Open-access ESTAÇÃO MARÍTIMA DA GAMBOA: ENTRE A EXPANSÃO FERROVIÁRIA E OS MELHORAMENTOS PORTUÁRIOS NO RIO DE JANEIRO IMPERIAL (1876-1883)1

GAMBOA MARITIME STATION: BETWEEN RAILWAY EXPANSION AND PORT IMPROVEMENTS IN IMPERIAL RIO DE JANEIRO (1876-1883)

Resumo

No momento em que as ferrovias eram expandidas, a navegação a vapor generalizada e o funcionamento dos portos eram questionados em todo o país, dotar o Rio de Janeiro de uma infraestrutura capaz de integrar esses modais se tornou aspiração das classes dominantes. Apenas nesse contexto específico, a ideia de uma Estação Marítima na Corte do Império pôde se concretizar. Não havia precedentes para os esforços e recursos empenhados, tanto do governo imperial quanto da maior empresa brasileira - a Estrada de Ferro Dom Pedro II. Objetivo neste artigo demonstrar a elaboração da Estação Marítima da Gamboa enquanto solução unificada para contemplar mudanças complexas e dirimir problemas de origens distintas, suscitando uma ação avassaladora para a preparação e a execução de sua construção (1876-1883). A investigação foi realizada em fontes governamentais, da empresa e em publicações não relacionadas aos promotores da obra.

Palavras-chave: ferrovia; porto; império; Rio de Janeiro; Gamboa

Abstract

At a time when railroads were expanding, widespread steam navigation and the functioning of ports were questioned throughout the country, providing Rio de Janeiro with an infrastructure capable of integrating these modes became an aspiration of the ruling classes. Only in this specific context could the idea of a Maritime Station in the Court of the Empire come to fruition. There was no precedent for the efforts and resources committed, both by the imperial government and by the largest Brazilian company - the Estrada de Ferro Dom Pedro II. Objective, in this paper, to demonstrate the creation of the Maritime Station of Gamboa as a unified solution to contemplate complex changes and resolve problems of different origins, raising overwhelming action for the preparation and execution of its construction (1876-1883). The investigation was carried out in government and company sources and in publications not related to the promoters of the work.

Keywords: railroad; harbor; empire; Rio de Janeiro; Gamboa

Introdução

Uma extensa biblioteca poderia ser constituída apenas com os livros sobre História Ferroviária do Brasil. Ramo mais bem desenvolvido da História dos Transportes por historiadores em todo o mundo, os estudos e as pesquisas que abordam os processos históricos desde a elaboração até a descontinuidade de linhas, redes, sistemas, empresas, sindicatos e instituições públicas dedicadas aos caminhos de ferro e ao ferroviarismo são incontáveis. Adquiriram uma complexidade que propicia aos historiadores mais jovens a possibilidade de recortes temáticos, cronológicos e espaciais radicalmente inovadores.

A tendência dos historiadores que fundaram as investigações sobre a História Ferroviária é abordar uma porção significativa do transporte ferroviário de determinada sociedade e/ou economia, focando em uma ou mais perspectiva(s) na infinita variedade analítica que a história das ferrovias oferece (LANNA, 2005). Raramente os objetos têm como central a relação das ferrovias com outros modais de transporte ou colocam em debate outro tipo de relação histórica e socialmente estabelecida pelos caminhos de ferro. Em realidade, a vitalidade da historiografia ferroviária garantiu uma reprodução endógena relativamente bem-sucedida (PAULA, 2008).

Neste artigo, viso, portanto, inverter o itinerário mais recorrente, trazendo luz à história da idealização, elaboração e construção de uma única estação ferroviária, fundamentalmente relacionada com o porto e a navegação no Rio de Janeiro: trata-se da Estação Marítima da Estrada de Ferro Dom Pedro II, na Gamboa. Ao longo do artigo, busco evidenciar que a sua construção se constituía em anseio há muito guardado por sucessivos governos imperiais e direções da maior empresa brasileira e maior ferrovia do país, mas, igualmente, sua elaboração significou o ponto mais alto da política de melhoramentos portuários no principal porto brasileiro: o do Rio de Janeiro, Corte do Império.

A problemática central que motivou a pesquisa reside no desafio imposto ao entendimento do turvo itinerário idealização-projeto-construção da estação marítima, constituindo fases cambiantes em si e afetando umas às outras em sincronia, transcorridas em curta temporalidade. Turvo ao ponto de que cada uma dessas se refazia por se tratar de um processo histórico complexamente atravessado pelos debates sobre a escravidão, pelas disputas da política imperial e da estrada de ferro, num momento de expansão econômica garantida pelo sucesso da lavoura cafeeira. Ademais, a análise deve ser sofisticada devido ao fato de ter sido uma grande intervenção na Corte do Império - maior cidade do Hemisfério Sul-, numa porção urbana em que a cidade se expandia e concentrava expressivos interesses econômicos (ABREU, 2000). Ainda podem ser acrescidas as questões sobre o estágio técnico-tecnológico da engenharia ferroviária e portuária, bem como os elevados investimentos que significavam a construção e o equipamento do ramal e da estação com aquelas peculiaridades e demandas.

A concretização da maior e mais dispendiosa obra - se tomada isoladamente - de edificação ferroviária e portuária do Império do Brasil só foi possível graças à inédita superação de desafios legais, financeiros e de engenharia (CECHIN, 1978, p. 58). Tamanho vulto dos valores envolvidos nessa empreitada espantava, num momento em que a construção de estações significava apenas 6% do capital empregado pela Estrada de Ferro Dom Pedro II (doravante EFDPII). Não era para menos, fazer o trem se aproximar o máximo possível do navio mercante era uma das principais aspirações dos membros das classes dominantes que ansiavam pela constituição de redes de transportes no Brasil, em meados do século XIX. Para que essas redes se tornassem realidades e os corredores ferroviários radiais pudessem cumprir plenamente suas funções de transporte para as exportações e importações (SUMMERHILL, 1997, p. 322), os modais deveriam se integrar e ser compatíveis com as demandas e os padrões coevamente estabelecidos. Lamounier (2015, p. 210) afirma que, a partir da década de 1870, essa diretriz foi perseguida pelas empresas ferroviárias, mesmo na contingência dos elevados custos de construção e manutenção da expansão ferroviária, servindo esta como instrumento da integração entre modais. Grandi (2022) pontua que data, exatamente, entre as décadas de 1870 e 1880 o surgimento dos mais completos planos viários para o Brasil, sendo os primeiros a centrarem suas elaborações na combinação da expansão sem precedentes das estradas de ferro com o avanço da navegação a vapor interior e costeira, o que certamente demandaria infraestruturas que garantissem mínima articulação entre esses modais.

O estabelecimento do Brasil enquanto maior produtor mundial e price maker do café já era realidade palpável quando a EFDPII passou a ser encarada como solução para o escoamento daquela produção. Desde os interiores das províncias do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais até a Corte do Império, embarcando o produto no porto do Rio Janeiro, a grande ferrovia do Brasil era encarada como meio para a diminuição das perdas e a otimização do transporte da maior e mais valiosa importação do país, especialmente com o encerramento do tráfico transatlântico de escravos (EL-KAREH, 1980). Em duas décadas de funcionamento daquela estrada de ferro, ficou patente que estacionar suas composições na cidade não significava estar próximo ou ter acesso conveniente ao porto. Dessa constatação surgem as demandas por uma Estação Marítima que, ademais, serão complementadas pelo esgotamento da Estação Central, no Campo de Santana (LAMARÃO, 1991).

A partir da década de 1870, com a revolução dos vapores na navegação marítima (MANTUANO, 2018), os portos brasileiros passaram a ser questionados sobre suas limitações técnicas e de capacidade. Isso era especialmente sensível no Rio de Janeiro, o que contribuiu como um fator complementar para que estações marítimas de ferrovias fossem vistas como soluções integradoras e complexas - ao mesmo tempo, ferroviárias e portuárias - para problemas novos e desafiadores.

A possibilidade de uma ferrovia chegar a um porto e de uma empresa ferroviária obter vastos terrenos para construir estação marítima que pudesse melhorar substancialmente uma fração de determinada operação portuária era algo distante em todo o país, pelo menos até a década de 1870 (HONORATO, 1996). A ponte da São Paulo Railway, em Santos, era o que de mais significativo surgiu nesse sentido (SAES, 1981), mas ainda longe de uma estação marítima. A única empresa que tinha condições objetivas de reunir articulação política nacional e local, força nos tribunais, defesa na imprensa, saberes técnicos de engenharia (MARINHO, 2015), recursos humanos e, especialmente, financeiros para realizar tal obra era a EFDPII, especialmente devido à forte ascendência que o governo imperial tinha sobre a empresa (TOPIK, 1987) e seu domínio sobre as terras de marinha.

