Análise do perfil lipídico de uma população de estudantes universitários

Resumos

OBJETIVO:

avaliar o perfil lipídico de uma população de estudantes universitários.

MÉTODO:

estudo transversal, realizado com 702 alunos, de ambos os gêneros, matriculados nos diversos cursos de uma universidade pública de Fortaleza, CE. Os dados sociodemográficos e os relativos aos hábitos de vida foram coletados mediante questionário autopreenchido. A coleta sanguínea foi realizada em um laboratório de análises clínicas.

RESULTADOS:

prevaleceu uma população jovem, com média de idade de 21,5 anos e do gênero feminino (62,7%). Valores elevados de triglicerídeos, colesterol total e colesterol associado à lipoproteína de baixa densidade foram encontrados em 23,0%, 9,7% e 5,9% dos alunos, respectivamente. O colesterol associado à lipoproteína de alta densidade apresentou-se com valores diminuídos em 12,0% dos sujeitos, apresentando, também, associação estatisticamente significativa com o tabagismo (p=0,0231) e sedentarismo (p=0,0357).

CONCLUSÃO:

alterações no perfil lipídico estão presentes na população jovem e estudos de intervenção devem ser incentivados com a finalidade de diminuir a prevalência de doenças cardiovasculares na idade adulta.

Dislipidemias; Triglicerídeos; HDL-Colesterol; LDL-Colesterol; Adulto Jovem

OBJECTIVE:

to evaluate the lipid profile in a population of university students.

METHODS:

cross-sectional study with 702 students, of both genders enrolled in various courses at a public university in Fortaleza-CE. The demographic data and data on lifestyle habits were collected through a self-administered questionnaire. The blood collection was performed in a clinical laboratory.

RESULTS:

showed a predominantly young population, with a mean age of 21.5 years with more females (62.7%). High levels of triglycerides, total cholesterol and cholesterol associated with low density lipoprotein (LDL-c) were found in 23.0%, 9.7% and 5.9% of students, respectively. The cholesterol associated with high density lipoprotein (HDL-c) was at reduced values in 12.0% of subjects and was significantly associated with smoking (p=0.0231) and physical inactivity (p=0.0357).

CONCLUSION:

changes in lipid profile are present in the young population and intervention studies should be encouraged in order to reduce the prevalence of cardiovascular disease in adulthood.

Dyslipidemias; Triglycerides; Cholesterol, HDL; Cholesterol, LDL; Young Adult

OBJETIVO:

evaluar el perfil lipídico en una población de estudiantes universitarios.

MÉTODO:

se trata de estudio transversal realizado en 702 alumnos, de ambos géneros, matriculados en los diversos cursos de una universidad pública de Fortaleza, estado de Ceará. Los datos sociodemográficos y los relativos a los hábitos de vida fueron recolectados mediante un cuestionario tipo autollenado. La recolección sanguínea fue realizada en un laboratorio de análisis clínicos.

RESULTADOS:

prevaleció una población joven, con media de edad de 21,5 años y del género femenino (62,7%). Valores elevados de triglicéridos, colesterol total y colesterol asociado a la lipoproteína de baja densidad (LDL-c) fueron encontrados en 23,0%, 9,7% y 5,9% de los alumnos, respectivamente. El colesterol asociado a la lipoproteína de alta densidad (HDL-c) mostró valores disminuidos en 12,0% de los sujetos y presentó asociación estadísticamente significativa con el tabaquismo (p=0,0231) y sedentarismo (p=0,0357).

CONCLUSIÓN:

las alteraciones en el perfil lipídico están presentes en la población joven y los estudios de intervención deben ser incentivados con la finalidad de disminuir la prevalencia de enfermedades cardiovasculares en la edad adulta.

Dislipidemias; Triglicéridos; HDL-Colesterol; LDL-Colesterol; Adulto Joven

Introdução

Os lipídios, representados pelos fosfolípides, colesterol, triglicerídeos (TG) e ácidos graxos, são considerados essenciais para o corpo humano, seja por formarem a estrutura básica das membranas celulares (fosfolípides), seja por serem precursores dos hormônios esteroides, dos ácidos biliares e da vitamina D, assim como constituintes das membranas celulares, atuando na fluidez dessas e na ativação de enzimas aí situadas (colesterol)^{( 1 )}.

