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Articulações entre a rua e o digital nas práticas culturais juvenis: os casos do rap de protesto e graffiti ilegal em Portugal

Articulations between the street and the digital in youth cultural practices: the cases of protest rap and illegal graffiti in Portugal

Resumo

Neste artigo, pretendemos examinar o papel dos media digitais na participação e subculturas juvenis, através de dois estudos de caso interligados: o rap de protesto e o graffiti ilegal. A internet e outras tecnologias digitais não só vieram dar voz a estes grupos, apoiando formatos e canais alternativos de expressão e comunicação, como também têm contribuído para agregar esforços individuais em torno dos mesmos interesses e atividades. As conclusões apresentadas baseiam-se em diferentes pesquisas realizadas num período de cerca de 10 anos, em Portugal, utilizando metodologias qualitativas (observação participante, entrevistas aprofundadas e metodologias de recolha visual), tanto em contextos urbanos como na internet, integrando-as numa estratégia de pesquisa etnográfica offline e online. Desejamos, em primeiro lugar, aprofundar o debate teórico em torno do tema das subculturas juvenis, participação e media digitais; em segundo lugar, apresentar sinteticamente resultados das pesquisas desenvolvidas.

Palavras-chave:
Subculturas e participação juvenis; Media digitais e internet; Rap e graffiti

Abstract

In this article, we examine the role of digital media in youth participation and subcultures through two interrelated case studies: protest rap and illegal graffiti. The internet and other digital technologies not only have given voice to these groups, supporting alternative formats and channels of expression and communication, but also contributed to aggregate individual efforts around the same interests and activities. The findings presented are based on different research projects conducted over a period of about ten years, in Portugal, using qualitative methods (participant observation, in-depth interviews and methodologies of visual collection), both in urban contexts and on the internet, integrating them in an ethnographic research strategy offline and online. We wish, firstly, to deepen the theoretical debate on the theme of youth subcultures, participation and digital media, secondly, to briefly present a summary of findings of the research projects carried out.

Keywords:
Subcultures and youth participation; Digital media and internet; Rap and graffiti

Introdução

Durante a última década, despontou o debate académico em torno da relação entre juventude e os “novos media”, com um foco particular nos usos sociais de variadas tecnologias. Uma área específica de estudo tem sido dedicada a uma abordagem centrada no contexto das chamadas subculturas juvenis (Bennett, 20045. BENNETT, A.; KAHN-HARRIS, K. (orgs.). After Subculture. Critical Studies in Contemporary Youth Cultures. Nova Iorque: Palgrave-Macmillan. 2004.; Gelder, 200725. GELDER, K. Subcultures: cultural histories and social practice. Londres e Nova Iorque: Routledge , 2007.). Tal obriga-nos a reequacionar este quadro conceptual, avaliando de que forma esta abordagem teórica, tradicionalmente associada a um período pré-digital, pode ser pensada na atualidade.

Neste artigo propomo-nos examinar esta questão através de dois estudos de caso interligados, que podem ser incluídos na chamada cultura hip-hop: o rap de intervenção e o graffiti ilegal. Ambos os casos podem ser definidos como subculturas, pelo simples facto de se caracterizarem por ser movimentos culturais alternativos, subterrâneos e, em certo sentido, subversivos (Thornton, 199747. THORNTON, S. General Introduction. In: GELDER, K.; THORNTON, S. (orgs.). The Subcultures Reader. Londres e Nova Iorque: Routledge , 1997. p. 1-7.; Gelder, 200725. GELDER, K. Subcultures: cultural histories and social practice. Londres e Nova Iorque: Routledge , 2007.; MacDonald, 2001. Nesta abordagem, estamos particularmente interessados em compreender o papel dos media digitais nas subculturas, como veículos para práticas culturais existentes, mas também enquanto promotores de novas formas de participação e criatividade. Será que a adopção de diferentes tecnologias digitais altera significativamente estas subculturas? Será que contribui para transformações expressivas no modo como estes grupos organizam as suas práticas e participam publicamente?

A base empírica para este debate parte de um conjunto de pesquisas realizadas pelos autores ao longo de mais de uma década em que se debruçaram sobre algumas das denominadas subculturas juvenis. O amplo espaço temporal permite-nos ter acesso a material analítico diversificado e consolidado no tempo mas, principalmente, ter uma noção das dinâmicas que foram ocorrendo ao longo desse período e das mutações envolvendo a apropriação dos media e tecnologias digitais. Essas investigações, com uma forte base qualitativa e etnográfica, iniciaram-se em 2001 e deram origem a quatro projetos autónomos de pesquisa1 1 O primeiro projeto de pesquisa centrou-se numa análise da cultura hip-hop na região metropolitana de Lisboa (Grácio et al., 2004). Mais tarde, ambos os autores desenvolveram projetos de investigação autónomos no âmbito das suas teses de doutoramento, especificamente sobre o contexto do graffiti e da street art em Lisboa (Campos, 2010) e sobre a apropriação da internet na cultura hip-hop (Simões, 2010). Mais recentemente, participaram num projeto internacional sobre inclusão e participação digital, onde foi analisado o caso específico do rap negro (Campos; Simões, 2011, 2014). Como resultado, conduziram-se mais de 100 entrevistas aprofundadas com músicos de rap e writers, recolheu-se e analisou-se um vasto leque de dados visuais, pictóricos e sonoros, assim como conteúdos online sobre essas práticas, criados pelos próprios protagonistas entrevistados ou por outros. Atualmente, a dimensão de participação juvenil é desenvolvida através do projeto “Activismo Juvenil em Rede” (EXPL/IVC‐COM/2191/2013), financiado por Fundos Nacionais através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), que serviu de base também à presente reflexão. Projeto desenvolvido no Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais CICS.NOVA–FCSH/UNL, UID/SOC/04647/2013, com o apoio financeiro da FCT/MEC através de Fundos Nacionais. . O vasto horizonte temporal permite-nos, também, ter uma visão diacrónica desses contextos e das alterações que se foram registando, situação particularmente interessante para debater um fenómeno relativamente recente como é o da expansão dos media digitais e, particularmente, da chamada web 2.0.

De que falamos quando falamos de subcultura?

A juventude apresenta-se como um observatório privilegiado de práticas culturais significativas, em torno das quais se desenvolvem diferentes manifestações expressivas ligadas à produção e ao consumo de diversos bens, atividades e gostos particulares. Tais manifestações expressivas podem agregar-se em torno de um conjunto restrito, marginal ou minoritário de práticas que, por essa razão, têm sido consideradas subculturais. Numa das suas acepções, as subculturas não seriam apenas subconjuntos dentro de outros conjuntos maiores (formados pela “cultura dominante”, a “cultura de massas”, etc.) mas apresentariam igualmente um carácter subterrâneo, subalterno ou subversivo (Thornton 199747. THORNTON, S. General Introduction. In: GELDER, K.; THORNTON, S. (orgs.). The Subcultures Reader. Londres e Nova Iorque: Routledge , 1997. p. 1-7.; Gelder 200725. GELDER, K. Subcultures: cultural histories and social practice. Londres e Nova Iorque: Routledge , 2007.). Esta abordagem tende a acentuar o carácter não consensual e conflitual da relação entre culturas, refletindo a hegemonia de certos grupos sociais relativamente a outros, o que, por sua vez, desencadearia práticas de resistência (ou contra-hegemónicas) por parte de certos grupos.

