RESUMO
OBJETIVO:
Estimar a relação entre gasto catastrófico em saúde (GCS) e multimorbidade em amostra nacional representativa da população brasileira com 50 anos de idade ou mais.
MÉTODOS:
Foram utilizados dados de 8.347 participantes do Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros (2015–2016). A variável dependente foi o GCS, definido pela razão entre as despesas com saúde do adulto de 50 anos ou mais e a renda domiciliar. A variável de interesse foi a multimorbidade (duas ou mais doenças crônicas), e a variável utilizada para estratificação foi o escore de riqueza. As principais análises foram baseadas na regressão logística multivariada.
RESULTADOS:
A prevalçncia de GCS foi de 17,9% e 7,5% para gastos correspondentes a 10% e 25% da renda domiciliar, respectivamente. A prevalçncia da multimorbidade foi de 63,2%. A multimorbidade apresentou associações positivas e independentes com GCS (OR = 1,95, IC95% 1,67–2,28 e OR = 1,40, IC95% 1,11–1,76 para gastos correspondentes a 10% e 25%, respectivamente). Os gastos associados à multimorbidade foram maiores entre aqueles com menor escore de riqueza.
CONCLUSÕES:
Os resultados chamam atenção para a necessidade de uma abordagem integrada da multimorbidade nos serviços de saúde, de forma a evitar os GCS, particularmente entre adultos mais velhos com piores condições socioeconômicas.
DESCRITORES
Idoso; Multimorbidade; Fatores Socioeconômicos; Gasto Catastrófico
ABSTRACT
OBJECTIVE:
To estimate the relation between catastrophic health expenditure (CHE) and multimorbidity in a national representative sample of the Brazilian population aged 50 year or older.
METHODS:
This study used data from 8,347 participants of the Estudo Longitudinal de Saúde dos Idosos Brasileiros (ELSI – Brazilian Longitudinal Study of Aging) conducted in 2015–2016. The dependent variable was CHE, defined by the ratio between the health expenses of the adult aged 50 years or older and the household income. The variable of interest was multimorbidity (two or more chronic diseases) and the variable used for stratification was the wealth score. The main analyses were based on multivariate logistic regression.
RESULTS:
The prevalence of CHE was 17.9% and 7.5%, for expenditures corresponding to 10 and 25% of the household income, respectively. The prevalence of multimorbidity was 63.2%. Multimorbidity showed positive and independent associations with CHE (OR = 1.95, 95%CI 1.67–2.28, and OR = 1.40, 95%CI 1.11–1.76 for expenditures corresponding to 10% and 25%, respectively). Expenditures associated with multimorbidity were higher among those with lower wealth scores.
CONCLUSIONS:
The results draw attention to the need for an integrated approach of multimorbidity in health services, in order to avoid CHE, particularly among older adults with worse socioeconomic conditions.
DESCRIPTORS:
Middle Aged; Aged; Multimorbidity; Socioeconomic Factors; Cost of Illness; Catastrophic Expenditure
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, a preocupação relacionada aos gastos com saúde tem sido destaque globalmente, considerando que esses gastos tçm crescido mais rapidamente do que o Produto Interno Bruto (PIB) da maioria dos países, especialmente naqueles de baixa e média renda 11. World Health Organization. Global report: Public Spending on Health: a closer look at global trends. Geneva: WHO; 2018. . Entretanto, um maior gasto nacional não implica necessariamente melhores condições de saúde nem maior equidade no acesso aos serviços 22. Hsiao WC. Why is a systemic view of health financing necessary? health affairs. Health Aff (Millwood). 2007;26(4):950-61. https://doi.org/10.1377/hlthaff.26.4.950
https://doi.org/10.1377/hlthaff.26.4.950...
. De maneira geral, os sistemas de saúde devem permitir que as pessoas utilizem os serviços sem incorrer em sacrifício financeiro, o que faz parte do objetivo de cobertura universal em saúde, proposto pela Organização das Nações Unidas, em seus Objetivos do Desenvolvimento Sustentável 33. World Health Organization. Tracking universal health coverage: 2017 Global Monitoring Report. Geneva: WHO; 2017. Co-published by the The World Bank. . Embora muitos países se esforcem neste sentido, dados recentes apontam uma tendçncia de aumento dos gastos catastróficos com saúde 44. Wagstaff A, Flores G, Hsu J, Smitz MF, Chepynoga K, Buisman LR, et al. Progress on catastrophic health spending in 133 countries: a retrospective observational study. Lancet Glob Health. 2018;6(2):e169-79. https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30429-1
https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30...
, aqueles que excedem uma porcentagem da renda, do consumo ou da capacidade de pagamento das famílias 33. World Health Organization. Tracking universal health coverage: 2017 Global Monitoring Report. Geneva: WHO; 2017. Co-published by the The World Bank.–55. Xu K, Evans DB, Kawabata K, Zeramdini R, Klavus J, Murray CJ. Household catastrophic health expenditure: a multicountry analysis. Lancet. 2003;362(9378):111-7. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(03)13861-5
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(03)13...
. Existem diferentes pontos de corte, que variam de 10% a 40%, para definir esse tipo de gasto, a depender do denominador utilizado para o cálculo 33. World Health Organization. Tracking universal health coverage: 2017 Global Monitoring Report. Geneva: WHO; 2017. Co-published by the The World Bank.–55. Xu K, Evans DB, Kawabata K, Zeramdini R, Klavus J, Murray CJ. Household catastrophic health expenditure: a multicountry analysis. Lancet. 2003;362(9378):111-7. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(03)13861-5
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(03)13...
.
Dados reportados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que, em 2010, 808 milhões de pessoas (11,7% da população mundial) incorreram em gastos com saúde que excederam 10% do orçamento familiar e, para 179 milhões de pessoas (2,6% da população mundial), os gastos correspondentes excederam o limite de 25% do orçamento familiar 33. World Health Organization. Tracking universal health coverage: 2017 Global Monitoring Report. Geneva: WHO; 2017. Co-published by the The World Bank. . No Brasil, entre 2007 e 2015, 25,6% da população incorreu em gastos com saúde superiores a 10% do total das despesas ou rendas domiciliares 66. World Health Organization. World health statistics 2018: monitoring health for the SDGs, sustainable development goals. Geneva: WHO; 2018. .