Quanto aos TGs, esses são formados com base em três ácidos graxos ligados a uma molécula de glicerol e constituem uma das formas de armazenamento energético mais importantes do organismo, sendo depositados nos tecidos adiposos e musculares. Já com relação às lipoproteínas, destaca-se que essas permitem a solubilização e o transporte dos lipídios, substâncias geralmente hidrofóbicas, no meio aquoso plasmático. Torna-se importante frisar que existem quatro grandes classes de lipoproteínas separadas em dois grupos: a) as ricas em TG, maiores e menos densas, representadas pelos quilomícrons, de origem intestinal, e pelas lipoproteínas de densidade muito baixa, de origem hepática, e b) as ricas em colesterol, formando partículas de Densidade Baixa (LDL-c) e de Densidade Alta (HDL-c)^{( 1 )}.

Em muitas situações, as concentrações desses lipídeos e/ou lipoproteínas não estão em quantidades normais no corpo humano, ocorrendo o que a literatura científica denomina de dislipidemia. Estudar o perfil lipídico (determinações bioquímicas do Colesterol Total − CT, HDL-c, TG e do LDL-c) após jejum de 12 a 14 horas, tem sido uma atividade de grande valia, haja vista que as pesquisas já realizadas, de correlação entre a morfologia das artérias, obtidas em autópsias e os fatores de risco cardiovascular têm permitido demonstrar que a dislipidemia é um fator de grande importância para o desenvolvimento da aterosclerose em idades posteriores da vida^{( 2 )}, assim como para o desenvolvimento de outros agravos de saúde como a síndrome metabólica e o diabetes mellitus tipo 2^{( 1 )}.

Sabe-se que a predisposição genética possui influência no desenvolvimento de alterações nos níveis de colesterol; entretanto, não é determinante, na maioria dos casos em que a exposição a um inadequado estilo de vida é observado^{( 1 )}. Vale salientar que pesquisadores já têm identificado a presença de fatores de risco para doenças crônicas em pessoas jovens, sobretudo nos adolescentes, demonstrando que, a cada dia, os indivíduos de pouca idade vêm apresentando hábitos inadequados de vida^{( 3 )}. Assim, torna-se necessário e de fundamental importância avaliar o estilo de vida dos adultos jovens para que medidas de prevenção possam ser tomadas o mais precocemente possível^{( 4 )}.

Ainda, com relação à população jovem, destaque pode ser dado aos estudantes universitários. Dentre algumas justificativas que comprovam a importância de se estudar esse público está o fato de que eles são submetidos a condições particulares com sua entrada no sistema universitário. Para muitos estudantes, o ingresso na faculdade corresponde ao primeiro momento em que eles terão de se responsabilizar por sua moradia, alimentação e gestão de suas finanças. A associação entre a dificuldade em realizar tais tarefas e os fatores psicossociais, estilo de vida e situações próprias do meio acadêmico contribui para a exposição desses estudantes a hábitos inadequados de vida, como omissão de refeições, consumo de lanches rápidos e ingestão de refeições nutricionalmente desequilibradas, o que pode resultar em componentes de risco para diversas doenças^{( 5 )}.

Estudos^{( 6 - 7 )} mostram que grande parcela de estudantes universitários já havia usado drogas lícitas e ilícitas pelo menos uma vez na vida, e que muitos deles consideravam o consumo de álcool e cigarro como normal e de aceitação social, o que faz com que seu consumo seja crescente e, consequentemente, traga malefícios à saúde. Dessa forma, depreende-se que os universitários apresentam distintos comportamentos de risco e que, portanto, devem ser investigados.

Particularizando a problemática para as dislipidemias, autores portugueses realizaram um levantamento com 154 estudantes de uma universidade e constataram que a exposição à vida universitária aumentou sobremaneira o nível de colesterol. Os autores verificaram que os alunos recém-ingressos no ensino superior apresentavam proporções menores de dislipidemias (28,6%), sobrepeso (12,5%) e tabagismo (0,0%), quando comparados aos estudantes expostos à vida acadêmica (44,0% − dislipidemia, 16,3% − sobrepeso e 19,3% − tabagismo)^{( 4 )}.