Nos estudos clássicos sobre as subculturas juvenis, sobretudo na sua variante britânica associada ao Centre for Contemporary Cultural Studies (CCCS) de Birmingham, nos anos 70, o problema da interpretação das subculturas juvenis dependia da convicção de que estas formavam um todo coerente que mantinha uma relação de diferença, mas também, e essencialmente, de oposição em relação à “cultura dominante” (Cohen, 199715. COHEN, P. Subcultural conflict and working-class community. In: GELDER, K.; THORNTON, S. (orgs.). The Subcultures Reader. Londres e Nova Iorque: Routledge, 1997 [ed. orig. 1972]. p. 90-99. [1972]; Hall; Jefferson, 197628. HALL, S.; JEFFERSON, T. (orgs.). Resistance through rituals: youth cultures in post-War Britain. Londres: Hutchinson, 1976.; Brake 19857. BRAKE, M. Comparative Youth Culture. The Sociology of Youth Cultures and Youth Subcultures in America, Britain and Canada. Londres: Routledge & Kegan Paul, 1985.). A explicação para essa oposição era, fundamentalmente, estrutural. Os jovens das classes dominadas (fundamentalmente a classe operária) “resistiam” simbolicamente (através das suas práticas) e, de forma coletiva, à hegemonia da classe dominante ou à cultura de massas, concebendo dessa forma uma solução cultural para o problema social resultante da sua posição subordinada.

Serão, no entanto, as abordagens pós-subculturais (Bennett; Kahn-Harris, 20045. BENNETT, A.; KAHN-HARRIS, K. (orgs.). After Subculture. Critical Studies in Contemporary Youth Cultures. Nova Iorque: Palgrave-Macmillan. 2004.; Muggleton; Weinzierl, 200339. MUGGLETON, D.; WEINZIERL, R. (org.). The Post-Subcultures Reader. Nova Iorque: Berg , 2003.), particularmente na sua versão pós-moderna (Bennett, 1999; Muggleton, 1997, 2000), a pôr em causa de forma mais evidente o teor da anterior oposição. Para essas perspectivas, o facto de, por um lado, se considerarem as subculturas como um todo coerente e homogéneo e, por outro lado, se definirem as mesmas como uma forma de resistência fundada na classe social dos jovens, revela mais uma construção ideológica do que uma realidade empiricamente observável. Construção essa que evidencia o paradigma moderno (neste caso, neo-marxista) subjacente à anterior oposição (Muggleton 1997, 2000).

Pelo facto de a relação entre grupos juvenis, práticas culturais e identidades ser mais variável, flexível e transitória do que aquilo que o conceito de subcultura parece sugerir, propostas teóricas mais recentes, que ancoram sobretudo (embora não apenas) em paradigmas que podemos designar pós-modernos (Muggleton, 199737. MUGGLETON, D. The post-subculturalist. In: REDHEAD, S.; WYNNE, D.; O’CONNOR, J. (org.). The Clubcultures Reader. Readings in Popular Cultural Studies. Oxford: Blackwell, 1997. p. 185-203.; Muggleton; Weinzierl, 2003; Bennett; Kahn-Harris, 20045. BENNETT, A.; KAHN-HARRIS, K. (orgs.). After Subculture. Critical Studies in Contemporary Youth Cultures. Nova Iorque: Palgrave-Macmillan. 2004.), avançam com conceitos como o de tribo urbana ou de neotribo (Bennett, 1999; Feixa, 199820. FEIXA, C. De jóvenes, bandas y tribus. Barcelona: Ariel, 1998.). Todavia, ainda que por razões inversas, tais conceitos revelam-se igualmente problemáticos. Por um lado, por inviabilizarem qualquer explicação que possa ser atribuída à estrutura social, fazendo depender as práticas apenas das escolhas individuais que veem como efémeras e inconsequentes. Por outro lado, por tenderem a esvaziar ideologicamente essas mesmas práticas, considerando-as destituídas de qualquer motivação ideológica consistente. Vejamos de forma um pouco mais desenvolvida esses dois argumentos.

Em primeiro lugar, embora os interesses e as atividades juvenis atuais se distingam pela sua aparente dispersão e volatilidade, tal não significa que as características estruturais não possam ser usadas para explicar as práticas (sub)culturais dos jovens (Bennett, 20114. BENNETT, A. “The Post-Subcultural Turn: Some Reflections 10 Years on”. Journal of Youth Studies, vol. 14, nº 5, p. 493-506. 2011.). Apenas não devemos entender as práticas juvenis como uma “solução estrutural” (concebida como “resposta de classe”) para um problema de ordem social, nem pensar as subculturas de forma homogénea. Tal parece ser a convicção de variados autores contemporâneos que tentam recuperar o papel desempenhado por fatores como a classe social (Griffin, 201127. GRIFFIN, C. E. The trouble with class: researching youth, class and culture beyond the ‘Birmingham School’. Journal of Youth Studies, 14 (3), p. 245-259. 2011.; McCulloch et al., 2006), a etnicidade ou o género (Blackman, 20056. BLACKMAN, S. Youth subcultural theory: a critical engagement with the concept, its origins and politics, from the Chicago school to postmodernism. Journal of youth studies, 8 (1), p. 1-20. 2005.; Williams, 201149. WILLIAMS, J. P. Subcultural theory: traditions and concepts. Cambridge: Polity, 2011.) na interpretação das práticas juvenis. O desafio que se coloca, tanto em termos teóricos como empíricos, é o de tentar identificar as explicações de determinada prática, não excluindo, à partida, como parecem fazer os autores pós-modernos, causas de tipo estrutural.

Em segundo lugar, a relevância dada pela perspetiva pós-moderna à ausência de valores das subculturas juvenis coloca-a no extremo oposto da perspetiva subcultural dos autores do CCCS, que encarava as práticas juvenis como ideologicamente motivadas. Todavia, a tentativa de “esvaziar” ideologicamente as práticas juvenis parece-nos tão desadequada como a tentativa de mobilização ideológica “forçada”. Na realidade, tanto existiram (e existem) culturas juvenis claramente politizadas, como culturas cuja dimensão ideológica é mais ténue ou praticamente imperceptível. Veja-se, para o primeiro caso, por exemplo, os movimentos juvenis associados à ocupação de casas (McKay, 1998)2 2 Pela sua componente “antissistema”, essas práticas juvenis associadas ao radicalismo ecológico, políticas de ação direta, novas experiências musicais, etc., têm sido designadas Do It Yourself Cultures, sendo consideradas como uma espécie de contracultura dos anos 90. ou os recentes movimentos de protesto3 3 Ver, também, para os movimentos antiglobalização na Europa e América Latina, Feixa, Saura e Costa (2002). potenciados pelas redes sociais na internet (Feixa; Nofre, 201321. FEIXA, C.; NOFRE, J. (orgs.) #Generación Indignada: Topías y utopias del 15M. Lleida: Editorial Milenio, 2013.).