Por mais que a Estação Marítima da EFDPII não fosse uma concessão pública, conforme previa o modelo de melhoramentos portuários3 regrado pela Lei 1.746 de 1869 (BRASIL, 1.746/1869), e a base legal fundiária em que repousava fosse a da propriedade de terrenos lindeiros e aforamento das terras de marinha4 (BRASIL, 4.615/1868), o fato é que as razões para sua construção e boa parte das suas limitações eram exatamente as mesmas de concessões como a da Companhia Docas de Dom Pedro II. Isso quer dizer que o processo histórico de elaboração e construção da Estação Marítima da Gamboa permite que a concebamos com um melhoramento portuário que, assim como a expansão das ferrovias, era parte da política de melhoramentos materiais idealizada e, em alguma medida, realizada nas últimas décadas do Império.

Os chamados melhoramentos materiais deixaram de ser meros projetos, e o que foi possível realizar se concretizou em um momento politicamente turbulento. Os projetos para construção, manutenção e operação de determinadas infraestruturas, encaradas como de alta relevância e grande repercussão, eram parte das reformas ansiadas, sendo contidos num conjunto de medidas que carregavam as aspirações de manutenção da ordem pela classe senhorial. Naquele momento, o ponto pacífico no bloco no poder do Império já era razão de dissenso aberto: a estabilidade e a previsibilidade da escravidão estavam ameaçadas, sendo encaminhada com fragilidade pela reforma que a postergava e procurava amortecer os efeitos de seu fim - a Lei do Ventre Livre (1871). A escravidão nacional (SALLES; MARQUESE, 2016), feição transnacional da nova escravidão baseada num centrípeto polo dinâmico - a plantation produtora de commodities para o mercado mundial - e estimulada pelo capitalismo em constante mundialização, sentia os abalos das tendências econômicas produzidas pelo desequilíbrio introduzido na combinação contraditória entre seu pleno funcionamento, expansão econômica e ruptura definitiva da principal fonte de obtenção de cativos: o tráfico transatlântico de escravos.

A elevação do preço dos escravos criou um efeito de concentração de plantéis, capitais e poder no polo dinâmico da economia imperial, a cafeicultura no Rio de Janeiro e em São Paulo. Em linhas gerais, a propriedade escrava deixou de ser elástica, tornando-se inelástica. Essa mudança desencadeou outras e generalizadas em dois ritmos (SALLES, 2012, p. 24): o lento, das relações sociais e na composição da classe senhorial, arrastando-se desde 1850; e o veloz, dos arranjos e embates no sistema representativo-partidário, colapsado desde a crise introduzida com a assunção do gabinete minoritário do conservador Visconde de Itaboraí (1868). Para Salles (2012), o que no ritmo lento significava um declínio programado da escravidão, ainda perfeitamente funcional e dominante, pelo menos até 1879; no ritmo veloz da disputa partidária, introduziu acirradas disputas, com quebras de regras, emergência de novos atores e organizações - como o Partido Republicano e o movimento abolicionista -, e a introdução de inovações políticas, o que abriu a senda para ações governamentais sem precedentes. Já para Alonso (2002), esse mesmo contexto histórico, na década de 1870, já se apresentava como de avanço do capitalismo em detrimento da escravidão. A autora correlaciona diretamente a mudança estrutural à crise política de difícil resolução para “ordem saquarema”. Ainda que as lideranças do Partido Conservador buscassem liderar reformas como forma de remediar os abalos no sistema político, as mudanças econômico-sociais propiciaram uma janela de oportunidade para o surgimento e a organização de agentes com postura contestatória do sistema político e do próprio regime, demandando espaço político, especialmente no próprio Estado Nacional.

O programa de melhoramentos materiais que se estende nas duas últimas décadas do Império, na interpretação de Salles (2012, p. 36), poderia ser entendido tanto como elemento da lenta transição para o fim gradual da escravidão quanto como efeito da disputa política por qual fração partidária melhor executaria reformas que sustentariam o sistema político, a hegemonia senhorial e o próprio Império, naquela contingência; já Alonso julga que “a agenda de modernização da infraestrutura do país” (2002, p. 85), iniciada no gabinete comandado pelo Visconde de Rio Branco (1871-1875) e continuada pelo Duque de Caxias (1875-1878), era uma forma de adaptação ao penetrante capitalismo controlada pelos mesmos conservadores, representantes dos proprietários de escravos e formuladores da ordem política imperial procurando atender ao apelo por reformas, de forma a amainar as oposições e contestações que sofriam por novos e ascendentes agentes políticos - estava contido nesse movimento a intitulada “geração 70” que, em realidade, colaborou política e tecnicamente com a realização de muitos dos projetos desse programa de avanço nas infraestruturas de interesse do Estado Nacional.

Como veremos, a construção da Estação Marítima da Estrada de Ferro Dom Pedro II é propiciada por esse contexto histórico em que grandes projetos de infraestrutura eram almejados como instrumento de continuidade política e expansão econômica, ambas justificadas pela necessidade de “reformas”. No caso específico, iniciada em um gabinete conservador, mas finalmente inaugurada e concluída em gabinetes liberais. No entanto, desde os debates sobre o projeto e a criação do plano de obras até sua concretização e encerramento factual (1876-1883), recorrentes disputas, obstáculos, revezes, certas frustrações, algum atraso e imprecisões orçamentárias eram condicionadas por um emaranhado de limitações financeiras, do estágio técnico-tecnológico da engenharia, desafios naturais e urbanos, interesses políticos, trocas de governos e, especialmente, a dificílima multiplicidade de propriedades privadas dos terrenos necessários para a obra obstaculizaram-na no tempo, bem como a sua completude e melhor aproveitamento.

Projeto, plano de obras, orçamento e medidas preparatórias

O processo que resultou na Estação Marítima da Gamboa é fruto de distintos e combinados anseios tão antigos quanto a própria superação da Serra do Mar pela Estrada de Ferro Dom Pedro II. Afinal, se o modelo de expansão e ganho de produtividade dos transportes terrestres no Brasil era o de construir ferrovias radiais que ligassem a produção de produtos básicos no interior aos portos importadores/exportadores (NATAL, 1991), afirmava-se, então, essa necessidade com três desdobramentos: adaptar a cidade portuária à inserção da estrada de ferro, suas locomotivas e composições; aproximar a(s) ferrovia(s) o máximo possível do porto, chegando mesmo a tocá-lo; e construir na cidade, de preferência em terrenos contíguos ao porto, infraestrutura de armazenagem e circulação de mercadorias e pessoas, capaz de operar os fluxos viabilizados pela ferrovia.

Durante as décadas de 1860 e 1870, a constatação das dificuldades urbanas encaradas pela estrada de ferro tomaram forma em crescentes reclamações a respeito das inconveniências sobre a localização da Estação Central no Campo de Santana, especialmente a respeito dos trajetos tortuosos que os carretos e carregadores faziam com as mercadorias pelas ruas do Rio de Janeiro e das limitações espaciais e técnicas da infraestrutura própria da maior ferrovia do país na capital do Império. Diversos projetos foram formulados para sanar essa questão. Algumas iniciativas conseguiram expandir e aperfeiçoar o transporte e a armazenagem entre a estação terminal e o porto, mas a tração animal, a estreiteza da bitola, o entrecortado trânsito urbano, além das próprias dimensões e capacidades das infraestruturas de circulação, guarda e armazenagem persistiam incompatíveis com o volume, a diversidade e a complexidade dos fluxos de mercadorias que o transporte ferroviário e, a partir da década de 1870, também a navegação a vapor passaram a trafegar (LAMARÃO, 1991).

Quando concebida, a Estação Central situava-se em arrabalde extenso na freguesia de Santana, distante das freguesias marítimas que contavam com as unidades de produção portuárias e autoridades públicas, especialmente as aduaneiras. Ganhava, assim, em terreno, mas perdia em proximidade com o porto (EL KAREH, 1980). Com o passar dos anos, a estação continuou longe do porto, mas a expansão/complexificação urbana e dos fluxos de mercadorias e pessoas a enredaram num trânsito tão viciado quanto vital para reprodução da economia e da sociedade. Os carris urbanos não davam conta do intenso movimento de mercadorias entre o Campo de Santana e o porto do Rio Janeiro, os carregadores e carroceiros pululavam puxando as cargas pelas ruas da cidade (MOURA, 1988; TERRA, 2013). Por conta disso, diversos engenheiros tentaram fazer chegar o trem até os trapiches ou até a Alfândega, assim como muitas empresas foram incorporadas com esses fins (SILVA, 1992).

Sob a direção de Francisco Pereira Passos, foi publicado o documento fundamental em que se plasmavam as justificativas para a construção do ramal e da estação, as decisões para a execução de tamanha empreitada, as diretrizes orçamentárias e a organização técnica do plano de obras que concretizariam o projeto da futura Estação Marítima. Esse documento é o Anexo A4 do Relatório do Anno de 1876 da Estrada de Ferro Dom Pedro II. O projeto é assinado por Passos, mas ele registra que estava amparado em alongado debate que foi objeto de extenso relatório do engenheiro-residente daquela estrada de ferro, Francisco de Paula Bicalho (BRASIL, 1877).

