Acessibilidade / Reportar erro

Metamorfoses de uma universidade: Os estudantes da USP entre 2000 e 2020

Metamorphoses of a university: USP students between 2000 and 2020

Resumo

Com o final do regime autoritário e a expansão do ensino fundamental e médio nos anos 1990, cresceram as demandas por maior acesso ao ensino superior e por maior abertura das universidades públicas aos grupos historicamente menos representados. O artigo explora a forma como a USP respondeu a essas demandas, discutindo a expansão de vagas, a adoção de ações afirmativas e de políticas de permanência. Em seguida, examinamos as mudanças na composição do corpo estudantil. Ao descrever essas transformações, nossa análise documenta os ganhos, as contradições e as assimetrias do processo recente de democratização dessa universidade.

Palavras-chave
Desigualdades educacionais; Ensino superior público; Democratização do ensino superior; Ações afirmativas; Universidade de São Paulo

Abstract

Following the end of the authoritarian regime and the increase in elementary and secondary education in the 1990s, there was a rise in demands for broader access to higher education and for public universities to become more inclusive to historically underrepresented groups. This article explores how USP responded to them by discussing the expansion of recruitment and the adoption of affirmative actions and retention policies. Furthermore, we examine the changes in the composition of the student body. Our analysis highlights the gains, contradictions, and asymmetries that have emerged during this university’s recent democratization process.

Keywords
Educational inequalities; Public higher education; Democratization of higher education; Affirmative actions; University of São Paulo

A primeira vez que ouvi falar em mérito, essa palavra, o que ela significa, foi dentro da USP, ali perto do Crusp, por um professor aleatório, que me disse “você tem mérito, você passou no vestibular”.

Egresso dos anos 1990, homem, branco, primeiro da família no ensino superior

Introdução

O retorno à democracia teve efeitos importantes sobre as universidades públicas1. Reivindicações por expansão de vagas, recorrentes pelo menos desde os anos 1960, ressurgiram nos anos 1990, acompanhadas por intensa pressão social para a ampliação do ingresso de grupos historicamente menos representados. Essas demandas foram impulsionadas pelo aumento do número de matrículas no ensino médio entre os jovens de quinze a dezessete anos (Castro, 2009CASTRO, Jorge A. de (2009), "Evolução e desigualdade na educação brasileira". Educação & Sociedade, 30 (108): 673-697. https://doi.org/10.1590/S0101-73302009000300003.
https://doi.org/10.1590/S0101-7330200900...
), gerando maiores expectativas de acesso ao nível mais alto de escolarização e às recompensas materiais e simbólicas a elas associadas. Trata-se de uma dinâmica especialmente significativa no caso do Brasil, onde os diplomas de ensino superior são especialmente eficazes para proteger contra o desemprego e para dar entrada às ocupações melhor remuneradas (Reis, 2023REIS, Maurício Cortez. (2023), Trabalhadores com ensino superior: área de formação, ocupação e diferencial de rendimentos em relação aos trabalhadores com Ensino médio. Ipea: Texto para Discussão 2861. http://dx.doi.org/10.38116/td2861.
http://dx.doi.org/10.38116/td2861...
; Lima e Abdal, 2007LIMA, Márcia & ABDAL, Alexandre. (2007), "Educação e trabalho: a inserção dos ocupados de nível superior no mercado formal". Sociologias, 17: 216-238.; Inep, 2023INEP. (2023), "Censo da Educação Superior 2022: divulgação dos resultados". Inep, https://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2022/apresentacao_censo_da_educacao_superior_2022.pdf, consultado em 02/02/2024.
https://download.inep.gov.br/educacao_su...
, p. 142).