Como tem sido assinalado, algumas formações de protesto atuais combinam uma dimensão “estética” com outra “política” nas suas intervenções, produzindo aquilo que tem sido designado “Carnavais de protesto” (St. John, 2003). Tais formações são, ao mesmo tempo, orientadas por um hedonismo individualista (prazer ligado à festividade) e pela motivação ideológica associada a determinadas causas (como a ecologia, o combate à globalização neoliberal, etc.). Na verdade, a articulação (leia-se compatibilização) entre consumo e resistência constitui um dos desafios que se colocam à teoria contemporânea que se debruça sobre subculturas juvenis (Johansson; Lalander, 2012). A clara oposição à cultura e sociedade dominantes (particularmente ao capitalismo neoliberal) de formações de protesto contemporâneas (nomeadamente, movimentos antiglobalização) permite resolver num plano político aquilo que, no caso das subculturas descritas pelos autores do CCCS, se circunscrevia apenas ao terreno do lazer (Feixa et al., 200222. FEIXA, C.; SAURA, J. R.; COSTA, C. (orgs.). Movimientos juveniles: de la globalización a la antiglobalización. Barcelona: Ariel , 2002.).

Tais formações procuram tirar partido da aptidão que as suas ações de protesto têm para atrair a atenção dos media e o interesse público, dando assim visibilidade política às relações de opressão e subordinação, ao mesmo tempo em que concretizam, de um modo particular, objectivos gerais. É justamente esta articulação entre a ação específica e o seu impacto macropolítico que torna essas formas de protesto eficazes (Muggleton; Weinzierl, 200339. MUGGLETON, D.; WEINZIERL, R. (org.). The Post-Subcultures Reader. Nova Iorque: Berg , 2003.: 16). Tal exige que se olhe para esses movimentos sociais como “micropolíticos”, inseridos numa lógica mais ampla e complexa do que constitui o político e as lutas sociais (Johansson; Lalander, 2012: 5). Vários objetos urbanos contemporâneos, tais como aqueles que examinaremos mais à frente ligados a “culturas de rua”, são igualmente um bom exemplo desta dimensão política que percorre as práticas subculturais juvenis, podendo ser inseridas na categoria ampla de “estratégias urbanas de resistência” (Johansson; Lalander, 2012: p. 7-8).

Graffiti ilegal e rap de protesto enquanto subculturas

O que pretendemos explorar de seguida são algumas dimensões do conceito de subcultura que nos parecem essenciais para compreender como o aplicamos ao nosso objecto de estudo. Na verdade, várias dimensões que serão sublinhadas adequam-se às características específicas dos casos estudados - rap de intervenção e graffiti ilegal -, embora possam ser transponíveis para outros objetos com contornos idênticos.

A condição primordial para podermos falar em “subcultura” diz respeito à autonomização (ainda que relativa) de um conjunto de práticas, e respectivas representações, em torno de um universo cultural específico. O carácter “alternativo” dos universos subculturais deve ser sublinhado, embora, como se compreenderá, tal nos confronte com o problema de pensar a relação com os universos culturais mais vastos. Como é que este carácter alternativo é expresso? Através do confronto e da oposição a algo ou apenas pela diferenciação (demarcação) produzida por determinadas práticas e interesses relativamente ao que se apresenta como maioritário ou dominante? Em que medida constitui um elemento de definição identitária importante para os membros de uma subcultura? Nas subculturas de que daremos conta de seguida, o carácter alternativo das práticas reveste-se de contornos contestatários, e em alguns casos subversivos, mediante a afirmação de práticas, produtos e circuitos com carácter específico.

Outra dimensão central, como discutimos atrás, diz respeito às justificações produzidas em torno da atividade subcultural. Associada a qualquer subcultura, existe uma dimensão ideológica que se traduz nalguma forma de justificação que consubstancia as preocupações partilhadas por diferentes participantes e sustenta as suas práticas. Nos casos específicos que examinaremos, essas justificações traduzem-se numa “motivação ideológica” mais ou menos específica, através da qual se expressa o comprometimento com determinadas práticas, criações culturais e formatos criativos, de natureza não-convencional ou mesmo “dissidente”. Tanto as práticas, os circuitos e os produtos subculturais, como a dimensão ideológica ou as justificações subjacentes aos mesmos, possuem implicações claras a nível identitário. Em parte, as implicações identitárias decorrem da natureza das atividades consideradas, mas também da função que lhes é atribuída pelos seus praticantes ou quem adere às mesmas. Do mesmo modo, alguns dos traços dos praticantes afiguram-se fundamentais na sua definição identitária. É o caso, por exemplo, da etnicidade, do género e da classe, no caso da música rap de protesto (Simões, 201342. SIMÕES, J. A. Entre percursos e discursos identitários: etnicidade, classe e género na cultura hip-hop. Revista Estudos Feministas, 21 (1), p. 107-128. 2013.), que se constituem como factores de diferenciação dos praticantes, mas igualmente como elementos explicativos das suas motivações e das atividades a que se dedicam.

Resumindo, quando confrontados com determinadas práticas juvenis, a questão a que deveríamos procurar dar resposta é esta: de que forma, através de que práticas e utilizando que recursos culturais específicos, certos jovens expressam a sua alternativa simbólica - a ponto de ser possível qualificá-la como subcultural -, de modo, quer a manifestar o seu descontentamento em relação a assuntos social e culturalmente relevantes, quer a construir uma identidade cultural determinada?

Nessa perspectiva, as subculturas juvenis podem ser vistas pela sua importância cultural e simbólica, mas também pela sua relevância política e cívica mais ampla4 4 O que depende do modo como “participação política” é definida. Em estudos recentes, a noção tem sido alargada de modo a incluir diferentes formas de participação cívica e cultural, incluindo ativismo não institucionalizado. Veja-se, Dahlgren (2007), Loader (2007) e Dahlgren e Olsson (2009). . Tal deverá incluir a observação de diferentes formas de produção cultural (produtos, práticas) relacionadas com universos culturais particulares e os seus grupos, assim como o vasto leque de manifestações culturais e circuitos através dos quais os interesses partilhados são colectivamente postos em prática e celebrados; e as elaborações discursivas (representações, ideologias) através das quais diferentes práticas são justificadas e os significados atribuídos.

Passemos, então, aos casos por nós estudados. O hip-hop é um movimento cultural de origem norte-americana, surgido na década de 1970, que muito rapidamente se globalizou (Bennett, 20002. BENNETT, A. Popular Music and Youth Culture: Music, Identity and Place. Londres: MacMillan. 2000.; Mitchell, 200136. MITCHELL, T. Introduction: Another Root - Hip Hop outside the USA. In: MITCHELL, T. (org.). Global Noise: Rap and Hip-Hop Outside the USA. Middletown: Wesleyan University Press, 2001. p. 1-38.; Rose, 199441. ROSE, T. Black Noise: Rap Music and Black Culture in Contemporary America, Londres: Wesleyan University Press, 1994.). Originalmente constituído por quatro vertentes expressivas, duas delas ligadas à música (rap, mcing5 5 Actividade a cargo do MC, Mestre-de-Cerimónias, cantor rap ou, simplesmente, rapper. e djing6 6 Actividade realizada pelo DJ, Disk Jockey ou quem manipula os discos e produz a sonoridade típica do rap. ), outra à expressão corporal (breakdance), e uma última dedicada à expressão pictórica (graffiti), o movimento hip-hop foi sofrendo várias alterações ao longo do tempo a que também não são alheias as apropriações e reinvenções regionais (Bennett, 2000; Mitchell, 2001; Simões, 201043. SIMÕES, J. A. Entre a rua e a internet. Um estudo sobre o hip-hop português. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais . 2010.).

