Conselho Ultramarino e a defesa do Brasil. Lisboa: ICS, 2015., na qual também se destaca a figura de Antonio Rodrigues da Costa, sendo, ao mesmo tempo, uma referência para a própria história do Conselho Ultramarino.
  • 9
    Dessa época, veja-se, por exemplo, o parecer de sua autoria sobre as alianças preliminares à Guerra da Sucessão Espanhola. “Parecer de Antonio Rodrigues da Costa, oficial-maior da Secretária de Estado, ano de 1701”. BA, Cód. 51 – VI – 34, fl. 95.
  • 10
    Recebeu o “lugar de conselheiro ultramarino de capa e espada” em 1707, mas só assumiu o posto em 15 de fevereiro de 1709, quando de seu retorno da embaixada à Áustria. Cf. Registro Geral de Mercês, D. João V. ANTT, L. 1, fl. 250.
  • 11
    A melhor biografia de Antonio Rodrigues da Costa nos é dada por Diogo Barbosa Machado (1965 [1741])MACHADO, Diôgo Barbosa. Bibliotheca lusitana. Coimbra: Atlândida, 1965 [1741]. v. I.. Veja-se também o relato de Antonio Rodrigues da Costa sobre a primeira missão: Embaixada que fez o excelentíssimo Senhor Conde de Villar-Maior… Lisboa: Miguel Manescal, 1694COSTA, Antonio Rodrigues da. Embaixada que fez o excelentíssimo Senhor Conde de Villar-Maior… Lisboa: Miguel Manescal, 1694..
  • 12
    Veja-se o regimento do Conselho, publicado por Marcelo Caetano (1969, p. 65)CAETANO, Marcelo. O Conselho Ultramarino, esboço de sua história. Rio de Janeiro, Sá Cavalcante, 1969 [1967].. Na listagem dos conselheiros, apresentada na obra, a data do ingresso, 5 de janeiro de 1707, é a que corresponde à nomeação e não ao exercício efetivo do posto.
  • 13
    “Sobre os papéis que se ofereceram de arbítrios acerca das minas para com eles se segurarem os interesses da Fazenda real e se pôr em melhor forma o governo daquelas terras”, de 17 de julho de 1709. BN, Documentos Históricos, 1951, v. 93, p. 219.
  • 14
    Ibid., p. 221-222.
  • 15
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 9 de dezembro de 1712. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 87Documentos Históricos. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, v. 11 (1929), v. 39 (1938), v. 40 (1938), v. 41 (1938), v. 42 (1938), v. 43 (1939), v. 44 (1939), v. 45 (1939), v. 54 (1941), v. 55 (1942), v. 70 (1945), v. 71 (1946), v. 84 (1949), v. 85 (1949), v. 86 (1949), v. 93 (1951), v. 95 (1952), v. 96 (1952), v. 97 (1952), v. 98 (1952)..
  • 16
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 27 de março de 1713. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 41; as citações estão na página 51.Documentos Históricos. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, v. 11 (1929), v. 39 (1938), v. 40 (1938), v. 41 (1938), v. 42 (1938), v. 43 (1939), v. 44 (1939), v. 45 (1939), v. 54 (1941), v. 55 (1942), v. 70 (1945), v. 71 (1946), v. 84 (1949), v. 85 (1949), v. 86 (1949), v. 93 (1951), v. 95 (1952), v. 96 (1952), v. 97 (1952), v. 98 (1952).
  • 17
    Ibid., p. 42.
  • 18
    Ibidem.
  • 19
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 15 de abril de 1711 e outra de 15 de dezembro de 1714. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 17 e 142Documentos Históricos. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, v. 11 (1929), v. 39 (1938), v. 40 (1938), v. 41 (1938), v. 42 (1938), v. 43 (1939), v. 44 (1939), v. 45 (1939), v. 54 (1941), v. 55 (1942), v. 70 (1945), v. 71 (1946), v. 84 (1949), v. 85 (1949), v. 86 (1949), v. 93 (1951), v. 95 (1952), v. 96 (1952), v. 97 (1952), v. 98 (1952)..
  • 20
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 2 de maio de 1716. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 231.Documentos Históricos. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, v. 11 (1929), v. 39 (1938), v. 40 (1938), v. 41 (1938), v. 42 (1938), v. 43 (1939), v. 44 (1939), v. 45 (1939), v. 54 (1941), v. 55 (1942), v. 70 (1945), v. 71 (1946), v. 84 (1949), v. 85 (1949), v. 86 (1949), v. 93 (1951), v. 95 (1952), v. 96 (1952), v. 97 (1952), v. 98 (1952).
  • 21
