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Hipertensão: condição de não doença - o significado da cronicidade na perspectiva dos sujeitos

Resumos

Objetivou-se compreender as concepções do processo saúde-doença-cuidado para indivíduos portadores de Hipertensão Arterial Sistêmica, bem como o significado dessa enfermidade em suas vidas. Trata-se de pesquisa qualitativa, descritiva. Foram sujeitos da pesquisa nove indivíduos portadores de hipertensão arterial, em acompanhamento com equipe de saúde da família. Utilizou-se a entrevista semiestruturada, observação e análise documental para a coleta dos dados. Foi realizada análise temática dos dados. Foi unânime entre os participantes a concepção de que a hipertensão, mesmo sendo um agravo crônico, não representa uma condição de doença. Atribui-se isso ao fato dessa enfermidade não apresentar sintomas físicos, somado à estabilidade de seus níveis pressóricos, pelo uso correto de medicações. Associaram esse posicionamento, ainda, com o longo período de tempo em que vivenciam essa condição crônica. Por essas razões, esses sujeitos definem-se como pessoas saudáveis. Assim, constata-se que esses sujeitos aprenderam a viver "com" a hipertensão e não "apesar" dela.

Hipertensão; Doença crônica; Processo saúde-doença; Enfermagem em saúde comunitária


The purpose of this study was to understand the concepts underlying the health-disease-care process of subjects with systemic arterial hypertension, as well as the meaning of this disease in their lives. It consists of a qualitative descriptive study. Study participants were nine subjects with arterial hypertension, in follow-up with a family health team. The study utilized semi-structured interviews, observation and documentary analysis for data collection. Data were analyzed through thematic analysis. There was a unanimous feeling among the participants that hypertension, despite being a chronic illness, does not represent a disease condition. This is attributed to the fact that this illness does not present physical symptoms, added to the ability to stabilize pressure levels with the correct use of medication. This position was also associated with the long period of time in which they experience this chronic condition. For these reasons, these subjects define themselves as healthy people. Therefore, it is verified that these subjects have learned how to live "with" hypertension rather than "despite" it.

Hipertension; Chronic disease; Health-disease process; Community health nursing


El objetivo fue comprender los conceptos del proceso de la salud-enfermedad-cuidado de los individuos con hipertensión, así como la importancia de esta enfermedad en sus vidas. Investigación cualitativa, descriptiva con nueve pacientes hipertensos, seguido con un equipo de salud de la familia. Fue utilizada la entrevista semi-estructurada, observación y análisis de documentos para recopilar datos. Se realizó el análisis temático de los datos. Fue unánime entre los participantes el concepto de que la hipertensión, a pesar de ser un agravo crónico, no presenta una condición de enfermedad. Se atribuye al hecho que esta enfermedad no presenta síntomas físicos, combinado con la estabilidad de sus niveles de presión arterial, el uso correcto de los medicamentos, incluso con el largo período de tiempo que vivencian con esta enfermedad crónica. Por estas razones, estos individuos se definen como personas sanas. Así, personas han aprendido a vivir "con" hipertensión y no "a pesar" de ella.

Hipertensión; Enfermedad crónica; Proceso salud-enfermedad; Enfermería de salud comunitaria


ARTIGO ORIGINAL

Hipertensão: condição de não doença – o significado da cronicidade na perspectiva dos sujeitos

Fernanda Machado da SilvaI; Maria de Lourdes Denardin BudóII; Celso Leonel SilveiraIII; Marcio Rossato BadkeIV; Margrid BeuterV

IMestre em Enfermagem. Professora Assistente do Curso de Enfermagem da Universidade Federal do Pampa. Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: fernandasilva@unipampa.edu.br

IIDoutora em Enfermagem. Professora Associado do Departamento de Enfermagem e do PPGEnf/UFSM. Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: lourdesdenardin@gmail.com

IIIMestrando em Enfermagem do PPGEnf/UFSM. Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: ccilveira@hotmail.com

IVMestre em Enfermagem. Professor Assistente do Departamento de Enfermagem da UFSM. Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: marciobadke@yahoo.com.br

VDoutora em Enfermagem. Professora Adjunto do Departamento de Enfermagem e do PPGEnf da UFSM. Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: beuter@terra.com.br

Endereço para correspondência

RESUMO

Objetivou-se compreender as concepções do processo saúde-doença-cuidado para indivíduos portadores de Hipertensão Arterial Sistêmica, bem como o significado dessa enfermidade em suas vidas. Trata-se de pesquisa qualitativa, descritiva. Foram sujeitos da pesquisa nove indivíduos portadores de hipertensão arterial, em acompanhamento com equipe de saúde da família. Utilizou-se a entrevista semiestruturada, observação e análise documental para a coleta dos dados. Foi realizada análise temática dos dados. Foi unânime entre os participantes a concepção de que a hipertensão, mesmo sendo um agravo crônico, não representa uma condição de doença. Atribui-se isso ao fato dessa enfermidade não apresentar sintomas físicos, somado à estabilidade de seus níveis pressóricos, pelo uso correto de medicações. Associaram esse posicionamento, ainda, com o longo período de tempo em que vivenciam essa condição crônica. Por essas razões, esses sujeitos definem-se como pessoas saudáveis. Assim, constata-se que esses sujeitos aprenderam a viver "com" a hipertensão e não "apesar" dela.