As primeiras manifestações de uma cultura hip-hop portuguesa ocorrem em meados da década de 1980, afirmando-se principalmente nos anos 90 no contexto dos grandes centros urbanos (Contador; Ferreira, 199716. CONTADOR, A.; FERREIRA E. Ritmo e Poesia: os caminhos do rap. Lisboa: Assírio &Alvim. 1997.; Fradique, 200324. FRADIQUE, T. Fixar o movimento - Representações da música rap em Portugal. Lisboa: Publicações Dom Quixote. 2003.; Simões, 201043. SIMÕES, J. A. Entre a rua e a internet. Um estudo sobre o hip-hop português. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais . 2010.). Ao longo das últimas décadas muitas mudanças ocorreram neste campo. Comecemos pelo caso do rap português. Aquilo que verificamos é uma ramificação de géneros que, embora não reproduzindo o que encontramos na realidade norte-americana, espelha um campo cultural extremamente dinâmico e diversificado. Como vários estudos demonstram (Contador; Ferreira, 1997; Cidra, 200214. CIDRA, R. ‘Ser Real’: o rap na construção de identidades na Área Metropolitana de Lisboa. Ethnologia, nº 12-14, p. 189-222. 2002.; Fradique, 2003; Simões, 2010, 2013) esta é, desde os primórdios, uma música fortemente conotada com as minorias étnicas socialmente excluídas vivendo nas zonas suburbanas, principalmente na área metropolitana de Lisboa (AML). Esta dimensão étnica e classista parece mimetizar as origens (socioculturais e étnicas) do rap norte-americano, sendo apropriado por estas comunidades como uma espécie de bandeira simbólica de natureza transnacional. O denominado rap de protesto, intervenção ou underground, com ligação estreita às comunidades negras, corresponde a um dos géneros que maior impacto tem tido ao longo do tempo, não por razões de ordem comercial ou mediática, mas antes porque mobiliza um número considerável de adeptos (produtores e consumidores musicais) e porque se constituí como um género com valorização simbólica particular. Encontramo-nos no domínio do rap assumidamente não-comercial, vinculado a um conjunto de princípios e de formas estéticas que não procuram alcançar o grande público, antes visam um programa de índole ideológica, ao serviço de políticas de identidade de natureza classista e étnica. Este tipo de rap é, na sua esmagadora maioria, de natureza amadora ou semi-amadora, produzido com escassos recursos e estando dependente de pequenos circuitos de natureza local (Simões, 2010).

O graffiti7 7 Importa referir que o conceito de graffiti em Portugal envolve manifestações distintas, sendo algo diferente do “grafite” no contexto brasileiro. No Brasil, “grafite” é considerado uma forma de expressão pictórica legitima e apreciada ao contrário da “pixação” que é socialmente entendida como uma forma de vandalismo, sem relevância estética. afirma-se igualmente durante a década de 1990, sendo um fenómeno que adquire maior visibilidade nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. Esta permanece uma prática essencialmente transgressiva e ilegal, em consonância com o espírito original saído do contexto norte-americano. Na base deste gesto, encontra-se um jogo de aquisição de estatuto e reconhecimento social num universo que vive na sombra, protegendo-se das autoridades. Este é um meio hierarquizado, com valores, códigos de conduta e vocabulário particulares e que não estão acessíveis a quem não pertence ao meio. Assinar as paredes com o tag8 8 Tag é o pseudónimo criado pelo writter para agir anonimamente. Este tag é, também, a assinatura, a sua identidade gráfica disseminada pelo espaço urbano. é o acto mais elementar e simbolicamente mais poderoso nesta subcultura urbana (Castleman, 198213. CASTLEMAN, C. Getting Up. Subway graffiti in New York. Cambridge: MIT Press. 1982.; Cooper; Chalfant, 198417. COOPER, M.; CHALFANT, H. Subway Art. Londres: Thames & Hudson, 1984.). Dar visibilidade ao tag, recorrendo a estratégias particulares de disseminação, converte-se no móbil de todos aqueles que ambicionam desenvolver uma carreira neste meio9 9 O graffiti ilegal em Portugal tem, então, algum paralelo com a pixação brasileira. (Campos, 20109. CAMPOS, R. Porque pintamos a cidade? Uma abordagem etnográfica ao graffiti urbano. Lisboa: Fim de Século, 2010.; McDonald, 2001). Mas o graffiti não se resume a isto. Existe, igualmente, uma vertente que, não se opondo a esta, apresenta características bem distintas. Falamos do hall of fame, também profusamente denominado de “graffiti artístico”. Este formato pictórico caracteriza-se, geralmente, por produções de grandes dimensões, de maior complexidade técnica e visual, com preocupações de ordem estética. De natureza legal ou semi-legal em grande parte dos casos, não é alvo central de recriminação social ou de perseguição por parte das autoridades. Importa ainda notar que muitas destas obras de graffiti tendem a ser consideradas formas estéticas socialmente legítimas, enquadradas na chamada “street art” ou arte urbana. Parte considerável desses artistas têm produções comissionadas e trabalham com galerias de arte e outros espaços de exposição convencionais (Campos, 2010)10 10 Este é o tipo de expressão que se aproxima do “grafite”, tal como é entendido no contexto brasileiro. .

Das nossas palavras, facilmente se depreende que ambos os objetos se constituem como universos sociais e culturais de natureza mais subterrânea e oposicional, seja porque se situam claramente no âmbito da ilegalidade (graffiti), seja porque ideológica e simbolicamente se posicionam numa situação de transgressão ou contestação de um conjunto de valores e representações sociais dominantes (rap underground). Acresce a este facto a natureza minoritária e relativamente invisível dessas práticas, bem como a fabricação de uma estrutura normativa e simbólica interna, que reflete aquilo que encontramos em muitos grupos em situações de desvio, subalternidade ou periferização (Matza; Sykes, 196134. MATZA, D.; SYKES, G. Juvenile Delinquency and subterranean values. American Sociological Review, vol. 26 (5), p. 712-719. 1961.; Young, 199750. YOUNG, J. The subterranean world of play. In: GELDER, K.; THORNTON, S. (orgs.). The Subcultures Reader. Londres e Nova Iorque: Routledge , 1997 [ed. orig. 1971]. p. 71-80. [1971]).

Subculturas e circuitos digitais juvenis: entre o online e o offline

Que consequências possuem a internet e as tecnologias digitais para as subculturas que estudámos? Como são utilizados os diferentes recursos digitais em práticas eminentemente de rua?

Tais questões implicam que se examine, ainda que brevemente, o significado da “rua” para estas subculturas. Ambos os casos estudados afirmam-se inequivocamente como culturas de rua. Tal significa, em primeiro lugar, que as práticas expressivas que sustentam a pertença a este meio se manifestam no espaço público urbano sendo, por isso, de índole essencialmente informal. Significa, em segundo lugar, que a rua desempenha um papel simbolicamente central para a definição de uma identidade cultural e para a justificação ideológica da existência destas subculturas. É na rua, e através da rua, que as redes se firmam e reforçam, que as expressões ganham vida e que, portanto, o reconhecimento e o prestígio entre pares se adquirem.