Estudos apontam maior impacto dos gastos catastróficos com saúde em famílias de nível socioeconômico mais baixo 77. Barros AJ, Bastos JL, Dâmaso AH. Catastrophic spending on health care in Brazil: private health insurance does not seem to be the solution. Cad Saude Publica. 2011;27 Suppl 2: s254-62. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011001400012
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201100...
,88. Boing AC, Bertoldi AD, Barros AJD, Posenato LG, Peres KG. Socioeconomic inequality in catastrophic health expenditure in Brazil. Rev Saude Publica. 2014;48(4):632-41. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2014048005111
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20140...
. Além disso, evidçncias mostram associação positiva entre doenças crônicas e maior desembolso direto com saúde 99. McRae I, Yen L, Jeon YH, Herath PM, Essue B. Multimorbidity is associated with higher out-of-pocket spending: a study of older Australians with multiple chronic conditions. Aust J Prim Health. 2013;19(2):144-9. https://doi.org/10.1071/PY12035
https://doi.org/10.1071/PY12035...
,1010. Sum G, Hone T, Atun R, Millett C, Suhrcke M, Mahal A, et al. Multimorbidity and out-of-pocket expenditure on medicines: a systematic review. BMJ Glob Health. 2018;3(1): e000505. https://doi.org/10.1136/bmjgh-2017-000505
https://doi.org/10.1136/bmjgh-2017-00050...
. Dentro do contexto de envelhecimento populacional, caracterizado pela predominância e pelo grande ônus das doenças crônicas não transmissíveis 1111. GBD 2016 Causes of Death Collaborators. Global, regional, and national age-sex specific mortality for 264 causes of death, 1980-2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet. 2017;390(10100):1151-1210. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(17)32152-9
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(17)32...
, a preocupação com o impacto financeiro gerado por elas também tem sido objeto de estudo 99. McRae I, Yen L, Jeon YH, Herath PM, Essue B. Multimorbidity is associated with higher out-of-pocket spending: a study of older Australians with multiple chronic conditions. Aust J Prim Health. 2013;19(2):144-9. https://doi.org/10.1071/PY12035
https://doi.org/10.1071/PY12035...
,1212. Bähler C, Huber CA, Brüngger B, Reich O. Multimorbidity, health care utilization and costs in an older adult community-dwelling population: a claims data based observational study. BMC Health Serv Res. 2015;15:23. https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-2
https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-...
.
O fenômeno da multimorbidade – a ocorrçncia simultânea de mais de uma doença no mesmo indivíduo 1313. World Health Organization. The World Health Report 2008 - primary health care (now more than ever). Geneva: WHO; 2008. – também é cada vez mais comum, e com tendçncia de crescimento 1414. Kingston A, Robinson L, Booth H, Knapp M, Jagger C; MODEM project. Projections of multi-morbidity in the older population in England to 2035: estimates from the Population Ageing and Care Simulation (PACSim) model. Age Ageing. 2018;47(3):374-80. https://doi.org/10.1093/ageing/afx201
https://doi.org/10.1093/ageing/afx201...
. Idosos com multimorbidade representam uma complexa demanda, já que utilizam com maior frequçncia os serviços 1212. Bähler C, Huber CA, Brüngger B, Reich O. Multimorbidity, health care utilization and costs in an older adult community-dwelling population: a claims data based observational study. BMC Health Serv Res. 2015;15:23. https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-2
https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-...
, elevam os custos para os sistemas de saúde 1212. Bähler C, Huber CA, Brüngger B, Reich O. Multimorbidity, health care utilization and costs in an older adult community-dwelling population: a claims data based observational study. BMC Health Serv Res. 2015;15:23. https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-2
https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-...
,1515. Picco L, Achilla E, Abdin E, Chong SA, Vaingankar JA, McCrone P, et al. Economic burden of multimorbidity among older adults: impact on healthcare and societal costs. BMC Health Serv Res. 2016; 16:173. https://doi.org/10.1186/s12913-016-1421-7
https://doi.org/10.1186/s12913-016-1421-...
e aumentam as chances de gastos catastróficos para as famílias 99. McRae I, Yen L, Jeon YH, Herath PM, Essue B. Multimorbidity is associated with higher out-of-pocket spending: a study of older Australians with multiple chronic conditions. Aust J Prim Health. 2013;19(2):144-9. https://doi.org/10.1071/PY12035
https://doi.org/10.1071/PY12035...
.
A relação entre condições socioeconômicas, doenças crônicas e gastos em saúde na população geral já foi avaliada por diferentes estudos 77. Barros AJ, Bastos JL, Dâmaso AH. Catastrophic spending on health care in Brazil: private health insurance does not seem to be the solution. Cad Saude Publica. 2011;27 Suppl 2: s254-62. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011001400012
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201100...
–1010. Sum G, Hone T, Atun R, Millett C, Suhrcke M, Mahal A, et al. Multimorbidity and out-of-pocket expenditure on medicines: a systematic review. BMJ Glob Health. 2018;3(1): e000505. https://doi.org/10.1136/bmjgh-2017-000505
https://doi.org/10.1136/bmjgh-2017-00050...
, porém a associação entre gasto catastrófico em saúde e multimorbidade em idosos ainda é pouco explorada, especialmente em países em desenvolvimento. No Brasil, essa associação é desconhecida, embora particularmente relevante, considerando o rápido envelhecimento populacional e as desigualdades sociais nas condições de saúde e no uso dos serviços dessa população 1616. Lima-Costa MF, Facchini LA, Matos DL, Macinko J. Mudanças em dez anos das desigualdades sociais em saúde dos idosos brasileiros (1998-2008). Rev Saude Publica. 2012;46 Supl 1:100-7. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000059
https://doi.org/10.1590/S0034-8910201200...