Descritores: Hipertensão. Doença crônica. Processo saúde-doença. Enfermagem em saúde comunitária.

RESUMEN

El objetivo fue comprender los conceptos del proceso de la salud-enfermedad-cuidado de los individuos con hipertensión, así como la importancia de esta enfermedad en sus vidas. Investigación cualitativa, descriptiva con nueve pacientes hipertensos, seguido con un equipo de salud de la familia. Fue utilizada la entrevista semi-estructurada, observación y análisis de documentos para recopilar datos. Se realizó el análisis temático de los datos. Fue unánime entre los participantes el concepto de que la hipertensión, a pesar de ser un agravo crónico, no presenta una condición de enfermedad. Se atribuye al hecho que esta enfermedad no presenta síntomas físicos, combinado con la estabilidad de sus niveles de presión arterial, el uso correcto de los medicamentos, incluso con el largo período de tiempo que vivencian con esta enfermedad crónica. Por estas razones, estos individuos se definen como personas sanas. Así, personas han aprendido a vivir "con" hipertensión y no "a pesar" de ella.

Descriptores: Hipertensión. Enfermedad crónica. Proceso salud-enfermedad. Enfermería de salud comunitaria.

INTRODUÇÃO

As condições crônicas representam problemas de saúde que exigem gerenciamento contínuo, por parte de seus portadores, por um longo período. Abarcam um grupo extremamente amplo de agravos, que apresentam em comum a cronicidade e a necessidade de cuidados permanentes.1 Dentre eles, a Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) apresenta-se como uma enfermidade de grande relevância epidemiológica, por sua alta prevalência e por representar o principal fator de risco para doenças cardiovasculares.

Atribui-se à HAS e suas comorbidades cardiovasculares um elevado custo social e financeiro, devido ao grande número de internações hospitalares e procedimentos altamente especializados. Como consequência, tem-se o aumento de absenteísmo no trabalho e aposentadorias precoces e, principalmente, a fragilidade na qualidade de vida de seus portadores. Por sua relevância epidemiológica e social a HAS representa um importante problema de saúde pública.

Já, na perspectiva dos portadores, essa enfermidade é percebida de maneira única e subjetiva, devido à gama de sentimentos, simbologias e preocupações que representa em suas vidas. Dentre eles, a cronicidade da HAS constitui-se num dos fatores de maior impacto na vida dessas pessoas. Por essa característica, impõem-se adaptações no cotidiano de seus portadores, sendo necessárias, muitas vezes, mudanças significativas em suas práticas de vida.

A cronicidade constitui-se num conceito biomédico, utilizado na classificação clínica dos agravos, devido à sua impossibilidade de cura. Sob um olhar sociológico, apresenta-se como uma concepção referente às condições de falta de saúde que podem ser gerenciadas, mas não curadas, e, por essa razão, passam a fazer parte da história de vida de seus portadores. Na sua maioria, manifestam sintomas periódicos ou contínuos, que repercutem em várias dimensões da vida de seus portadores.2

O significado da condição crônica é diferentemente percebido por grupos sociais distintos, determinado pelo "ângulo" pelo qual é interpretado, ou seja, por aqueles que a vivenciam ou por aqueles que desenvolvem o cuidado. Nesse entendimento, Kleinman3 explica as perspectivas para a representação da doença, na percepção de diferentes sujeitos, de acordo com a língua inglesa. Em relação à perspectiva do adoecido, denomina-se illness a experiência humana frente à condição de doença. Representa o modo como o indivíduo e os membros da família vivem e respondem aos sintomas e incapacidades e a forma com que suas vidas são modificadas pela repercussão advinda dessa condição. Já, a perspectiva do profissional, representada pelo termo disease, é percebida com base na visão biomédica, através das lentes teóricas e das formas práticas, pautadas na percepção da doença como alterações na estrutura biológica ou funcional de seus portadores.3

Nesse entendimento, a interpretação dos significados da doença (illness) por parte dos profissionais da equipe de saúde pode contribuir para o desenvolvimento de um cuidado mais humanizado e integral. Para tanto, o enfermeiro, como parte da equipe multidisciplinar, precisa conhecer a história da doença (illness) na voz de seus portadores, construída a partir da sua concepção sobre o processo saúde-doença-cuidado, suas experiências de adoecimento e práticas de cuidado, em situações concretas do seu mundo.

Nesse sentido, "a experiência da enfermidade é entendida como processo subjetivo, construído nos contextos socioculturais e vividos pelos atores".4:90 A doença crônica não pode ser reduzida aos sintomas físicos, de maneira padronizada, mas necessita do entendimento de que representa um processo subjetivo, segundo vivências de seus portadores, tipos de enfermidades e, ainda, mediado pela cultura dos mesmos.

