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“Que tal um samba?” e suas camadas

“What about a samba?” and its layers of meaning

RESUMO

Trata-se de uma leitura ideológica da letra de uma canção de Chico Buarque, que apresenta um convite metafórico: restaurar uma situação de estrago, aludindo a um sofrimento imposto. A canção foca nessa contribuição fundamental dos afro-brasileiros, o samba, incidindo sobre locais tradicionalmente considerados seu berço - Valongo, Gamboa, Pedra do Sal - mas que, numa outra camada, são espaços de memória da escravidão. A análise aponta ainda uma outra camada, uma história de curta duração: o que pode estar por detrás da dor coletiva aludida, tendo como referente histórico recente a necropolítica bolsonarista.

PALAVRAS-CHAVE
Chico Buarque; escravidão; samba

ABSTRACT

It is an ideological reading of a song by Chico Buarque, which presents a metaphorical invitation to restore a situation of damage, referring to an imposed suffering. The song focuses on this fundamental contribution of Afro-Brazilians, the samba, focusing on places traditionally considered their birthplace - Valongo, Gamboa, Pedra do Sal - but which, in another layer, are spaces of memory of Slavery. The analysis also shows another layer, which would concern a short-lived history, pointing out what may be behind the collective pain alluded to, having as a recent historical reference the Bolsonarist necro-politics.

KEYWORDS
Chico Buarque; slavery; samba

Quantas camadas terá uma canção de Chico Buarque?

Tentarei dar conta dessa questão na abordagem da letra2 2 Reitero que meu objetivo, nesta leitura ideológica aqui proposta, é abordar a LETRA dessa canção, advertindo o leitor para que acione a sua memória musical, uma vez que a melodia também é produtora de significado. de “Que tal um samba?” (BUARQUE, 2022BUARQUE, Chico. Que tal um samba?. In: BUARQUE, Chico. Que tal um samba?. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2022. 1 single.), à primeira vista de uma quase comovente simplicidade:

Que tal um samba?Um samba
Que tal um samba?
Puxar um samba, que tal?
Para espantar o tempo feio
Para remediar o estrago
Que tal um trago?
Um desafogo, um devaneio
Um samba pra alegrar o dia
Pra zerar o jogo
Coração pegando fogo
E cabeça fria
Um samba com categoria, com calma
Cair no mar, lavar a alma
Tomar um banho de sal grosso, que tal?
Sair do fundo do poço
Andar de boa
Ver um batuque lá no cais do Valongo
Dançar o jongo lá na Pedra do Sal
Entrar na roda da Gamboa
Fazer um gol de bicicleta
Dar de goleada
Deitar na cama da amada
Despertar poeta
Achar a rima que completa o estribilho
Fazer um filho, que tal?
Pra ver crescer, criar um filho
Num bom lugar, numa cidade legal
Um filho com a pele escura
Com formosura
Bem brasileiro, que tal?
Não com dinheiro
Mas a cultura
Que tal uma beleza pura
No fim da borrasca?
Já depois de criar casca
E perder a ternura
Depois de muita bola fora da meta
De novo com a coluna ereta, que tal?
Juntar os cacos, ir à luta
Manter o rumo e a cadência
Esconjurar a ignorância, que tal?
Desmantelar a força bruta
Então que tal puxar um samba
Puxar um samba legal
Puxar um samba porreta
Depois de tanta mutreta
Depois de tanta cascata
Depois de tanta derrota
Depois de tanta demência
E uma dor filha da puta, que tal?
Puxar um samba
Que tal um samba?
Um samba.
(BUARQUE, 2022BUARQUE, Chico. Que tal um samba?. In: BUARQUE, Chico. Que tal um samba?. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2022. 1 single.).

Sim, quantas camadas de significação essa canção teria? Vamos começar pelas iniciais. Num primeiro momento, trata-se aqui, em meio a uma situação adversa, de um convite à alegria e aos pequenos e também grandes prazeres da vida, a tudo que vale a pena, desde tomar um trago, jogar futebol, dançar, até o exercício da criatividade mais alta e daquilo que nos plenifica: fazer poesia, deitar na cama da amada, fazer um filho. Uma ode à vida. E essa alegria é sem arroubos, é um pouco machucada, uma alegria bemolizada (estou falando em termos de conteúdo, não em termos musicais). Apesar do tom contido, sem nenhuma concessão à grandiloquência, há um convite para um samba; e o interessante é que é algo para já, não vale como um aceno ao futuro, a um “amanhã que vai ser outro dia”, mas incide como uma proposta de superação, agora. Em meio à depressão cívica em que se patinava em meados de 2022, era tudo de que precisávamos. A força desse convite nos reenergiza: “Coração pegando fogo”, diz o verso 10.

Mas, em meio às pequenas e grandes alegrias, registra-se também muita negatividade a ser superada, como se verá adiante. Há termos que, na sua enxutez e na sua contundência, demandam que lhes seja fornecido um referente histórico, ou referentes.

Por outro lado, o samba sempre foi, na imagética de Chico Buarque, o espaço da vida, do afeto e da alegria: “Se todo mundo sambasse,/ seria tão fácil viver”, já dizia ele em “Tem mais samba”, uma canção de 1964. Mas é que em certas situações - e o Brasil viveu duas delas, no espaço de duas gerações - ficou difícil sambar, e ficou difícil viver.

Muitas vezes, o samba na produção de Chico vem intercambiado com “Carnaval”: o contraposto de tudo que é repressão, opressão e signo de morte. Daí, impõe-se um paralelismo entre duas canções separadas por exatos 50 anos: “Quando o Carnaval chegar”, de 1972, e “Que tal um samba?”, de 2022 - irmanadas em suas condições de produção, ambas engendradas em tempos de opressão política e de erosão democrática: respectivamente, os 21 anos de Ditadura Militar (de 1964 a 1985); e os “anos de estupidez e obscurantismo”, os “quatro anos de um governo funesto [que] duraram uma eternidade”3 3 Esse discurso de Chico Buarque em 24 de abril de 2023, no Palácio de Queluz, em Portugal, ao receber o Prêmio Camões 2019, teve sua entrega atrasada em quase quatro anos porque o então presidente da República, Jair Bolsonaro, recusou-se a assinar o diploma, o que foi feito pelo novo presidente do Brasil, recém-eleito, Luiz Inácio Lula da Silva. , nas palavras do próprio Chico Buarque (2023)BUARQUE, Chico. Leia na íntegra o Discurso de Chico Buarque ao receber o Prêmio Camões. Estado de Minas, 24 abr. 2023. Disponível em: https://acesse.dev/UCXis. Acesso em: 11 nov. 2023.
https://acesse.dev/UCXis...
, em discurso ao receber o Prêmio Camões de Literatura, em Portugal.

Vejamos algumas estrofes da canção de 1972, produzida em plena Ditadura civil-militar, implantada pelo golpe de 1964:

Quem me vê sempre parado, distante,
Garante que eu não sei sambar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
[...]
Eu vejo as pernas de louça
Da moça que passa e não posso pegar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
[...]
E quem me vê apanhando da vida
Duvida que eu vá revidar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu vejo a barra do dia surgindo
Pedindo pra gente cantar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu tenho tanta alegria, adiada
Abafada, quem dera gritar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar.
(BUARQUE, 1972BUARQUE, Chico. Quando o Carnaval chegar. In: BUARQUE, Chico. Quando o Carnaval chegar. Rio de Janeiro: Phonogram, 1972. Faixa 5.).