Na década de 1870, as questões acerca da inserção da EFDPII na cidade passaram a girar em torno da morosidade, dos custos e dos riscos no trajeto urbano a duras penas superado pelas mercadorias trazidas, levadas e consumidas pela estada de ferro, trajeto esse majoritariamente feito através da contratação de serviços junto a Companhia Locomotora pela própria estrada de ferro ou por outras empresas, além dos carregadores por si que atendiam seus clientes (SILVA, 1992). A distância obstaculizada entre a Estação Central e o porto constituía forte razão para a construção de um ramal marítimo. E mais: a problemática acentuava-se na carência de capacidades para armazenagem, manipulação e guarda dos produtos, sendo a empresa e seus clientes completamente dependentes de terceiros - armazéns e trapiches especialmente (MANTUANO; HONORATO, 2015). Essas eram as principais questões que alimentavam a discussão sobre a localização e as dimensões requeridas para a primeira estação marítima de uma ferrovia no Rio de Janeiro.

A primeira solução aventada foi, simplesmente, ampliar a estação terminal então existente na Corte. A conclusão tomada pelos engenheiros da ferrovia era simples: o porto continuaria distante e separado da estação pelo morro da Providência. E mais, os custos de tal operação seriam proibitivos pela própria evolução urbana que apontava para Santana como área de expansão do centro comercial e fabril da cidade. Pereira Passos justificava a inviabilidade da primeira opção:

O primeiro meio seria muito despendioso, porque os terrenos circunvizinhos estão cobertos de edificaçoes, cuja desapropriação custaria somma enorme, pois em cerca de 3.000 contos foi calculada, sobre os dados offlciaes que acaba de remetter-me a Recebedoria do Municipio Neutro, a desapropriação só da área comprehendida entre a rua do General Pedra e o recinto da Estrada, área essa que, entretanto, acrescentaria bastante á de que hoje se dispõe. Além disso, fícaria esse meio dependente da Illma. Gamara Municipal, para a suppressão ou modificação das ruas da cidade que, por todos os lados, limitam o recinto da Estrada (BRASIL, 1877, A4, p. 3).

O documento silencia quanto à possibilidade de a estrada simplesmente se desfazer da estação no Campo de Santana e construir outra na contiguidade ao porto. No entanto, é possível avançar para análise da divisão produtiva que se procurava encetar. As freguesias portuárias do Rio de Janeiro eram conhecidas pela elevada concentração e o trânsito de escravizados, livres pobres, nacionais e imigrantes, sendo paragens historicamente identificadas com o tráfico e o mercado de escravos, com a progressiva ocupação por moradias populares e unidades de produção portuárias precárias e insalubres, bem como algumas oficinas e fábricas (ABREU, 2000). Se, por um lado, o valor das desapropriações seria módico e haveria oferta de terrenos o suficiente para uma estação já grande e com possibilidade futura de expansão - cômoda para a “estação de mercadorias” no porto, localizando-se em terras de marinha e possibilitando à ferrovia participar diretamente da operação portuária; por outro, não era recomendável retirar a estação de passageiros do terminal estabelecido no Campo de Santana (SILVA, 1992).

Superada a questão e decidida por uma Estação Marítima que dividiria o fluxo e incrementaria as capacidades da Estação Central, os engenheiros da estrada centraram maior atenção na discussão sobre o local exato em que se construiria a estação marítima, já que o porto oferecia algumas enseadas naturais aptas para tal desde o morro de São Bento até a ponta do Caju. Não era intuito daquela estrada de ferro cobrir de linhas férreas todo o litoral das freguesias portuárias, apenas alcançar o porto pontualmente. Dois critérios gerais foram estipulados: maior proximidade e desimpedimento possíveis para o ramal que seguiria a partir da Estação Central; menor custo possível nas desapropriações e manutenção dos foros anuais pagos pelos terrenos de marinha a serem ocupados e edificados (BRASIL, 1877, A4, p. 2-3).

Três experiências balizaram a decisão sobre a localização da estação marítima: entre 1869 e 1870, a própria EFDPII encetou estudos e projetos, sob a direção de Mariano Procópio Ferreira Lage, para construção de um ramal que circundaria os morros de fronte a Estação Central e chegaria à praia Formosa - projeto esse que não prosperou, devido às condições financeiras do governo imperial, ao final da Guerra do Paraguai; desde 1870, vigia a concessão da Docas de Dom Pedro II que abrangia desde o Arsenal de Marinha até a enseada da Saúde, mas que operava apenas no armazém, cais e pontes primeiramente construídos em frente à Praça Municipal, sem avançar nos planos apresentados ao governo imperial; em 1872, fracassou a iniciativa de uma empresa que sequer foi incorporada, mas alardeava um tal “caminho aéreo” que levaria à estada de ferro por meio de viadutos elevados e férreos sobre a cidade até a Prainha (LAMARÃO, 1991).

Por um lado, os engenheiros admitiam que para construir até a Saúde haveriam de enfrentar a Companhia Docas de Dom Pedro II, e encampá-la seria excessivamente oneroso: “A que vae do Arsenal de Marinha a Saude, concedida á Companhia das Docas de Dom Pedro II exigirá para se adquiril-a e desapropriações dispendiosissimas” (BRASIL, 1877, A4, p. 4). Por outro, excluídos os elevados férreos pelo avultado investimento inicial, o caminho por terra seria longo, exigiria muitas desapropriações e terminaria cercado de edifícios e logradouros extremamente movimentados, o que levaria à perda de produtividade na operação do ramal e a limitações futuras para a expansão da estação:

[...] Estação maritima, que se projecta, será forçosamente filial á actual Estação Central da Estrada; nesta ultima é que se deverá fazer a composição dos trens mixtos para attender ás necessidades dos serviços de passageiros e de mercadorias, e, além desta, muitas outras condições de serviço exigem a mais prompta e desimpedida comunicação entre as duas Estações: ora, qualquer ponto que se escolha, entre o Arsenal de Marinha e a Saude, seria ligado á Estação Central, atravessando uma das partes da cidade, onde é mais densa e activa a população, e, como consequência disso, teríamos a morosidade de communicação, por ser necessário dar aos trens marcha extremamente vagarosa, sem todavia, se evitarem totalmente os desastres e accidentes, pelo grande numero de passagens de nivel forçadas e a considerável concurrencia e circulação de vehiculos e viandantes por ellas (BRASIL, 1877, A4, p. 5).

Avaliaram, então, as enseadas mais próximas da Estação Central, separadas dela pelo morro da Providência, mas com vastos terrenos disponíveis em valores razoáveis, frente a águas calmas, abrigadas para acostagem segura de embarcações e com certa profundidade. Depreendiam ser promissora a enseada da Gamboa. A partir disso, produziram um consenso:

A enseada da Gambôa é de todos os pontos do litoral o que mais convém para as construcções da Estação maritima. É abrigada, tem fundo sufficiente, que ainda póde ser augmentado por meio de escavações de pouco custo, sendo estas, todavia, desnecessárias para as pontes que serão prolongadas. Ha alli amplo e apropriado espaço para todos os armazéns, depositos, desvios, linhas auxiliares, etc.; as desapropriações da área indispensável são relativamente de pouco valor; e a ligação com a Estação Central é a mais curta, mais commoda, menos dispendiosa e menos sujeita aos embaraços de passagens de nivel (BRASIL, 1877, A4, p. 5) [grifos meus].

Influenciou essa decisão, ademais, a preocupação dos diretores sobre o traçado do ramal, por isso Bicalho encomendou aos consultores James Wells e Carlos Jordão um estudo completo em que se basearia a discussão sobre o trajeto, fazendo um escrutínio comparado de opções em suas vantagens e desvantagens - considerando as obras e as operacionais. Wells e Jordão apresentaram dois traçados que consideravam razoáveis: um contornando pela Praia Formosa e outro superando o morro da Providência através de túnel. A conclusão era simples: pela praia formosa, o ramal teria um percurso maior (2.088 metros) e seria mais moroso, pois já se vislumbrava que a cidade se expandiria naquele sentido; é desse estudo que surge a decisão que daria concretude ao, tão conhecido dos cariocas, Túnel da Marítima ou, nos dizeres dos engenheiros da época: tunnel da Providencia.

A construção de dois pequenos túneis subsequentes e divididos por uma sinuosidade natural no morro encurtava o ramal projetado para 1.096 metros. Assim, se localizaria em área de difícil ocupação residencial futura em suas imediações (BRASIL, 1877, A4, p. 6). Os dois túneis eram complementares: o primeiro teria 83 metros e o segundo, 313 metros; totalizavam um trecho de 511 metros de extensão, contando com o clarão naturalmente aberto entre eles; ambos contavam com a altura máxima de 5,95 metros e largura máxima de 8,5 metros, conforme é possível constatar na EFDPII -Planta da Locação Definitiva da Estação Marítima da Gamboa (1877), reproduzida parcialmente na Figura 1. Para tanto, a técnica de perfuração da rocha do morro da Providência combinava a utilização tópica de máquinas a ar comprimido para acionar as perfuratrizes e, essencialmente, a dinamite para as grandes demolições (BRASIL, 1877, A4, p. 6-7).