    Cf. “Consulta do Conselho Ultramarino” de 17 de dezembro de 1712. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 98, p. 123Documentos Históricos. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, v. 11 (1929), v. 39 (1938), v. 40 (1938), v. 41 (1938), v. 42 (1938), v. 43 (1939), v. 44 (1939), v. 45 (1939), v. 54 (1941), v. 55 (1942), v. 70 (1945), v. 71 (1946), v. 84 (1949), v. 85 (1949), v. 86 (1949), v. 93 (1951), v. 95 (1952), v. 96 (1952), v. 97 (1952), v. 98 (1952). et seq.
  • 22
    Sobre a Guerra dos Mascates, além da clássica obra de Evaldo Cabral de Mello (1995)MELLO, Evaldo Cabral de. A fronda dos mazombos: nobres contra mascates, Pernambuco, 1666-1715. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. e dos trabalhos citados de Laura de Mello e Souza, gostaríamos de indicar Rodrigo Bentes Monteiro (2002)MONTEIRO, Rodrigo Bentes. O Doce perdão. In: MONTEIRO, Rodrigo Bentes. O rei no espelho: a monarquia portuguesa e a colonizac̜ão da América, 1640-1720. São Paulo: Editora Hucitec, 2002, p. 231-277. e Breno Lisboa (2016)LISBOA, Breno. Todo o cuidado e vigilância com um dos principais domínios de Vossa Majestade. In: LISBOA, Breno et al. Essa parte tão nobre do corpo da monarquia: poderes, negócios e sociabilidades em Pernambuco colonial (séculos XVI-XVIII). Recife: UFPE, 2016, p. 265-287.; destaque-se que o título desta última obra é uma frase de Antonio Rodrigues da Costa.
  • 23
    Dentre os papéis de Felix Machado, governador de Pernambuco, encarregado de restabelecer o controle da situação, encontra-se a cópia de uma carta, infelizmente sem autor e data, mas que expressa a difusão da ideia de um possível acordo com à França. O autor avaliava que os responsáveis seriam “dez ou até doze homens que hão de ser dos menos afazendados e dos que se acham maiores dívidas aos mercadores” do Recife e que para se “livrarem dos seus credores, procurando juntamente melhorar de fortuna, são mais capazes de concorrer para qualquer traição e de oferecerem a França aquelas capitanias, sem que nisso tenha parte a mais nobreza e povo”. No mesmo códice, sobre a exigência de pactos, vejam-se as anotações de Felix Machado feitas ainda em Portugal, nas quais ele registrava a dúvida: “Se não me quiserem receber senão com algumas capitulações, se hás hei de conceder e quais serão as mais largas que se lhe podem permitir”. BNP, Coleção Pombalina, 526, fls. 220 e 233 respectivamente.
  • 24
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 11 de dezembro de 1714. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 98, p. 222Documentos Históricos. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, v. 11 (1929), v. 39 (1938), v. 40 (1938), v. 41 (1938), v. 42 (1938), v. 43 (1939), v. 44 (1939), v. 45 (1939), v. 54 (1941), v. 55 (1942), v. 70 (1945), v. 71 (1946), v. 84 (1949), v. 85 (1949), v. 86 (1949), v. 93 (1951), v. 95 (1952), v. 96 (1952), v. 97 (1952), v. 98 (1952).; a citação encontra-se na página 231.
  • 25
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 26 de abril de 1714. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 98, p. 216Documentos Históricos. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, v. 11 (1929), v. 39 (1938), v. 40 (1938), v. 41 (1938), v. 42 (1938), v. 43 (1939), v. 44 (1939), v. 45 (1939), v. 54 (1941), v. 55 (1942), v. 70 (1945), v. 71 (1946), v. 84 (1949), v. 85 (1949), v. 86 (1949), v. 93 (1951), v. 95 (1952), v. 96 (1952), v. 97 (1952), v. 98 (1952)..
  • 26
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 12 de maio de 1713. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 98, p. 194; a citação encontra-se na página 196.
  • 27
    “Do Conselho Ultramarino a S. M., no ano de 1732, feita pelo conselheiro Antonio Rodrigues da Costa”. RIHGB, 3ª ed., Rio de Janeiro, 1931[1845], T. VII, p. 477Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: IHGB, t. VII (1931[1845]), t. XXX (1867)..
  • 28
    “Carta do Marquês de Angeja para D. Lourenço de Almeida, governador de Pernambuco” de 24 de setembro de 1716. BN, Documentos Históricos, 1938, v. 40, p. 88.