Resultado de iniciativas que levaram à profissionalização da carreira docente, com proteção de salários e benefícios sociais, além de forte investimento na pesquisa, a posição dominante das universidades públicas (Schwartzman e Balbachevsky, 2014SCHWARTZMAN, Simon & BALBACHEVSKY, Elizabeth. (2014), "Research and teaching in a diverse institutional environment: converging values and diverging practices in Brazil". In: AARREVAARA, Timo & FINKELSTEIN, Martin. Teaching and research in contemporary higher education. Dordrecht, Springer, pp. 221-235.) decorreu também de estratégias de fechamento social que se revelaram bastante efetivas para reservar os cursos que dão acesso a essas posições mais valorizadas para os estudantes oriundos dos grupos sociais mais privilegiados (Almeida, 2015ALMEIDA, Ana Maria F. (2015), The changing strategies of social closure in elite education in Brazil. In: VAN ZANTEN, Agnès; BALL, Stephen J. & DARCHY-KOECHLIN, Brigitte. Elites, Privilege, and excellence: The national and global redefinition of educational advantage, Londres, Routledge.). Entre elas, destaca-se a visão dominante de mérito acadêmico que orientou por longo tempo o recrutamento de estudantes para a graduação (Almeida, 2004ALMEIDA, Ana Maria F. (2004), "Língua nacional, competência escolar e posição social". In: ALMEIDA, Ana Maria F.; CANÊDO, Letícia Bicalho; GARCIA, Afrânio Raul & BITTENCOURT, Agueda Bernardete (orgs.). Circulação internacional e formação internacional das elites. Campinas, Editora da Unicamp, pp. 29-46. e 2007; Feres Jr., 2017; Barbosa e Pires, 2021). Apoiada na confiança exclusiva nas provas do vestibular para avaliar o preparo para o ensino superior, essa visão legitimava a profunda segmentação social da escola básica brasileira, consumando a desigualdade de oportunidades educacionais que não permite aos grupos menos privilegiados se apropriarem dos recursos necessários para uma escolarização de longa duração, principalmente a que leva aos diplomas mais valorizados. Somavam-se a isso a ausência de apoio pedagógico aos estudantes que ingressaram na universidade com menos preparo, em geral oriundos de famílias menos escolarizadas e com menor renda, e a oferta desses cursos mais valorizados em horário integral, com reduzido auxílio financeiro àqueles estudantes que não tinham como se manter durante o ensino superior sem trabalhar.

Em conjunto, essas medidas levaram a uma forte segregação de base econômica e racial no ensino superior, que se fazia sentir já na composição do grupo de estudantes que se dispõe a pleitear a admissão a essas universidades. Em 1999, quando a rede pública do estado de São Paulo era responsável por 84,1% do total de matrículas no ensino médio (Corti, 2016CORTI, Ana Paula. (2016), Ensino Médio em São Paulo: a expansão das matrículas nos anos 1990. Educação & Realidade, 41(1): 41-68. https://doi.org/10.1590/2175-623655996
https://doi.org/10.1590/2175-623655996...
, p. 48), apenas 32,3% dos estudantes se inscreviam para o vestibular da USP (USP, 2000). Esses dados documentam o processo de autoexclusão que resulta, pelo menos em parte, das barreiras mencionadas acima e que levou as universidades públicas a se firmarem como redutos dos estudantes oriundos das camadas médias e privilegiadas, predominantemente formados no ensino médio privado, brancos (Carvalhaes e Costa Ribeiro, 2018CARVALHAES, Flávio & COSTA RIBEIRO, Carlos A. (2018), "Estratificação horizontal da educação superior no Brasil: desigualdades de classe, gênero e raça em um contexto de expansão educacional". Tempo Social, 31 (1): 195-233.; Prates, Silva e Paula, 2012; Carvalho, 2007CARVALHO, José Jorge. (2007), "O confinamento racial do mundo acadêmico brasileiro". Padê: Estudos em Filosofia, 1 (1).). No caso da USP, havia também uma sobrerrepresentação de estudantes autodeclarados amarelos em relação à população total de São Paulo.