Figura 1
Recorte da Planta [Projeto] do Ramal Marítimo da Gamboa (1877)

A estação teria 65.014 metros quadrados e contaria com portões, grades, arruamento e calçamento externos renovados, com galerias para escoamento de águas e despejo de esgotos. Entre o morro da Providência e a rua da Gamboa, num grande terreno de 43.055 metros quadrados, haveria três armazéns projetados: todos com a face marítima virada para rua da União, servidos de caminhos férreos para o acesso de locomotivas, carros e composições com bitola mista, ladeados de pátios e áreas de passagem e manobras férreas lindeiras às ruas do Barão da Gamboa e da Gamboa; os três armazéns deveriam ter dois pavimentos - não há informação sobre a altura projetada -, as frentes de acesso férreo e marítima mediriam 28,5 metros, e o cumprimento de cada um deles variaria da seguinte maneira: 200 metros para o maior; 150 para o do meio; e 80 metros para o menor; bem como variaria, nas laterais, o número e o tamanho dos portões de abertura em dobradiça. Ainda haveria um quarto armazém menor no terreno conquistado nas proximidades do cais, que mediria 21.959 metros quadrados, cujas medidas não constam no Anexo A4. Os quatro armazéns totalizariam 14.000 metros quadrados de capacidade de armazenagem (BRASIL, 1877, A4; FIGUEIRA, 1908).

Conforme se vê na Figura 2, os armazéns foram projetados numa distância considerável do cais, separados pela rua da Gamboa. Apenas dos portões laterais se vislumbrariam diretamente o cais e as pontes, o que nos faz depreender que sua projeção privilegiou a ligação contínua entre as linhas do ramal e as pontes, sem passar pelos armazéns, vencendo a passagem de nível na rua da Gamboa. O acesso aos armazéns se daria apenas convenientemente e com a necessidade de fazer manobras. Segundo o relatório, as áreas de armazéns, telheiros, passagens e manobras seriam apartadas da área contígua ao cais pela rua da Gamboa. A finalidade da área ligada ao cais seria previamente destinada:

Estes terrenos são cortados pela rua da Gamboa. O lado do mar é destinado ao serviço de embarque e descarga das mercadorias e materiaes da estrada por meio do caes e das 3 pontes projectadas, e para depósitos desses materiaes e armazenagem de enssacadores de sal, commissarios de toucinhos, queijos e mais generos de fácil deterioração. A área do outro lado da mesma rua é destinada aos telheiros e grandes armazéns para o serviço das mercadorias de exportação e importação (BRASIL, 1877, A4, p. 8).

Figura 2
Recorte da Planta [Projeto] da Estação Marítima da Gamboa (1877)

Na face marítima da rua da Gamboa, um aterramento destruiria trapiches - o maior deles, do Barão da Gamboa -, armazéns e uma fábrica, avançando até 200 metros no mar, e seria coroado com um cais de cantaria em formato de “L”, perfazendo 250 metros de comprimento. As pedras e as terras extraídas do morro da providência comporiam o aterro. Um enrocamento até o leito submarino serviria para amarração do aterro e sustentação do cais. Essa técnica, no entanto, limitava a profundidade das embarcações que poderiam atracar diretamente no cais: “O caes projectado permitte a atracação de pequenos barcos, e sua construcção é necessaria para amparar as terras no local que está hoje coberto pelo mar e será aterrado” (BRASIL, 1877, A4 p. 8), o que já era reconhecido como grande e generalizado inconveniente da operação portuária do Rio de Janeiro.

Para superar as limitações do cais projetado, os engenheiros da estrada de ferro abraçaram a solução corrente e que garantia a reprodução da operação portuária pré-capitalista: a construção de três pontes de madeira, fundadas em estacas, travejadas e aparafusadas com barras e parafusos de ferro. A maior delas seria baseada na ponte já existente do Trapiche da Gamboa, segundo o projeto no Anexo A4:

Estão projectadas tres pontes de madeira do mesmo systema, sendo a maior de 200 metros de extensão no prolongamento da ponte actual do trapiche da Gambôa, em direcção á ilha de Santa Barbara. Este comprimento será sufficiente para permittir nella a atracação de navios de calado ordinário. É destinada á carga e descarga das mercadorias em geral. A segunda ponte, com 100 metros de extensão, é destinada especialmente ao serviço de pequenas embarcações. A terceira ponte, de 95 metros de comprimento, servirá para a descarga do material e combustível da Estrada, sendo estes depositados na área contigua á ponte (BRASIL, 1877, A4, p. 8-9).

As pontes totalizariam 5.027 metros quadrados de área para carga e descarga de mercadorias (FIGUEIRA, 1908, p. 185). A projeção dessas pontes era tida como grande avanço no relatório e projeto, mas, olhando retrospectivamente, eram, também, evidência do que o mais avançado melhoramento portuário oitocentista poderia oferecer: o aperfeiçoamento, o fortalecimento, a elevação da escala e as melhorias generalizadas na lógica operacional vigente. Não havia ruptura com a operação portuária de então, e a ponte do Trapiche da Gamboa foi a base para o projeto da Ponte da Marítima.

Embora os engenheiros tenham realizado estudos sobre o traçado do ramal, a dimensão e a segurança dos túneis, o tamanho e a disposição de armazéns, cais e pontes, simplesmente não o fizeram ou omitiram demais informações quanto ao leito submarino e à morfologia costeira da enseada escolhida, a da Gamboa. Há aí uma clara subestimação das obras de engenharia hidráulica. Os desafios para construir e manter a profundidade em terrenos submersos, arenosos e, via de regra, lodacentos não foram devidamente avaliados ou expostos no projeto. A negligência quanto a esse fator comprometia os valores orçados para o cais e as pontes, bem como nublavam a custosa manutenção dessas infraestruturas e seus equipamentos, já inerentes à operação portuária, mas agravados pela capacidade de carga - própria, das mercadorias e das composições - que a estrada de ferro vislumbrava acrescer com o fluxo pela Estação Marítima.

O desafio de ligar a EFDPII ao porto e dotá-la de uma estação de mercadorias com altas capacidades impôs um orçamento impressionante para construção do Ramal e Estação Marítima. Toda a obra significaria um investimento de 2.400:000$000 a ser executada em tetos anuais de 700:000$000, ou seja, tinha prazo de pouco mais de três anos para sua conclusão. Para se ter uma ideia, apenas a estação demandaria 1.186:000$000, sendo que a estrada de ferro, em mais de duas décadas de funcionamento e expansão, construiu 71 estações que totalizavam 3.679:508$564 de capital empregado, ou seja, a sua direção estava disposta a investir em uma única estação 32.2% do que havia empregado em todas as suas estações.

No momento do projeto, a estrada operava linhas na extensão de 503 quilômetros, o investimento médio para essa implantação significou, até aquele momento, 101:550$294 por quilômetro; o ramal projetado era de pouco mais de um quilômetro e custaria 1.214:000$000 (BRASIL, 1877, A4, A9), excedendo em incríveis 1.095% o valor o médio para esse tipo de investimento.

Importante pontuar que, em todos os relatórios, desde a apresentação do orçamento até a demonstração das despesas, o diretor esclarece que a única e exclusiva fonte de recursos a financiar essa obra seria o fundo para investimentos da própria EFDPII.

Tabela 1
Orçamento das obras da Estação Marítima da Gamboa (1876)

Todo esse esforço era duplamente justificado pela direção da estrada: por um lado, as demandas da empresa passaram a impor capacidades, qualidades e custos no trajeto entre o porto e a Estação Central que, supostamente, determinavam a preponderância do projeto tal qual estava concebido. O próprio Anexo A4 discrimina que, apenas no exercício daquele relatório, 141:937$606 foram despendidos com os custos desde o translado marítimo de mercadorias na Baía de Guanabara até o transporte urbano, realizado pela Companhia Locomotora (BRASIL, 1877, A4, p. 7). Assim os engenheiros concebiam as vantagens da construção do ramal e da Estação Marítima propriamente para EFDPII:

Sabe-se que esta recebe dos mercados estrangeiros o seu principal material de consumo, o combustível, e quasi que a totalidade de seu material fIxo e rodante, cujo transporte e descarga representam importante verba do seu custeio ; esses materiaes são descarregados e depositados no litoral em terreno que, para esse fím, é alugado, e d’onde são transferidos para o recinto da Estrada por intermédio da Empreza Municipal Locomotora que vive exclusivamente desse serviço, e á custa da Estrada de ferro D. Pedro II; mas esse meio de transporte, que pouco differe das carroças ordinárias, além de ser oneroso á Estrada, é demorado e, pelas baldeações a que os sujeita, dá lugar a quebras do carvão e do coke e a avarias das machinas e mais material que vem para a Estrada (BRASIL, 1877, A4, p. 3).

Em justificativa social e politicamente mais ampla, a direção da estada reafirmava a quem estava servindo quando declarava atender “aos interesses do commercio e da lavoura” e decidia que “[...] o melhor local para a Estação Terminal será aquelle que menos onerar taes gêneros [de importação e exportação] com as despezas de baldeações e transportes intermédios [...]” (BRASIL, 1877, A4, p. 3).