  • 29
    “Do Conselho Ultramarino a S. M., no ano de 1732, feita pelo conselheiro Antonio Rodrigues da Costa”. RIHGB, 3ª ed., Rio de Janeiro, 1931[1845], T. VII, p. 477Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: IHGB, t. VII (1931[1845]), t. XXX (1867)..
  • 30
    Ibidem, p. 482. Ideias que lembram muito a também conhecida passagem sobre uma possível ida da Corte de Portugal para o Brasil de D. Luís da Cunha (2001 [Século XVIII], p. 371)CUNHA, Luís da; SILVA, Abílio Diniz (ed.). Instruções políticas. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2001 [Séc. XVIII].. Registre-se também o interessante comentário sobre o tema feito por Adriana Romeiro (2001, p. 160)ROMEIRO, Adriana. Um visionário na corte de D. João V: revolta e milenarismo nas Minas Gerais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001..
  • 31
    “Sobre os papéis que se ofereceram de arbítrios acerca das minas para com eles se segurarem os interesses da Fazenda real e se pôr em melhor forma o governo daquelas terras”, de 17 de julho de 1709. BN, Documentos Históricos, 1951, v. 93; todas as citações dos parágrafos anteriores estão entre as páginas 225 e 228.
  • 32
    Sobre o tema, veja-se o clássico de Eli Heckscher (1943)HECKSCHER, Eli. La época mercantilista. México: Fondo de Cultura Económica, 1943. e o trabalho de Steve Pincus (2012)PINCUS, Steve. Rethinking mercantilism: political economy, the British Empire, and the Atlantic world in the seventeenth and eighteenth centuries. The William and Mary Quarterly, v. 69, n. 1, p. 3-34, Jan. 2012..
  • 33
    Curiosamente na famosa “consulta-testamento”, já citada, o autor não trata das questões econômicas aqui analisadas.
  • 34
    José Calvet de Magalhães (1967)MAGALHÃES, José Calvet de. História do pensamento económico em Portugal, da Idade-Média ao mercantilismo. Coimbra: Coimbra Editora, 1967., José Luís Cardoso (2003)CARDOSO, José Luis Cardoso et al. O Tratado de Methuen: diplomacia, guerra, política e economia. Lisboa: Livros Horizonte, 2003 e António Sérgio (1974)SÉRGIO, António et al. (ed.). Antologia dos economistas portugueses (século XVII). Lisboa: Sá da Costa, 1974..
  • 35
    O texto foi publicado tardiamente, aparecendo pela primeira vez em de Duarte Ribeiro de Macedo (1817)MACEDO, Duarte Ribeiro de; CAMINHA, Antonio Lourenço (ed.). Obras inéditas de Duarte Ribeiro de Macedo... Lisboa: Impressão Regia, 1817. e posteriormente por António Sérgio (1974)SÉRGIO, António et al. (ed.). Antologia dos economistas portugueses (século XVII). Lisboa: Sá da Costa, 1974.. A citação encontra-se respectivamente nas páginas 92 e 223 com ligeiras diferenças.
  • 36
    Dados os limites deste trabalho, indico apenas Carl Hanson (1986)HANSON, Carl. Economia e sociedade no Portugal barroco, 1668-1703. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1986. e José Luis Cardoso et al. (2003)CARDOSO, José Luis Cardoso et al. O Tratado de Methuen: diplomacia, guerra, política e economia. Lisboa: Livros Horizonte, 2003.
  • 37
    Novamente é possível perceber a confluência de ideias com D. Luís da Cunha (2001 [século XVIII], p. 295)FIGUEIREDO, Luciano. O Império em apuros: notas para o estudo das alterações ultramarinas e das práticas políticas no império colonial português, séculos XVII e XVIII. In: FURTADO, Júnia (org.). Diálogos oceânicos: Minas Gerais e as novas abordagens para uma história do império ultramarino português. >Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001, >p. 197-254..
  • 38
    “Resposta do Rei” de 7 de novembro de 1709. AHU-MG, Cx. 1, Doc. 14.
  • 39