Quando logravam superar essas barreiras e ingressar nas universidades públicas, os estudantes oriundos de camadas menos privilegiadas se viam relegados a cursos menos prestigiados socialmente, em geral noturnos (Sampaio, Limongi e Torres, 2000; Setton, 1999SETTON, M. da G. (1999), "A divisão interna do campo universitário: uma tentativa de classificação". Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 80 (196). https://doi.org/10.24109/2176-6681.rbep.80i196.985.
https://doi.org/10.24109/2176-6681.rbep....
). Os outros se viram empurrados para o ensino superior privado, composto, pela maior parte, por instituições orientadas para o ensino, mas sem uma missão acadêmica forte e, a partir do final dos anos 1990, devido a uma importante mudança legal, cada vez mais apoiadas por mantenedoras de natureza comercial, isto é, orientadas para o lucro (Sampaio, 2014SAMPAIO, Helena. (2014), "Diversidade e diferenciação no ensino superior no Brasil: conceitos para discussão". Revista Brasileira de Ciências Sociais, 29 (84): 43-55.).

Esse contexto, marcado por forte valorização social do ensino superior e de denúncia pública das desigualdades de oportunidades em todos os níveis educacionais, impulsionou uma importante expansão da matrícula, muito acima da taxa de crescimento da população brasileira, que foi de pouco menos de 20% entre 2000 e 2022. Entre 2001 e 2010, as matrículas na educação superior passaram de pouco mais de 3.036.113 para 6.379.299, num aumento de mais de 50%, atingindo quase 10 milhões em 2022 (Inep, 2023INEP. (2023), "Censo da Educação Superior 2022: divulgação dos resultados". Inep, https://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2022/apresentacao_censo_da_educacao_superior_2022.pdf, consultado em 02/02/2024.
https://download.inep.gov.br/educacao_su...
). No ensino superior público, por sua vez, as matrículas passaram de 939.225 para 1.461.696 entre 2001 e 2010, chegando a 2.076.517 em 2022. Ao longo do período, o quadro se complexificou com o aumento do número de vagas em cursos de graduação a distância, modalidade mais procurada por jovens trabalhadores e, sobretudo, por trabalhadoras (Perosa e Soares, 2021PEROSA, Graziela & SOARES, Alessandro S. (2021), "Educación superior privada: las paradojas de la expansión educativa brasileña". Propuesta Educativa, (55): 15-33.). Entre 2010 e 2022, as matrículas nessa modalidade cresceram mais de 300%, chegando a 4.330.934, estando prestes a ultrapassar o número de matrículas na modalidade presencial, que estava em 5.657.908 (Inep, 2022).

O mesmo contexto impulsionou também experimentos com ações afirmativas, que se multiplicaram pelas universidades públicas, na maioria dos casos por iniciativa de suas próprias instâncias decisórias. Em 2011, um ano antes da promulgação da chamada Lei de Cotas, mais de 70% das universidades públicas as adotavam (Feres Jr., Daflon e Campos, 2011). Progressivamente, essas iniciativas provocaram alterações significativas nas características sociais dos estudantes de graduação dessas universidades (Perosa e Costa, 2015PEROSA, Graziela & COSTA, Taline L. (2015), "Uma democratização relativa? Um estudo sobre o caso da expansão da Unifesp". Educação & Sociedade, 36 (130): 117-137. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302015140518.
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020151...
; Almeida e Ernica, 2015ALMEIDA, Ana Maria F. & ERNICA, Maurício. (2015), "Inclusão e segmentação social no Ensino Superior público no Estado de São Paulo (1990-2012)". Educação & Sociedade, 36 (130): 63-83. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302015139672.
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020151...
; Aguiar e Piotto, 2018AGUIAR, Márcio M. & PIOTTO, Débora C. (2018), "Desigualdade à brasileira: capital étnico-racial no acesso ao ensino superior". Educação, 41 (3): 478-491. https://doi.org/10.15448/1981-2582.2018.3.24897.
https://doi.org/10.15448/1981-2582.2018....
; Senkevics e Mello, 2019SENKEVICS, Adriano S. & MELLO, Ursula M. (2019), "O perfil discente das universidades federais mudou pós-Lei de Cotas?". Cadernos de Pesquisa, 49 (172), 184-208. https://doi.org/10.1590/198053145980.
https://doi.org/10.1590/198053145980...
).