Considerar a dimensão cultural do processo saúde-doença-cuidado é fundamental para que se tenha a abrangência suficiente para sua total compreensão. Isso porque existe uma intrincada relação entre as crenças, valores, costumes que são desenvolvidos no cotidiano pelas pessoas e a forma como elas se expressam nas situações de saúde e de doença.5

Assim, os fatores culturais apresentam-se intrínsecos à forma de agir das pessoas, suas percepções e atitudes frente às situações de saúde ou falta de saúde. No entanto, a dimensão cultural deve ser avaliada como componente de uma combinação complexa de influências, que se refletem na forma em que as pessoas vivem e reagem a tais situações.6 Assim, deve-se considerar que o processo saúde-doença-cuidado resulta das múltiplas determinações sociais entre os potenciais de fortalecimento e desgaste de um indivíduo, grupo ou sociedade. Por essa razão, as práticas de vida e cuidado dos indivíduos serão norteadas pela combinação desses elementos e, ainda, pelos fatores individuais, como as vivências, condição física e emocional, e pela motivação pessoal.

Portanto, o usuário deve ser ouvido no papel de sujeito de seu processo saúde-doença-cuidado e não de objeto de ações de saúde ditadas pelo conhecimento científico. Além disso, ao se reduzir o usuário ao papel de portador de determinada doença, no qual necessita da intervenção profissional de forma sistematizada e padronizada, isso o descaracteriza de suas percepções e crenças, construídas a partir da sua realidade sociocultural, criando um grande distanciamento entre esses dois modos de ver e exercer o cuidado. Assim, a percepção do profissional deve contemplar a noção do usuário como um ser complexo, dotado de diferentes dimensões, integradas entre si, e inserido em uma realidade complexa.7

Diante do exposto e tomando como ponto de partida a realidade sociocultural da comunidade pesquisada, o presente estudo objetivou compreender as concepções do processo saúde-doença-cuidado para indivíduos portadores de Hipertensão Arterial Sistêmica bem como o significado desta enfermidade (illness) em suas vidas.

MÉTODO

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, do tipo descritivo. Visualiza-se como adequada ao problema de pesquisa, pois representa a abordagem privilegiada para analisar a realidade dos sujeitos e compreender as diversas maneiras com que interpretam suas experiências de vida.

Participaram da pesquisa nove pessoas moradoras de uma comunidade assistida por uma Unidade de Saúde da Família (USF), em município do interior do Rio Grande do Sul. Como critérios de inclusão utilizaram-se: pessoas portadoras de HAS isolada (que não apresentassem agravos/danos ocasionados pela hipertensão – cardiopatias – ou outra doença crônica associada), maiores de 18 anos e em acompanhamento* com a equipe de saúde da família da USF.

Para a coleta de dados utilizaram-se a entrevista semiestruturada, observação e análise documental.8 O trabalho de campo foi desenvolvido entre os meses de fevereiro e agosto de 2009 e ocorreu em três cenários do campo de estudo. O primeiro foram as reuniões do Grupo de Hipertensos e Diabéticos da USF, onde, por meio da observação, selecionaram-se os possíveis sujeitos da pesquisa. Outro cenário foi a USF, no sentido de disponibilizar documentos para a confirmação dos critérios de inclusão dos sujeitos. E o terceiro cenário, os domicílios dos sujeitos, onde se realizaram-se as entrevistas semiestruturadas e a observação do cotidiano desses usuários e suas famílias.

A análise dos dados sustentou-se na análise temática, a qual está sistematizada em três etapas cronológicas,8 quais sejam: pré-análise, momento em que se realizaram as transcrições das entrevistas e organização do material empírico; exploração do material, em que foi efetivada a categorização do material empírico; e tratamento dos resultados obtidos e interpretação, que se constituiu da articulação entre o conteúdo empírico e o referencial teórico. Nas etapas de pré-analise e exploração do material, foi utilizado o software Atlas Ti 5.0 (Qualitative Research and Solutions), para auxiliar na codificação das entrevistas.

O projeto contou com a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da universidade à qual a pesquisa estava vinculada, conforme a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS-MS), de acordo com o Certificado de Apresentação para Apreciação (CAAE): 0306.0.243.000-08.

CONCEPÇÕES E SIGNIFICADO DE HIPERTENSÃO ARTERIAL E O PROCESSO SAÚDE-DOENÇA-CUIDADO

Para compreender o significado da HAS (illness) na vida dos sujeitos, devem-se investigar suas concepções e experiências sobre essa enfermidade, que traduzam a representação atribuída a essa doença pelos portadores, considerando-os parte de um determinado grupo sociocultural. Esse significado e a forma com que vivenciam a condição crônica em suas vidas são fortemente influenciados pelas suas concepções de saúde, falta de saúde e cuidado. Tendo em vista que tais constructos são produzidos socialmente pelos sujeitos, tendo forte ligação com sua cultura, procurou-se desvendar o conhecimento popular acerca do processo saúde-doença-cuidado, valendo-se de suas percepções e experiências individuais e coletivas. É importante ter em mente que esse saber, mesmo sendo construído em uma realidade sociocultural, apresenta-se heterogêneo entre os indivíduos pertencentes a esse grupo, repleto de interpretações simbólicas, como também de reinterpretações do saber científico.