. Assim, os objetivos deste estudo são: (1) descrever a distribuição dos gastos catastróficos em saúde (GCS) em amostra nacional representativa da população brasileira de adultos mais velhos; (2) estimar a associação destes gastos com multimorbidade; e (3) avaliar se as condições socioeconômicas interferem nessa associação.
MÉTODOS
Foram utilizados dados da linha de base do Estudo Longitudinal de Saúde dos Idosos Brasileiros (ELSI-Brasil), conduzido entre 2015 e 2016 em amostra representativa da população brasileira não institucionalizada, com idade igual ou superior a 50 anos. O ELSI-Brasil utilizou uma amostra probabilística selecionada por meio de processos de estratificação e conglomerados, em diferentes estágios. Nos domicílios selecionados, todos os residentes com 50 anos ou mais foram elegíveis para a entrevista e outros procedimentos. A amostra final da linha de base do ELSI-Brasil foi composta por 9.412 indivíduos, residentes em 70 municípios de diferentes regiões do país.
No presente estudo, foram considerados todos os indivíduos com idade igual ou superior a 50 anos que participaram do inquérito da linha de base da pesquisa e que possuíam todas as informações necessárias para a análise de dados proposta, totalizando 8.347 pessoas. Mais detalhes sobre o ELSI-Brasil podem ser vistos na homepage da pesquisa (elsi.cpqrr.fiocruz.br) e em publicação anterior 1717. Lima-Costa MF, Andrade FB, Souza Jr PRB, Neri AL, Duarte YAO, Castro-Costa E, et al. The Brazilian Longitudinal Study of Aging (ELSI-Brazil): objectives and design. Am J Epidemiol. 2018;187(7):1345-53. https://doi.org/10.1093/aje/kwx387
https://doi.org/10.1093/aje/kwx387...
.
O ELSI-Brasil foi aprovado pelo Comitç de Ética em Pesquisa do Instituto René Rachou da Fundação Oswaldo Cruz (CAAE:34649814.3.0000.5091) e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) antes das entrevistas.
Variável Dependente
A variável dependente do estudo foi o gasto catastrófico em saúde (sim/não), definido como a razão entre o desembolso direto, relativo a todas as despesas com saúde realizadas pelo adulto com 50 anos ou mais nos últimos 30 dias e a renda total do domicílio. Os indivíduos cujos gastos atingiram valores iguais ou maiores a 10% ou valores iguais ou maiores a 25% da renda domiciliar foram classificados como incorrendo em gastos catastróficos, conforme proposto previamente 33. World Health Organization. Tracking universal health coverage: 2017 Global Monitoring Report. Geneva: WHO; 2017. Co-published by the The World Bank.,44. Wagstaff A, Flores G, Hsu J, Smitz MF, Chepynoga K, Buisman LR, et al. Progress on catastrophic health spending in 133 countries: a retrospective observational study. Lancet Glob Health. 2018;6(2):e169-79. https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30429-1
https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30...
.
Foram consideradas as seguintes despesas de saúde para compor o desembolso direto: consulta médica, consulta com dentista, internações hospitalares, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, psicólogo, cuidador/técnico de enfermagem, exames de laboratório/imagem e outros, nutricionista e medicamentos. No ELSI-Brasil, considerou-se o período recordatório de 90 dias para os gastos com saúde, com exceção das despesas com medicamentos, coletadas com base nos últimos 30 dias. Desta forma, para permitir a soma dos valores e calcular o desembolso direto nos últimos 30 dias, os gastos avaliados com período recordatório de 90 dias foram divididos por trçs. Todas as variáveis relacionadas ao gasto e à renda foram deflacionadas para o ano de 2015, utilizando-se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) disponibilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O poder de compra de 1 real de 2016 equivalia, em média, a 95 centavos do ano de 2015.
A renda domiciliar foi estabelecida pela soma dos rendimentos de todos os moradores, considerando cinco fontes: salário ou trabalho autônomo; aposentadoria ou pensão por morte; Bolsa Família, Benefício de Prestação Continuada, pensão alimentícia ou doação em dinheiro; aluguéis ou arrendamentos; e outras. Foi assumido que os dados faltantes para um ou mais itens representariam ausçncia de renda no item em questão. Os entrevistados que não relataram o valor exato do rendimento foram solicitados a informar o intervalo mais próximo, sendo utilizado o ponto médio do intervalo como valor do rendimento. Para o último intervalo de classe, o valor foi imputado considerando o ganho mediano dos demais moradores com rendimento nessa faixa, que informaram a renda na pergunta aberta.
Covariáveis
A multimorbidade, definida como a presença de duas ou mais condições crônicas de saúde 1313. World Health Organization. The World Health Report 2008 - primary health care (now more than ever). Geneva: WHO; 2008. , foi a principal variável independente. As doenças crônicas foram selecionadas de uma lista com 17 doenças, sendo elas: hipertensão arterial, diabetes, colesterol alto, infarto do miocárdio, angina, insuficiçncia cardíaca, acidente vascular encefálico (AVE), asma, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), artrite ou reumatismo, osteoporose, problema na coluna, depressão, câncer, insuficiçncia renal crônica, doença de Parkinson e doença de Alzheimer. A presença dessas doenças foi avaliada por meio de autorrelato, utilizando-se a pergunta: “Algum médico já disse que o(a) senhor(a) tem...”.
As demais variáveis independentes incluíram: idade (50–59, 60–69, 70–79 e 80 anos ou mais); sexo (feminino e masculino); proporção de idosos no domicílio; escolaridade (não estudou, 1–3, 4–7 e 8 ou mais anos de estudo); estado civil (sem ou com relação marital); escore de riqueza (1º, 2º, 3º, 4º e 5º quintis); número médio de medicamentos utilizados; plano de saúde (sim e não); e limitação funcional (sim e não).