Dados da literatura já vêm demonstrando que, apesar de jovens, muitos universitários já possuem fatores de risco para doenças crônicas e metabólicas^{( 8 )}. Com o objetivo de verificar o perfil lipídico de estudantes de nutrição e a sua relação com outros fatores de risco cardiovascular, um estudo realizado em Santa Catarina, Brasil, com 63 estudantes universitárias, cuja idade variava entre 17 e 43 anos, identificou valores de HDL-c baixos em 47,6% das estudantes e encontrou hipercolesterolemia em 38,1% delas^{( 9 )}.

Outra investigação brasileira, dessa vez realizada na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, São Paulo, com 153 estudantes universitários, teve como objetivo analisar o perfil lipídico e sua correlação com fatores de risco para doenças cardiovasculares e, dentre seus principais resultados, destaca-se que níveis alterados de colesterol total, LDL-c e TG foram detectados em 11,8, 9,8 e 8,5% dos estudantes, respectivamente, assim como níveis reduzidos de HDL-c em 12,4% deles^{( 10 )}.

É importante ressaltar que, diante de tais achados, caso não ocorra intervenção precoce, provavelmente, esses problemas irão se perpetuar e continuarão a impactar negativamente a saúde desses indivíduos^{( 11 - 12 )}.

Dessa forma, levando em consideração que as dislipidemias estão presentes na população jovem e que os estudos com essa população são escassos, sobretudo no Brasil, o objetivo desta investigação foi o de analisar o perfil lipídico numa população de estudantes universitários.

Métodos

Trata-se de estudo de corte transversal, realizado com estudantes de ambos os gêneros, de uma universidade pública de Fortaleza, Brasil, no período de janeiro a julho de 2011.

Com base no número total de alunos matriculados nos cursos presenciais da universidade investigada, extraiu-se a amostra mediante aplicação da fórmula para populações infinitas, sendo utilizado P=50%, Q=50%, nível de significância de 0,05 e erro amostral relativo de 8% (erro absoluto=4%)^{( 13 )}.

O cálculo resultou em 702 estudantes que foram estratificados de acordo com as áreas: Humanas (20,4%), Exatas (16,5%), Agrárias (14,0%), Saúde (15,1%), Ciências (18,1%) e Tecnologia (15,9%). Estabeleceram-se os critérios de inclusão: ter idade ≥18 anos, ser aluno dos cursos presenciais diurnos, concordar em participar de todas as etapas da coleta de dados, possuir telefone fixo ou celular e e-mail para contato. Foram excluídas as gestantes e as nutrizes.

Da totalidade dos cursos presenciais diurnos, selecionaram-se dois de cada área do conhecimento. Os alunos foram recrutados por meio de convites feitos pelos pesquisadores em sala de aula e cartazes afixados pela universidade.

Os dados sociodemográficos e os relativos aos hábitos de vida foram coletados mediante questionário autopreenchido, sendo utilizado referencial teórico pertinente a cada um deles:

Sedentarismo − foram classificados sedentários os alunos que afirmaram não praticar atividades físicas regulares, com frequência mínima de três vezes por semana e com duração mínima de trinta minutos consecutivos, por exercício^{( 14 )}.

Tabagismo − foi classificado em quatro categorias: fumantes diários (os que fumaram, pelo menos, um cigarro por dia, por no mínimo um mês antes do preenchimento do questionário); fumantes ocasionais (os que não fumam diariamente); ex-fumantes (aqueles que, após terem sido fumantes, deixaram de fumar há pelo menos um mês) e não fumantes (os que nunca fumaram ou estavam fumando há menos de um mês)^{( 15 )}.

Consumo de álcool − utilizou-se o AUDIT (Alcohol Use Disorders Identification Test), sendo empregada a versão validada no Brasil^{( 16 )}.

Quanto aos dados antropométricos, vale deixar claro que todas as medições foram realizadas por um grupo de enfermeiros devidamente treinados que seguiram, rigorosamente, os procedimentos-padrões, mostrados a seguir.

Peso - foi mensurado com os acadêmicos descalços, com roupas leves e sem o uso de acessórios. Para tanto, utilizou-se uma balança antropométrica eletrônica para adultos, com capacidade de 200kg.