A seguir são apresentadas as concepções do processo saúde-doença-cuidado evidenciadas pelos sujeitos da pesquisa, bem como significado desta enfermidade (illness) em suas vidas.

Concepções do processo saúde-doença-cuidado

Ao serem solicitados a relatar sobre os conceitos de saúde e falta de saúde, alguns participantes apresentaram uma concepção de saúde considerando, principalmente, os fatores físicos, centralizados na saúde do corpo, sem considerar os demais determinantes envolvidos nesse processo. Nessa perspectiva, associaram o conceito de saúde com a adesão ao tratamento e com o acesso aos serviços de saúde: saúde é não estar doente! [...] é ter a nossa saúde, a saúde no nosso físico e no nosso corpo. [...] a pessoa tem cuidar dela, ir ao médico e ir em busca. Porque nós que temos de ir atrás (S 01, 54 anos).

[...] saúde é estar com os exames em dia. Tomar os remédios em dia. Ir ao médico regularmente também [...] as pessoas que, por exemplo, são hipertensas e não tomam o remédio certo, quando dá uma dessas doenças do coração, isquemia, essas coisas, eu acho que um pouco é que não se cuidam. (S 4, 47 anos).

[...] para melhorar mais a saúde, tinha que ter um especialista, um psiquiatra, que pudesse atender o povo. [...] que pudessem fazer fisioterapia com pacientes em casa [...]. Tudo que o povo tem direito, tem que ter! [...] no momento que tiver tudo isso aí, vão ter menos doentes, amanhã ou depois (S3, 50 anos).

A saúde foi visualizada por alguns sujeitos desta pesquisa como um desfecho de ações de prevenção e reabilitação, representada pela ausência de doenças e sintomas físicos. Esse fato indica uma visão biologicista e medicalizada sobre o processo saúde-doença-cuidado, ao centralizá-lo como resultado de atos biomédicos e da adesão ao tratamento medicamentoso. Ficou evidente a importância e a responsabilização frente à condição de saúde, que parte da população deposita nessas ações, direcionando menor atenção aos demais determinantes socioambientais envolvidos nesse processo. Percebe-se que o acesso aos serviços de saúde e a adesão ao tratamento, mencionados pelos sujeitos como "cuidar-se", foram exemplificados como fatores determinantes para assegurar a saúde. A preocupação é que, nessa visão, o acesso aos serviços de saúde seja suficiente ou superior aos demais fatores envolvidos no processo saúde-doença.

A compreensão de acesso foi apresentada por esses sujeitos como garantia de atendimento e tratamento adequados e de qualidade, de forma equânime para toda a população. Entende-se que essa argumentação vem ao encontro de uma visão de saúde mais ampliada, pois elucida uma concepção de "saúde como direito de todos", o que se aproxima do preconizado pela legislação vigente.9 No entanto, ao esperar como produto final a ausência ou melhora de doenças, reitera a visão medicalizada sobre o processo saúde-doença-cuidado.

Somando-se a isso, observou-se uma entonação de responsabilização imputada ao indivíduo pela sua condição de saúde, pois, em alguns relatos, a saúde é apresentada como um resultado de cuidar-se ou não. A concepção de cuidado, nessa perspectiva, centraliza-se nas práticas de vida das pessoas, como fruto de escolhas individuais. Com isso, apresentaram um posicionamento de responsabilização do indivíduo, pela sua condição de saúde e doença. Entende-se que esse fato pode ser justificado pela influência que a mídia, e mesmo os serviços de saúde apresentam sobre essa concepção, pois se sabe que, muitas vezes, a noção de saúde veiculada nesses meios atribui às pessoas a responsabilidade pela manutenção da mesma,10 por meio de práticas de vida mais saudáveis.

Outra visão sobre o processo saúde-doença-cuidado observado nas falas dos sujeitos destaca a relação deste com o trabalho. Verificou-se, nos relatos, uma variação acerca da influência que o trabalho teria nesse processo. No entanto, predominou nas argumentações a associação com as funções laborais que envolviam, principalmente, as atividades físicas. As falas selecionadas expõem essa reflexão: eu sempre trabalhei. Eu costurava muito [...] trabalhei muito para fora. Nós éramos plantadores. Eu fui muito do serviço! Por isso que hoje eu não posso nem plantar um pé de folhagem [...] e já não costuro mais, por causa da coluna. Horrível da coluna! (S6, 78 anos).