O paralelismo é interessante, mas o importante consiste em ressaltar as discrepâncias. Diferentemente da canção da década de 1970, engendrada no meio da Ditadura Militar, e que é uma autêntica “canção de repressão” (MENESES, 1982MENESES, Adelia Bezerra de. (1982). Desenho mágico: poesia e política em Chico Buarque. 3. ed. São Paulo: Ateliê, 2002.) acenando para um futuro em que se daria a libertação, na canção de 2022 é ainda no seio da situação adversa que se propõe “sair do fundo do poço” e “puxar um samba”- e tudo que ele significa de vida. Nessa canção recente não se está em regime de espera (“se guardando” para quando algo chegar), mas há uma convocação para - em meio a essa situação hostil, repito - “juntar os cacos” e “ir à luta”. Também havia em “Quando o Carnaval chegar” um tom de velada ameaça, um andamento em que se repertoriava tudo que não se podia fazer. Por outro lado, em “Que tal um samba?” se inventoria tudo que se pode fazer, mesmo em tempos de “tanta demência” - como os da enunciação da canção.

E já que falei em “canção de repressão”, é o caso de se convocar ainda uma outra, canônica, “Cálice”, composta por Chico Buarque e Gilberto Gil em 1973, também em plena Ditadura,e que a partir do seu título acena para a censura, para o silêncio imposto (“cale-se”) e para a situação-limite do silêncio que é a morte. Foi censurada e teve sua liberação somente em 1978. Vejamos o início dessa composição:

Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta
[...].
(BUARQUE; GIL, 1978BUARQUE, Chico; GIL, Gilberto.Cálice. In: BUARQUE, Chico. Chico Buarque. Rio de Janeiro: Phonogram, 1978. Faixa 2.).

Nesse paralelismo avulta não só aquilo que todos que já se debruçaram sobre essas duas canções não podem deixar de apontar: na sequência de sons dos termos “labuta” e “escuta”, de “Cálice”, 50 anos depois, a rima certa comparece numa outra canção. Pois para a palavra “bruta”, da expressão força bruta, que é retomada em “Que tal um samba?”, a rima é, sim, puta (“uma dor filha da puta”, diz o verso completo) e não o eufemismo irônico “filha da outra”, da canção da década de 1970. Pode-se dizer que, quando enuncia com todas as letras o palavrão, o que o Autor fez foi “achar a rima que completa o estribilho” de 50 anos atrás.

Mas há também uma relação entre o “cálice/ de vinho tinto de sangue”, bem como “beber dessa bebida amarga” da canção “Cálice”, e o convite a “um trago” de “Que tal um samba?”. Em vez de tragar a dor, o aceno a um trago/ para remediar o estrago dos tempos de tanta borrasca. Em vez de “engolir a labuta”, “ir à luta”.Sem alardes, sem grandiloquência, sem vitimização: um convite à resistência. Não há que se engolir nada, a proposta é resiliência, individualmente e enquanto coletividade.

E, finalmente,tomando-se a última estrofe de “Cálice” -

Quero perder de vez tua cabeça
Minha cabeça perder teu juízo
Quero cheirar fumaça de óleo diesel
Me embriagar até que alguém me esqueça
(BUARQUE; GIL, 1978BUARQUE, Chico; GIL, Gilberto.Cálice. In: BUARQUE, Chico. Chico Buarque. Rio de Janeiro: Phonogram, 1978. Faixa 2.).

- ressalta a contraposição entre “perder a cabeça” da canção de 1973e a “cabeça fria” da canção de 2022. No presente, nada de perder nem a cabeça, nem o juízo, nada de se embriagar até o esquecimento (do outro, que seja).

Não dá para falar de canção de repressão sem convocar aquela que se tornou, junto com “Caminhando” (1968), de Geraldo Vandré, quase que um hino oficial do protesto, cantada em qualquer reunião em que comparecessem mais do que uma dúzia de pessoas, e em todas as reuniões de estudantes (logo dissolvidas pela polícia, que sistematicamente prenderia uns e outros), e que todos sabiam de cor: “Apesar de você”, de 1970. Há aí os elementos da “canção de protesto”, sintetizados na recusa de um presente de trevas, e projeção para um futuro que haveria de vir, redimindo uma situação social de falta de liberdade e autoritarismo, tortura e morte (MENESES, 1982MENESES, Adelia Bezerra de. (1982). Desenho mágico: poesia e política em Chico Buarque. 3. ed. São Paulo: Ateliê, 2002.), sintetizados na simbólica escuridão (da qual uma variante será “tempo feio” de “Que tal um samba?”). Logo foi proibida, no momento em que os censores se deram conta de que o “você” do texto poderia referir-se ao ditador general Médici:

Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão, não
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão, viu
Você que inventou esse estado
E inventou de inventar
Toda a escuridão
[...].
(BUARQUE, 1970BUARQUE, Chico. Apesar de você. In: BUARQUE, Chico. Apesar de você. Rio de Janeiro: Phonogram-PolyGram-Philips, 1970. Compacto simples, lado A.).

A situação de opressão comparece canonicamente em “amor reprimido”, “grito contido”, “samba no escuro”:

Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros, juro
Todo esse amor reprimido
Esse grito contido
Este samba no escuro
Você que inventou a tristeza
Ora, tenha a fineza
De desinventar
Você vai pagar e é dobrado
Cada lágrima rolada
nesse meu penar.
(BUARQUE, 1970BUARQUE, Chico. Apesar de você. In: BUARQUE, Chico. Apesar de você. Rio de Janeiro: Phonogram-PolyGram-Philips, 1970. Compacto simples, lado A.).

Aqui o samba é no escuro, diferentemente da canção recente, em que o convite de puxar um samba é feito “pra alegrar o dia”, às claras e em espaços públicos (e espaços significativos para as origens do próprio samba, como se verá). Quanto à “lágrima rolada” e o “penar”, serão retomados na canção de 2022, talvez até intensificados, em “uma dor filha da puta”. No entanto, aqui o amor não será relegado para o futuro, mas “deitar na cama da amada” é uma proposta para o momento.

Finalmente, em “Apesar de você”, na sequência de estrofes mediais em que são convocados ingredientes das canções de protesto de todos os tempos, “jardim florescer” e sobretudo “dia” (“dia a raiar”, “dia que há de vir”), surgem na estrofe final os topoi da poesia e do canto coral , metáfora de uma comunhão reencontrada:

Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia
Como vai se explicar
De repente, impunemente
Como vai abafar
Nosso coro a cantar
Na sua frente.
(BUARQUE, 1970BUARQUE, Chico. Apesar de você. In: BUARQUE, Chico. Apesar de você. Rio de Janeiro: Phonogram-PolyGram-Philips, 1970. Compacto simples, lado A.).