    O navegante inglês Dampier de passagem por Salvador em 1699 é testemunha desse quadro: “são raríssimos os navios ingleses que aportam aqui – antes de nós, havia 11 ou 12 anos que não ancorava um só navio inglês no porto” (DAMPIER, 2006DAMPIER, William. A voyage to new Holland, &c. in the year, 1699... >Stroud: Nonsuch, 2006 [1703]. [1703], p. 67) e um ou dois comerciantes franceses e outro holandês que lá encontrara tinham ido ao Brasil em navios portugueses. O relato sobre o Brasil pode ser visto ainda em Jean Marcel França (2012, p. 460)FRANÇA, Jean Marcel. A construção do Brasil na literatura de viagem dos séculos XVI, XVII e XVIII: antologia de textos, 1591-1808. Rio de Janeiro: José Olympio; São Paulo: Unesp, 2012. de que extraímos a tradução. Charles Boxer, em artigo sobre o comércio inglês com Portugal na primeira metade do século XVIII, corrobora tal apreciação, fornecendo vários testemunhos ingleses, tanto para a importância do comércio via Portugal como para as dificuldades colocadas para o contato direto com o Brasil. Bom exemplo dessa situação é o relato de Lumley, enviado britânico em Lisboa, para o secretário de Estado, Lord Carteret, em 1723, no qual afirmava, com algum exagero: “I can venture to assure your lordship that in all Brazil there is not above one British house established”, salvo alguns ingleses e irlandeses católicos “as such, who are of no consideration, and may be placed there to evade our Treaty and to prevent any of His Majesty’s Protestant subjects and substantial traders, from reaping the benefit of it” (apud BOXER, 1969BOXER, Charles. Brazilian gold and british traders in the first half of the eighteenth century. The Hispanic American Review, v. 49, n. 3, 1969, p. 454-472. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/2511780?origin=crossref&seq=1. Acesso em: 16 maio 2022. Doi: https://doi.org/10.2307/2511780.
    https://www.jstor.org/stable/2511780?ori...
    , p. 463). Ver ainda Carlos Gabriel Guimarães (2017)GUIMARÃES, Carlos Gabriel. Os ingleses no Rio de Janeiro na primeira metade do século XVIII: o caso da família Gulston, c. 1710 – c.1720 – primeiras impressões. In: MATHIAS, Carlos Leonardo Kelmer et al. Ramificações ultramarinas: sociedades comerciais no âmbito do Atlântico luso, século XVIII. Rio de Janeiro: Mauad, 2017, p. 93-114. e Rodrigo Ricupero (2017)RICUPERO, Rodrigo. O Exclusivo metropolitano no Brasil e os tratados diplomáticos de Portugal com a Inglaterra (1642-1661). Revista de História, n. 176, p. 01-33, 2017. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/revhistoria/article/view/117515. Acesso em: 16 maio 2022. Doi: 10.11606/issn.2316-9141.rh.2017.117515.
    https://www.revistas.usp.br/revhistoria/...
    .
  • 40
    “Representação da Mesa do Bem Comum do Comércio” de 4 de julho de 1715. Documento anexo da “Consulta do Conselho Ultramarino ao rei D. João V sobre o que informa o vice-rei e governador-geral, Marquês de Angeja, acerca da introdução do comércio dos estrangeiros nas conquistas” de 17 de julho de 1715. AHU-BA, Cx. 10, Doc. 797. A consulta sem os anexos encontra-se nos BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 175.
  • 41
    “Sobre os papéis que se ofereceram de arbítrios acerca das minas para com eles se segurarem os interesses da Fazenda real e se pôr em melhor forma o governo daquelas terras”, de 17 de julho de 1709. BN, Documentos Históricos, 1951, v. 93, p. 227.
  • 42
    Ver Charles Boxer (1969)BOXER, Charles. Brazilian gold and british traders in the first half of the eighteenth century. The Hispanic American Review, v. 49, n. 3, 1969, p. 454-472. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/2511780?origin=crossref&seq=1. Acesso em: 16 maio 2022. Doi: https://doi.org/10.2307/2511780.
    https://www.jstor.org/stable/2511780?ori...
    , Carlos Gabriel Guimarães (2017)GUIMARÃES, Carlos Gabriel. Os ingleses no Rio de Janeiro na primeira metade do século XVIII: o caso da família Gulston, c. 1710 – c.1720 – primeiras impressões. In: MATHIAS, Carlos Leonardo Kelmer et al. Ramificações ultramarinas: sociedades comerciais no âmbito do Atlântico luso, século XVIII. Rio de Janeiro: Mauad, 2017, p. 93-114. e Maria Julia de Oliveira Silva (1992)SILVA, Maria Julia de Oliveira. Fidalgos-mercadores no século XVIII: Duarte Sodré Pereira. Lisboa: INCM, 1992..
  • 43