A rua é, assim, o território físico, mas também social e ideológico, em torno do qual se legitimam certas formas de atuação, solidariedades locais, estratégias de visibilidade e de aquisição de estatuto. Isto é particularmente evidente no graffiti, que utiliza a cidade como meio para a um jogo social que assenta na conquista do espaço urbano, através da disseminação de uma marca (o tag). O reconhecimento neste meio é adquirido, precisamente, em função do impacto visual que a obra de um writer adquire na cidade. Neste meio competitivo, é na rua que se dirimem as batalhas simbólicas em torno do prestígio individual e colectivo (da crew11 11 Crew corresponde a um grupo de writers que agem colectivamente, assumindo uma identidade colectiva particular. ). No caso do rap de protesto, a rua assume uma dupla função. Por um lado, grande parte daquilo que é a dinâmica mais rudimentar do rap ocorre nos espaços informais da rua ou do bairro (beatbox12 12 Componente do rap que consiste na produção vocal de beats (ou batidas que delimitam o ritmo), associada à improvisação. , rimas, jams13 13 Jam sessions, encontros entre rappers e DJs dos quais resultam sessões colectivas de improviso. As circunstâncias e os locais em que as jams ocorrem são variáveis, embora a rua e outros espaços públicos sejam os mais comuns. , etc.). Por outro lado, num sentido mais metafórico, a rua (e o bairro) remetem para o horizonte das vivências narradas pelas letras deste tipo de rap (Forman, 200223. FORMAN, M. The ‘hood comes first. Race, space and place in rap and hip-hop. Middletown (Connecticut): Wesleyan University Press, 2002.). A rua é, desse modo, também um espaço simbólico que representa a dura vivência do dia-a-dia nestes bairros estigmatizados (pobreza, violência policial, periferização residencial, exclusão étnica, etc.).

O espaço simbólico da rua e a natureza algo subterrânea e invisível destes grupos, poderiam sugerir alguma aversão à inclusão de tecnologias mediáticas que potenciam, precisamente, uma maior exposição e abertura ao exterior. Com efeito, excepto nos casos em que os bens criados estão vinculados a alguma forma de comercialização ou visam o mercado, estas são práticas que adquirem pouca expressão nos media e, por isso, pouca atenção pública. A questão que se coloca é, então, como foram as tecnologias e media digitais acolhidos no âmbito das atividades culturais destes grupos?

No primeiro projeto de investigação por nós desenvolvido, esta não era ainda uma questão fulcral (Grácio et al., 200426. GRÁCIO, S.; SIMÕES, J. A.; NUNES, P.; CAMPOS, R. Subculturas juvenis urbanas: ideologia, performatividade e consumo cultural. O caso do movimento hip-hop. Lisboa: FCSH/UNL, 2004.). A desigual disseminação das tecnologias digitais na sociedade portuguesa tornava esta questão algo residual (Obercom 2015). Todavia, esta não era uma questão completamente despropositada, pois notava-se a adopção destas novas ferramentas por alguns protagonistas, na sua atividade cultural. Sentiam-se, porém, algumas resistências à introdução da internet como ferramenta de uso corrente por parte de alguns atores. Tais reservas decorriam, em grande medida, de uma representação destas culturas como sendo “culturas de rua”, baseadas num estrito código de conduta e avaliação em que, aparentemente, o meio dito “virtual” não tinha lugar. Entrevistas realizadas neste e nos projetos seguintes (Campos, 20109. CAMPOS, R. Porque pintamos a cidade? Uma abordagem etnográfica ao graffiti urbano. Lisboa: Fim de Século, 2010.; Simões, 201043. SIMÕES, J. A. Entre a rua e a internet. Um estudo sobre o hip-hop português. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais . 2010.) reforçaram precisamente esta ideia: a carreira faz-se na rua e é aí que o prestígio se conquista (não nos monitores de computador). As palavras seguintes são elucidativas:

Há tempos atrás, em Algés, estava um graf do Obey (…) lindo, que dizia: “run and tell your friends in the internet who rules the city”. Isto explica bem o que eu penso da Internet. É conversa de internet e depois o que se passa realmente na rua. Conversas de internet são desnecessárias, as coisas são na rua, frente a frente (Entrevista ao writer FIRE, 2005).

Na Net não podes fazer umas das cenas mais importantes, como por exemplo subir a um palco e improvisar! ([Entrevista on-line] MC, administrador de um fórum, 2005).

Esta era, em grande medida, uma contenda geracional, situação que aliás é sugerida pelas palavras anteriores de FIRE e do MC, opondo os representantes da chamada “old school” a uma nova geração de protagonistas, mais familiarizados com os media digitais. Porém, o que se tem vindo a verificar é que as poucas resistências que existiam se foram dissipando, em função de uma maior banalização e incorporação do digital no quotidiano.

Por outro lado, não podemos ignorar que a transposição do hip-hop para a internet não se limita a ser uma mera reprodução dos seus vários atributos offline, acarreta também características novas, com base nas quais se edificam circuitos próprios e alternativos. O espaço urbano, apropriado física e simbolicamente, é assim transposto para a internet, que simultaneamente o descontextualiza e preserva, dando-lhe um alcance mais amplo mas, ao mesmo tempo, podendo manter diversas alusões ao lugar (Simões, 200944. SIMÕES, J. A. Redes, Internet e hip-hop: redefinindo o espaço dos fluxos. In: CARMO, R. M.; SIMÕES, J. A. (orgs.). A Produção das mobilidades: redes, espacialidades e trajectos, Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais . 2009. p. 71-89.).

Analisemos, então, a forma como estas tecnologias foram apropriadas nos casos particulares do graffiti e do rap de protesto. A abordagem ao material empírico recolhido durante a última década permite-nos avançar com um quadro de leitura deste objecto construído a partir do confronto com os dados. Partindo dos dados analisados, identificámos dois eixos de análise principais, em torno dos quais se articula um conjunto de funções que a internet e as tecnologias digitais podem assumir (Simões, 200944. SIMÕES, J. A. Redes, Internet e hip-hop: redefinindo o espaço dos fluxos. In: CARMO, R. M.; SIMÕES, J. A. (orgs.). A Produção das mobilidades: redes, espacialidades e trajectos, Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais . 2009. p. 71-89.; Campos; Simões, 201112. CAMPOS, R.; SIMÕES, J. A. Participação e inclusão digital nas margens: uma abordagem exploratória das práticas culturais de jovens afro-descendentes. O caso do rap negro. Media & Jornalismo, 19, p. 117-133. 2011., 2014): a) num primeiro eixo, articulam-se funções ligadas à memória, à comunicação e à visibilidade dessas subculturas; b) num segundo eixo, em estreita ligação com o anterior, articulam-se funções relacionadas com a representação, a narração e a identidade das mesmas.

Esses não são eixos (e funções) exclusivos das subculturas examinadas, mas assumem uma configuração particular nestes casos. Tivemos em consideração, nesta decomposição, não apenas os “usos” e “representações” acerca da internet, mas estendemos a análise a um conjunto de ferramentas digitais (celular, câmara fotográfica e vídeo, etc.) que, no fundo, servem para alimentar de conteúdos as plataformas online. Desse modo, estamos perante um ecossistema digital multimediático em que distintos dispositivos funcionam em rede, de forma integrada.