A Universidade de São Paulo não passou incólume por essas transformações. Maior universidade pública brasileira, a USP contava, em 2000, com mais de 60 mil estudantes distribuídos entre graduação e pós-graduação e já formava o maior número de doutores por ano entre as universidades brasileiras, 1.549. Eram mais de 4.500 docentes, dos quais mais de 90% com doutorado e em torno de 77% em contratos em tempo integral e dedicação exclusiva (USP, 2001). Ela já era reconhecida em diversas avaliações pela qualidade da formação oferecida, e era responsável por parte importante da produção científica do país. Além disso, mantinha museus, editora e outras iniciativas de difusão cultural, bem como uma ampla rede de prestação de serviços em saúde na maioria dos seus campi.

A posição dominante da USP foi resultado de um investimento de longo prazo (Schwartzman, 2006SCHWARTZMAN, Simon. (2006), "A universidade primeira do Brasil: entre intelligentsia, padrão internacional e inclusão social". Estudos Avançados, 20 (56): 161-189. https://www.revistas.usp.br/eav/article/view/10128.
https://www.revistas.usp.br/eav/article/...
). Para que esse modelo possa funcionar, exige-se um relativo pequeno número de estudantes por professor (8,9 em 1993; 13,2 em 2000) e um forte investimento em infraestrutura para ensino e pesquisa, como prédios, laboratórios, bibliotecas, entre outros (USP, 1987, 2001). Tudo isso alimenta uma visão um tanto elitista da sua missão, apoiada pela visão de mérito mencionada acima, que pensa essa universidade quase nos mesmos termos que justificaram sua criação em 1934, voltada para “a formação das classes dirigentes” mediante a “organização de um aparelho cultural e universitário, que ofereça oportunidade a todos e processe a seleção dos mais capazes” (São Paulo, 1934SÃO PAULO. (1934), Decreto n. 6.283 de 25 de janeiro 1934. Cria a Universidade de São Paulo e dá outras providências. https://www.leginf.usp.br/antigo/criacao/decreto6283.htm.
https://www.leginf.usp.br/antigo/criacao...
). Não obstante, já na sua origem, o caráter híbrido da universidade se impunha, se não como projeto, certamente como necessidade, com a implementação de cursos de formação de professores que iriam atrair boa parte dos estudantes oriundos de famílias menos privilegiadas (Bontempi Jr., 2011).

Pouco mais de vinte anos depois, este texto examina retrospectivamente a forma como a USP respondeu às demandas por mais vagas e maior abertura aos grupos historicamente menos representados, identificando as medidas implementadas e os resultados alcançados em termos da diversificação do corpo estudantil. Mostramos que noções de desigualdade educacional e justiça social passaram progressivamente a ser importantes geradoras de políticas nessa universidade, ecoando o que se passava à época no debate brasileiro em torno da educação (Almeida, 2008ALMEIDA, Ana Maria F. (2008), "O assalto à educação pelos economistas". Tempo Social, 20 (1): 163-178. https://doi.org/10.1590/S0103-20702008000100008.
https://doi.org/10.1590/S0103-2070200800...
). As respostas se manifestaram em três dimensões: expansão de vagas, implementação de ações afirmativas e intensificação do apoio à permanência estudantil, que examinamos na próxima seção. Como resultado, indicamos, na terceira seção, que a composição social do corpo discente se modificou significativamente, acompanhando de perto as transformações no recrutamento, e analisamos a maior ou menor permeabilidade de cursos e unidades a estudantes historicamente menos representados frente a essas mudanças. Na conclusão, apontamos alguns limites desse processo e os desafios que permanecem.