O escore de riqueza, categorizado em quintis, foi definido através da análise de componentes principais 1818. Fry K, Firestone R, Chakraborty NM. Measuring equity with nationally representative wealth quintiles. Washington, DC: Population Services International; 2014. , usando informações sobre propriedade familiar de bens duráveis e características da habitação: bens domésticos (internet, televisão, televisão a cabo, geladeira, máquina de lavar roupa, lava-louças, máquina de secar roupa, computador, telefone de mesa, telefone celular, micro-ondas, motocicleta, carro) e características domésticas (empregada doméstica, parede de alvenaria ou parede de madeira, água encanada, rua pavimentada, banheiro).
A limitação funcional foi avaliada segundo o relato de dificuldades para realizar uma ou mais atividades básicas de vida diária (atravessar de um cômodo a outro, vestir-se, tomar banho, comer, deitar-se e/ou levantar da cama e usar o banheiro).
Análise dos Dados
Foi realizada análise descritiva das variáveis do estudo e da proporção das despesas de saúde em relação ao desembolso direto. Utilizou-se a regressão logística univariada, seguida de regressão logística múltipla, para avaliar a associação entre o gasto catastrófico e cada variável independente. Foram incluídas no modelo múltiplo todas as variáveis com p-valor menor do que 0,20 e permaneceram no modelo final aquelas significativamente associadas ao desfecho. Os resultados foram expressos por meio do odds ratio e respectivos intervalos de confiança (IC95%). As probabilidades ajustadas de gasto catastrófico entre indivíduos com multimorbidade de acordo com o escore de riqueza foram calculadas a partir da inclusão do termo de interação entre a multimorbidade e o escore de riqueza. A análise dos dados foi realizada com o software Stata 14.0 ( StataCorp College Station , Estados Unidos), considerando-se os parâmetros amostrais e os pesos dos indivíduos.
RESULTADOS
A Tabela 1 apresenta a análise descritiva da amostra, composta majoritariamente por mulheres (54%), adultos na faixa etária entre 50 a 59 anos (46,9%), com relação marital (63,2%) e 8 anos ou mais de estudo (37,4%). A maioria da população estudada apresentava multimorbidade (63,2%), não tinha limitação funcional (84,4%) e não possuía plano de saúde privado (74,1%). A prevalçncia de GCS foi de 17,9% para o ponto de corte de 10% da renda domiciliar e de 7,5% para o ponto de corte de 25% da renda domiciliar.
Características sociodemográficas e de saúde dos participantes da pesquisa (Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros), 2015–2016
A partir da avaliação dos componentes do gasto em saúde, verificou-se que o gasto com medicamentos representou a maior proporção do desembolso direto (65,1%), seguido do gasto com dentista e do gasto com consultas médicas ( Tabela 2 ).
Proporção média das despesas de saúde em relação ao desembolso direto de adultos mais velhos no Brasil (Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros), 2015–2016.
Na análise univariada, todas as variáveis foram significativamente associadas ao gasto catastrófico nos dois pontos de corte, com exceção da escolaridade para ambos os pontos e da atividade física para o ponto de corte de 25% da renda domiciliar ( Tabela 3 ).
Análises univariadas entre o gasto catastrófico e variáveis independentes (Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros), 2015–2016.
A Tabela 4 apresenta os resultados dos fatores associados ao GCS. Após o ajuste do modelo, indivíduos do sexo feminino, mais velhos, com menor escolaridade, com limitação funcional e que possuíam plano de saúde privado apresentaram maiores chances de incorrer em GCS, para ambos os pontos de corte. Apenas a associação entre a escolaridade de 4 a 7 anos de estudo e o gasto igual ou maior a 25% da renda domiciliar e a associação entre o escore de riqueza para o mesmo ponto de corte não se mantiveram estatisticamente significativas após o ajuste do modelo. Observou-se ainda que a presença de multimorbidade aumentou em 95% a chance de GCS igual ou superior a 10%, além de aumentar em 40% a chance de GCS igual ou superior a 25% da renda domiciliar. Os resultados também apontaram que adultos mais velhos pertencentes ao maior escore de riqueza possuem 5% menos chances de incorrer em gasto catastrófico para o ponto de corte de 10% da renda domiciliar ( Tabela 4 ).
Modelo múltiplo de regressão logística para os fatores associados ao gasto catastrófico em saúde (Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros), 2015–2016.
A Figura 1 apresenta as probabilidades ajustadas de GCS de acordo com a presença de multimorbidade e escore de riqueza. Nos dois pontos de corte, verificaram-se diferenças significativas entre as probabilidades de gastos catastróficos de acordo com a presença de multimorbidade e o escore de riqueza. As probabilidades de GCS foram maiores entre indivíduos com multimorbidade e com menor escore de riqueza, para os dois pontos de corte.
Probabilidades ajustadas de gasto catastrófico em saúde entre adultos mais velhos com e sem multimorbidade de acordo com escore de riqueza (Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros), 2015–2016.
DISCUSSÃO
O presente estudo verificou um impacto significativo das despesas com saúde na renda domiciliar de adultos mais velhos. Aproximadamente um quinto dos indivíduos analisados incorreram em GCS excedendo em 10% a renda domiciliar, e 8% dos indivíduos incorreram em GCS, quando utilizado o ponto de corte de 25%. O gasto com medicamentos foi a principal despesa com saúde. Os GCS foram significativamente associados à multimorbidade, a qual potencializou também os efeitos das desigualdades socioeconômicas, independentemente do ponto de corte utilizado.
A prevalçncia de GCS estimada para os dois pontos de corte é superior à encontrada na população total de países ricos e de países da América Latina e Caribe 44. Wagstaff A, Flores G, Hsu J, Smitz MF, Chepynoga K, Buisman LR, et al. Progress on catastrophic health spending in 133 countries: a retrospective observational study. Lancet Glob Health. 2018;6(2):e169-79. https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30429-1
https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30...