No que ao graffiti diz respeito, a utilização dos media e tecnologias digitais decorre, em grande medida, de um imperativo de memória no âmbito de uma cultura que produz bens de índole eminentemente transitória. A efemeridade da pintura de graffiti obrigou, praticamente desde as origens, ao uso da fotografia como recurso de registo visual (Cooper; Chalfant, 198417. COOPER, M.; CHALFANT, H. Subway Art. Londres: Thames & Hudson, 1984.; Castleman, 198213. CASTLEMAN, C. Getting Up. Subway graffiti in New York. Cambridge: MIT Press. 1982.). Os acervos visuais em fotografia serviram como testemunhos de obras provisórias, contribuindo para criar portefólios que sustentaram o prestígio dos seus criadores. Mais recentemente, a multiplicação dos aparatos digitais de captação visual (câmaras fotográfica e vídeo, celulares, etc.), apenas veio dar um novo impulso a esta atividade. A proliferação da fotografia digital neste meio tornou incontornável o uso da internet como veículo de divulgação das atividades. Os computadores passam, assim, a ser o novo repositório de memórias visuais destes jovens:

Eu tenho as fotos todas (do graffiti) no PC, ainda, nunca mandei revelar nada... se algum dia me acontece alguma coisa ao PC estou bem lixado, tenho lá a minha vida toda... (Entrevista ao writer KEYMS, 2005).

Mas não foi apenas o uso da fotografia que passou a ser potenciado, também o vídeo começou a ser empregue, particularmente em determinadas ações. Filmar “missões” arriscadas, como sejam as pinturas coletivas de carruagens de trem ou de metro, que geralmente não têm testemunhas14 14 São realizadas frequentemente de noite e ocorrem geralmente sem que existam testemunhas dos eventos, excepto aqueles que fazem parte destas missões. , passou a ser comum entre algumas crews. Neste caso, o registo visual pretende perpetuar a obra produzida, mas também certas práticas, episódios perigosos e destemidos, que contribuem para o prestígio dos seus protagonistas.

Para além da questão da memória, há a questão da visibilidade proporcionada pelas plataformas digitais, sendo a internet uma “vitrine” das obras e atividades dos writers, contribuindo decisivamente para a construção da sua carreira neste mundo. Para tal, diversas plataformas foram sendo usadas, como os blogues e sites, as redes sociais (Hi5, Facebook, etc.), ou sites de divulgação de vídeos e fotografias (YouTube, Vimeo, Flickr, etc.).

[…] Vou estando relativamente atento ao que se passa na comunidade fotolog, é um fenómeno que começou a surgir em finais de 2003 e que possibilitou que muitos writers pudessem com mais facilidade mostrar o seu trabalho (…) Porque depois os fotologs têm links e através de um fotolog inicial consegues uma série de links para outros fotologs. Em geral eu vejo os fotologs de quase todos os writers portugueses e alguns writers estrangeiros... já é uma quantidade razoável, praí 30 ou 35 fotologs à vontade... (Entrevista ao writer FICTO, 2005).

Esta situação, a que se junta a facilidade de comunicação e troca de informação entre os writers, transforma a internet numa ferramenta imprescindível, como revela FICTO.

Pois a internet neste momento está a ter um papel importante nesse sentido, porque se calhar tu nem conheces a pessoa de lado nenhum, mas gostas do trabalho dela e através da internet consegues entrar em contacto com essa pessoa e através daí surgem certas amizades dentro do graffiti... (Entrevista ao writer FICTO, 2005).

Estas também funcionam como tecnologias de representação e narração, na medida em que permitem criar uma biografia de práticas culturais (pintura de paredes, pintura de trens, encontros de writers) e de obras (tags, fames, etc.) que se encontram num acervo digital particular, mas que também estão expostas na esfera pública em sites, blogues ou redes sociais, contribuindo para a construção da imagem pública de writers e crews. Desse modo, estes podem ser usados estrategicamente, uma vez que são objeto de operações de filtragem e de seleção no sentido de criar uma certa narrativa individual e colectiva. Por último, a criação destes acervos e a sua disponibilização na internet contribuem para que uma certa identidade individual e grupal se componha, tornando os atores publicamente reconhecíveis por certas práticas ou produtos culturais. Convém notar, por isso, que a marca digital deixada pelos indivíduos é relevante para a forma como são representados e avaliados pela comunidade. Desse modo, o seu prestígio social joga-se também neste campo, sendo este um reduto de contendas e disputas simbólicas, como nos revela a seguinte passagem:

É o tag dele... éramos putos a fazer cenas más, mas éramos putos a mexer e que não andávamos a dizer a ninguém «eu faço bué! Sou bué da mau e faço isto e aquilo» e ele não, ele ia logo para a net meter fotos e chibar-se para toda a gente, «ah a minha crew faz bué da trains», mesmo atitude puto estúpido que precisa de se afirmar no graf. (…) Depende das cenas, uma cena é haver sites de graf onde estão trains expostos, outra é... agora é a fantochada dos fotologs, agora é a moda, toda a gente mete cenas no fotolog, por acaso eu também tenho um fotolog, quase toda a gente tem, mas não ando lá a meter os meus trains e a exibir-me e a meter lá tudo o que faço, mando umas fotos engraçadas, com o sol por trás e tal... (Entrevista ao writer KEYMS, 2005).

Em resumo, para além da rua e da cidade, a internet é mais um espaço de protagonismo, de visibilidade e de negociação de estatuto (Campos, 20098. CAMPOS, R. Movimentos da imagem no graffiti. Das ruas da cidade para os circuitos digitais. In: CARMO, R. M.; SIMÕES, J. A. (orgs.). A produção das mobilidades. Redes, espacialidades e trajectos. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2009. p. 91-112., 2012). Tal não implica que esta seja alvo de uma avaliação inteiramente positiva, na medida em que pode servir para denegrir ou desprestigiar o trabalho de outrem, sendo por isso abordada com algumas reservas por parte dos writers. A forte presença da internet foi notada nas pesquisas desenvolvidas no contexto português, mas igualmente noutros contextos sociais e geográficos (Snyder, 200945. SNYDER, G. Graffiti lives: Beyond the tag in New York’s urban underground, New York: New York University Press, 2009.).

O caso dos circuitos que se formam online em torno da música rap é porventura um pouco mais complexo. Em primeiro lugar, pela própria diversidade do universo musical, que gera diferentes tipos de produtos e, como tal, pode circular sob diversas formas. Mas também porque os autores de tais produtos, como já tínhamos aludido atrás, podem apresentar estatutos bastante distintos e, portanto, ter à partida diferentes propósitos quando decidem apresentar o seu trabalho online, utilizando para o efeito canais de difusão com âmbitos mais ou menos amplos, alguns claramente orientados para o mercado e a comercialização, outros cumprindo desígnios assumidamente amadores, voltados para a promoção restrita, com um carácter quase privado. Numa pesquisa recente verificámos que, de facto, o rap tem uma forte presença na internet, sob diferentes formatos (Simões, 201043. SIMÕES, J. A. Entre a rua e a internet. Um estudo sobre o hip-hop português. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais . 2010.). Iremos, todavia, centrar-nos exclusivamente no caso que nos interessa particularmente, o rap underground ou de protesto.

As funções desempenhadas pelos media e tecnologias digitais neste caso concreto são, em grande medida, semelhantes àquelas que desempenham no caso já abordado do graffiti. Estes são óptimos veículos de construção e registo de memória audiovisual e visual (fotos e vídeos de concertos, gravações, performances, etc.).