Estatura - usou-se fita antropométrica inelástica, fixada em parede lisa, e os pesquisados foram orientados a se posicionarem eretos e imóveis, com as mãos espalmadas sobre as coxas e com a cabeça ajustada ao plano de Frankfurt.

Índice de Massa Corporal (IMC) - definido como a razão entre o peso (kg) e o quadrado da altura (m²⁾, foi calculado e analisado, levando em consideração o preconizado pela Organização Mundial da Saúde^{( 17 )}, ou seja, considerado como baixo se IMC<18,5kg/m², eutófico, se ≥18,5 e <25,0, sobrepeso, se valores situados entre 25,0 e 29,9kg/m² e com obesidade aquele com IMC≥30kg/m²;

Circunferência da Cintura (CC) - medida no ponto médio entre a última costela e a borda superior da crista ilíaca, foi aferida no final do movimento expiratório, mediante a utilização de uma fita métrica inelástica, colocada sobre a pele, no sujeito em posição ereta^{( 8 )}.

A coleta de sangue venoso - foi feita em um laboratório de análises clínicas. Utilizou-se sistema de coleta a vácuo, BD Vacutainer ^(r) (São Paulo, Brasil), por meio de punção. Para tal, os participantes do estudo se submeteram a um jejum alimentar de doze horas para as determinações bioquímicas de triglicerídeos, colesterol total e suas frações. A amostra foi armazenada em tubos de 5mL, sem anticoagulante (para as dosagens de triglicerídeos, colesterol total e frações).

Após a coleta, as amostras foram processadas e centrifugadas durante vinte minutos em centrífuga sorológica digital, LS3 Plus CELM^(r) (São Paulo, Brasil), com força g máxima 1.700 x g. A seguir, alíquotas de 1mL de soro foram separadas para a realização das dosagens bioquímicas. Na avaliação dos parâmetros bioquímicos, empregaram-se kits comerciais, Labtest Diagnóstica S/A^(r) (Minas Gerais, Brasil), com técnicas padronizadas, baseadas em métodos enzimáticos e colorimétricos, por espectrofotometria, segundo as recomendações do fabricante. Enquanto as concentrações foram determinadas mediante emprego do analisador bioquímico automático Labmax 240^(r) (Minas Gerais, Brasil), as determinações do LDL-c foram calculadas mediante a fórmula de Friedewald. Para todos os participantes ofereceu-se um lanche gratuito, após a coleta das amostras sanguíneas.

No tocante à análise estatística, adotou-se o software SPSS, versão 16.0. Para as variáveis sociodemográficas e econômicas, do tipo contínuo, foram calculadas as médias e o desvio-padrão. Para associar o perfil lipídico com o gênero, foi utilizada a mediana das variáveis e o teste de Mann-Whitney. Na associação entre as médias dos níveis séricos de colesterol total, HDL-c, LDL-c e triglicerídeos com as variáveis relacionadas aos hábitos de vida e aos dados antropométricos, utilizou-se a análise de variância Anova e, em seguida, teste de Tukey. Para todos os cruzamentos foram considerados significantes aqueles cujo valor p fosse inferior a 0,05.

Ressalta-se que todos os universitários assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Federal do Ceará, sob Protocolo nº 208/10.

Resultados

Participaram do presente estudo 702 universitários. Desses, 62,7% eram mulheres, 49,3% pardos, 92,0% solteiros e 53,3% estavam na faixa etária de 20 a 24 anos. A idade variou de 18 a 58 anos, com média de 21,5 anos (dp=1,57). Houve participação majoritária dos alunos da área de Ciências Humanas, 20,4%, e dos novatos, 69,1%.

A média da renda familiar foi de R$3.211,66 (dp=3.765,48), distribuída em maior concentração nas classes econômicas B e C (79,0%), consideradas com poder aquisitivo mediano para os padrões brasileiros. Além disso, 64,7% dedicavam-se, exclusivamente, aos estudos e 70,4% moravam com os pais.

Detectou-se excesso de peso em 26,4%, sendo 21,3 e 5,1% para sobrepeso e obesidade, respectivamente. A CC esteve com seus valores elevados em 5,4% dos estudantes. Verificou-se, ainda, que 70,2% eram sedentários, 8,5% faziam uso do tabaco e 6,6% possuíam consumo nocivo do álcool.