, onde a estimativa de GCS alcançou 13,4% em 2000, saltando para 14,8% em 2010, considerando o total de despesas com saúde da família para o ponto de corte de 10% do consumo familiar 44. Wagstaff A, Flores G, Hsu J, Smitz MF, Chepynoga K, Buisman LR, et al. Progress on catastrophic health spending in 133 countries: a retrospective observational study. Lancet Glob Health. 2018;6(2):e169-79. https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30429-1
https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30...
. Entre países ricos, estudo realizado com australianos de 55 anos ou mais verificou que 11,8% e 5,1% incorreram em GCS para os pontos de corte de 10% e 20%, respectivamente 99. McRae I, Yen L, Jeon YH, Herath PM, Essue B. Multimorbidity is associated with higher out-of-pocket spending: a study of older Australians with multiple chronic conditions. Aust J Prim Health. 2013;19(2):144-9. https://doi.org/10.1071/PY12035
https://doi.org/10.1071/PY12035...
. Ante a estimativa de 25,6% da OMS, para o período entre 2007 e 2015, que considerou a população brasileira como um todo 66. World Health Organization. World health statistics 2018: monitoring health for the SDGs, sustainable development goals. Geneva: WHO; 2018. , a prevalçncia de GCS entre adultos mais velhos no país para o ponto de corte de 10% pode ser considerada elevada.
A maior prevalçncia de GCS entre idosos, em relação ao total da população, tem sido descrita na literatura 1919. Azzani M, Roslani AC, Su TT. Determinants of household catastrophic health expenditure: a systematic review. Malays J Med Sci. 2019;26(1):15-43. https://doi.org/10.21315/mjms2019.26.1.3
https://doi.org/10.21315/mjms2019.26.1.3...
, podendo ser explicada pelas diferenças nos tipos e frequçncia de gastos entre famílias jovens, quando comparadas às famílias de idosos. Em geral, a maior parte das despesas com saúde se refere aos gastos com medicamentos e consultas médicas 2020. Arenliu Qosaj F, Froeschl G, Berisha M, Bellaqa B, Holle R. Catastrophic expenditures and impoverishment due to out-of-pocket health payments in Kosovo. Cost Eff Resour Alloc. 2018; 16:26. https://doi.org/10.1186/s12962-018-0111-1
https://doi.org/10.1186/s12962-018-0111-...
. Entre idosos, além destes gastos serem mais elevados, a sua proporção em relação à renda também é maior 1515. Picco L, Achilla E, Abdin E, Chong SA, Vaingankar JA, McCrone P, et al. Economic burden of multimorbidity among older adults: impact on healthcare and societal costs. BMC Health Serv Res. 2016; 16:173. https://doi.org/10.1186/s12913-016-1421-7
https://doi.org/10.1186/s12913-016-1421-...
.
Corroborando estudo prévio 99. McRae I, Yen L, Jeon YH, Herath PM, Essue B. Multimorbidity is associated with higher out-of-pocket spending: a study of older Australians with multiple chronic conditions. Aust J Prim Health. 2013;19(2):144-9. https://doi.org/10.1071/PY12035
https://doi.org/10.1071/PY12035...
, verificou-se que indivíduos com multimorbidade apresentaram mais chances de ter gastos catastróficos, independente do ponto de corte. McRae et al. 99. McRae I, Yen L, Jeon YH, Herath PM, Essue B. Multimorbidity is associated with higher out-of-pocket spending: a study of older Australians with multiple chronic conditions. Aust J Prim Health. 2013;19(2):144-9. https://doi.org/10.1071/PY12035
https://doi.org/10.1071/PY12035...
não só observaram associação positiva entre multimorbidade e GCS entre adultos mais velhos, como verificaram um gradiente nesta relação: cada doença crônica adicional aumentou em 46% a chance de gastos com saúde excederem 20% da renda 99. McRae I, Yen L, Jeon YH, Herath PM, Essue B. Multimorbidity is associated with higher out-of-pocket spending: a study of older Australians with multiple chronic conditions. Aust J Prim Health. 2013;19(2):144-9. https://doi.org/10.1071/PY12035
https://doi.org/10.1071/PY12035...
. Entre os motivos para esta associação, pode-se mencionar a maior utilização dos serviços por indivíduos com multimorbidade 1212. Bähler C, Huber CA, Brüngger B, Reich O. Multimorbidity, health care utilization and costs in an older adult community-dwelling population: a claims data based observational study. BMC Health Serv Res. 2015;15:23. https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-2
https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-...
, a qual está relacionada à complexidade do cuidado, como por exemplo, a necessidade de utilização de vários medicamentos 2121. Cavalcanti G, Doring M, Portella MR, Bortoluzzi EC, Mascarelo A, Dellani MP. Multimorbidity associated with polypharmacy and negative self-perception of health. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2017;20(5):634-42. https://doi.org/10.1590/1981-22562017020.170059
https://doi.org/10.1590/1981-22562017020...
. Indivíduos com multimorbidade podem gastar em média 10 vezes mais com saúde do que aqueles sem multimorbidade 1010. Sum G, Hone T, Atun R, Millett C, Suhrcke M, Mahal A, et al. Multimorbidity and out-of-pocket expenditure on medicines: a systematic review. BMJ Glob Health. 2018;3(1): e000505. https://doi.org/10.1136/bmjgh-2017-000505
https://doi.org/10.1136/bmjgh-2017-00050...
.
Os resultados do presente estudo também demostram que há desigualdades socioeconômicas relacionadas ao GCS, relação consistentemente descrita na literatura 88. Boing AC, Bertoldi AD, Barros AJD, Posenato LG, Peres KG. Socioeconomic inequality in catastrophic health expenditure in Brazil. Rev Saude Publica. 2014;48(4):632-41. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2014048005111
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20140...
,2222. Yazdi-Feyzabadi V, Mehrolhassani MH, Darvishi A. Measuring catastrophic health expenditures and its inequality: evidence from Iran's Health Transformation Program. Health Policy Plan. 2019;34(4):316-25. https://doi.org/10.1093/heapol/czz031
https://doi.org/10.1093/heapol/czz031...