    Sobre o contrabando no período, ver Paulo Cavalcante (2006)CAVALCANTE, Paulo. Negócios de trapaça: caminhos e descaminhos na América Portuguesa (1700-1750). São Paulo: Hucitec, 2006. e Ernst Pijning (1997aPIJNING, Ernst. Controlling contraband: mentality, economy and society in eighteenth-century Rio de Janeiro. Tese de Doutorado, História, Baltimore: Johns Hopkins University, 1997.; 1997b)PIJNING, Ernst. Passive resistance: portuguese diplomacy of contraband trade during king John V’s reign, 1706-1750. Arquipélago (História), >Ponta Delgada, 2ª série, v. 2, 1997, p. 171-191. Disponível em: https://repositorio.uac.pt/bitstream/10400.3/468/1/ErnestPijning_p171-191.pdf>. Acesso em: 16 maio 2022.
    https://repositorio.uac.pt/bitstream/104...
    .
  • 44
    Sobre o contrabando num plano mais teórico dentro da discussão do Sistema Colonial, ver Fernando Novais. (1995 [1979], p. 84 e 91)NOVAIS, Fernando. Portugal e Brasil na crise do antigo sistema colonial (1777-1808). 6. ed. São Paulo: Hucitec, 1995 [19٧9].. Gustavo Acioli Lopes (2018, p. 158)LOPES, Gustavo Acioli. A fênix e o Atlântico: a capitania de Pernambuco e a economia-mundo europeia (1654-1750). São Paulo: Alameda, 2018. lembra que o contrabando “tornava-se atraente, porque lucrativo, devido à intensificação do exclusivo metropolitano”.
  • 45
    Tais dados foram coligidos da “Coleção das leis e ordens que proíbem os navios estrangeiros, assim os de guerra, como os mercantes nos portos do Brasil”, provavelmente organizada na década de 1760. AHU, Cód. 1193. A coleção enviada pelo Marquês de Pombal, então Conde de Oeiras, para o Marquês do Lavradio em 1769, na altura de sua nomeação para o Vice-Reinado, indicaria outros números, mas sem alterar a preponderância de ordens da segunda década; veja-se Marcos Carneiro de Mendonça (1960, p. 82)MENDONÇA, Marcos Carneiro de Mendonça. O Marquês de Pombal e o Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1960.. Outra “coleção de leis” sobre o tema, possivelmente organizado localmente, encontra-se no Códice “Informação geral da Capitania de Pernambuco” de 1749, publicado no volume 28 dos Anais da Biblioteca Nacional. BN, 1908Anais da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1908. v. 30., v. XXX, p. 216 et seq., cujo original ou outra cópia podem ser vistos em ANTT, Manuscritos do Brasil, v. 43.
  • 46
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 22 de dezembro de 1802. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 95, p. 168.
  • 47
    Ver no volume 2, p. 251, 269 e 275. Visconde de Borges de Castro. Collecção dos Tratados, Convenções, Contratos e Actos Públicos celebrados entre a Corôa de Portugal e as mais potências desde 1640, 8 v. Lisboa: Imprensa Nacional, 1856-8BORGES DE CASTRO, José Ferreira. Collecção dos tratados, convenções, contratos e actos publicos celebrados entre a Coroa de Portugal e as mais potencias desde 1640 até o presente... Lisboa: Imprensa Nacional, 1856-8. 8 v., continuada por Julio Biker, Suplemento à Collecção dos Tratados..., 24 v. Lisboa: Imprensa Nacional, 1872-80BIKER, Julio Firmino Judice. Supplemento á collecção dos tratados, convenções, contratos e actos publicos celebrados entre a corôa de Portugal e as mais potencias desde 1640 até o presente... Lisboa: Imprensa Nacional, 1872-80. 22 v..
  • 48
    Ver a “Nota de Robert Walpole e contra-nota [escrita pelo Marquês de Pombal], seguidas de vários documentos sobre o tema de 1772 e de anos seguintes”. BNP, Coleção Pombalina, Cód. 638 – Miscelânea, fl. 207 et seq.
  • 49
    Veja-se, por exemplo, Josep Maria Delgado (2015)DELGADO, Josep Maria. El impacto de Utrecht en la organización del comercio colonial español (1713-1739). In: ALBAREDA, Joaquim (ed.). El declive de la monarquia y del imperio español – los tratados de Utrecht (1713-1714). Barcelona: Crítica, 2015. e Fernando Novais (1995 [1979], p. 84)NOVAIS, Fernando. Portugal e Brasil na crise do antigo sistema colonial (1777-1808). 6. ed. São Paulo: Hucitec, 1995 [19٧9]..