Expansão de vagas, ações afirmativas, políticas de permanência

Expansão de vagas e ações afirmativas foram as principais respostas à demanda por maior acesso ao ensino superior público. Embora não tenham sido objeto de ações coordenadas, essas duas medidas se difundiram rapidamente por todo o espaço do ensino superior ao longo dos anos 2000. Por sua vez, a admissão de maior número de estudantes oriundos de grupos historicamente pouco representados exigiu adaptações e, em especial, levou a investimento nos serviços de apoio aos estudantes.

Expansão de matrículas

Expansão de matrículas exige recursos significativos. Não é surpresa, portanto, que parte importante da ampliação que ocorreu no setor privado e nas universidades federais tenha sido impulsionada por estímulo do governo federal, que ofereceu subvenções, criou novas universidades e disponibilizou incentivos para a ampliação de vagas nas existentes. O caso das três universidades estaduais paulistas é um pouco diferente. Como gozam de autonomia orçamentária e de gestão, as decisões de expansão de vagas ficam sob o controle dos órgãos colegiados internos, que implementaram diferentes medidas para isso. No início dos anos 2000, pressionadas pelo forte debate sobre a missão das universidades públicas e pelas iniciativas do governo federal, elas aderiram à tendência geral de aumento de vagas. Em paralelo, passaram a pleitear mais recursos do governo do estado para isso, não contando com um programa estruturado de apoio. No caso da USP, o resultado líquido foi um crescimento significativo do número de estudantes matriculados na graduação entre 1990 e 2020, passando de 34.139 para 55.624, como mostra a Figura 1.

FIGURA 1
: Evolução do número de estudantes matriculados na USP – 1990-2020

O aumento de matrículas nem sempre se apoiou no argumento da democratização. No entanto, esse foi um dos seus efeitos, uma vez que parte significativa das novas vagas foi implementada no noturno, passando de 12.114 para 19.943, ou foi resultado da criação de unidades em regiões com menor tradição universitária. Além disso, como mostra Carlotto (2018)CARLOTTO, Maria C. (2018), "A universidade vista 'a certa distância': a estrutura social da USP e sua representação simbólica". Política & Sociedade, 17 (38). https://doi.org/10.5007/2175-7984.2018v17n38p224, isso se deu principalmente pela criação de cursos ou aumento de vagas em cursos de áreas profissionais não tradicionais.

A criação da EACH, em 2005, no distrito Ermelino Matarazzo é um bom exemplo dessa política de expansão das vagas do início dos anos 2000 e da nova forma de pensar a universidade que tomava corpo nesse período (Garcia e Carlotto, 2013GARCIA, Sylvia. G. & CARLOTTO, Maria C. (2013), "Tensões e contradições do conceito de organização aplicado à universidade: o caso da criação da USP-Leste". Avaliação: Revista Avaliação da Educação Superior, 18 (3): 657-684. https://doi.org/10.1590/S1414-40772013000300008.
https://doi.org/10.1590/S1414-4077201300...
). Com dez novos cursos de graduação, muito diferentes dos tradicionais da USP, a EACH se tornou uma das maiores unidades da USP. Desde 2005 metade dos seus estudantes vinham de escolas públicas e aproximadamente 27% deles residiam na zona leste de São Paulo (Perosa, Santos e Menna-Barreto, 2011; Dantas, 2019DANTAS, Adriana S. R. (2019), "A USP da periferia: a participação política contribuindo para descontruir as lógicas espaciais". Geofronter, 2 (5). https://periodicosonline.uems.br/index.php/GEOF/article/view/3621.
https://periodicosonline.uems.br/index.p...
).