Assim, em “Que tal um samba?” Chico Buarque dialoga com as suas canções de repressão da década de 1970. A recusada realidade opressora tem o mesmo páthos, mas a estratégia mudou. Pois as canções conversam, e o tempo decorrido na sua produção, um intervalo de quase 50 anos, separando os tempos da Ditadura de 64 do governo de erosão democrática de 2022, provocou mudanças. Em termos pessoais, isso significou para o Autor uma passagem da juventude à maturidade, mais precisamente, à terceira idade (de calma resiliência, de mais estratégia, talvez); em termos sociais, isso correspondeu a um amadurecimento da sociedade civil, que, mal ou bem, se expressou - nunca circularam tantas declarações, nunca tantas entidades se posicionaram, nunca tantas “cartas abertas” foram escritas, permeando todas as mídias; nunca tantos manifestos suprapartidários, de professores, psicanalistas, advogados, artistas, associações de classes etc. vieram à luz. Mas sobretudo a sociedade brasileira se expressou com o voto, sem esbanjar, mas o suficiente para ganhar democraticamente as eleições de outubro/novembro de 2022. “Que tal um samba?” é de junho de 2022, e essa canção acabou funcionando como uma previsão do futuro: “depois de tanta demência” o Brasil pode voltar a sambar. E, embora seja doído, com o reconhecimento de que se criou casca, sim, que se perdeu a ternura (desmentindo - com muita pena - o lema do Che Guevara: “É preciso endurecer,mas sem perder a ternura, jamais”)4 4 Ernesto Che Guevara: “Hay que endurecer, pero sin perder la ternura jamás”. .

Vamos à canção de 2022. Como nada do que o Chico escreve é por acaso, há que se procurar referentes para a vida real, e tudo é muito condensado. A eleição de Bolsonaro em 2018 nos levou a um “tempo feio” - expressão que comparece logo no comecinho, no quarto verso, e que se desdobrará ao longo da canção em: “estrago”, “fundo do poço”, “borrasca”, “bola fora da meta”, “cacos” (a serem juntados), “ignorância” (a ser esconjurada), “força bruta” (a ser desmantelada)5 5 No entanto, não se fica na mera constatação - cada vez que um desses termos negativos aparece, leva acoplado um verbo que o anula: fala-se em tempo feio, mas a ação proposta é “espantar”; fala-se em cacos, mas a ação é “juntar”; fala-se em ignorância mas o verbo proposto é esconjurar; fala-se em “força bruta”, mas a ação esperada é desmantelar. Aliás, assim como observou o professor Walter Garcia na canção “Águas de março”, de Tom Jobim, aqui também se verifica uma “alternância entre versos otimistas e pessimistas” (GARCIA,W., 2017) nesse impulso de os artistas apreenderem a vida na sua contraditória diversidade. , “mutreta”, “derrota”, “demência”, “e uma dor filha da puta”. Essa insistência significativa nesse painel de negatividade e de morte nos obriga, a nós, ouvintes/leitores, a um dever de memória histórica. Literalmente, a fazer memória. Cada expressão dessas, semeadas nesses versos, ecoa perplexidades e feridas, recentíssimas, da perspectiva de uma história de curta duração. Todos os ouvintes contemporâneos da canção “Que tal um samba?” somos testemunhas históricas de fatos que estão condensados sob essas expressões.

De fato, paralelamente à pergunta reiterada “Que tal um samba?”, os signos da negatividade vão num crescendo, até tudo desembocar nessa dor indiciando o sofrimento pavoroso dos três últimos anos, “uma dor filha da puta”. A tendência é a sociedade esquecer, mas temos o dever da memória. Por sua contundência, essa expressão exige uma explicação: o Brasil teve 700 mil mortes pela covid-19 na pandemia mal gerenciada pela corja bolsonarista. Setecentas mil. Essas mortes poderiam ter sido reduzidas a um terço se tivéssemos tido um enfrentamento adequado da pandemia. Os 700 mil óbitos no país representam a cifra absurda de 10% dos mortos oficiais por covid no mundo - sendo que o Brasil representa 3% da população do planeta. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) declarou que a covid-19 matou no Brasil quatro vezes mais que a média mundial de óbitos por habitante (OANTAGONISTA, 2022OANTAGONISTA. Fiocruz: covid matou 4 vezes mais no Brasil do que a média mundial. 10 out. 2022. Disponível em: https://encr.pw/hTSUt. Acesso em: 11 nov. 2023.
https://encr.pw/hTSUt...
). De fato, o Brasil teve como mandatário supremo (cuja voz é por grande parte do povo respeitada e ouvida, porque revestida do peso do cargo) um indivíduo que desestimulava o uso de máscaras e o isolamento social; que para combater o vírus defendia remédios para malária (cloroquina) e um fungicida (ivermectina); que boicotava as vacinas e atrasou o quanto pôde as compras e o processo de vacinação (haja vista as conclusões da Comissão Parlamentar de Inquérito - CPI da Covid, em 2022); que pôs à frente do Ministério da Saúde, depois de demitir outros ministros que não se afinavam com seu negacionismo, um general parceiro que se tornou conhecido pela afirmação de que “um manda e outro obedece”. Pois bem, sob o comando desse militar especialista em logística, extraviaram-se 80 mil doses de vacinas que deveriam ter seguido para o Amazonas, mas desembarcaram em outro estado brasileiro cujo nome se inicia por letras iguais: Amapá. Mas há também o caso da crise do oxigênio em Manaus, o que fez um número enorme de pacientes com covid sufocar até o fim. Conforme apuração da CPI da Covid, o Ministério da Saúde foi alertado, mas, passando-se um mês sem que nenhuma iniciativa fosse tomada, a escassez do insumo propiciou a morte dos pacientes nas UTIs.

E desdobrando ainda o que poderia ser a “dor filha da puta”, da canção “Que tal um samba?”, para só ficarmos em dois casos extremos, o que falar dos agravos contra os povos indígenas e,sobretudo, do genocídio Yanomami? Repito: genocídio. Ao longo do governo bolsonarista, não se tratou somente de omissão, mas houve vontade política de extermínio indireto de povos indígenas, devastados pela mineração criminosa em suas terras, com o afrouxamento do controle do garimpo ilegal e do desmatamento, bem como impunidade e desmonte técnico das instituições ambientais. Junto com as florestas destruídas, os rios poluídos e a terra arrasada, sucumbiriam necessariamente os povos originários. Segundo um levantamento realizado em janeiro de 2023 pelo site Sumaúma, 570 crianças yanomamis com menos de 5 anos morreram por causas evitáveis nos últimos quatro anos - um aumento de 29% (MARCELO; CRUZ, 2023MARCELO,Carlos; CRUZ, Márcia Maria. Eliane Brum: “A luta pela Amazônia é uma luta para sempre”. Estado de Minas - Pensar, 27 jan. 2023. Disponível em: https://l1nq.com/kJiZD. Acesso em: 30 out. 2023.
https://l1nq.com/kJiZD...
). Foi “a boiada passando”, do então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, escolhido a dedo para o desmantelamento dos controles ambientais e, por paradoxal que seja (paradoxo coerente com o projeto de ação desse governo), sob suspeita de integrar um esquema de tráfico de madeira ilegal.