  • 50
    “Consulta do Conselho Ultramarino de 24 de julho de 1715”. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 175; as citações encontram-se na página 186.
  • 51
    “Carta de Ofício” de 15 de setembro de 1716, Londres. BNP, Cód. 1608 – Cartas de D. Luís da Cunha (1716-1718), fl. 121. “Golston” ou Gulston é o nome da família inglesa estudada por Carlos Gabriel Guimarães (2017, p. 93)GUIMARÃES, Carlos Gabriel. Os ingleses no Rio de Janeiro na primeira metade do século XVIII: o caso da família Gulston, c. 1710 – c.1720 – primeiras impressões. In: MATHIAS, Carlos Leonardo Kelmer et al. Ramificações ultramarinas: sociedades comerciais no âmbito do Atlântico luso, século XVIII. Rio de Janeiro: Mauad, 2017, p. 93-114.. Sobre o tema, ver também Charles Boxer (1969, p. 462)BOXER, Charles. Brazilian gold and british traders in the first half of the eighteenth century. The Hispanic American Review, v. 49, n. 3, 1969, p. 454-472. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/2511780?origin=crossref&seq=1. Acesso em: 16 maio 2022. Doi: https://doi.org/10.2307/2511780.
    https://www.jstor.org/stable/2511780?ori...
    .
  • 52
    “Ofício de 12 de janeiro de 1730”. ANTT, Ministério dos Negócios Estrangeiros, L. 795 – Cartas de D. Luís da Cunha para a Corte e outras pessoas do serviço de SM escritas em Haia no ano de 1728, 1729 e 1730, fl. 1 do ano de 1730, a citação encontra-se na fl. 26. Registre-se que, embora o embaixador na altura negociasse com os holandeses a questão sobre o tráfico na Costa da Mina, dele não podemos tratar, dados os limites deste texto. Veja-se, sobre a questão, Pierre Verger (1988)VERGER, Pierre. Fluxo e refluxo do tráfico de escravos entre o Golfo de Benin e a Bahia de Todos os Santos. Salvador: Corrupio, 1987. e Gustavo Acioli Lopes (2018)LOPES, Gustavo Acioli. A fênix e o Atlântico: a capitania de Pernambuco e a economia-mundo europeia (1654-1750). São Paulo: Alameda, 2018.; destaco ainda que Lopes (2018, p. 103) apresenta a opinião de Antonio Rodrigues da Costa sobre o contrabando nessa região.
  • 53
    A Mesa do Bem Comum do Comércio não tinha dúvida sobre a falsa alegação da maioria dos navios arribados: “Rara vez ou nunca nau partida da Europa para as mesmas Índias [Orientais] se viu arribada em a nossa América [antes dos descobrimentos auríferos], porque as nações inglesa, holandesa ou francesa abundantes de navios, costumam fazer esta navegação com um número de gente tão proporcionado à capacidade de cada navio, que sempre superabundam os mantimentos ao necessário sustento da gente com que o navegam e mais ainda até a altura do Brasil, onde comumente chegam com breve viagem pela inalterável observância de partirem da Europa em conhecidas monções”. “Parecer do Conselho Ultramarino sobre as causas de que nascem os excessos da saca da moeda e as dificuldades de escoamento dos frutos do Reino”. AHU, Cx. 25, pasta 9, apud LOPES, 2018LOPES, Gustavo Acioli. A fênix e o Atlântico: a capitania de Pernambuco e a economia-mundo europeia (1654-1750). São Paulo: Alameda, 2018., p. 116.
  • 54
    Seria impossível apresentar com detalhes as informações encontradas na correspondência do Governo-Geral do período aqui abordado e publicada na já referida coleção Documentos Históricos. Rio de Janeiro: BN, 1928-1955 (série original), 121ou 111 v. (2012, v. 111). Indicamos, contudo, correspondência com as capitanias do Norte: v. 39, 40, 84, 85, 86; com as capitanias do Sul: v. 11, 70 e 71, correspondência com a própria capitania da Bahia e anexas: v. 40, 41, 42, 43, 44, 45 e 71; e, ainda, as Portarias v. 54, 55 e 70.
  • 55
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 19 de janeiro de 1715; “Consulta do Conselho Ultramarino” de 21 de abril de 1716. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 150 e p. 228, respectivamente.
  • 56
    “Carta para o governador do Rio de Janeiro, Francisco de Távora” de 3 de dezembro de 1715. BN, Documentos Históricos, 1945, v. 70, p. 267.