Os circuitos digitais são também poderosas ferramentas de comunicação, facilitando a constante troca de informação entre a comunidade de rappers através de múltiplas plataformas. É particularmente significativa a comunicação com o potencial público da obra musical, na medida em que permite disseminar o trabalho dos rappers. Neste caso, ferramentas como o YouTube ou as redes sociais podem ser mobilizadas com intuitos específicos, destinadas à promoção de indivíduos e grupos. A importância destas redes revela-se pela sua extraordinária capacidade de divulgação, mas também pela natureza dinâmica e interativa da comunicação que permite aos rappers irem avaliando o impacto das suas produções:

Vi que no MySpace metias uma música hoje, amanhã já tinhas 20 pessoas que tinham ouvido, é a mesma coisa quase que teres oferecido 20 CDs, estás a perceber? (…) Quando metes um vídeo ou som no YouTube costumam estar lá comentários, nos comentários costumo ver quem mais se destaca, quem mais estão a falar, porque faz de conta, tu ouves um som meu e depois metes lá um comentário: “yah, também se fosses ver o som tal, também é bom…”, para estar mais ou menos actualizado (…) (Entrevista ao rapper Jackson, 2011).

A questão da visibilidade proporcionada por estas tecnologias é essencial, muito mais importante do que no caso anteriormente analisado do graffiti. O carácter amador e improvisado (e em certos casos provisório) de muitas destas práticas, mas igualmente o seu teor alternativo, contestatário e subversivo, encontram na internet um meio único para se reproduzir e propagar. Esta é uma situação que altera o paradigma anterior, marcado por uma série de constrangimentos que impediam uma maior visibilidade destes grupos e das suas produções musicais. E a este respeito, os rappers entrevistados são peremptórios, a internet é incontornável:

A net é um must, é obrigatório […] sem site, sem página quem é que te vai conhecer? (Entrevista ao rapper Kromo di Gueto, 2011).

A internet é uma arma poderosa [...] a internet é democrática, de uma certa forma é bastante democrática. Várias coisas aconteceram depois da chegada da internet. […] há grupos que já estão cá a mais de 10 anos e não tinham acesso ... agora através da net já podem promover o videoclip através do YouTube, há pessoas que já têm 120 e tal mil “views”, em crioulo e em português, estás a ver? São pessoas que não têm editoras (…) (Entrevista ao rapper LBC, 2011).

As diferentes plataformas usadas, nomeadamente o MySpace e YouTube, revelam formas de gestão estratégica da imagem, funcionando como tecnologias de representação, narração e identidade. Tal é evidente nos perfis criados nas plataformas, com uma seleção de imagens, notas biográficas e “statements” pessoais15 15 Isto é bastante evidente numa análise que fizemos de algumas destas plataformas online. , etc. Dessa forma, há alguma mimetização daquilo que é a representação comum dos artistas musicais com alguma expressão pública.

Os jovens colocam as suas imagens nas suas redes sociais porque é o cartão-de-visita do rapper. É muito importante para um músico aparecer, estar no rádio, na internet, num programa de televisão (Entrevista ao rapper Djoek, 2011).

O YouTube, por exemplo, serve como óptima referência na medida em que possibilita a disponibilização de formas narrativas audiovisuais em registo de videoclip, que retratam os imaginários do artista e da sua obra. E os videoclips são elementos fundamentais para a disseminação das obras musicais, mas também para a construção de uma identidade visual dos rappers.

Montei o meu primeiro vídeo no Movie Maker. A música foi feita no dia e o instrumental foi feito na hora e depois meti-me a filmar, coloquei umas fotos e misturei tudo. Mostrei ao pessoal e os meus amigos disseram logo “yeah, vamos colocar no YouTube” e a partir daí já foi aquela conexão. Meti no YouTube, no MySpace, criei um para mim e coloquei outras músicas e fotos minhas (Entrevista ao rapper Machine, 2011).

Uma análise de diversos videoclips disponíveis no YouTube ou nas plataformas geridas pelos rappers, demonstra-nos que, neste rap de protesto, é muito comum os videoclips revelarem uma espécie de “encenação da periferia”, um retrato particular dos bairros onde vivem estes jovens. Tal performatividade do quotidiano está, de alguma forma, em consonância com um tipo de rap que pretende retratar o dia-a-dia destes jovens, invocando muitos dos problemas e dificuldades sentidos em zonas que estes classificam constantemente como sendo “guetos” de natureza étnica e classista (Campos; Simões, 201411. CAMPOS, R.; SIMÕES, J. A. Digital participation at the margins: online circuits of rap music by Portuguese Afro-descendant youth. Young: Nordic Journal of Youth Research, 21(1), p. 87-106. 2014.). Desse modo, a visualidade aqui presente reitera a dimensão da autenticidade que é referida como elemento distinto fulcral do rap de protesto.

Conclusão: media digitais como fórmulas de visibilidade, narração e empoderamento

Se é um facto que no início dos anos 2000 a receptividade aos media digitais por parte dos vários grupos e indivíduos que se dedicavam ao rap e ao graffiti era ainda marcada por alguma dissensão (Grácio et al., 200426. GRÁCIO, S.; SIMÕES, J. A.; NUNES, P.; CAMPOS, R. Subculturas juvenis urbanas: ideologia, performatividade e consumo cultural. O caso do movimento hip-hop. Lisboa: FCSH/UNL, 2004.; Campos, 20109. CAMPOS, R. Porque pintamos a cidade? Uma abordagem etnográfica ao graffiti urbano. Lisboa: Fim de Século, 2010.), os últimos anos são assinalados aparentemente por uma maior aceitação destes utensílios. A ambivalência com que tais tecnologias foram inicialmente acolhidas deve-se, a nosso ver, às características mais fundamentais das subculturas que se assumem, marcadamente, como “culturas de rua”. A representação de uma cultura que se expressa e ganha sentido no espaço físico urbano colide com a representação de um universo “virtual” aparentemente desvinculado da realidade.

Hoje, os media digitais estão completamente integrados em diversas culturas juvenis urbanas. A realidade revela-nos um universo juvenil altamente conectado, sendo os dispositivos móveis e media digitais parte integrante do quotidiano juvenil (Lenhart et al., 200730. LENHART, A.; MADDEN, M.; MACGILL, A. R.; SMITH, A. Teens and Social Media. Washington: Pew Internet & Americam Life Project, 2007.; Vickery; Wunsch-Vincent, 200748. VICKERY, G.; WUNSCH-VINCENT, S. Participative Web and User-created Content. Web 2.0, wikis and social networking. Paris, OECD, 2007.). Por outro lado, os jovens parecem ter-se apercebido do potencial representado por estas tecnologias para a prossecução das suas atividades expressivas. Estes recursos são apropriados em função de um móbil específico, respeitando regras culturais estabelecidas, mas renovando hábitos e procedimentos. Quer no caso do graffiti, quer no caso do rap, potenciar a comunicação entre pares e a visibilidade dos protagonistas, parece ser uma das principais vantagens da utilização dos media digitais. Esta visibilidade é gerida pelos atores em função de uma série de objetivos e com recurso a diversas plataformas tecnológicas. A gestão estratégica desses circuitos de comunicação tem em consideração o público a quem se destina, a informação e o impacto que se pretende alcançar. Ou seja, a exposição dos actores é gerida de acordo com as redes que pretendem sustentar, podendo ser realizada num circuito mais fechado (membros da comunidade) ou mais aberto (potencialmente disponível a todos). Esta maior visibilidade produzida pelas redes digitais tem uma série de consequências.