É a isso que se pode chamar de necropolítica, uma política de morte. (Aliás, num parêntese, “Viva la muerte!” era a saudação dos militares franquistas na ditadura da Espanha: é a pulsão de morte que opera nesses domínios sombrios do autoritarismo opressor.) No caso brasileiro, o genocídio de povos indígenas conduziria a um ecocídio, na medida em que são esses povos originários que protegem a floresta e que, nos termos de Davi Kopenawa, impedem a “queda do céu” e o comprometimento irreversível do meio ambiente (KOPENAWA; ALBERT, 2015KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. A queda do céu: palavras de um xamã Yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.).

A memória é curta, e há que se registrar tudo isso, nem que seja em uma análise de texto, para as gerações futuras que hão de cantar essa canção (“Ars longa, vitabrevis6 6 “A arte é longa, a vida é breve” (aforisma de Hipócrates, difundido pelo filósofo latino Sêneca). ), que toca tão fundo nesse nervo exposto.

Voltemos a “Que tal um samba?”. É importante assinalar que, ao mesmo tempo que faz esse convite, Chico aproveita para tornar mais uma vez evidente que os mais celebrados bens culturais caracterizadores do Brasil, constitutivos da identidade brasileira, o samba e o futebol, são tingidos de africanidade, tão desmerecida pela boçalidade do governo nefasto. No entanto aqui, nesses tópicos, entraremos no recorte de uma história de longa duração.

Mas, antes, começo pelo “gol de bicicleta”, logo após a referência à Gamboa. Aí vemos que o samba se emparelha com outro signo de identidade brasileira que é o futebol: foi um jogador negro que inventou o gol de bicicleta, Leônidas da Silva, chamado de “Diamante Negro”. E há na canção outras alusões relativas ao futebol; “zerar o jogo”, “dar de goleada”, “bola fora de meta”.

No entanto, a importância maior é dada mesmo ao samba (não fosse esse o título da canção!), devedor das nossas raízes africanas, postulando o reconhecimento de um enorme legado dos afro-brasileiros. Antes do meio da canção, há uma sequência de três versos que condensam referências fortes de vivências culturais ligadas a tradições de origem africana e, muito especificamente, ao samba. Numa primeira camada, é só festa:

ver um batuque lá no Cais do Valongo,
dançar o jongo lá na Pedra do Sal,
entrar na roda da Gamboa.

Vamos examinar esses espaços.

O Cais do Valongo, situado na região portuária do Rio de Janeiro, no bairro da Saúde, recebeu o título de Patrimônio Histórico da Humanidade em 2017 da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), por ser vestígio material da chegada de escravizados nas Américas. E tornou-se um lugar de celebração do legado cultural que a África trouxe ao Brasil, de ancestralidade e identidade. É assim que a esplanada do Valongo acolhe, na atualidade, além do tambor do Valongo (tambor de Cumba), o samba, rodas de capoeira, representações de jongo, desfiles de congada, cirandas, tambores rituais do candomblé, rodas de danças afro-brasileiras etc. (PROJETO “Tambor...”, 2023PROJETO “Tambor no Valongo - Ibejada” acontece neste sábado, 30, no Cais do Valongo. Por Sambando.com. 30 set. 2023. Disponível em: https://encr.pw/dksvI. Acesso em: 13 nov. 2023.
https://encr.pw/dksvI...
).

Quanto à Pedra do Sal, localizada no mesmo bairro da Saúde, é um monumento histórico e religioso, tombado em 20 de novembro de 1984 pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro. Nesse espaço a Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esporte colocou um retrato de Dona Ivone Lara e uma placa que diz: “Neste local o sal era descarregado das embarcações que aportavam nas proximidades. Passou depois a ponto de sambistas que trabalhavam como estivadores”.

Também nas suas imediações foram fundados os primeiros terreiros de candomblé da cidade e aí se encontra a Comunidade Remanescentes de Quilombos da Pedra do Sal. Na atualidade, comporta celebrações e rodas de samba semanais. Ao mesmo tempo local de resistência, de culto e de festas, tornou-se um espaço de referência da cultura afro-brasileira (ROTEIRO Pequena África, s. d.ROTEIRO PEQUENA ÁFRICA (RioTur). Circuito cultural e gastronômico de celebração da herança africana no Rio de Janeiro. s. d. Disponível em: https://riotur.rio/que_fazer/pequena-africa. Acesso em: 28 dez. 2023.
https://riotur.rio/que_fazer/pequena-afr...
).

Não por acaso, é na Pedra do Sal que o eu lírico de “Que tal um samba?” propõe “dançar o jongo”. Envolvendo canto, dança e percussão de tambores, o jongo, vindo de Angola, é uma atividade de múltiplos significados, originalmente “de intenção religiosa fetichista”, tendo perdido na atualidade seu caráter esotérico (ALBIN, 2021ALBIN, Ricardo Cravo. Jongo. Dicionário Cravo Albin da música popular brasileira. Criação e supervisão geral: Ricardo Cravo Albin, 2021. Disponível em: https://dicionariompb.com.br/termo/jongo. Acesso em: 28 dez. 2023.
https://dicionariompb.com.br/termo/jongo...
). No parecer do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), datado de 1º de setembro de 2005, embasando as tratativas para tornar o jongo reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial, assinado pelo antropólogo Marcus Vinicius Carvalho Garcia, é citada uma definição do jongueiro Jefinho, que transcrevo:

O jongo, também conhecido pelos nomes de tambu, tambor e caxambu nas comunidades afro-brasileiras que o praticam envolve canto, dança e percussão de tambores; por seu intermédio, atualizam-se crenças nos ancestrais e nos poderes da palavra. O jongo formou-se basicamente a partir da herança cultural dos negros de língua banto, habitantes do vasto território do antigo Reino do Congo. Trazidos para o Brasil para trabalhar, como escravos, nas fazendas de café e cana-de-açúcar do Vale do Rio Paraíba (Região Sudeste), desenvolveram uma forma própria de comunicação. O canto baseado em provérbios, imagens metafóricas e mensagens cifradas permitia fazer a crônica do cotidiano e reverenciar os antepassados [...]. (JEFINHO apud GARCIA, M. V, 2005GARCIA, Marcus Vinicius Carvalho. Parecer nº 001/GI/DPI/Iphan. Processo nº 01450.005763/2004-43. Assunto: Registro do Jongo no Livro de Registro das Formas de Expressão do Patrimônio Cultural de Natureza Imaterial. Brasília, 1º set. 2005. Disponível em: https://acesse.dev/UjXHF. Acesso em: 27 out. 2023.
https://acesse.dev/UjXHF...
).