Com relação ao perfil lipídico dos universitários, altos valores de triglicerídeos, colesterol total e LDL-c foram encontrados em 23,0, 9,7 e 5,9%, respectivamente. No referente ao HDL-c, valores diminuídos estiveram presentes em 12,0% dos estudantes.

Ao associar o perfil lipídico com o gênero, percebeu-se que o masculino foi o que apresentou maiores medianas de colesterol total, LDL-c e triglicerídeos, enquanto o gênero feminino apresentou valores mais elevados de HDL-c. Em todos os cruzamentos foi encontrada associação estatisticamente significativa, conforme sumarização na Tabela 1.

Tabela 1
Valores de mediana para perfil lipídico de acordo com o gênero. Estudantes universitários. Fortaleza, CE, Brasil, 2011

Perfil lipídico (mg/dl)		Feminino (N=440)	Masculino (N=262)	Total (N=702)	Valor p*
Colesterol total					0,0079
	Mediana	146	153	149
	Mín-Máx	12-1512	89-250	12-1512
HDL-c					0,0000
	Mediana	56	49	52
	Mín-Máx	38-124	38-70	38-124
LDL-c					0,0000
	Mediana	66	79	70
	Mín-Máx	14-174	12-172	12-174
Triglicerídeos					0,0000
	Mediana	125	135	130
	Mín-Máx	46-220	50-244	46-244

• *Teste de Mann-Whitney

Os níveis séricos de colesterol total estiveram elevados nos indivíduos fumantes, com excesso de peso e naqueles que apresentaram valores elevados da circunferência da cintura. Além disso, apresentaram-se indiferentes quando associados à prática de atividade física. Não houve relação estatisticamente significativa em nenhum dos cruzamentos realizados. No que se refere ao HDL-c, percebe-se que as variáveis tabagismo e sedentarismo apresentaram relação significante, ou seja, estudantes que fumam e que são inativos fisicamente apresentaram médias inferiores quando comparados aos universitários não fumantes que praticam atividades físicas (Tabela 2).

Tabela 2
Associação entre as médias dos níveis séricos de colesterol total, HDL-c, LDL-c e triglicerídeos com as variáveis relacionadas aos hábitos de vida e aos dados antropométricos, em estudantes universitários. Fortaleza, CE, Brasil, 2011

Variável		Colesterol total			Lipoproteína de baixa densidade (HDL-c)			Lipoproteína de alta densidade (LDL-c)			Triglicerídeos
		Média	p*		Média	p*		Média	p*		Média	p*
Tabagismo			0,5812			0,0231			0,1697			0,0771
	Fumante	159			51			80			134
	Não fumante	154			54			74			126
Sedentarismo			0,9422			0,0357			0,3132			0,1532
	Sim	155			52			76			130
	Não	155			54			73			126
IMC			0,5800			0,0751			0,0203			0,1542
	Baixo peso	151			53			73			124
	Eutrófico	153			54			72			125
	Sobrepeso	160			52			81			132
	Obesidade	161			51			83			130
Circunferência da cintura			0,5112			0,4471			0,3638			0,2167
	Normal	155			53			74			127
	Elevada	161			54			79			133

• *Teste utilizado - Anova. Considerado significante p<0,05

As médias do LDL-c estiveram mais elevadas nos indivíduos fumantes, sedentários, com valores elevados da circunferência da cintura e, principalmente, naqueles com excesso de peso, apresentando, nesse último item, associação estatisticamente significativa. As médias dos triglicerídeos não apresentaram relação significante com nenhuma das variáveis estudadas (Tabela 2).

Com base na normalidade das variáveis, foram realizadas medidas de correlação por intermédio do teste de Spearman. A correlação entre os níveis de LDL-c e HDL-c demonstrou ser proporcional (r=0,167), mas fraca e estatisticamente insignificante (p=0,248) (Figura 1). Entre os não fumantes a correlação entre os níveis de HDL-c foi positiva (r=0,391) e estatisticamente significante (p=0,005); isto é, nesse grupo, há aumento nos níveis dessa lipoproteína (Figura 2). No que se refere ao LDL-c, esse fato não se repetiu (r=-0,223) e não houve relevância estatisticamente significativa (p=0,122) (Figura 2).