  • 57
    Do verbo “trebucar”, ou seja “emborear-se o batel, voltar-se sobre um lado e alagar-se” (SILVA, 1823SILVA, António Moraes e. Diccionário da Lingua Portugueza. 3. ed. Lisboa: Lacerda, 1823. 2 v.).
  • 58
    “Carta para o Conde de Assumar” de 18 de março de 1717. BN, Documentos Históricos, 1945, v. 70, p. 360.
  • 59
    Ver “Carta de excomunhão” (SILVA, 1823SILVA, António Moraes e. Diccionário da Lingua Portugueza. 3. ed. Lisboa: Lacerda, 1823. 2 v.). “Cartas escritas entre 1715 e 1717 para o governador Lourenço de Almeida”. BN, Documentos Históricos, 1938, v. 40, p. 27, 59, 73 e 90 e 1949, v. 85, p. 11; a citação encontra-se na última carta.
  • 60
    “Carta para Luís de Melo da Silva” de 18 de abril de 1717. BN, Documentos Históricos, 1946, v. 71, p. 11.
  • 61
    “Carta para o governador Lourenço de Almeida” de 30 de maio de 1715. BN, Documentos Históricos, 1938, v. 40, p. 27.
  • 62
    Ver “Carta do Marquês de Angeja para Diogo de Mendonça Corte Real” de 14 de janeiro de 1715 (RAU; SILVA, 1958RAU, Virginia; SILVA, Maria Fernanda Gomes da. Os manuscritos do arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1958. 2 v., p.131). Nessa obra também se encontram outras cartas referentes à presença de navios estrangeiros no Brasil.
  • 63
    “Carta do Marquês de Angeja para o rei D. João V” de 5 de janeiro de 1715, anexa à “Consulta do Conselho Ultramarino ao rei D. João V sobre o que informa o vice-rei e governador geral, Marquês de Angeja, acerca da introdução do comércio dos estrangeiros nas conquistas” de 17 de julho de 1715. AHU-BA, Cx. 10, Doc. 797. A consulta sem os anexos encontra-se disponível em BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 165. Sobre o tema ver também a “Consulta” de 24 de julho de 1715, p. 175 do referido volume.
  • 64
    Todas as citações se encontram na carta do Marquês de Angeja citada na nota anterior.
  • 65
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 24 de julho de 1715. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 96, p. 175, as citações encontram-se nas páginas 179 e 180.
  • 66
    A título de comparação, em consulta do Conselho da Fazenda de 1655 sobre o comércio estrangeiro, as justificativas da proibição eram as perdas do comércio português e da fazenda real, mas não se colocava o problema das desvantagens que os moradores do Brasil teriam em comprar mais caro e vender mais barato os seus gêneros. “Representação do Conselho da Fazenda” de 1655. ANTT, Manuscritos da Livraria, 1146, fls. 59-61.
  • 67
    Cf. “Representação da Mesa do Bem Comum do Comércio” de 4 de julho de 1715. AHU, Cx. 25, pasta 9, e “Carta dos deputados da Mesa [do Espírito Santo dos Homens de Negócio] ao Rei [D. João V]” de setembro de 1723. AHU, Cx. 3, Doc. 294, apud LOPES, 2018LOPES, Gustavo Acioli. A fênix e o Atlântico: a capitania de Pernambuco e a economia-mundo europeia (1654-1750). São Paulo: Alameda, 2018., p. 116 e 106.
  • 68
    “Informe do Provedor da Casa da Moeda” de 11 de março de 1711. BNP, Cód. 9860, Doc. 28. Se o título indica uma data, ao final do texto se indica outra: “Lisboa, 19 de fevereiro de 1711”. A dissertação de Rafael da Silva Coelho (2013)COELHO, Rafael da Silva. Moeda no Brasil no final do século XVII. Dissertação de Mestrado, História Econômica, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 2013. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8137/tde-26052014-120428/pt-br.php. Acesso em: 16 maio 2022. Doi:10.11606/D.8.2014.tde-26052014-120428.
    https://teses.usp.br/teses/disponiveis/8...
    corrobora a opinião de que o aumento do meio circulante favoreceria a posição dos proprietários rurais.
  • 69
    “Parecer acerca das casas da moeda nos portos do Brasil e conquistas”. BNP, Coleção Pombalina, 738, fl. 271.
  • 70