[...] acho que não devia nunca ter parado de trabalhar em obra, porque dali que começou a complicar! [...] que eu podia seguir trabalhando, porque eu me aposentei foi por idade, não foi por deficiente de nada. Então, nunca me faltou vontade de trabalhar! Eu sempre estou lutando com uma coisa e outra! E não pode é parar mesmo! (S2, 80 anos).

O trabalho foi apontado por alguns participantes como agente causador de doenças, principalmente pela exigência de esforços físicos para o desempenho das funções. Logo, a doença seria uma repercussão física relacionada ao excesso de trabalho. Assim, a instalação de doenças, principalmente a hipertensão, foi frequentemente associada às atividades laborais, quando essas atividades eram consideradas "pesadas".11

Já, para alguns informantes, o trabalho agiria como fator de proteção à saúde, o que pode ser interpretado pelo fato de manter-se e sentir-se ativo fisicamente e em movimento, logo, conferindo saúde às pessoas. Nesse aspecto, o trabalho é um valor fundamental para os sujeitos, pois o avaliam como uma fonte de renovação e saúde em suas vidas. Além disso, para os sujeitos investigados, "trabalha-se para ter saúde, mas também fica-se doente de trabalhar".12:46

Observou-se também a argumentação sobre a capacidade para trabalhar representando uma evidência da condição de saúde, pois uma pessoa que apresenta disposição e energia para executar as atividades laborais não poderia ser ou estar doente. Nesse aspecto, essa argumentação se aproxima dos achados de outra pesquisa,13 cujos sujeitos definiram-se como saudáveis, pela capacidade de exercerem determinadas atividades, como cuidar da casa e trabalhar.

Outra visão observada entre os participantes refere-se a uma concepção ampliada sobre o processo saúde-doença-cuidado. Nessa perspectiva, a saúde foi articulada com questões subjetivas, como sentimentos de bem-estar e fé e, também, como o equilíbrio entre fatores objetivos e subjetivos. Predominou, nas argumentações, a concepção de saúde associada a sentimentos positivos, como sentir-se bem, ter ânimo e disposição na vida, tais como nos relatos a seguir: ter saúde é a gente viver bem, se sentir bem! [...] a pessoa que tem saúde, ela tem ânimo, disposição! [...] e a pessoa que está doente, está até amargurada, frustrada, não tem vontade de nada, nem de conversa com as pessoas (S9, 68 anos).

[...] eu acho que a saúde é fundamental! [...] a pessoa tendo saúde, vai para frente em todos os sentidos da vida! E se não tem saúde a pessoa não tem equilíbrio, não consegue ir para frente! (S7, 48 anos).

[...] eu acho que eu tenho saúde. Eu gosto da minha vida, da minha felicidade! Eu ajudo os outros, sou muito boa de coração. [...] eu me sinto, graças a Deus, bem e feliz! [...] as pessoas até dizem: A senhora sempre está de bom humor!. Então saúde é pensar positivo e realista. Não pensar em coisas que não têm proveito. [...] então a pessoa tem que ter ânimo e pensar naquilo que é o certo! (S 08, 65 anos)

A saúde foi percebida por grande parte dos sujeitos desta pesquisa como algo primordial, essencial à vida do ser humano. Complementaram com a visão de saúde como totalidade e plenitude na vida das pessoas, pois, ao alcançá-la, o indivíduo não precisaria de mais nada. Nessa perspectiva, a saúde se apresenta como um "instrumento necessário para que os demais aspectos da vida possam acontecer".10:248 Assim, a saúde representaria um elemento propulsor em todos os aspectos da vida dos sujeitos.

Os mesmos participantes destacaram como relevantes os fatores emocionais, no sentido de nutrir bons sentimentos – otimismo, alegria e felicidade, como condicionantes à saúde plena. Assim, apontaram como estratégia importante focalizar os pensamentos em aspectos positivos da vida, o que se entende por representar uma forma de cuidado à saúde.

De maneira oposta, a falta de saúde (ou a doença) foi percebida pelos participantes como falta de ânimo, ou seja, como um fator limitante na vida das pessoas. Nesse sentido, a doença foi associada a sentimentos negativos, cuja repercussão estaria tanto no âmbito individual, como nas relações com as outras pessoas. As representações de doença e de saúde são semelhantes na medida em que ambas são ilustradas em sentimentos e emoções.14 Isso representa dizer que esses constructos apresentam semelhanças na forma como são percebidos e explicados pelos sujeitos, mas com repercussões opostas em suas vidas. Assim, se ter saúde é estar bem e alegre, em contrapartida a doença estaria relacionada a sentimentos como mágoa e tristeza.

Outro aspecto observado, na fala desses sujeitos, foi a relação entre a concepção de saúde e a disposição de vida, no sentido de assumir um posicionamento de estímulo frente à realização de atividades, como o trabalho, lazer e o próprio gosto de se relacionar com as pessoas: é uma pessoa alegre, é uma pessoa que tem vontade até de se comunicar com os outros. Gosta de sair, passear, até fazer compras. É tudo isso! [...] que eu gosto de trabalhar, de cozinhar, de caminhar... e quando eu caminho bastante, eu sei que eu estou bem. Me sinto bem! Fisicamente. Tudo! Me sinto até mais leve, bem melhor! [...] isso é ter saúde (S9, 68 anos).