Figura 1
Correlação entre os níveis de LDL-c e HDL-c em universitários. Fortaleza, CE, Brasil, 2011

Figura 2
Correlação entre os níveis de HDL-c e LDL-c e tabagismo em universitários. Fortaleza, CE, Brasil, 2011

Discussão

No presente estudo, avaliaram-se 702 estudantes universitários, de ambos os gêneros. Prevaleceu uma população jovem, com média de idade de 21,5 anos e do gênero feminino. O excesso de peso, o sedentarismo, o consumo de tabaco e de álcool estiveram presentes em 26,4, 70,2, 8,5 e 6,6% da amostra, respectivamente. Valores elevados de triglicerídeos, colesterol total e LDL-c foram encontrados em 23,0, 9,7 e 5,9% dos alunos, respectivamente. O HDL-c esteve com valores diminuídos em 12,0% dos sujeitos e apresentou associação estatisticamente significativa com o tabagismo e sedentarismo.

A média de idade de 21,5 anos pode ser explicada por ser essa a faixa etária mais frequente para cursar o ensino superior no Brasil. Para comprovar tal afirmação, pode-se destacar uma investigação, realizada no sudoeste do Estado de Minas Gerais, com 349 estudantes dos cursos de Enfermagem, Ciências Biológicas, Nutrição e Educação Física, a qual encontrou que 45,3% da amostra tinha idade entre 20 e 30 anos^{( 18 )}.

Conforme observado, o sobrepeso e a obesidade estiveram presentes em 21,3 e 5,1%, respectivamente, percentuais superiores aos encontrados em universitários de Portugal^{( 19 )}, 12,2 e 3,2%, e inferiores aos encontrados no Chile^{( 20 )}, onde o excesso de peso esteve presente em 70,1% da amostra.

Em relação à prática de atividade física, a maioria dos estudantes foi classificada como sedentária (70,2%). Ainda como observado, referências que pudessem ser comparadas a esse resultado são, praticamente, unânimes em demonstrar o elevado índice de inatividade física entre os estudantes do ensino superior. Tais achados não remetem apenas ao Brasil, pois são comuns em outros países, muitas vezes com prevalências mais preocupantes. Em âmbito nacional, estudos encontraram percentuais de sedentarismo de 74,7 e 57,9%, respectivamente^{( 18 , 21 )}, enquanto, internacionalmente, pesquisas encontraram valores de 91,5 e 72,5%, respectivamente^{( 20 , 22 )}.

Ainda, em relação aos hábitos de vida, o tabagismo e o etilismo estiveram presentes em 8,5 e 6,6% dos estudantes. Quanto ao tabagismo, estudiosos venezuelanos, ao investigarem uma população de 100 estudantes universitários, encontraram valores superiores ao da presente pesquisa, destacando que 23,0% deles faziam uso do tabaco^{( 23 )}. Outros pesquisadores, ao buscarem investigar fatores de risco para enfermidades crônicas não transmissíveis em 120 acadêmicos de medicina, encontraram prevalências de tabagismo e etilismo em, aproximadamente, 34,2 e 68,3% deles, respectivamente^{( 22 )}.

Observou-se que, no estudo em questão, os homens foram os que apresentaram maiores alterações nos valores de CT (p=0,0079), LDL-c (p=0,0000) e triglicerídeos (p=0,0000). Já as mulheres obtiveram maiores índices de HDL-c (p=0,0000). Esses achados, ao serem comparados com a literatura, podem ser similares ou não. Por exemplo, estudo realizado em Cartagena, Colombia, com 301 estudantes encontrou, também, que os homens foram os que apresentaram maiores alterações nos níveis de CT, LDL-c e triglicerídeos, encontrando nesse último associação estatisticamente significante^{( 24 )}.

Os achados da presente pesquisa, entretanto, não coincidem com os resultados de uma investigação realizada em Portugal, com 154 estudantes da Universidade de Aveiro. Os autores também encontraram associação estatisticamente significativa entre o perfil lipídico e o gênero; entretanto, foram as mulheres que apresentaram maiores médias de CT (164,1mg/dL), LDL-c (83,04mg/dL) e triglicerídeos (112,69mg/dL), quando comparadas aos homens^{( 4 )}.