Muito antes da aprovação imperial dos projetos e plantas, como previa a lei sobre “desapropriações para construcção de obras e serviços das estradas de ferro do Brasil” (BRASIL, 1664/1855), a equipe de Pereira Passos já havia estruturado sua linha de ação inicial e executado algumas diretrizes preparatórias. A principal medida foi a aquisição e a transferência do aforamento do Trapiche da Gamboa, junto aos herdeiros do Barão da Gamboa, no valor de 265:914$520, já em 1876 (FIGUEIRA, 1908, p. 176). Também antecederam a autorização oficial, os contatos e adiantamentos junto ao empreiteiro inglês Edward James Lynch para estudar o solo costeiro e o leito submarino, fazer sondagens e verificar a sua opinião técnica sobre o melhor sistema para execução das obras. Por conta disso, em 1877, antes mesmo da autorização para as obras e da contratação de Lynch, a rubrica “Estação Marítima da Gamboa” já aparecia na seção “Capital Empregado” do Balanço Contábil da EFDPII com o valor de 523:787$807.

Desapropriações: os desafios legais e financeiros

Apenas em 3 de novembro de 1877, as obras foram, formalmente, autorizadas por decreto imperial que aprovava o projeto e as plantas que determinavam a desapropriação de exatos 50 edifícios e terrenos (BRASIL, 6.728/1877). No mesmo mês, a estrada contratou Lynch para todos os serviços de demolição, perfuração, edificação e construção das obras, com exclusividade (BRASIL, 1878, p. 5). Em 21 de dezembro, com a presença de Dom Pedro II, realizou-se a cerimônia do primeiro “tiro de mina”, quando Pereira Passos proferiu as seguintes palavras: “O que esta ceremonia significa é a solemnisação do triumpho de uma ideia que ha 22 annos ministros e directores da Estrada todos têm embalde procurado realizar [...]” (FIGUEIRA, 1908, p. 183) [grifos meus]. A ideia de que o engenheiro se jacta de iniciar a execução não era a construção de uma mera estação, mas sim a aproximação da ferrovia com o porto.

A Estação Marítima foi o principal feito do engenheiro Passos como diretor da estrada de ferro, e ele ainda contou com Francisco Bicalho na condição de supervisor geral da obra e com James Wells como responsável diretamente no campo, além do secretário da estrada, Manoel Fernandes Figueira, como responsável pela negociação e indenização dos proprietários desapropriados.

Os fundos destinados à obra se comprometeriam mais imediatamente com as desapropriações necessárias para a realização do projeto. Logo no começo de 1878, a EFDPII fazia circular edital em jornais de grande circulação para convocação dos proprietários que ainda não haviam manifestado interessado em negociar:

ESTRADA DE FERRO D. PEDRO II

Edital

De ordem do snr. Diretor, abaixo se transcreve, para conhecimento dos proprietários dos prédios e terrenos, compreendidos na planta aprovada pelo decreto n. 6723, de 3 de novembro proximo passado, para cosntrucção da Estação Maritima da Gambôa, a ultima parte do § 4º do art. 12 do regulamento para execução da lei n. 816, de 10 de julho de 1855, sobre desapropriações para construcção de obras e serviços das estradas de ferro do Brazil:

“As construcções, plantações e quaisquer bemfeitorias feitas na propriedade, depois de conhecido o plano das obras e com o fim de elevarem a indemnização, não deverão ser attendidas” (O CRUZEIRO, 06/01/1878, p. 3).

Impressiona a extensão da lista de proprietários convocados para negociação com a estrada de ferro para construção de um ramal de apenas um quilômetro contendo uma única estação. A lista era parcial, mas a amostra já expõe negociantes que figuram como poderosos membros das classes dominantes no Império. Nomeadamente o veador Mayrink, Joaquim Fernandes de Oliveira Mendes, Francisco Teixeira de Magalhães e Antonio Martins Lage, membros da Associação Comercial do Rio de Janeiro (MATHIAS, 1993).

Não bastasse a força do outro lado da mesa de negociações, a própria legislação sobre desapropriações para construções ferroviárias era protetiva à propriedade. O Decreto imperial 1.644 de 27 de outubro de 1855 estipulava que nenhuma desapropriação poderia proceder-se sem antes respeitar o amplo direito de negociação e demanda por parte do proprietário. Nos casos em que a empresa ferroviária e o proprietário não chegassem a um acordo consensual, apontavam-se árbitros com mediação do judiciário, mas a indenização tinha um piso estipulado, e esse era alto:

1ª Nenhuma indemnisação poderá ser menor, do que o valor de 20 annos do rendimento do predio, devendo ser calculado este rendimento pela decima que houver pago no ultimo semestre immediato á aquelle, em que houver de verificar-se a desapropriação; e no caso de não ter pago decima neste semestre, pela certidão da que pagou no semestre anterior. [...] (BRASIL, 1644/1855) [grifos meus].

Em seu relatório, a diretoria da EFDPII relata o procedimento amparado em lei para as ofertas junto aos proprietários: “Para o calculo desse rendimento a Estrada tomou o valor locativo do prédio segundo os lançamentos da Recebedoria do Rio de Janeiro, e deduziu desse valor a importância da decima, considerando o saldo como o rendimento a que se refere a lei” (BRASIL, 1879, A13, p. 2). A referência legislada dos vinte anos de rendimentos dos imóveis como um piso era tratada, ao mesmo tempo, como um teto para as indenizações.

Segundo o relatório do Ministério da Agricultura para o ano de 1878, as obras só não iniciavam devido às difíceis negociações quanto a desapropriações dos terrenos, especialmente na futura linha férrea (BRASIL, 1878, p. 228). Com as avultadas indenizações previstas e os grandes interesses instalados no trajeto do futuro ramal e na enseada da Gamboa, naquele momento, apenas uma empresa do porte da EFDPII poderia concretizar o projeto, especialmente pelo forte apoio do governo imperial.

No relatório para o ano de 1878, os diretores da estrada expressam que a maior parte dos proprietários da enseada da Gamboa negociaram amigavelmente, receberam suas indenizações de modo expedito e muito rapidamente franquearam seus terrenos e edifícios para exame das equipes de demolição; já os proprietários de imóveis lindeiros ao morro da Providência interpuseram dificuldades: “Os terrenos para o ramal foram todos pagos em virtude de sentença arbitral por não ter sido possível chegar a acordo com os respectivos proprietarios” (BRASIL, 1879, A13, p. 1).

Como se pode ver no Quadro 1, que expressa o momento inicial no processo de desapropriação dos imóveis necessários à construção do ramal e da estação marítima, as ações administrativas e jurídicas eram tão ou mais importantes que a obra em si. O principal desafio para a concretização do acesso ferroviário ao porto era o fato de que este se confundia com a cidade, traço comum a outras operações portuária pré-capitalistas, e seu entorno guardava interesses múltiplos, variados e distintos sobre o urbano. Esses interesses estavam cristalizados, em grande medida, na propriedade fundiária e em seus usos.

Quadro 1
Desapropriações realizadas para a construção do ramal e a Estação Marítima da Gamboa (1878)

Como é possível ver no quadro, destacavam-se os vastos terrenos desapropriados junto a Antonio de Calazans Raythe - acionista e diretor de empresas de navegação a vapor; a polpuda indenização por metro quadrado a Franciso Coelho Basto - proprietário de fábricas e oficinas; e o valor recebido pelos herdeiros do Barão da Gamboa - grandes proprietários fundiários na Corte, e operadores do Trapiche da Gamboa há quase meio século. Ainda se deve reparar que o Quadro 1 exibe alguns proprietários que não constavam no edital de convocação para negociação, pois parte deles já estava em contato com a direção da estrada, o que é evidência da avassaladora pressão que a EFDPII fazia contra os proprietários que possuíam imóveis no caminho do ramal. Naquele momento, o total desapropriado se elevava a mais de quarenta mil metros quadrados; a média da desapropriação por metro quadrado era de 45$588, valor compatível aos terrenos das áreas mais centrais e nobres da cidade (LOBO, 1978); e o total das desapropriações já alcançava um valor de dez dígitos: 1.090:046$840. A maior soma nas indenizações de desapropriações era fruto de negociações amigáveis com os proprietários. Em 1878, as ações para desapropriação apenas principiavam e a diretoria da estrada de ferro, coadjuvada pelos procuradores da Fazenda Nacional, agia com todo vigor político e judicial para controlar os valores a serem dispendidos por essas propriedades.

Em fevereiro, a construção do cais chegou a ser embargada pelo Dr. Francisco Teixeira de Magalhães, um dos proprietários desapropriados (BRASIL, 1879, p. 106). O relatório para aquele ano argumenta que uma intervenção no judiciário, através do Procurador dos Feitos da Fazenda, foi necessária para que a obra voltasse a ter andamento (BRASIL, 1879, A13, p. 3).

No ano seguinte, o dispendido em desapropriações saltou para 1.216:907$120, e a questão não estava resolvida. Segundo relatório da diretoria, ainda restavam inconclusos no Tribunal da Relação da Corte os processos para desapropriação dos imóveis de Francisco Teixeira de Magalhães, Joaquim Fernandes de Oliveira Mendes e Joaquim Ferreira Alves, o que demandaria mais recursos para rubrica de desapropriações (BRASIL, 1880, p. 133).