[...] [saúde] é ter equilíbrio, para ter disposição para conversar, passear, trabalhar, para tudo! Aí tu tens saúde! (S7, 48 anos).

Nesse entendimento, a saúde estaria vinculada à concepção de movimento, associada à possibilidade de desenvolvimento de práticas cotidianas, permeada pela sensação de bem-estar. Nessa concepção, a saúde estaria articulada tanto à percepção de possibilidade física para dar conta de tais atividades, quanto à disposição dos sujeitos para fazê-las.14

Ainda numa perspectiva ampliada sobre o processo saúde-doença-cuidado, outros participantes conceituaram a saúde como um equilíbrio entre fatores objetivos, como emprego, renda, condições de vida, de forma articulada com os subjetivos, como sentimentos de paz e sossego, numa relação de condicionalidade: [...] a vida da gente é a coisa mais importante para própria vida da gente! Tu estando bem espiritualmente, em paz com a tua família, de bem com a tua vida [...]. Não adianta tu ter emprego e não ter saúde. Não adianta também tu teres dinheiro no bolso e não ter paz, sossego. Saúde é estar trabalhando, com o teu dinheiro, estar de bem com teu companheiro, com teu filho, estar de bem com Deus! [...] tem que ter autoestima! Tem que se gostar! [...] então, uma coisa traz a outra. A gente precisa de tudo! (S7, 48 anos).

Entende-se que a visão de saúde desses sujeitos aproxima-se da concepção proposta pela Promoção da Saúde, a qual pauta-se numa perspectiva positiva e ampliada, envolvendo recursos pessoais, sociais e capacidades físicas, que vai para além de um estilo de vida saudável, na direção de um bem-estar global.15 Assim, integraram elementos da subjetividade com a organização sociocultural, ao processo saúde-doença-cuidado.

Essa explanação suscita uma compreensão de saúde numa perspectiva de integralidade, baseada em percepções subjetivas e ampliadas. Os entrevistados sugerem uma representação de saúde como algo positivo, centrada na concepção de bem-estar e viver bem. Para tanto, sinalizaram com estratégias de saúde, priorizar a própria vida, sustentando sentimentos como paz espiritual, harmonia, autonomia, autoestima e amor próprio. Nessa perspectiva subjetiva, a saúde é representada pelo bem-estar como um sentido de um estado de harmonia consigo, o qual se articula, ainda, com sentimentos de paz espiritual e autoestima.16

Significado (illness) da HAS frente ao processo saúde-doença-cuidado

Partindo-se do entendimento que faziam sobre o processo saúde-doença-cuidado, foi solicitado que os participantes fizessem uma reflexão sobre o significado da HAS em suas vidas. Foi unânime nos relatos dos participantes desta pesquisa, a concepção de que a hipertensão não se configura uma condição de doença: eu comecei com um ardume aqui assim [região torácica], e fui consultar, e aí já complicou a pressão, e aí já comecei e fiquei me tratando, me cuidando. Minha pressão é normal agora. Já faz anos que normalizou. Tomo os remédios, bem certinho [...]. Mas, no mais, não sou doente, tirando a coluna que eu sofro, eu tenho muita saúde, graças a Deus! (S6, 78 anos).

[...] que a minha doença maior é a bronquite! A pressão, graças a Deus, está controlando direitinho. Eu faço os medicamentos direito e tudo certinho. [...] eu me sinto bem (S 3, 50 anos).

[...] eu posso dizer que eu tenho saúde, porque eu não sou uma pessoa doente, que tenha problemas. [...] porque a minha pressão é sempre boa. Eu me sinto bem! (S 1, 54 anos).

Entende-se que a hipertensão, mesmo sendo uma condição crônica, não representou para os participantes desta pesquisa uma doença. Observa-se que, pelo fato de não apresentar sintomas físicos, não restringe nenhuma atividade, logo, a HAS não foi considerada uma condição de falta de saúde.

Entende-se que, para o grupo investigado, pelo fato de a HAS não apresentar sinal de sofrimento ou incapacidade, eles não se consideravam como pessoas doentes. Pelo contrário, avaliavam-se como pessoas saudáveis, principalmente pela estabilidade de seus níveis pressóricos, garantida pela adesão ao tratamento, tanto pelo uso da medicação de forma contínua e correta, quanto pela execução dos demais cuidados: me tratando e me cuidando. Nesse aspecto, sabe-se que o primeiro tipo de significado de doença (illness) é o sintoma atribuído àquela determinada enfermidade, como se representasse um sinal convencional de incapacidade ou angústia decorrente e esperado da condição de doente.3 Justificando a visão da HAS como condição de não doença, os entrevistados destacam outros agravos, como no exemplo do problema de coluna e da bronquite, por apresentarem sintomas e limitações, representando elementos que ameaçam sua posição de pessoas saudáveis.