Em relação ao cruzamento realizado entre os hábitos de vida e dados antropométricos com o perfil lipídico, o presente estudo encontrou que os sujeitos fumantes, sedentários, com excesso de peso e com a circunferência da cintura elevada foram os que apresentaram dislipidemia.

Para o tabagismo, foi encontrada associação estatisticamente significativa com os níveis de HDL-c (p=0,0231). A literatura deixa claro que o tabagismo conduz a alterações do perfil lipídico, acarretando significativo aumento nos valores dos triglicéridos, das VLDL e do LDL-c, assim como diminuição do HDL-c^{( 25 )}.

O sedentarismo esteve associado, também, ao HDL-c, apresentando menores médias do colesterol entre aqueles que não praticavam atividades físicas regulares. Sabe-se que o exercício físico produz aumento do metabolismo lipídico e dos glicídios. Uma das alterações mais significativas é o aumento do HDL-c, considerada a fração que possui um efeito protetor para a doença aterosclerótica^{( 1 )}. Esses achados, confrontados com a literatura, corroboram a forte ligação existente entre a prática de exercícios físicos e a manutenção da saúde^{( 26 )}.

O excesso de peso esteve associado estatisticamente (p=0,0203) ao aumento nos níveis de LDL-c na presente pesquisa. Em estudo realizado na Universidade Tufts, em Boston, Estados Unidos, com 564 (média de idade=19,1 anos) estudantes, identificou-se que 16,2% dos universitários já apresentavam sobrepeso/obesidade. Além disso, foi encontrada forte associação entre o sobrepeso e os níveis elevados de CT e LDL-c, assim como entre a prática de atividades físicas, o aumento do HDL-c e a diminuição dos triglicerídeos^{( 26 )}.

A classificação da circunferência da cintura (CC), no presente estudo, não apresentou relação estatística significante com o perfil lipídico; entretanto, percebeu-se que aqueles estudantes que estavam com a medida elevada possuíam médias de CT, LDL-c e TG aumentadas, quando comparados àqueles com CC normal. A busca pela literatura identificou que estudiosos brasileiros também encontraram resultados similares e outros pesquisadores já haviam observado que indivíduos com obesidade abdominal apresentavam maior prevalência de dislipidemia, assim como de outros agravos como hipertensão arterial e diabetes mellitus ^{( 9 )}.

Diante do exposto, percebe-se que os estudantes universitários avaliados apresentaram alterações significativas em distintas variáveis relacionadas à saúde, como o excesso de peso, o sedentarismo e a dislipidemia, o que demonstra a necessidade de haver avaliações rotineiras nessa parcela da população. Pesquisadores já sugerem a necessidade de avaliar a saúde, os determinantes de saúde e o comportamento de jovens durante a transição da escola para a universidade^{( 27 )}.

Não se pode negar que os jovens, ao entrarem na universidade, ainda estão moldando seus hábitos, estão em um ponto crítico das suas vidas e fazendo escolhas de estilo de vida. A transição para a vida adulta é um momento ideal para incentivar os sujeitos a adotarem hábitos de vida saudáveis. Dessa forma, as chances de essa população aderir às orientações no que se refere a um estilo de vida mais saudável aumentam significativamente^{( 11 - 12 )}.

Conclusão

Os resultados do estudo apontam que alterações no perfil lipídico estiveram presentes na população investigada. Valores elevados de triglicerídeos, colesterol total e LDL-c foram encontrados em 23,0, 9,7 e 5,9% dos universitários, respectivamente. O HDL-c esteve com valores diminuídos em 12,0% dos sujeitos e apresentou associação estatisticamente significante com o tabagismo (p=0,0231) e sedentarismo (p=0,0357).

Diante desses achados, novas pesquisas devem ser realizadas, sejam elas de cunho epidemiológico, para que amostras maiores de estudantes universitários possam ser analisadas em distintas áreas brasileiras, sejam elas pesquisas de intervenção, para que hábitos saudáveis de vida sejam incorporados e desenvolvidos na vida desses acadêmicos.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Sept-Oct 2013

Histórico

• Recebido
  28 Jul 2012
• Aceito
  15 Jul 2013