Já se vê que se trata de uma celebração própria a uma comunidade, em que, como diz o antropólogo, se reforça o pertencimento a uma matriz cultural e religiosa africana, e em que os sons dos tambores representam a voz ancestral do grupo (GARCIA, M. V., 2005GARCIA, Marcus Vinicius Carvalho. Parecer nº 001/GI/DPI/Iphan. Processo nº 01450.005763/2004-43. Assunto: Registro do Jongo no Livro de Registro das Formas de Expressão do Patrimônio Cultural de Natureza Imaterial. Brasília, 1º set. 2005. Disponível em: https://acesse.dev/UjXHF. Acesso em: 27 out. 2023.
https://acesse.dev/UjXHF...
). Refere ele ainda:

Há um ponto de jongo eternizado na voz de Clementina de Jesus - falecida cantora herdeira direta das tradições jongueiras da região de Valença/RJ - que denota o respeito e a importância desses instrumentos musicais sagrados: “Tava drumindo/ angona7 7 Segundo o verbete “jongo” do Dicionário Cravo Albin da música popular brasileira, “angona” é um dos nomes pelos quais o jongo é conhecido em São Paulo (ALBIN, 2021). me chamou/ vem cantar meu povo/ cativeiro se acabou”. (GARCIA, M. V., 2005GARCIA, Marcus Vinicius Carvalho. Parecer nº 001/GI/DPI/Iphan. Processo nº 01450.005763/2004-43. Assunto: Registro do Jongo no Livro de Registro das Formas de Expressão do Patrimônio Cultural de Natureza Imaterial. Brasília, 1º set. 2005. Disponível em: https://acesse.dev/UjXHF. Acesso em: 27 out. 2023.
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).

Também fica fácil concluir que logo o jongo se tornou um ícone de resistência afro-brasileira - o que tem tudo a ver com a nossa canção em pauta.

Voltemos à Pedra do Sal. Importa dizer que nessa região morava a famosa Tia Ciata (que aliás hoje dá nome à rua que serve de logradouro para a Pedra do Sal), e que está ligada entranhadamente às origens do samba, sendo sua casa chamada de “berço mítico do samba” no Rio de Janeiro. Aliás, falando das tias baianas, “responsáveis por uma nova geração de africanos e baianos que nascia carioca” (MOURA, 2022MOURA, Roberto. Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro. Ed. revista e atualizada. São Paulo: Todavia, 2022., p. 187)8 8 Agradeço a Walter Garcia a indicação do livro de Roberto Moura, Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro, fundamental para o estudo das origens do samba carioca. , que faziam doces e quitutes e davam continuidade ao culto religioso, e em cuja casa se reuniam aqueles que se irmanavam na ancestralidade, na música e na dança, diz Roberto Moura (2022, p. 188)MOURA, Roberto. Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro. Ed. revista e atualizada. São Paulo: Todavia, 2022.:

É fácil perceber a centralidade dessas mulheres conterrâneas, mantenedoras das festas realizadas em homenagem aos santos que depois se profanizavam em encontros de conversa e música, onde se expandia a afetividade do corpo, atualizando o prazer e a funcionalidade da coesão.

De fato, na Pedra do Sal reuniam-se grandes sambistas do passado, como Donga, João da Baiana, Pixinguinha,Heitor dos Prazeres. Aliás, foi o pintor e sambista Heitor dos Prazeres que batizou a região de “Pequena África”, com suas casas coletivas ocupadas por negros escravizados e alforriados (MOURA, 2022MOURA, Roberto. Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro. Ed. revista e atualizada. São Paulo: Todavia, 2022.). Para Roberto Moura, a Pedra do Sal é a capital da Pequena África.

Relativamente à Gamboa, na atualidade, o programa Samba da Gamboa, apresentado na TV Brasil por Diogo Nogueira, divulga a tradição cultural do samba raiz, derivando das rodas de samba um programa televisivo de qualidade. Mas “Gamboa” é também o bairro, aliás desmembrado do bairro da Saúde.

Valongo, Pedra do Sal, Gamboa: espaços culturais da contemporaneidade, no Rio de Janeiro, de afirmação de valores afro-brasileiros, de celebração da herança africana, de culto, de entretenimento e de diversão - e que se transformaram em pontos turísticos. Mas, por detrás dessas atividades de dança, do batuque, da capoeira, do jongo e do samba, por detrás do lúdico nesses lugares referidos, numa outra camada, o eu lírico sabe o que lá existiu antes, sabe o que se passou anteriormente nesses espaços.E o ouvinte/leitor também sabe.

No último livro da trilogia Escravidão, de Laurentino Gomes, Da Independência do Brasil à Lei Áurea, há um capítulo nomeado “O Valongo”, que diz:

No bairro da Gamboa, na cidade do Rio de Janeiro, os ossos falam. Eles contam uma história de dor e sofrimento por muito tempo escondida nas entranhas da terra. Ali nas imediações funcionava, até meados do século XIX, o Cais do Valongo, o maior entreposto de compra e venda de seres humanos do continente americano. Na época da Independência do Brasil, navios negreiros vindos da costa da África despejavam nessa região, por ano, entre 18 mil e 45 mil homens, mulheres e crianças escravizados. Muitos chegavam desnutridos, doentes e fracos demais para serem exibidos de imediato nos concorridos leilões públicos, onde pessoas de aparência mais saudável eram arrematadas por valores altos. Em vez disso, permaneciam em quarentena, para serem engordados e tratados das doenças, ritual que mais tarde permitiria ao vendedor apresentá-los aos compradores em condições de alcançarem melhores preços. Milhares deles, no entanto, não conseguiam sobreviver a essa experiência tão traumática. Morriam antes de encontrar um novo dono. Os corpos eram, então, atirados em valas comuns, quase à flor da terra. Ainda hoje, seus restos podem ser observados em algumas delas. (GOMES, 2022GOMES, Laurentino. Escravidão. Vol. III - Da Independência do Brasil à Lei Áurea. Rio de Janeiro: Globo Livros, 2022., p. 209).

Assim é que a evocação de Valongo, da Pedra do Sal, da Gamboa não ressoa em nós apenas lugares de celebração cultural, ou ecos das origens do samba; é impossível que não despertem em nós as histórias de dor, que confusamente guardamos ou tentamos esquecer, mas que estão presentes na atualidade9 9 Como na canção “Subúrbio” (2006), de Chico Buarque, em que a música vem emparelhada com sofrimento: “Carrega a tua cruz/ E os teus tambores”, fala o eu lírico dirigindo-se à periferia. . Reitero: esses três pontos assinalados, da cidade do Rio de Janeiro, antes de se tornarem lugares de celebração, são lugares de memória.

Ainda no documento do IPHAN que embasa a outorga, pelas Nações Unidas, do título de Patrimônio Artístico Mundial ao Cais do Valongo, registra-se que praticamente um quarto de todos os africanos escravizados chegaram pelo Rio de Janeiro, que assim é considerado o maior porto escravagista da história (IPHAN, 2016IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Sítio Arqueológico Cais do Valongo. Proposta de inscrição na lista do Patrimônio Mundial. Janeiro 2016. Disponível em: https://acesse.one/JMpSv. Acesso em: nov. 2023.
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).

Então, em pontuais e enxutas referências feitas pelo eu lírico em “Que tal um samba?”, comparecem, amalgamadas, a história do samba e a história da escravidão. O que já justificaria o tom contido anteriormente apontado nessa canção.

Mas existe também - como já aludido - a questão contemporânea: então, há que se reler/reouvir a canção não apenas considerando o passado, mas também no registro político de agora. Há que se reler tudo no recorte de um país estigmatizado pela escravatura, que tem um legado de brutalidade e de injustiça que o marca fundamente na atualidade, no prolongamento de um racismo sistêmico que só há muito pouco tempo começa a ser denunciado um pouco mais consequentemente.

A canção todinha é atravessada pela questão da negritude - que aqui neste país significou séculos do mais abominável regime de opressão do ser humano,do qual tão duramente nos ressentimos. Ele vem do passado, perdura na atualidade, mas ultrapassa os governos de plantão, atingindo o cerne da nossa vida social.