. No Brasil, a ocorrçncia de GCS para a população total foi 5,2 vezes maior entre os mais pobres, segundo o Índice Econômico Nacional, e 4,2 vezes maior entre os indivíduos com menor escolaridade, segundo anos de estudos completos 88. Boing AC, Bertoldi AD, Barros AJD, Posenato LG, Peres KG. Socioeconomic inequality in catastrophic health expenditure in Brazil. Rev Saude Publica. 2014;48(4):632-41. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2014048005111
https://doi.org/10.1590/S0034-8910.20140...
. O presente estudo avança ao mostrar que as desigualdades associadas aos GCS entre adultos mais velhos apresentam padrões distintos, quando avaliadas em função da multimorbidade, que potencializa o efeito dessas desigualdades. Independentemente do ponto de corte utilizado, a probabilidade de GCS foi maior entre indivíduos com multimorbidade e pertencentes aos menores escores de riqueza, quando comparados aos indivíduos sem multimorbidade, sendo esta diferença significativamente atenuada com o aumento da condição socioeconômica.
Ambos resultados reforçam a importância do investimento para efetivação de uma cobertura universal em saúde que garanta acesso a serviços e cuidados de qualidade, sem comprometer de forma catastrófica o orçamento das famílias 33. World Health Organization. Tracking universal health coverage: 2017 Global Monitoring Report. Geneva: WHO; 2017. Co-published by the The World Bank. . No Brasil, a manutenção do Sistema Único de Saúde (SUS) é essencial para que este objetivo seja alcançado, pois ao longo dos seus 30 anos de existçncia, o sistema se mostrou efetivo na redução de desigualdades no acesso e nas condições de saúde da população 2323. Castro MC, Massuda A, Almeida G, Menezes-Filho NA, Andrade MV, Noronha KVMS, et al. Brazil's unified health system: the first 30 years and prospects for the future. Lancet. 2019;394(10195):345-56. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(19)31243-7
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(19)31...
, especialmente entre indivíduos com doenças crônicas, considerando que mais de 70% dos idosos brasileiros dependem exclusivamente do SUS 2424. Macinko J, Andrade FB, Souza Junior PRB, Lima-Costa MF. Primary care and healthcare utilization among older Brazilians (ELSI-Brazil). Rev Saude Publica. 2018;52 Suppl 2:6s. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000595
https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018...
. Além disso, dados da mais recente pesquisa nacional sobre acesso a medicamentos no Brasil mostraram que 67,7% dos adultos e idosos brasileiros com doenças crônicas que tiveram acesso total ao tratamento, obtiveram algum medicamento gratuitamente, sendo que 47,5% obtiveram todos os medicamentos dessa forma 2525. Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NUL, Mengue SS, Arrais PSD, Farias MR et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional. Rev Saude Publica. 2016;50 Supl 2:6s. https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2016050006161
https://doi.org/10.1590/s1518-8787.20160...
.
Ainda que o acesso a medicamentos gratuitos no SUS seja maior entre indivíduos com baixa renda, pessoas de média renda também costumam acessar a assistçncia farmacçutica pública 2626. Boing AC, Bertoldi AD, Boing AF, Bastos JL, Peres KG. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saude Publica. 2013;29(4):691-701. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000400007
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201300...
. Isso pode ter relação com o tipo de plano e seguro de saúde privados contratados por esta parcela da população. Estes planos comumente apresentam cobertura limitada para medicamentos, atendimento domiciliar, fisioterapia e outros serviços, fazendo com que indivíduos que possuem este tipo de plano privado de saúde recorram ao sistema público para garantir o acesso à estes serviços 2727. Matta SR, Bertoldi AD, Emmerick ICM, Fontanella AT, Costa KS, Luiza VL; Grupo PNAUM. Fontes de obtenção de medicamentos por pacientes diagnosticados com doenças crônicas, usuários do Sistema Único de Saúde. Cad Saude Publica. 2018;34(3): e00073817. https://doi.org/10.1590/0102-311x00073817
https://doi.org/10.1590/0102-311x0007381...
. Estudo recente demostrou a utilização exclusiva do SUS para obter medicamentos por 29,3% dos indivíduos com doenças crônicas que possuíam plano de saúde e entre 34,4% daqueles com estas doenças e que pertenciam a maior classificação econômica 2727. Matta SR, Bertoldi AD, Emmerick ICM, Fontanella AT, Costa KS, Luiza VL; Grupo PNAUM. Fontes de obtenção de medicamentos por pacientes diagnosticados com doenças crônicas, usuários do Sistema Único de Saúde. Cad Saude Publica. 2018;34(3): e00073817. https://doi.org/10.1590/0102-311x00073817
https://doi.org/10.1590/0102-311x0007381...
. Esta pode ser uma das explicações para o fato de o plano privado de saúde não constituir um fator de proteção contra gastos catastróficos em saúde 77. Barros AJ, Bastos JL, Dâmaso AH. Catastrophic spending on health care in Brazil: private health insurance does not seem to be the solution. Cad Saude Publica. 2011;27 Suppl 2: s254-62. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011001400012
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201100...
, podendo inclusive aumentar a ocorrçncia deste desfecho, conforme apontam os resultados do presente estudo. Assim como no Brasil, outros estudos recentes realizados em países como o México 2828. Knaul FM, Arreola-Ornelas H, Wong R, Lugo-Palacios DG, Méndez-Carniado O. Efecto del Seguro Popular de Salud sobre los gastos catastróficos y empobrecedores en México, 2004-2012. Salud Publica Mex. 2018;60(2):130-40. https://doi.org/10.21149/9064
https://doi.org/10.21149/9064...
e a China 2929. Zhao SW, Zhang XY, Dai W, Ding YX, Chen JY, Fang PQ. Effect of the catastrophic medical insurance on household catastrophic health expenditure: evidence from China. Gac Sanit. 2020;34(4):370-6. https://doi.org/10.1016/j.gaceta.2018.10.005
https://doi.org/10.1016/j.gaceta.2018.10...
demonstraram que programas públicos de saúde diminuem os riscos de gastos catastróficos.