Ações afirmativas

Os experimentos com ações afirmativas, por sua vez, foram resultado de processos diversos. Os primeiros ocorreram por iniciativa de parlamentares estaduais, no caso das universidades estaduais do Rio de Janeiro e da Bahia, ou por iniciativa de colegiados internos, no caso da Universidade de Brasília. Até a adoção da chamada Lei de Cotas em 2012, a maioria das iniciativas havia sido resultado de ação local (Daflon, Feres Jr. e Campos, 2013).

A primeira experiência com ações afirmativas na USP ocorreu em 2006, com a implementação do Sistema de Pontuação Acrescida, parte de um programa mais amplo, denominado “Programa de Inclusão Social da USP” (Inclusp). Nesse período, ações afirmativas para ingresso na graduação estavam se difundindo pelo país, na sequência das experiências pioneiras iniciadas por universidades estaduais entre 2002 e 2004. Em 2005, entre as 98 universidades federais e estaduais existentes, 24 haviam implementado alguma iniciativa desse tipo (Feres Júnior, Daflon e Campos, 2011). Em 2007, o governo federal lançou o Programa de Apoio ao Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), com incentivos econômicos a iniciativas voltadas para a abertura das universidades públicas para grupos menos representados, como expansão de vagas nos cursos noturnos e ampliação das políticas de inclusão e assistência estudantil.

Ainda que houvesse um certo consenso sobre a necessidade de tornar as universidades públicas mais acessíveis aos grupos menos representados, as primeiras experiências com ações afirmativas foram acompanhadas por intenso debate sobre a melhor estratégia a ser adotada. A reserva de vagas, estratégia privilegiada por algumas, estava no centro do debate. Daflon, Feres Jr. e Campos (2013, p. 321) notam bem que universidades de maior prestígio aderiram com menor entusiasmo a ela, reservando um menor número de vagas ou optando pela alternativa da bonificação, como ocorreu nas estaduais paulistas.

No caso dessas universidades, a reserva de vagas foi percebida como uma ameaça à visão de excelência que sustentava sua política universitária, baseada na formação de quadros para a própria reprodução das posições universitárias e para as mais altas posições do serviço público e privado. Mesmo diante da difusão das ações afirmativas pelo território nacional e do lançamento de vários programas federais orientados para democratizar o ensino superior (Lima, 2010LIMA, Márcia. (2010), "Desigualdades raciais e políticas públicas: ações afirmativas no governo Lula". Novos Estudos Cebrap, (87), 77-95. https://doi.org/10.1590/S0101-33002010000200005.
https://doi.org/10.1590/S0101-3300201000...
), as três universidades estaduais paulistas mantiveram-se reticentes.

A Unicamp e a USP recuaram mais precocemente dessa posição e implementaram suas primeiras ações afirmativas já em 2005 (Unicamp) e 2006 (USP). Recusando-se a implementar reserva de vagas até à segunda metade da década seguinte, as duas universidades passaram a adicionar pontos à nota dos candidatos, em número suficiente para colocar na dianteira aqueles estudantes oriundos da escola pública cujo desempenho já era bastante alto.

Vão, portanto, continuar insistindo em atribuir ao processo de recrutamento de estudantes a responsabilidade pelo sucesso ou fracasso de sua missão educativa. Esse tipo de política admite a elitização do sistema de ensino e reconhece as universidades como beneficiárias desse processo de elitização. Porém, não atribui às mesmas um papel específico no confronto das desigualdades educacionais. Abertura para grupos até então pouco representados é interpretada como uma ameaça ao status quo, percebido como garantia do bom funcionamento dessas universidades, tal como reiterado em rankings e avaliações de diferentes tipos que se multiplicaram nesse período. Mais do que isso, currículos e pedagogias em vigor nas universidades são temas de estudo desprestigiados no campo acadêmico e se alteram lentamente.