Àquela altura, o orçamento para desapropriações já havia sido superado em 228:134$370, e os recursos financeiros necessários para fazer jus às indenizações negociadas ou sentenciadas passaram a escassear ao ponto de proprietários terem de peticionar pelo efetivo pagamento, mesmo após já terem entregado seus imóveis (REVISTA DE ENGENHARIA, 15/01/1881, p. 16). O rombo prometia ser maior conforme as disputas judiciais se resolviam e a obra avançava, pois os proprietários no entorno das demolições e dos trabalhos de perfuração passaram a reclamar de avarias decorrentes daquela movimentação em seus imóveis (REVISTA DE ENGENHARIA, 15/12/1881, p. 191).

O caso de judicialização mais arrastada das indenizações para desapropriação com vistas à construção da Estação Marítima da Gamboa foi a dos terrenos de Joaquim Fernandes de Oliveira Mendes na rua da Gamboa, dos números 159 a 167. A questão se complicou porque a estrada não reconhecida um valor que Mendes considerava intrínseco à sua propriedade e deveria majorar a indenização ser paga: uma mina de águas ditas medicinais que o negociante engarrafava e ali mesmo vendia (BRASIL, 1879, A13, p. 3).

No ano anterior, ciente das movimentações da diretoria da EFDPII para a construção do ramal e a estação marítima, Mendes solicitou avaliação da Academia Imperial de Medicina sobre as propriedades terapêuticas das águas que extraía na Gamboa. O parecer do farmacêutico Augusto Cesar Diogo e do médico João Pinto do Rego Cesar é categórico ao negar as pretensas qualidades superiores à água vendida por Mendes (ANNAES BRAZILIENSES DE MEDICINA, 1878, p. 278).

Com a negativa médica e o impasse jurídico, Mendes resolveu propor um novo acordo em que a estrada se disporia a pagar indenização e preservar a dita fonte, autorizando-o a explorá-la por vinte anos. Desta vez o fez diretamente ao ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. O ministro indeferiu o acordo sumariamente “[...] à vista da informação da directoria da estrada de ferro [...]” (REVISTA DE ENGENHARIA, 15/10/1880, p. 171) que rejeitava a proposta demonstrando ser inviável tal exploração, “[...] em razão de estar encravada a fonte no centro dos terrenos em que se tem de construir um dos armazéns da estação” (REVISTA DE ENGENHARIA, 15/01/1883, p. 40).

Progredindo tanto as desapropriações em seu entorno quanto as obras, nos meses seguintes, Mendes ficava isolado na disputa, e seus inquilinos foram despejados ainda em 1879, mas este ainda preservava a propriedade de seus imóveis. Ao final do mesmo ano, o Tribunal da Relação homologou a indenização pelos prédios, mas anulou sobre as águas por inconsistências das informações prestadas pelos arbitradores governamentais que se negaram a avaliar as qualidades da referida fonte. Essa decisão suscitou embargos de declaração por parte do proprietário e de nulidade pelo procurador da Fazenda, o que acarretou a anulação de todo o processo pelo Supremo Tribunal de Justiça, já em 1880. Nenhuma indenização, nem pelas rendas cessantes, nem pela propriedade, foi paga a Mendes (REVISTA DE ENGENHARIA, 15/01/1883, p. 40).

Os engenheiros resolveram, então, “jogar pesado”: dinamites, máquinas e operários munidos de ferramentas passaram a simplesmente ignorar a existência daquelas propriedades, executando toda a obra do ramal e da estação, passando e depositando materiais nas imediações, estacionando veículos, arruinando arruamento e calçamento, demolindo prédios vizinhos e construindo intensamente no imediato entorno das propriedades de Mendes. Dessa forma, a estrada agia para minorar a indenização e pressionar Mendes avariando seus edifícios e ali dificultando o acesso e o fluxo. Então, o proprietário encontrou na imprensa meio para protestar contra a assimetria de forças naquela disputa:

O proprietário Oliveira Mendes foi de facto desapropriado pela estrada de ferro de Pedro II, que arruinou com as obras da estação marítima na Gambôa os prédios delle, tornou-os inabitáveis, privando-o de sua renda annual superior a 18:000$000! Este oprimido e despojado proprietário está reduzido á penuria, vivendo de empréstimos. Nem indemnização e nem predios! Depois de passados anos nesta dura condição, o tribunal superior annullou o processo da desapropriação, por erro do procurador dos feitos. A fazenda nacional pagou as custas, e nem quer tentar nova acção e nem levantar a interdicção ilegal que pesa sobre os prédios, e nem indemnizar o proprietario da cessação de seus rendimentos!

O proprietario por ahi anda de audiência em audiência; fala e não o ouvem, prometem-lhe justiça e não lh’a fazem de qualquer modo (JORNAL DO COMMERCIO, 13/08/1882, p. 3) [grifos meus].

Naquele momento, a EFDPII oferecia 141:504$000 e Mendes ainda reclamava judicialmente o valor de 530:000$000; tenhamos em vista que o primeiro arbitramento havia fixado 417:400$000 apenas e tão somente pelos seus terrenos e edifícios. Após o desgastante imbróglio político e judicial, Mendes cedeu e resolveu negociar para, finalmente, receber algo. Assim o ministro da Agricultura, Comércio e Obras Públicas avisava, em 25 de janeiro de 1883:

Considerando, pois, que não é justo continue o proprietario privado do preço de seus prédios, de facto e de direito desapropriados desde 1877, que elle se oferece a pôr termo a tão dilatada questão, recendo 330:000$000, isto é, menos 87:440$000 do valor arbitrado, e desistindo de todas e quaes reclamações, e que entre as obras autorisadas da estrada de ferro D. Pedro II nenhuma é mais urgente, no interesse da e do commercio, do que as complementares da estação da Gambôa: resolvi aceitar a referida proposta [...] (REVISTA DE ENGENHARIA, 15/01/1883, p. 40) [grifos meus].

Mendes ainda conseguiu faturar algo mais. No mesmo ano, a diretoria da EFDPII relatava que o havia contratado para demolição final dos seus prédios e o erguimento de um muro que prolongaria o já existente nos terrenos vizinhos e fecharia a área dedicada exclusivamente à Estação Marítima da Gamboa.

Ao final fático da obra, a rubrica de desapropriações alcançara a impressionante cifra de 1.571:077$120, ultrapassando a previsão orçamentária em 58,8%. As desapropriações eram o principal inconveniente e retardante para as obras de expansão ferroviária e o melhoramento portuário no país. No Rio de Janeiro, esses óbices eram elevados ao máximo grau e, em última instância, impediam a elaboração de transformações radicais na operação portuária pelo estrangulamento financeiro que sofriam as intervenções de maior extensão na cidade e no porto.

Obras: os desafios das engenharias ferroviária, hidráulica e portuária

O andamento das desapropriações foi importante entrave no fluxo das obras (BRASIL, 1879, p. 104) que, em si, já eram complexas e demandavam trabalhos morosos e meticulosos. O plano delineado pela equipe de engenheiros da estrada estabeleceu duas frentes de obras: a do ramal e a da estação. Nessas duas frentes, os trabalhos mais sofisticados eram a perfuração do morro da Providência e a construção do cais.

A perfuração para construção dos túneis foi contratada por empreitada, e cada metro era retribuído com 825$000. O cais, também pago por empreitada, custou 53$800 por metro cúbico de aterramento e 410$000 por metro de muro e revestimento em pedra de cantaria (BRASIL, 1879, p. 105). Segundo a Revista de Engenharia, os custos orçados por unidades junto ao empreiteiro inglês Edward Lynch estiveram abaixo tanto dos valores projetados quanto da oferta usual de mercado pela grande escala do serviço (REVISTA DE ENGENHARIA, 10/07/1879, p. 10).

Ao final de 1878, os túneis estavam muito próximos de serem concluídos e o trabalho Lynch era elogiado: “A perfuração dos dous tunneis e o revestimento do de n. 1, a preparação do leito e para o ramal e para o local da Estação, e a construcção do caes foram contractados com o Sr. Eduardo Lynch, que tem até hoje cumprido bem as suas obrigações” (BRASIL, 1879, p. 105). Já em 1879, as linhas férreas estavam assentadas da Estação Central até a área do cais, na extensão real de 1.123 metros, e ainda estavam em construção as linhas “[...] do armazém n. 1, parte das do n. 2, desvios para a balança, para a recepção do carvão e materiaes e para o serviço especial de construcção da ponte” (BRASIL, 1880, p. 132), obstadas pela construção de armazéns, cais e pontes, mais morosas do que as obras do ramal.