Dentre os pontos fortes deste estudo, destaca-se a utilização de uma medida de gasto em saúde composta por um número abrangente de despesas, normalmente indisponível em estudos populacionais, possibilitando uma análise mais específica dos gastos realizados por adultos mais velhos no Brasil. No entanto, o autorrelato de doenças crônicas pode interferir na estimativa da multimorbidade, embora esta medida seja considerada válida em estudos epidemiológicos, sem a ocorrçncia de grande viés socioeconômico 3030. Macintyre S, Der G, Norrie J. Are there socioeconomic differences in responses to a commonly used self report measure of chronic illness? Int J Epidemiol. 2005;34(6):1284-90. https://doi.org/10.1093/ije/dyi200
https://doi.org/10.1093/ije/dyi200...
. O fato deste estudo ter utilizado o desembolso direto no numerador, bem como a renda domiciliar no denominador, em detrimento do gasto total em saúde e da capacidade de pagamento da família, pode ter reduzido o percentual de GCS. Embora tais medidas sejam amplamente utilizadas nas pesquisas, não há consenso na literatura sobre a melhor forma de cálculo. O delineamento transversal constitui outra limitação deste estudo, na medida em que impede a análise das relações temporais entre as variáveis. O período recordatório das medidas utilizadas para o cálculo do GCS, restrito a 30 e 90 dias, também pode ter interferido na magnitude do desfecho.
Os resultados deste estudo ajudam a entender o gasto catastrófico em saúde entre adultos mais velhos no Brasil, que pode ser potencializado pela presença de multimorbidade e entre indivíduos com baixa condição socioeconômica. Considerando o envelhecimento populacional, acompanhado de um aumento na prevalçncia de multimorbidade 1414. Kingston A, Robinson L, Booth H, Knapp M, Jagger C; MODEM project. Projections of multi-morbidity in the older population in England to 2035: estimates from the Population Ageing and Care Simulation (PACSim) model. Age Ageing. 2018;47(3):374-80. https://doi.org/10.1093/ageing/afx201
https://doi.org/10.1093/ageing/afx201...
, os sistemas de saúde precisam se adaptar a esta demanda, garantindo o acesso e a qualidade de seus serviços, especialmente aos grupos populacionais menos favorecidos. Pesquisas futuras são necessárias para monitorar os achados aqui apresentados e investigar a influçncia de combinações específicas de doenças sobre a ocorrçncia de GCS, com o objetivo de contribuir para a avaliação do impacto de políticas de cobertura universal em saúde na redução das desigualdades.
-
Financiamento: Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES - bolsa de doutorado para GMB).
REFERENCES
-
1World Health Organization. Global report: Public Spending on Health: a closer look at global trends. Geneva: WHO; 2018.
-
2Hsiao WC. Why is a systemic view of health financing necessary? health affairs. Health Aff (Millwood). 2007;26(4):950-61. https://doi.org/10.1377/hlthaff.26.4.950
» https://doi.org/10.1377/hlthaff.26.4.950 -
3World Health Organization. Tracking universal health coverage: 2017 Global Monitoring Report. Geneva: WHO; 2017. Co-published by the The World Bank.
-
4Wagstaff A, Flores G, Hsu J, Smitz MF, Chepynoga K, Buisman LR, et al. Progress on catastrophic health spending in 133 countries: a retrospective observational study. Lancet Glob Health. 2018;6(2):e169-79. https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30429-1
» https://doi.org/10.1016/S2214-109X(17)30429-1 -
5Xu K, Evans DB, Kawabata K, Zeramdini R, Klavus J, Murray CJ. Household catastrophic health expenditure: a multicountry analysis. Lancet. 2003;362(9378):111-7. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(03)13861-5
» https://doi.org/10.1016/S0140-6736(03)13861-5 -
6World Health Organization. World health statistics 2018: monitoring health for the SDGs, sustainable development goals. Geneva: WHO; 2018.
-
7Barros AJ, Bastos JL, Dâmaso AH. Catastrophic spending on health care in Brazil: private health insurance does not seem to be the solution. Cad Saude Publica. 2011;27 Suppl 2: s254-62. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011001400012
» https://doi.org/10.1590/S0102-311X2011001400012 -
8Boing AC, Bertoldi AD, Barros AJD, Posenato LG, Peres KG. Socioeconomic inequality in catastrophic health expenditure in Brazil. Rev Saude Publica. 2014;48(4):632-41. https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2014048005111
» https://doi.org/10.1590/S0034-8910.2014048005111 -
9McRae I, Yen L, Jeon YH, Herath PM, Essue B. Multimorbidity is associated with higher out-of-pocket spending: a study of older Australians with multiple chronic conditions. Aust J Prim Health. 2013;19(2):144-9. https://doi.org/10.1071/PY12035
» https://doi.org/10.1071/PY12035 -
10Sum G, Hone T, Atun R, Millett C, Suhrcke M, Mahal A, et al. Multimorbidity and out-of-pocket expenditure on medicines: a systematic review. BMJ Glob Health. 2018;3(1): e000505. https://doi.org/10.1136/bmjgh-2017-000505
» https://doi.org/10.1136/bmjgh-2017-000505 -
11GBD 2016 Causes of Death Collaborators. Global, regional, and national age-sex specific mortality for 264 causes of death, 1980-2016: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2016. Lancet. 2017;390(10100):1151-1210. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(17)32152-9
» https://doi.org/10.1016/S0140-6736(17)32152-9 -
12Bähler C, Huber CA, Brüngger B, Reich O. Multimorbidity, health care utilization and costs in an older adult community-dwelling population: a claims data based observational study. BMC Health Serv Res. 2015;15:23. https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-2
» https://doi.org/10.1186/s12913-015-0698-2 -
13World Health Organization. The World Health Report 2008 - primary health care (now more than ever). Geneva: WHO; 2008.