Então: o que estou querendo dizer é que o samba e o “ir à luta” proposto em “Que tal um samba?” não significariam apenas vencer o desmonte democrático em curso nos anos 2019-2022 e a iminência de um golpe10 10 A iminência do golpe “que estava no ar” se concretizaria como real tentativa de golpe, abortada por um triz no 8 de janeiro de 2023 (posteriormente, portanto, aos tempos da enunciação da canção) com a invasão e depredação das sedes dos três poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, em Brasília, sob o beneplácito de parte das forças policiais e elementos do Exército. (Tudo aquilo que a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - CPMI - do 8 de janeiro, encerrada em outubro de 2023, vasculhou.) , mas também a luta contra a situação de um país que tem um legado de iniquidade e contas a prestar como povo de matriz africana que nos formou.

Assim, reconhecer e, mais do que isso, reverenciar a influência cultural dos afro-brasileiros nos dois “produtos” mais representativos do país, o samba e o futebol, é uma das camadas de leitura da canção. A outra, como vimos, é mostrar um país atravessado pela história de sofrimento e/ou de degradação dos seus habitantes, de todos eles, tanto dos açoitados (que chegavam a um extremo de devastação física, tratados como animais) quanto dos açoitadores11 11 Açoitados/açoitadores: esse binômio foi criado por Chico Buarque no discurso que proferiu na outorga do “Prêmio Camões”, em Portugal, em 2023: “Como a imensa maioria do povo brasileiro, trago nas veias o sangue do açoitado e do açoitador, o que ajuda a nos explicar um pouco” (BUARQUE, 2023). (na degradação ética a que desciam, desumanizados pelo horror cru que praticavam).

Sem falar que somos todos mestiços. Mas a canção nos incita a ver essa questão em suas consequências na atualidade, repito, naquilo que se convencionou chamar de racismo estrutural, ou racismo sistêmico, neste país que teve como mola de sua formação social e econômica o escravagismo.

Vamos então a essa camada da canção.

É assim que no exato centro da letra (v. 26), os versos apresentam uma proposta - ou um desejo: a utopia de uma sociedade justa, num futuro simbolizado por um “filho”, que revelará toda a beleza do amálgama produzido no Brasil, que poderá viver o fim da borrasca:

Fazer um filho, que tal?
Pra ver crescer, criar um filho
Num bom lugar, numa cidade legal
Um filho com a pele escura
Com formosura
Bem brasileiro, que tal?
Não com dinheiro
Mas a cultura
Que tal um beleza pura
No fim da borrasca?
(BUARQUE, 2022BUARQUE, Chico. Que tal um samba?. In: BUARQUE, Chico. Que tal um samba?. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2022. 1 single.).

Além da clara citação de “Beleza pura”, de Caetano Veloso (1979)VELOSO, Caetano. Beleza pura. In: VELOSO, Caetano. Cinema transcendental. Rio de Janeiro: Polygram/Philips, 1979. Faixa 3. - “pele escura”/ com “formosura” /.../ não com dinheiro/ mas a cultura/[...] beleza pura” -, verifica-se a reiteração do termo filho (três incidências em quatro versos); e pulsa, com todas as letras, o desejo de “fazer um filho [...]/ pra ver crescer”. “Pra ver crescer”: - um filho que não vá engrossar as estatísticas de jovens negros que tombam abatidos pelos confrontos com a polícia, em que negros ou pardos são já de início abordados como suspeitos; o desejo de criar “um filho com a pele escura” sem que, ainda na primeira infância, a caminho da escola, a criança seja atingida por uma bala perdida. E o desejo de que esse filho cresça “num bom lugar, numa cidade legal”, não numa vulnerável “comunidade”, eufemismo para favela, por muitos considerada como substituta da senzala, numa condição “de miséria e mazela”. Pois, como diz a canção “Senzala e favela”, de Wilson das Neves (2023)NEVES, Wilson das. Senzala e favela (part. Chico Buarque e Emicida). Disponível em: https://acesse.dev/TRyWY. Acesso em: nov. 2023.
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, e que Chico canta com Emicida,

Chicote ou zunido de bala
Favela ou senzala
Não faz diferença12 12 A canção “Senzala e favela”, composta pelo baterista Wilson das Neves, ganhou uma interpretação de Chico Buarque e Emicida em 2023. A faixa faz parte do álbum homônimo, póstumo, que homenageia o lendário músico, falecido em 2017, dias antes da previsão da gravação desse disco.
(NEVES, 2023NEVES, Wilson das. Senzala e favela (part. Chico Buarque e Emicida). Disponível em: https://acesse.dev/TRyWY. Acesso em: nov. 2023.
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).

Mas se, ao tratar de elementos fundamentais da negritude, não se poderia deixar de dar espaço para o racismo sistêmico que nos estigmatiza (uma história de longa duração), há elementos pontuais que estão latentes nessa canção que fala em ignorância, derrota e demência, especificamente na contemporaneidade. E aí, numa outra camada, há que se desvendar fatos políticos recentes do governo Bolsonaro, e que dizem respeito diretamente a agravos contra os negros e retrocesso nas conquistas feitas da Abolição para cá.

É importante reiterar o quanto especificamente no governo bolsonarista as ações antirracismo degringolaram no país. Isso começou ainda na campanha eleitoral, quando o candidato estabeleceu como uma das promessas de campanha não reconhecer nenhum território quilombola.

Em entrevista ao programa Roda viva, da TV Cultura, realizada a 30 de julho de 2018, Jair Bolsonaro, ainda como candidato, quando perguntado, pelo frei David, coordenador da organização não governamental Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), sobre a política de cotas raciais, declarou-se contra porque

Essa política só visa dividir o Brasil entre brancos e negros.[...] Somos misturados no Brasil, o negro não é melhor do que eu e eu não sou melhor do que o negro, na Academia Militar vários negros formaram-se comigo, alguns abaixo de mim e outros acima de mim; para que quotas? (BOLSONARO, 2018BOLSONARO, Jair. Jair Bolsonaro - 30 jul. 2018. Roda viva. Entrevistadores: Ricardo Lessa; Daniela Lima; Thaís Oyama; Maria Cristina Fernandes; Leonencio Nossa; Bernardo Mello Franco. TV Cultura. Disponível em: https://l1nk.dev/cvfEG. Acesso em: 21 out. 2023.
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).

Confrontado na sequência pela jornalista Maria Cristina Fernandes, do Valor Econômico, sobre a dívida que a sociedade brasileira teria em relação aos afrodescendentes, declarou, do alto de seus coturnos: Dívida histórica? Eu nunca escravizei ninguém na minha vida”.

Em seguida, culpou os próprios africanos pelo tráfico de escravos para o Brasil, na época da Colônia, desresponsabilizando os colonizadores: “O português nem pisava na África, eram os negros que entregavam os escravos” (BOLSONARO apud GONÇALVES, 2018GONÇALVES, Géssica Brandino. Portugueses nem pisaram na África, diz Bolsonaro sobre escravidão. Folha de S. Paulo, 31 jul. 2018. Disponível em: https://l1nk.dev/Qbmfr. Acesso em: nov. 2023.
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). Aqui, aliam-se ignorância e má-fé.