    “Consulta do Conselho Ultramarino” de 15 de março de 1717. BN, Documentos Históricos, 1952, v. 97, p. 55. Registre-se que os autores estariam então interessados na fundação de uma companhia de comércio para o Oriente destinada ao comércio com o Brasil. Ver Virgínia Rau e Maria Fernanda Gomes da Silva (1958, p. 168, 172, 173)RAU, Virginia; SILVA, Maria Fernanda Gomes da. Os manuscritos do arquivo da Casa de Cadaval respeitantes ao Brasil. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1958. 2 v..
  • 71
    João e Paulo Martins. “As Casas da Moeda no Brasil são o assunto deste papel...”. BN, Cód. 1552, fl. 185; Cód. 1539, fl. 219 e Cód. 9860, Doc. 24. As três cópias apresentam pequenas variações, ainda que o nome dos autores só apareça no último dos indicados. Todas as citações dos parágrafos anteriores foram retiradas da primeira das cópias
  • 72
    Sobre a questão da identidade colonial, ver, entre outros, Stuart Schwartz (2003, p. 217)SCHWARTZ, Stuart. A formação de uma identidade colonial no Brasil. In: Da América Portuguesa ao Brasil. Lisboa: Difel, 2003. e as observações de Adriana Romeiro (2001, p. 209)ROMEIRO, Adriana. Um visionário na corte de D. João V: revolta e milenarismo nas Minas Gerais. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001..
  • 73
    Os “capítulos” aparecem em duas narrativas, escritas na perspectiva dos moradores do Recife. Manuel dos Santos. Calamidades de Pernambuco [1712 e versão definitiva 1749]SANTOS, Manuel dos Santos. Calamidades de Pernambuco [1712 e versão definitiva 1749]. Recife: Governo de Pernambuco, 1986 [1712-49].. Recife: Governo de Pernambuco, 1986, p. 54; e “Relação do levante que houve em Pernambuco e do que nele sucedeu depois de um tiro que deram ao governador Sebastião de Castro e Caldas” [1710]ANÔNIMO. Relação do levante que houve em Pernambuco e do que nele sucedeu depois de um tiro que deram ao governador Sebastião Castro e Caldas [Publicada com uma breve introdução por M. Lopes de Almeida]. Brasília, v. VI, Coimbra, IEB-FLUC, p. 283-329, 1951 [1710]. no periódico Brasília, Coimbra, IEB-FLUC, 1951, v. VI, p. 305. Sobre essas narrativas, ver Evaldo Cabral de Mello (1995, p. 455 et seq.)
  • 74
    “Perguntas a Antonio Carlos Ribeiro de Andrada Machado”, na prisão em Salvador em 1818. RIHGB, 1867, t. XXX, t. I, p. 113; e citação, p. 142.
  • 75
    Sobre o papel de Antonio Rodrigues da Costa na supressão da obra de Antonil, ver: Cf. ANTONIL, André João; SILVA, Andrée M. D. (ed.) (2001 [1711], p. 53)ANTONIL, André João; SILVA, Andrée Mansuy-Diniz (ed.). Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e minas. Com introdução e comentários de Andrée Mansuy Diniz Silva. Lisboa: CNCDP, 2001 [1711].; os comentários de Laura de Mello e Souza (2006, p. 98)SOUZA, Laura de Mello e. >A conjuntura crítica no mundo luso-brasileiro de inícios do século XVIII. In: . sol e a sombra: política e administração na América portuguesa do século XVIII. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.; e ainda a obra de Matteo Giuli, L’opulenza del Brasile coloniale (2021, p. 174-176)GIULI, Matteo. L’opulenza del Brasile coloniale. Roma: Carocci Editore, 2021..
  • 76
    Nenhum dos textos aqui analisados indica possíveis referências teóricas, valendo-se, contudo, em alguns casos, das práticas adotadas pelas demais potências.

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Documentos referentes a Minas Gerais (AHU-MG), Projeto Resgate, Cx. 1, Docs. 13 e 14.

ANTT – Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Lisboa

Registro Geral de Mercês, D. João V, Livro 1.

Manuscritos do Brasil, v. 43.

Ministério dos Negócios Estrangeiros, Livro 795.

Manuscritos da Livraria, 1146.

BA – Biblioteca da Ajuda, Lisboa

Códice 51 – VI – 34.

BNP – Biblioteca Nacional de Portugal, Lisboa

Coleção Pombalina, 526, 638 – Miscelânea.

Códice 1608 – Cartas de D. Luís da Cunha (1716-1718).

Códice 9860.

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Editado por

Editores responsáveis

Miguel Palmeira e Stella Maris Scatena Franco

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    20 Jun 2023
  • Aceito
    05 Dez 2023
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