Corroborando a percepção da HAS como condição de não doença na vida de seus portadores, alguns participantes associaram esse posicionamento com o longo período de tempo em que vivenciam essa condição crônica, como pode ser constatado na fala a seguir: desde a primeira gravidez, há 29 anos, que eu fiquei sabendo que eu era hipertensa. [...] e, de lá para cá, sempre tomando remédio. [...] exames, faz tempo que não faço. Eu sou muito relaxada nessa parte assim, sou mesmo! Ah, relaxamento mesmo. Não tem outra coisa para dizer. Eu tomo os meus remédios. Mais assim, fazendo tratamento e vai indo, como Deus quer! E a minha pressão é meio alta mesmo [...]. E eu nem me preocupo com isso! Eu sou acostumada! Já aprendi a conviver com ela, entende? (S7, 48 anos).

Eu comecei a me tratar há 35 anos atrás, no antigo INANPS [...] e dali sigo sempre, me tratando e me cuidando [...] faz tantos anos que eu me trato e agora, depois com os anos e com os tratamentos, já sei lidar com a pressão (S 6, 78 anos).

O fato de a HAS acompanhar durante longo período a vida desses sujeitos, sem apresentar repercussões em seu estado de saúde ou doença, configura-se numa situação que os liberta de maiores cuidados e/ou preocupações, justificado pelo fato de terem aprendido a conviver com ela. As doenças crônicas exigem que seus portadores aprendam a viver "com e apesar da doença", uma vez que ela os acompanha a todos os lugares, durante um longo período.2:20

Dessa forma, com o passar do tempo, o convívio com a hipertensão vai sendo incorporado ao cotidiano dos portadores, principalmente quando ainda não ocorreram eventos ou impedimentos graves.11 Visualiza-se que o curso da doença (illness) está tão próximo à história de vida de seus portadores, que fica inseparável relatarem uma, sem mencionarem a outra. Além disso, a ausência de sintomas físicos que denotem a presença da HAS na vida desses sujeitos acaba sendo um fator que contribuiu para esse convívio, pois não representa uma condição que exija maiores preocupações.

Outros participantes, ao refletirem sobre a condição de portadores de HAS, apontaram diretamente as causas que acreditavam terem sido responsáveis para o desenvolvimento da hipertensão nas suas vidas. Assim, destacaram principalmente as práticas de vida e, ainda, a relação com os outros, como fatores que influenciam no processo de adoecimento, tal como observado nos relatos: eu fiquei hipertensa, eu vou te explicar o porquê: eu fumei 36 anos na minha vida e bebi. [...] e eu fiquei hipertensa por causa da bebida e do cigarro. E eu boto a culpa nisso sim! (S3, 50 anos).

[...] eu já passei por muita complicação, que o pai do meu guri bebia e brigava com todo mundo. Eu acho que, de tanto nervosismo, foi, foi, que eu fiquei hipertensa (S4, 47 anos).

Observa-se nessas argumentações a influência do cotidiano dos sujeitos na causalidade da doença crônica, tanto em relação aos fatores individuais, como aos externos. Nesse sentido, confirmam a premissa de que o processo de adoecimento é construído socialmente, de forma que os elementos predisponentes, os individuais assim como os elementos externos, exemplificados nessa situação, respectivamente, como a decisão de fumar e a relações interpessoais, oscilam em relação à sua influência nesse processo.2

A visão das práticas de vida como determinantes individuais para o processo de adoecimento elucida um posicionamento de culpabilização dos participantes, ao responsabilizarem-se pelo desenvolvimento da HAS, atribuído às escolhas não saudáveis. Admite-se que o significado da HAS (illness), para esses sujeitos, está fortemente influenciado pela construção coletiva dessa condição, uma vez que é o próprio contexto sociocultural que os rotula como responsáveis por sua doença, devido às suas escolhas não saudáveis de vida.

Já os elementos externos, exemplificados nas falas por conflitos de relação entre os membros da família, foram associados por alguns participantes como predisponentes para o desenvolvimento da hipertensão. Nesse aspecto, o desenvolvimento da HAS é também percebido pelos sujeitos como uma repercussão de sofrimentos e infortúnios vivenciados ao longo da suas vidas, que não tiveram como evitar.11 Ainda nessa lógica, as emoções são constructos socioculturais que devem ser considerados na experiência do adoecimento, de modo que representam campos comunicativos que unem o indivíduo aos espaços macro e microssocial.4

Entende-se que os eventos externos, representados, nesse caso, pelos conflitos familiares, atuam como desencadeantes de fatores internos, mencionados pelas emoções decorrentes desses conflitos, como explicação para que se instalasse a hipertensão, na perspectiva dos sujeitos desta pesquisa.