No entanto, suas investidas contra os negros já se manifestavam antes, como demonstrado na palestra proferida no Clube Hebraica do Rio de Janeiro em abril de 2017. Bolsonaro (2017)BOLSONARO, Jair. Conferência na Hebraica, Rio de Janeiro, 5 abr. 2017. Disponível em: https://acesse.one/gbHGt. Acesso em: 13 nov. 2023.
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declara que, caso eleito presidente, “não vai ter um centímetro demarcado para reserva indígena ou para quilombola”. E nesse mesmo contexto acrescenta: “Fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de um bilhão de reais por ano é gasto com eles”.

O desrespeito, a ofensa, a abjeta truculência que equipara seres humanos a animais permaneceram impunes, malgrado o processo movido contra o então candidato à Presidência por crime de racismo. Avalia-se que haja mais de 6 mil territórios quilombolas no país, onde vivem cerca de 3 milhões de famílias. A direção da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Quilombolas (Conaq) confirma aquilo que todos pudemos constatar: o governo Bolsonaro cumpriu fielmente o que prometeu na campanha (MARQUES, 2022MARQUES, Hugo. Governo Bolsonaro sepulta de vez regularização de terras de quilombolas. Veja, 9 jan. 2022. Disponível em: https://acesse.dev/UIrpU. Acesso em: 30 out. 2023.
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).

No entanto, depois de eleito, a coisa previsivelmente piora: o recém-empossado mandatário tomou várias medidas extremamente lesivas à causa da negritude, como a nomeação, para presidente da Fundação Zumbi de Palmares, de Sergio Camargo, um negro que, paradoxalmente13 13 É o mesmo “paradoxo” que o da nomeação de um antiambientalista como ministro do Meio Ambiente, um anti-povos indígenas como presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai): exemplos paradigmáticos da “demência” referida em “Que tal um samba?”. Mas sabemos que essa loucura tinha lógica: a proposta de destruir a partir de dentro esses órgãos, a estratégia do desmonte. , se põe contra o movimento negro, e cujo objetivo máximo parecia ser o desmonte da entidade que presidia. São muitas as suas declarações extremamente ofensivas e lesivas à causa negra: desde classificar o movimento negro como “escória maldita”, “bando de vagabundos”, a chamar mãe de santo de “macumbeira”, ou dizer que Zumbi era um “filho da puta que escravizava pretos”, até considerar a escravidão “benéfica para os descendentes”. Também é conhecida sua promessa de botar na rua diretores da autarquia que não tivessem como objetivo a demissão de um “esquerdista” (ROSA; LINDNER, 2020ROSA, Vera; LINDNER, Julia. Presidente da Fundação Palmares chama movimento negro de “escória maldita”; ouça áudio. Estadão/Política, 2 jun. 2020. Atualização: 24 fev. 2023. Disponível em: https://encr.pw/GFzD0. Acesso em: 13 nov. 2023.
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). Contra as cotas raciais, à semelhança do chefe no Planalto, negava a existência de racismo no Brasil, considerando o Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, “uma data da qual a esquerda se apropriou para propagar vitimismo e ressentimento racial”.

Creio que importa dizer que aqui limitei o inventário da destruição efetivada pelo governo Bolsonaro ao recorte do racismo estrutural (citando também muito rapidamente o genocídio indígena), uma vez que numa análise/interpretação de uma letra de canção tematizando produções culturais do legado afro-brasileiro não caberia (em todos os sentidos) o registro da sua ação deletéria em outras esferas como a da educação, da cultura, dos direitos humanos em geral, do meio ambiente, da pauta de costumes (com o consequente incremento da homofobia, da misoginia, da aporofobia), com o desmantelamento de instituições da sociedade civil,com a criação do gabinete do ódio, o reinado da mentira como estratégia de governo etc. etc.

Muito coerentemente, o entrevistado defendeu no programa Roda viva acima referido, de julho de 2018, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, notório torturador. Sabe-se que a prática da tortura tão difundida no Brasil, e não apenas no Brasil da Ditadura, tem a ver com os costumes dos senhores de escravos, relativamente aos que lhes eram submetidos, no Brasil Colônia14 14 Para ficarmos no universo de Chico Buarque, cf. a canção “Sinhá” (2011), composta em parceria com João Bosco. .

Por isso, e “depois de tanta derrota”, é que eu gostaria de terminar essa abordagem de “Que tal um samba?”como convite a um descarrego, todos nós necessitados de limparmos as energias pesadas:

Cair no mar, lavar a alma
tomar um banho de sal grosso, que tal?
(BUARQUE, 2022BUARQUE, Chico. Que tal um samba?. In: BUARQUE, Chico. Que tal um samba?. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2022. 1 single.).

E, claro, endossando o convite a puxar um samba.

  • 2
    Reitero que meu objetivo, nesta leitura ideológica aqui proposta, é abordar a LETRA dessa canção, advertindo o leitor para que acione a sua memória musical, uma vez que a melodia também é produtora de significado.
  • 3
    Esse discurso de Chico Buarque em 24 de abril de 2023, no Palácio de Queluz, em Portugal, ao receber o Prêmio Camões 2019, teve sua entrega atrasada em quase quatro anos porque o então presidente da República, Jair Bolsonaro, recusou-se a assinar o diploma, o que foi feito pelo novo presidente do Brasil, recém-eleito, Luiz Inácio Lula da Silva.
  • 4
    Ernesto Che Guevara: “Hay que endurecer, pero sin perder la ternura jamás”.
  • 5
    No entanto, não se fica na mera constatação - cada vez que um desses termos negativos aparece, leva acoplado um verbo que o anula: fala-se em tempo feio, mas a ação proposta é “espantar”; fala-se em cacos, mas a ação é “juntar”; fala-se em ignorância mas o verbo proposto é esconjurar; fala-se em “força bruta”, mas a ação esperada é desmantelar. Aliás, assim como observou o professor Walter Garcia na canção “Águas de março”, de Tom Jobim, aqui também se verifica uma “alternância entre versos otimistas e pessimistas” (GARCIA,W., 2017GARCIA, Walter. A construção de “Águas de março”. In: BACCHINI, Luca (Org.). Maestro soberano: ensaios sobre Antonio Carlos Jobim. Belo Horizonte, UFMG Editora, 2017, p. 105-141.) nesse impulso de os artistas apreenderem a vida na sua contraditória diversidade.
  • 6
    “A arte é longa, a vida é breve” (aforisma de Hipócrates, difundido pelo filósofo latino Sêneca).
  • 7
    Segundo o verbete “jongo” do Dicionário Cravo Albin da música popular brasileira, “angona” é um dos nomes pelos quais o jongo é conhecido em São Paulo (ALBIN, 2021ALBIN, Ricardo Cravo. Jongo. Dicionário Cravo Albin da música popular brasileira. Criação e supervisão geral: Ricardo Cravo Albin, 2021. Disponível em: https://dicionariompb.com.br/termo/jongo. Acesso em: 28 dez. 2023.
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    ).
  • 8
    Agradeço a Walter Garcia a indicação do livro de Roberto Moura, Tia Ciata e a Pequena África no Rio de Janeiro, fundamental para o estudo das origens do samba carioca.
  • 9
    Como na canção “Subúrbio” (2006), de Chico Buarque, em que a música vem emparelhada com sofrimento: “Carrega a tua cruz/ E os teus tambores”, fala o eu lírico dirigindo-se à periferia.
  • 10
    A iminência do golpe “que estava no ar” se concretizaria como real tentativa de golpe, abortada por um triz no 8 de janeiro de 2023 (posteriormente, portanto, aos tempos da enunciação da canção) com a invasão e depredação das sedes dos três poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, em Brasília, sob o beneplácito de parte das forças policiais e elementos do Exército. (Tudo aquilo que a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito - CPMI - do 8 de janeiro, encerrada em outubro de 2023, vasculhou.)
  • 11
    Açoitados/açoitadores: esse binômio foi criado por Chico Buarque no discurso que proferiu na outorga do “Prêmio Camões”, em Portugal, em 2023: “Como a imensa maioria do povo brasileiro, trago nas veias o sangue do açoitado e do açoitador, o que ajuda a nos explicar um pouco” (BUARQUE, 2023BUARQUE, Chico. Leia na íntegra o Discurso de Chico Buarque ao receber o Prêmio Camões. Estado de Minas, 24 abr. 2023. Disponível em: https://acesse.dev/UCXis. Acesso em: 11 nov. 2023.
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    ).
  • 12
    A canção “Senzala e favela”, composta pelo baterista Wilson das Neves, ganhou uma interpretação de Chico Buarque e Emicida em 2023. A faixa faz parte do álbum homônimo, póstumo, que homenageia o lendário músico, falecido em 2017, dias antes da previsão da gravação desse disco.
  • 13
    É o mesmo “paradoxo” que o da nomeação de um antiambientalista como ministro do Meio Ambiente, um anti-povos indígenas como presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai): exemplos paradigmáticos da “demência” referida em “Que tal um samba?”. Mas sabemos que essa loucura tinha lógica: a proposta de destruir a partir de dentro esses órgãos, a estratégia do desmonte.
  • 14
    Para ficarmos no universo de Chico Buarque, cf. a canção “Sinhá” (2011BUARQUE, Chico; BOSCO, João. Sinhá. In: BUARQUE, Chico. Chico. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2011. Faixa 10.), composta em parceria com João Bosco.