Desde logo, a hierarquização simbólica do campo que anteriormente era sustentada através dos espaços informais da rua, em círculos sociais mais fechados, hoje é jogada igualmente nas inúmeras plataformas digitais. Deste modo, para além de ser importante ter estratégias de disseminação do trabalho no âmbito das redes sociais em que os jovens se movem e nos diversos palcos da sua atuação, também é fundamental utilizar as plataformas online para comunicar com determinados públicos (alargando a base social de receptores da informação).

Por outro lado, consideramos que o maior impacto público potencialmente proporcionado pelos media digitais, transforma-os em ferramentas de empoderamento de grupos e indivíduos que, de outra forma, teriam reduzido acesso a canais formais de comunicação social. Estes são, como vimos, meios de expressão (representação), mas também de construção identitária através da elaboração de narrativas (individuais e colectivas) em torno de determinados interesses e causas. Dessa forma, estes jovens têm a possibilidade de criar a sua própria agenda de forma colectiva e partilhada, o que, em muitos casos, se revela como alternativa ou contrária à agenda dos media mainstream, criando um discurso alternativo com um significado simbólico específico. Isso é especialmente evidente no caso do rap underground, cuja mensagem de cariz ideológico dificilmente adquiria relevo na esfera pública.

Desse modo, e em síntese, para além da possibilidade de se poder ter uma “voz” online, assegurada por processos de comunicação que potenciam redes e a visibilidade pública, é igualmente crucial o contributo dessa presença online para a construção de uma identidade partilhada, mediante a elaboração de múltiplas narrativas (individuais e coletivas) em diferentes plataformas e circuitos digitais que expandem (e se interligam) com os circuitos e as práticas de rua.

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    ROSE, T. Black Noise: Rap Music and Black Culture in Contemporary America, Londres: Wesleyan University Press, 1994.
  • 42
    SIMÕES, J. A. Entre percursos e discursos identitários: etnicidade, classe e género na cultura hip-hop. Revista Estudos Feministas, 21 (1), p. 107-128. 2013.
  • 43
    SIMÕES, J. A. Entre a rua e a internet. Um estudo sobre o hip-hop português. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais . 2010.
  • 44
    SIMÕES, J. A. Redes, Internet e hip-hop: redefinindo o espaço dos fluxos. In: CARMO, R. M.; SIMÕES, J. A. (orgs.). A Produção das mobilidades: redes, espacialidades e trajectos, Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais . 2009. p. 71-89.
  • 45
    SNYDER, G. Graffiti lives: Beyond the tag in New York’s urban underground, New York: New York University Press, 2009.
  • 46
    ST. JOHN, G. Post-Rave Thecnotribalism and the Carnival of Protest. In: MUGGLETON, D.; WEINZIERL, R. (org.). The Post-Subcultures Reader. Nova Iorque: Berg , 2003. p. 65-82.
  • 47
    THORNTON, S. General Introduction. In: GELDER, K.; THORNTON, S. (orgs.). The Subcultures Reader. Londres e Nova Iorque: Routledge , 1997. p. 1-7.
  • 48
    VICKERY, G.; WUNSCH-VINCENT, S. Participative Web and User-created Content. Web 2.0, wikis and social networking. Paris, OECD, 2007.
  • 49
    WILLIAMS, J. P. Subcultural theory: traditions and concepts. Cambridge: Polity, 2011.
  • 50
    YOUNG, J. The subterranean world of play. In: GELDER, K.; THORNTON, S. (orgs.). The Subcultures Reader. Londres e Nova Iorque: Routledge , 1997 [ed. orig. 1971]. p. 71-80.
  • 1
    O primeiro projeto de pesquisa centrou-se numa análise da cultura hip-hop na região metropolitana de Lisboa (Grácio et al., 2004). Mais tarde, ambos os autores desenvolveram projetos de investigação autónomos no âmbito das suas teses de doutoramento, especificamente sobre o contexto do graffiti e da street art em Lisboa (Campos, 2010) e sobre a apropriação da internet na cultura hip-hop (Simões, 2010). Mais recentemente, participaram num projeto internacional sobre inclusão e participação digital, onde foi analisado o caso específico do rap negro (Campos; Simões, 2011, 2014). Como resultado, conduziram-se mais de 100 entrevistas aprofundadas com músicos de rap e writers, recolheu-se e analisou-se um vasto leque de dados visuais, pictóricos e sonoros, assim como conteúdos online sobre essas práticas, criados pelos próprios protagonistas entrevistados ou por outros. Atualmente, a dimensão de participação juvenil é desenvolvida através do projeto “Activismo Juvenil em Rede” (EXPL/IVC‐COM/2191/2013), financiado por Fundos Nacionais através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), que serviu de base também à presente reflexão. Projeto desenvolvido no Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais CICS.NOVA–FCSH/UNL, UID/SOC/04647/2013, com o apoio financeiro da FCT/MEC através de Fundos Nacionais.
  • 2
    Pela sua componente “antissistema”, essas práticas juvenis associadas ao radicalismo ecológico, políticas de ação direta, novas experiências musicais, etc., têm sido designadas Do It Yourself Cultures, sendo consideradas como uma espécie de contracultura dos anos 90.
  • 3
    Ver, também, para os movimentos antiglobalização na Europa e América Latina, Feixa, Saura e Costa (2002).
  • 4
    O que depende do modo como “participação política” é definida. Em estudos recentes, a noção tem sido alargada de modo a incluir diferentes formas de participação cívica e cultural, incluindo ativismo não institucionalizado. Veja-se, Dahlgren (2007), Loader (2007) e Dahlgren e Olsson (2009).
  • 5
    Actividade a cargo do MC, Mestre-de-Cerimónias, cantor rap ou, simplesmente, rapper.
  • 6
    Actividade realizada pelo DJ, Disk Jockey ou quem manipula os discos e produz a sonoridade típica do rap.
  • 7
    Importa referir que o conceito de graffiti em Portugal envolve manifestações distintas, sendo algo diferente do “grafite” no contexto brasileiro. No Brasil, “grafite” é considerado uma forma de expressão pictórica legitima e apreciada ao contrário da “pixação” que é socialmente entendida como uma forma de vandalismo, sem relevância estética.
  • 8
    Tag é o pseudónimo criado pelo writter para agir anonimamente. Este tag é, também, a assinatura, a sua identidade gráfica disseminada pelo espaço urbano.
  • 9
    O graffiti ilegal em Portugal tem, então, algum paralelo com a pixação brasileira.
  • 10
    Este é o tipo de expressão que se aproxima do “grafite”, tal como é entendido no contexto brasileiro.
  • 11
    Crew corresponde a um grupo de writers que agem colectivamente, assumindo uma identidade colectiva particular.
  • 12
    Componente do rap que consiste na produção vocal de beats (ou batidas que delimitam o ritmo), associada à improvisação.
  • 13
    Jam sessions, encontros entre rappers e DJs dos quais resultam sessões colectivas de improviso. As circunstâncias e os locais em que as jams ocorrem são variáveis, embora a rua e outros espaços públicos sejam os mais comuns.
  • 14
    São realizadas frequentemente de noite e ocorrem geralmente sem que existam testemunhas dos eventos, excepto aqueles que fazem parte destas missões.
  • 15
    Isto é bastante evidente numa análise que fizemos de algumas destas plataformas online.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    27 Ago 2015
  • Aceito
    18 Fev 2016
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