Outro significado da HAS observado no relato de alguns participantes refere-se à necessidade de um tratamento contínuo. Assim, após o diagnóstico de portadores de hipertensão, passou a fazer parte do cotidiano desses sujeitos um plano de cuidados, que inclui o uso diário de medicações e adaptações nas suas práticas de vida. Esse fato pode ser evidenciado na fala a seguir: comecei a controlar [a pressão] com remédio. Porque tomar remédio ninguém gosta. Mas tenho que tomar! E só agora que eu vim tomar. Eu nunca fui doente! [...] eu tenho saúde! Basta eu querer me cuidar e controlar isso! Fazendo na alimentação e fazendo caminhada, que isso é bom! Então eu acho que sou uma pessoa sadia (S9, 68 anos).

Evidencia-se que a carga atribuída ao significado da HAS (illness), como uma doença crônica na vida desses sujeitos, é minimizada pelo cumprimento do plano de cuidados necessários. Dessa forma, mesmo gerando certo desconforto, o uso diário das medicações, assim como os demais cuidados pertinentes à HAS diminuem a representatividade desse agravo, cuja característica mais preocupante, para esses sujeitos, é sua incapacidade de cura.

Nesse aspecto, a maioria das doenças crônicas demanda a "reaprendizagem corporal", a qual envolve medidas de prevenção e proteção do corpo e a adesão de regimes e tecnologias médicas. E essas ações poderão repercutir na própria identidade do indivíduo.2:27

Assim, entende-se que o significado da HAS (illness) está intimamente associado com a percepção do portador sobre sua identidade de pessoa doente ou saudável. Mesmo não se considerando doente, fato que o isentaria do uso de medicações, essa prática faz-se necessária para o controle eficaz da pressão. Além de afastar-lhe o rótulo de pessoa doente, mesmo sendo portador de um agravo crônico, essa ação permite que se considere saudável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao refletir sobre a experiência desta investigação, percebe-se que, para alcançar o conhecimento sobre o significado que a HAS apresenta na vida dessas pessoas, se fez necessário imergir na "história de vida com hipertensão" de cada sujeito desta pesquisa. Ao enfocar a vida, e consequentemente a experiência da cronicidade dessas pessoas, procurou-se compreender as perspectivas individuais como parte de suas histórias, os eventos que as compõem e o contexto sociocultural onde ocorreram. Destacam-se, nos relatos desses sujeitos, a subjetividade e singularidade de cada história, uma vez que foram capturados em suas memórias os elementos que dão sentido ao significado (illness) da cronicidade na vida de cada um.

A entrevista realizada no ambiente domiciliar representou uma ferramenta privilegiada para alcançar a abrangência necessária para compreender as condições de vida e a dinâmica cotidiana dessas pessoas. Além disso, proporcionou um momento de reflexão, permitindo que eles reavaliassem esses elementos e, dessa forma, reelaborassem suas concepções acerca desse significado e de como administram suas vidas frente à cronicidade. Percebe-se que essa reflexão foi permeada pela forma como percebiam e vivenciavam o processo saúde-doença-cuidado, pautada nas suas experiências de vida e no contexto sociocultural a que pertencem.

Ainda sobre o significado (illness) da HAS, ficou evidente sua relação com as percepções dos portadores sobre suas identidades de pessoas doentes ou saudáveis. Nesse contexto, foi unânime nos relatos a concepção de que a hipertensão, mesmo sendo um agravo crônico, não representa uma condição de doença. Atribui-se essa avaliação dos entrevistados ao fato dessa enfermidade não apresentar sintomas físicos, somado à estabilidade de seus níveis pressóricos, pelo uso correto de medicações. Por essas razões, esses sujeitos definem-se como pessoas saudáveis.

Outro elemento intrínseco a essa análise refere-se ao fato de a HAS acompanhar durante longo tempo a vida de seus portadores. Muitas vezes, a história da hipertensão se confunde com a própria história de vida do indivíduo. Nesse sentido, constata-se que esses sujeitos aprenderam a viver com a HAS e não apesar dela.

Os achados desta pesquisa revelam elementos que devem ser considerados pelas equipes de saúde, em especial pelo enfermeiro, para que o planejamento das práticas de saúde resulte em ações integrais e resolutivas. Para tanto, sinaliza-se que as práticas de cuidado precisam estar aproximadas com a realidade vivenciada pelos sujeitos e exercidas na perspectiva da complexidade do ser humano cuidado.

Ademais, não se teve a pretensão, com esta investigação, de esgotar a temática em estudo, sendo considerada importante a percepção de novos olhares sobre ela. Assim, emerge a necessidade de novas investigações que possibilitem a análise sobre a influência existente entre o significado (illness) da cronicidade, no modo de viver das pessoas, principalmente, na forma como são direcionadas suas práticas de cuidado, na interface com o processo saúde-doença.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Abr 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 2013

    Histórico

    • Recebido
      02 Jun 2011
    • Aceito
      10 Jul 2012
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