Os aterramentos e a construção da muralha do cais retardavam o plano de obras, o que é evidência de que os engenheiros na direção da estada subestimaram técnica e financeiramente as dificuldades das obras de engenharia hidráulica e portuária. Apenas em maio de 1879, os primeiros cem metros de cais estavam estáveis. Por isso, a inauguração do ramal se deu em 1º de junho. Na presença do imperador, a direção da estrada apresentava o que chamavam de “resultado immenso”, pois a obra “[...] estabeleceu a sua communicação com o mar, cuja necessidade se fazia sentir desde que foram começados os trabalhos de o construcção da própria Estrada [...]” (BRASIL, 1880, p. 5).

A inauguração contou com o lançamento da pedra fundamental do primeiro armazém e um longo discurso do diretor Francisco Pereira Passos, ressaltando as economias que a EFDPII faria a partir do funcionamento do novo empreendimento, as suas conveniências para o comércio e a indústria nacionais, além das melhorias urbanas que a estação traria à Gamboa. O Imperador viajou de São Cristóvão até a Gamboa pelos novos trilhos que levavam à Estação Marítima

A direção da estrada também organizou o cartaz fotográfico intitulado Estrada de Ferro D. Pedro II - Vistas do Ramal e Estação Marítima da Gambôa (Figura 3) como forma de divulgar os avanços na obra, defender o projeto em execução e fazer a apologia da engenharia nacional. No cartaz o cais está centralizado, ladeado por fotografias dos túneis, o que denota a relevância da frente portuária para o projeto. As fotografias são encimadas pelas inscrições do diretor da estrada - Francisco Pereira Passos - e do empreiteiro do ramal e do cais - Edward James Lynch. As fotografias são assinadas por Albert Henschel & C., conhecido fotógrafo ferroviário teuto-brasileiro.

Figura 3
Estrada de Ferro D. Pedro II - Vistas do Ramal e Estação Marítima da Gambôa (1879)

Segundo ratificava a Gazeta de Notícias:

Se a Estação Marítima é de incontestável vantagem para a lavoura e para o comércio, terá mais utilidade ainda para a própria estrada que vai desde já economizar mais de cem contos de réis por ano nas despesas com descargas e carretos de seu material importado, como trilhos, carvão, etc., despesas que em 1878 se elevam a 161:543$679 (GAZETA DE NOTÍCIAS, 01/06/1879, p. 1).

Ademais, um ramal ferroviário à beira de um cais era significativo avanço para operação portuária da época, como se lê no Relatório do Ministério da Agricultura de 1879:

Logo que concluído o ramal poderão os trens chegar ao cais, começou a Estação Marítima da Gamboa a prestar importantes serviços à ferrovia, que aí recebe nos seus vagões, tanto os materiais que lhe são destinados como os pertencentes a particulares, tendo cessado por este modo as dificuldades e despesas com o carreto de pesados volumes através das estreitas ruas da cidade (BRASIL, 1879, p. 272).

No mês seguinte, toda a extensão do cais construído estava estável. No entanto, as escavações e os aterramentos permaneciam incompletos, o que acarretava riscos à sua manutenção. O cais da estação marítima foi fundado em estacadas de madeira e amparado por aterro constituído pelos materiais provenientes da perfuração do morro da Providência (pedras e areias). Finalmente foi concluído, em 1879, medindo 262 metros de largura e contendo um muro de 4 metros de altura que possibilitava até 3,5 metros de profundidade submersa, rente ao cais. Nas escavações para dragagem da área acostável que serviria ao cais e à ponte, extraíram-se 994,544 metros cúbicos de pedra e 4.679,672 metros cúbicos de pedra solta. Todo esse material foi utilizado no aterramento geral do cais, o que totalizou 17.210,610 metros cúbicos (BRASIL, 1880, p. 132).

Os trabalhos de engenharia hidráulica ainda obstavam a conclusão do projeto e impunham marcha mais lenta ao plano de obras. Estes não estavam confinados ao cais, as escavações do leito submarino e da própria área dos armazéns, com vistas ao seu nivelamento, eram trabalho lento e custoso, pois a Estação Marítima ocupava uma área de 81.907 metros quadrados - 25,9% maior do que a área originalmente projetada e três vezes maior que a Estação Central. Durante todo o primeiro semestre de 1879, a construção dos armazéns ficou tolhida à preparação do terreno (BRASIL, 1880, p. 131) e a construção das pontes não pôde principiar pela luta por um leito submarino preparado para garantir a estabilidade para suas fundações e a profundidade mínima projetada. Apenas ao fim do ano principiaram os trabalhos para fundação da ponte, em colunas de madeira articuladas com barras e parafusos de ferro fundido (BRASIL, 1880, p. 132).

Um ano depois do laudatório artigo na Gazeta de Notícias, uma avaliação um tanto mais desairosa era feita no Jornal do Commercio. O centro das críticas na seção “Publicações a Pedido” era a impossibilidade de o projeto ser concretizado pelas dificuldades que a natureza costeira da Gamboa impunha. Em artigo intitulado “O Café na Gamboa”, de autoria de “Viva o Escândalo”, o jornal publicava um desagravo em defesa dos trapiches de café, pois

[...] na Gamboa, justamente o lugar onde nunca em tempo algum pôde fazer-se estação maritima visto como nessa enseada nem ha fundo para os navios, e nem mesmo se podem construir pontes duradouras, porque o terreno, todo de lodo, não se presta a essas obras; mas o ex-dictador da estrada de ferro [Pereira Passos] a nada attende, e consumio em uma obra, que se presta aos fins para que foi executada, milhares de contos de réis [...] (JORNAL DO COMMERCIO, 23/10/1880, p. 3) [grifos meus].

O governo ignorou críticas como essa e seguiu realizando a Estação Marítima, o que incluía modificações nos projetos e nos planos de obras. Uma radical mudança no projeto original foi quanto ao número, à disposição e ao tamanho dos armazéns. Os engenheiros em campo passaram a relatar à direção da estrada que havia alguns inconvenientes na localização projetada dos armazéns, o que forçava a necessidade de adequações no projeto devido a duas variáveis: uma concernente a própria obra e outra quanto à futura operação da estação. A primeira delas era quanto ao terreno, pois, em tese, quanto mais se aproveitassem os terrenos aterrados na proximidade do mar, menor seria a necessidade imediata de mais trabalhos de nivelamento, já que os aterramentos eram finalizados em nível próprio; a segunda é que ter armazéns virados com seus portões laterais para o cais não garantiria um fluxo de composições que atravessassem a estação e fosse diretamente ao cais e à ponte, obrigando a procedimentos de transbordos sistemáticos, mudando os armazéns no sentido de direcionar o portão frontal defronte à linha férrea, por um lado, e aos cais e à ponte, por outro, o fluxo poderia sofrer menos interrupções. Essa mudança pode ser encarada como o reconhecimento de que o projeto original não contemplava o essencial para uma estação marítima: a mais avançada integração da ferrovia com o porto.

Tomadas as decisões para tão expressiva mudança em meio à execução da obra, assim foram planejados dois armazéns constituídos de dois edifícios:

Os quatro armazéns estão reunidos dous a dous, formando dous grandes edifícios de 156 m. de comprimento por 24 m. de largura e 9,70 m. de altura nos lados, tendo cada armazem dous pavimentos, dos quaes o superior apoia sobre fortes columnas de ferro fundido e sobre as paredes lateraes, que assim como as das frentes são de tijolo sem reboco, sobre soccos de alvenaria de pedra com paramento em forma de mosaico [Figura 4]. Para as fundações de quasi todas as columnas e paredes teve-se de empregar estacas de madeira batidas a macaco, por ser o solo compressivel (BRASIL, 1880, p. 131-132).

Figura 4
Armazéns da Estação Marítima da Gamboa (1881)

Os anos de 1879 e 1880 foram decisivos para as obras de construção da Estação Marítima da Gamboa. Foram nesses anos que mais se assentou, instalou e edificou a infraestrutura básica de sua existência material.

Fazendo-se um recorte em 1879 (Tabela 2), quando a estrada despendeu o máximo de recursos em um só exercício - 1.496:626$788 - naquelas obras, podemos ver que, pela primeira vez, as desapropriações foram superadas em valores pela construção dos armazéns; que as escavações continuavam demandando recursos, mesmo com o término do cais em meados do ano e especialmente pelo início da construção das pontes permanentes; e as perfurações e os revestimentos dos túneis, feitos em sua maioria em 1878, ainda permaneciam com saldos a serem liquidados junto ao empreiteiro.

Tabela 2
Despesa da construção da Estação Marítima da Gamboa em 1879

Em 1880, as pontes permanentes tornaram-se “a ponte permanente”, uma única e alongada ponte que partia do centro do cais com, a partir daquele momento, 300 metros de cumprimento e 12 metros de largura, de forma a alcançar em sua extremidade uma capacidade de receber embarcações que necessitavam de 6 a 8 metros de profundidade submersa. Essa ponte foi dotada de três pares de trilhos, sua bitola tinha 1,60 metro e a ligava ao armazém, entretanto os vagões na ponte eram movidos por força humana. A ponte estava ladeada por guindastes e guarnecida por telheiros. Apenas para a ponte, foram realizados 2.795 metros quadrados de assoalhamento (BRASIL, 1881, p. 113). Fato a ser considerado é que as locomotivas paravam nos armazéns da estação e à beira do cais, pois a ponte da estação - a maior e mais bem constituída e equipada do porto do Rio de Janeiro - não suportava o peso daqueles veículos, muito menos dava calado para as maiores embarcações a vapor, apesar de ser muito maior e melhor do que as pontes dos velhos trapiches.