-
14Kingston A, Robinson L, Booth H, Knapp M, Jagger C; MODEM project. Projections of multi-morbidity in the older population in England to 2035: estimates from the Population Ageing and Care Simulation (PACSim) model. Age Ageing. 2018;47(3):374-80. https://doi.org/10.1093/ageing/afx201
» https://doi.org/10.1093/ageing/afx201 -
15Picco L, Achilla E, Abdin E, Chong SA, Vaingankar JA, McCrone P, et al. Economic burden of multimorbidity among older adults: impact on healthcare and societal costs. BMC Health Serv Res. 2016; 16:173. https://doi.org/10.1186/s12913-016-1421-7
» https://doi.org/10.1186/s12913-016-1421-7 -
16Lima-Costa MF, Facchini LA, Matos DL, Macinko J. Mudanças em dez anos das desigualdades sociais em saúde dos idosos brasileiros (1998-2008). Rev Saude Publica. 2012;46 Supl 1:100-7. https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000059
» https://doi.org/10.1590/S0034-89102012005000059 -
17Lima-Costa MF, Andrade FB, Souza Jr PRB, Neri AL, Duarte YAO, Castro-Costa E, et al. The Brazilian Longitudinal Study of Aging (ELSI-Brazil): objectives and design. Am J Epidemiol. 2018;187(7):1345-53. https://doi.org/10.1093/aje/kwx387
» https://doi.org/10.1093/aje/kwx387 -
18Fry K, Firestone R, Chakraborty NM. Measuring equity with nationally representative wealth quintiles. Washington, DC: Population Services International; 2014.
-
19Azzani M, Roslani AC, Su TT. Determinants of household catastrophic health expenditure: a systematic review. Malays J Med Sci. 2019;26(1):15-43. https://doi.org/10.21315/mjms2019.26.1.3
» https://doi.org/10.21315/mjms2019.26.1.3 -
20Arenliu Qosaj F, Froeschl G, Berisha M, Bellaqa B, Holle R. Catastrophic expenditures and impoverishment due to out-of-pocket health payments in Kosovo. Cost Eff Resour Alloc. 2018; 16:26. https://doi.org/10.1186/s12962-018-0111-1
» https://doi.org/10.1186/s12962-018-0111-1 -
21Cavalcanti G, Doring M, Portella MR, Bortoluzzi EC, Mascarelo A, Dellani MP. Multimorbidity associated with polypharmacy and negative self-perception of health. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2017;20(5):634-42. https://doi.org/10.1590/1981-22562017020.170059
» https://doi.org/10.1590/1981-22562017020.170059 -
22Yazdi-Feyzabadi V, Mehrolhassani MH, Darvishi A. Measuring catastrophic health expenditures and its inequality: evidence from Iran's Health Transformation Program. Health Policy Plan. 2019;34(4):316-25. https://doi.org/10.1093/heapol/czz031
» https://doi.org/10.1093/heapol/czz031 -
23Castro MC, Massuda A, Almeida G, Menezes-Filho NA, Andrade MV, Noronha KVMS, et al. Brazil's unified health system: the first 30 years and prospects for the future. Lancet. 2019;394(10195):345-56. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(19)31243-7
» https://doi.org/10.1016/S0140-6736(19)31243-7 -
24Macinko J, Andrade FB, Souza Junior PRB, Lima-Costa MF. Primary care and healthcare utilization among older Brazilians (ELSI-Brazil). Rev Saude Publica. 2018;52 Suppl 2:6s. https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000595
» https://doi.org/10.11606/S1518-8787.2018052000595 -
25Oliveira MA, Luiza VL, Tavares NUL, Mengue SS, Arrais PSD, Farias MR et al. Acesso a medicamentos para doenças crônicas no Brasil: uma abordagem multidimensional. Rev Saude Publica. 2016;50 Supl 2:6s. https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2016050006161
» https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2016050006161 -
26Boing AC, Bertoldi AD, Boing AF, Bastos JL, Peres KG. Acesso a medicamentos no setor público: análise de usuários do Sistema Único de Saúde no Brasil. Cad Saude Publica. 2013;29(4):691-701. https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000400007
» https://doi.org/10.1590/S0102-311X2013000400007 -
27Matta SR, Bertoldi AD, Emmerick ICM, Fontanella AT, Costa KS, Luiza VL; Grupo PNAUM. Fontes de obtenção de medicamentos por pacientes diagnosticados com doenças crônicas, usuários do Sistema Único de Saúde. Cad Saude Publica. 2018;34(3): e00073817. https://doi.org/10.1590/0102-311x00073817
» https://doi.org/10.1590/0102-311x00073817 -
28Knaul FM, Arreola-Ornelas H, Wong R, Lugo-Palacios DG, Méndez-Carniado O. Efecto del Seguro Popular de Salud sobre los gastos catastróficos y empobrecedores en México, 2004-2012. Salud Publica Mex. 2018;60(2):130-40. https://doi.org/10.21149/9064
» https://doi.org/10.21149/9064 -
29Zhao SW, Zhang XY, Dai W, Ding YX, Chen JY, Fang PQ. Effect of the catastrophic medical insurance on household catastrophic health expenditure: evidence from China. Gac Sanit. 2020;34(4):370-6. https://doi.org/10.1016/j.gaceta.2018.10.005
» https://doi.org/10.1016/j.gaceta.2018.10.005 -
30Macintyre S, Der G, Norrie J. Are there socioeconomic differences in responses to a commonly used self report measure of chronic illness? Int J Epidemiol. 2005;34(6):1284-90. https://doi.org/10.1093/ije/dyi200
» https://doi.org/10.1093/ije/dyi200
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
14 Dez 2020 -
Data do Fascículo
2020
Histórico
-
Recebido
19 Dez 2019 -
Aceito
25 Mar 2020