Referências

  • ALBIN, Ricardo Cravo. Jongo. Dicionário Cravo Albin da música popular brasileira Criação e supervisão geral: Ricardo Cravo Albin, 2021. Disponível em: https://dicionariompb.com.br/termo/jongo Acesso em: 28 dez. 2023.
    » https://dicionariompb.com.br/termo/jongo
  • BOLSONARO, Jair. Conferência na Hebraica, Rio de Janeiro, 5 abr. 2017. Disponível em: https://acesse.one/gbHGt Acesso em: 13 nov. 2023.
    » https://acesse.one/gbHGt
  • BOLSONARO, Jair. Jair Bolsonaro - 30 jul. 2018. Roda viva Entrevistadores: Ricardo Lessa; Daniela Lima; Thaís Oyama; Maria Cristina Fernandes; Leonencio Nossa; Bernardo Mello Franco. TV Cultura. Disponível em: https://l1nk.dev/cvfEG Acesso em: 21 out. 2023.
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  • BUARQUE, Chico. Tem mais samba. In: BUARQUE, Chico. Chico Buarque de Hollanda Rio de Janeiro: RGE, 1966. Faixa 2.
  • BUARQUE, Chico. Apesar de você. In: BUARQUE, Chico. Apesar de você Rio de Janeiro: Phonogram-PolyGram-Philips, 1970. Compacto simples, lado A.
  • BUARQUE, Chico. Quando o Carnaval chegar. In: BUARQUE, Chico. Quando o Carnaval chegar Rio de Janeiro: Phonogram, 1972. Faixa 5.
  • BUARQUE, Chico. Subúrbio. In: BUARQUE, Chico. Carioca. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2006. Faixa 1.
  • BUARQUE, Chico. Leia na íntegra o Discurso de Chico Buarque ao receber o Prêmio Camões. Estado de Minas, 24 abr. 2023. Disponível em: https://acesse.dev/UCXis Acesso em: 11 nov. 2023.
    » https://acesse.dev/UCXis
  • BUARQUE, Chico. Que tal um samba?. In: BUARQUE, Chico. Que tal um samba? Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2022. 1 single.
  • BUARQUE, Chico; BOSCO, João. Sinhá. In: BUARQUE, Chico. Chico Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2011. Faixa 10.
  • BUARQUE, Chico; GIL, Gilberto.Cálice. In: BUARQUE, Chico. Chico Buarque Rio de Janeiro: Phonogram, 1978. Faixa 2.
  • CANTORI, Cláudio Roberto. “Que tal um samba?” (A poética da Redenção). Brasil247, 15 jul. 2022. Disponível em: https://l1nq.com/jNX5M Acesso em: 27 set. 2023.
    » https://l1nq.com/jNX5M
  • ESTADÃO. Presidente da Fundação Palmares: movimento negro é “escória maldita”. Ouça. Estadão Conteúdo, 2 jun. 2020. Disponível em: https://l1nk.dev/bF93Z Acesso em: nov. 2023.
    » https://l1nk.dev/bF93Z
  • GARCIA, Marcus Vinicius Carvalho. Parecer nº 001/GI/DPI/Iphan. Processo nº 01450.005763/2004-43. Assunto: Registro do Jongo no Livro de Registro das Formas de Expressão do Patrimônio Cultural de Natureza Imaterial. Brasília, 1º set. 2005. Disponível em: https://acesse.dev/UjXHF Acesso em: 27 out. 2023.
    » https://acesse.dev/UjXHF
  • GARCIA, Walter. A construção de “Águas de março”. In: BACCHINI, Luca (Org.). Maestro soberano: ensaios sobre Antonio Carlos Jobim. Belo Horizonte, UFMG Editora, 2017, p. 105-141.
  • GOMES, Laurentino. Escravidão Vol. III - Da Independência do Brasil à Lei Áurea. Rio de Janeiro: Globo Livros, 2022.
  • GONÇALVES, Géssica Brandino. Portugueses nem pisaram na África, diz Bolsonaro sobre escravidão. Folha de S. Paulo, 31 jul. 2018. Disponível em: https://l1nk.dev/Qbmfr Acesso em: nov. 2023.
    » https://l1nk.dev/Qbmfr
  • IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Sítio Arqueológico Cais do Valongo. Proposta de inscrição na lista do Patrimônio Mundial. Janeiro 2016. Disponível em: https://acesse.one/JMpSv Acesso em: nov. 2023.
    » https://acesse.one/JMpSv
  • KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. A queda do céu: palavras de um xamã Yanomami. São Paulo: Companhia das Letras, 2015.
  • MARCELO,Carlos; CRUZ, Márcia Maria. Eliane Brum: “A luta pela Amazônia é uma luta para sempre”. Estado de Minas - Pensar, 27 jan. 2023. Disponível em: https://l1nq.com/kJiZD Acesso em: 30 out. 2023.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    18 Nov 2023
  • Aceito
    05 Mar 2024
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