Nesse mesmo ano, foi decidida a construção de um terceiro armazém paralelo aos dois originalmente (re)projetados. O novo projeto era discutido enquanto se concluíam os primeiros armazéns com alvenarias, cantarias, estacas de madeira e colunas de ferro; também os equipavam com elevadores e balanças, instalavam calhas de ferro e escotilhas para o transporte de café, portas de madeira; mobiliavam os escritórios, faziam assoalhamento e esgotamento dos edifícios, calçavam e arruavam o entorno com paralelepípedos (BRASIL, 1881, p. 111-113).

O Gráfico 1 demonstra, em termos financeiros, o grande salto que a atividade construtora dos anos de 1879 e 1880 significou para a obra. Não à toa, em outubro de 1880, a estação foi entregue ao tráfego da EFDPII, especialmente operando a carga e a descarga de café, mesmo com muitos acabamentos e finalizações ainda sendo realizadas, bem como setores inteiros a serem construídos ou equipados. Meses depois, a estrada contratava Manoel Joaquim Borges para o serviço de calçamento com paralelepípedos no pátio da Estação Marítima (BRASIL, 1881, A1, p. 4).

Gráfico 1
Capital empregado pela EFDPII na construção do Ramal e Estação Marítima da Gamboa (1876-1882)

A pressão para a conclusão da obra era tão grande quanto as demandas por resoluções dos problemas urbanos e em propriedades vizinhas que aquela grande movimentação gerava. Figaro assim registrava algo tão banal quanto sintomático da inconclusão das intervenções iniciadas para construção da estação:

Quando demoliram os predios da rua da União para as obras da estação maritima na Gambôa, deram mais largura a essa rua, porém a esburacaram tanto que quando chove torna-se em lamaçal que dura dias e dias, sem se poder alli passar, e quem o fizer ficará sujo (FIGARO, 01/02/1881, p. 4).

O Jornal do Commercio, de forma cifrada e satírica, publicava nota assinada por “Papagaio”, em que levantava dúvidas sobre os chamamentos para fornecimento de materiais à obra. A ilação era a de que a diretoria da empresa direcionava as chamadas para beneficiar determinados fornecedores (JORNAL DO COMMERCIO, 30/07/1881, p. 3). O fato é que a construção e o equipamento da estação não cessaram com a sua plena operação, mesmo as necessidades técnicas mais básicas ainda não estavam instaladas quando ela foi entregue ao tráfego.

Em 1881, o cabeamento e os aparelhos Siemens foram instalados para munir a estação de linha telegráfica (BRASIL, 1882, p. 30), no ano seguinte foi instalada uma linha telefônica (BRASIL, 1883, p. 25). No relatório da diretoria da EFDPII para o ano de 1883, alguns poucos e específicos trabalhos de instalação e construção ainda persistiam: “No armazém n. 1 foram executados diversos trabalhos necessários para a installação do Almoxarifado. [...] Construio-se uma coberta para abrigo da machina do guindaste e reconstruiram-se duas rampas de madeira no caes para o serviço de descarga de carvão” (BRASIL, 1884, p. 110).

Como todos os melhoramentos portuários no Rio de Janeiro do século XIX, a Estação Marítima da Gamboa parecia incompleta e insuficiente desde a sua inauguração, isso explica a continuidade dos investimentos em sua infraestrutura e o orçamento original ter sido extrapolado em 44,6%, pelo menos até 1882. Em 1883, a EFDPII declarava ter 8.429:537$777 em capital empregado exclusivamente em estações, valor que cresceu 96,8% em seis anos. Excluindo os valores destinados ao ramal e suas desapropriações, a Estação Marítima da Gamboa significava, naquele momento, impressionantes 26,9% do investido pela empresa em todas as suas 71 estações (BRASIL, 1877-1884).

Considerações finais

A Estação Marítima da Gamboa foi a mais avançada e capaz unidade de produção portuária construída em seu tempo, sendo integral e plenamente operacional como planejada durante as duas últimas décadas do século XIX. No entanto, a solução encontrada pela EFDPII para fazer a ferrovia encontrar o mar no porto do Rio de Janeiro não tinha condições materiais e técnicas para romper com a lógica operacional vigente, em plena década de 1870. Ao contrário, a reproduzia em níveis superiores, ou seja, era coerente com a forma como o porto do Rio de Janeiro funcionava. Os avanços dos melhoramentos portuários no Rio de Janeiro do século XIX pareciam uma eterna corrida atrás. O desenvolvimento das forças produtivas nos transportes, tanto o ferroviário quanto a navegação a vapor, produziam importantes contradições com a operação portuária vigente, mesmo com o avanço produzido por esses melhoramentos.

Entretanto, a Estação Marítima da Gamboa foi o melhoramento portuário oitocentista erigido em menor tempo e, embora o balanço da obra exibisse vultosos investimentos, certamente foi um dos projetos executados de forma mais completa e avassaladora em todo o país. Além da experiência e da competência da equipe de Francisco Pereira Passos, esse fenômeno se deu por decisão política do governo imperial através da direção da Estrada de Ferro Dom Pedro II, lançando mão dos fundos da empresa e do Tesouro, o quanto fossem necessários para efetivar tal objetivo.

Embora seja um equívoco sobre sua história tomá-la como uma construção meramente portuária ou ferroviária, enquanto estação marítima o seu sucesso é inconteste: existiu como foi concebida, integral e funcionando plenamente, por duas décadas; e mesmo com a construção do porto do Rio de Janeiro, no alvorecer do século XX, foi poupada da demolição e permaneceu em atividade. A maior e mais cara estação ferroviária do Brasil oitocentista parece ter justificado o tempo e os recursos consumidos em sua elaboração e construção. Durante mais de um século, desempenhou funções exatas ou correlatas àquelas para que foi construída, e apenas na década de 1990 o ramal foi desativado e a estação, abandonada.

É necessário entender a elaboração e a construção da Estação Marítima da Gamboa (1876-1883) nos marcos surgidos da intercessão sócio-histórica entre a introdução e a expansão ferroviária no centro-sul brasileiro; a generalização da navegação a vapor e o crescimento de escala das embarcações mercantes; e a nascente preocupação quanto a perspectivas operacionais do porto do Rio de Janeiro, justamente quando os fluxos de importação e exportação - nomeadamente, do café - saltavam aos olhos. Não era mais uma estação ferroviária apenas, muito menos um trapiche de proporções agigantadas, mas algo novo, embora ainda coerente com o Estado Nacional e a empresa ferroviária que tiraram do papel aquele ramal e estação, bem como com a operação portuária que compôs e melhorou, procurando maior integração entre a ferrovia e o porto.

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  • 1
    Artigo não publicado em plataforma preprint. Todas as fontes e a bibliografia utilizadas são referenciadas.
  • 3
    Em outro trabalho defini como encaro os melhoramentos portuários na segunda metade do século XIX, para além do mero enquadramento formal: “Os melhoramentos terminaram por expandir as infraestruturas e reproduzir a lógica portuária pré-capitalista em escala superior. No entanto, mantiveram-se importantes limitações naturais e baixa intervenção na natureza, com capital variável sobrepujando o capital constante (o que acarretava as frágeis infraestruturas e baixo nível de mecanização), a mais-valia absoluta sendo a via preferencial pela qual a acumulação se dava, com a subsunção apenas formal do trabalho, um processo produtivo com níveis de integração e articulação correspondentes ao período de domínio da navegação a vela e com processos de trabalho nada padronizados, ainda extremamente dependente dos saberes e condição física dos trabalhadores” (MANTUANO, 2021, p. 169-170). O fenômeno de sua existência pretendia atender a demandas, anseios e necessidades correntes de acordo com as perspectivas e limitações coevas, não podendo se considerar mera etapa evolutiva de uma operação capitalista porvir. Embora, factualmente, em termos materiais e de experiências, os melhoramentos portuários constituíram acúmulos relevantes para operação portuária capitalista possibilitada com a destruição/construção do porto do Rio de Janeiro no início do século XX (MANTUANO, 2022).
  • 4
    Em outro trabalho defini a concepção coeva de terras de marinha: “Desde a Colônia, as Terras de Marinha são consideradas bens comuns e de interesse estratégico. Praias, margens de rios, lagoas, lagos, canais, mangues, etc. eram considerados pelo direito português como res publica de responsabilidade do soberano e não poderiam ser propriedade privada. Entretanto, como bem esclarece Honorato (1996), essas terras poderiam ser aforadas pelo princípio da Enfiteuse (ou, mais tarde, através da fundação de um Direito Concessional Moderno) com finalidade - única e exclusivamente - produtiva” (MANTUANO, 2020, p. 5).

Editado por

  • Editores Responsáveis: Miguel Palmeira e Stella Maris Scatena Franco

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    23 Jun 2023
  • Aceito
    18 Mar 2024
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