Apesar dos avanços notáveis da expansão e de dispositivos de políticas de bonificação (Piotto e Nogueira, 2016PIOTTO, Débora C. & NOGUEIRA, Maria Alice. (2016), "Incluindo quem? Um exame de indicadores socioeconômicos do Programa de Inclusão Social da USP". Educação e Pesquisa, 42 (3), 625-649. https://doi.org/10.1590/S1517-9702201609134896.
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201609...
), os resultados revelaram-se lentos e modestos, exigindo ajustes sucessivos nos anos seguintes. A documentação mostra que essas modificações foram acompanhadas de mudanças no discurso que as justificava. Pouco a pouco, as vozes oficiais parecem abraçar, cada vez com mais convicção e clareza, a disposição a contribuir para a democratização do corpo discente. Em 2016, a USP aderiu parcialmente ao Sisu. O número de vagas era definido pelas unidades até um teto de 30%.

Apesar dos limites, esse foi, ainda assim, um período rico no desenvolvimento de dispositivos institucionais visando a tornar a universidade mais inclusiva, certamente influenciado pela Lei das Cotas de 2012 e pela experiência de tantas outras universidades brasileiras. Gradativamente, observa-se uma mudança institucional da maior importância, em que se fortalece a percepção de que a universidade também é responsável pela formação de jovens vindos de escolas públicas, com atenção aos estudantes pretos e pardos. O argumento que delega exclusivamente à escola básica ou ao indivíduo a responsabilidade por resolver a desigualdade escolar brasileira perdeu força, sem, contudo, desaparecer.

A dificuldade em construir consenso suficiente para instaurar um novo modelo contribuiu para o acirramento progressivo das lutas internas em torno da inclusão social e racial, que se tornaram mais visíveis na greve de 2016. Após dez anos de Inclusp, o corpo discente estava mais diverso socialmente e, portanto, mais sensível às reivindicações do movimento negro organizado, como no caso do Núcleo de Consciência Negra da USP, fundado em 1987. Assim, em 2017, em parte como resultado dessa greve e de condições políticas internas favoráveis, a USP implementou, para todos os cursos, a reserva de 50% das vagas para estudantes egressos de escolas públicas e, dentre eles, 37% reservadas aos autodeclarados pretos, pardos e indígenas. Isso equivale a 18,5% do total de vagas da universidade. A adoção se deu de forma escalonada, atingindo essa proporção no ingresso em todos os cursos somente em 2021.

A reserva de vagas teve um efeito imediato sobre a composição do corpo discente. Como mostramos na próxima seção, houve alteração em todos os cursos e turnos, mesmo naqueles em que a impermeabilidade aos grupos menos representados havia resistido à política de bonificação em vigor anteriormente (Carlotto, 2018CARLOTTO, Maria C. (2018), "A universidade vista 'a certa distância': a estrutura social da USP e sua representação simbólica". Política & Sociedade, 17 (38). https://doi.org/10.5007/2175-7984.2018v17n38p224). Antes de discutir esses números, porém, vale a pena tratar de outra iniciativa, as políticas de permanência, que têm efeitos muito concretos sobre os estudantes oriundos de grupos menos representados, afetando seu interesse em ingressar nessa universidade e as chances de concluir seus cursos.

Políticas de permanência

Investimentos em iniciativas para apoiar estudantes oriundos de meios menos abastados não são uma novidade na USP. No entanto, a criação da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (Prip), em 2022, sinaliza uma mudança significativa, que é a inserção dessas iniciativas entre as principais dimensões da política universitária.

Entre as três universidades estaduais paulistas, a USP foi a primeira a fazer isso. Diferente da situação das universidades federais, em que pró-reitorias de “assuntos estudantis” e “assuntos comunitários” são uma ocorrência comum já há algumas décadas e que contam com um Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace) desde 1987, assim como com os recursos do Plano Nacional de Assistência Estudantil desde 2007, nas estaduais paulistas, tais iniciativas, em geral bastante robustas aliás, dependem de seus orçamentos próprios e permaneceram espalhadas por diferentes órgãos até muito recentemente.

O processo de institucionalização da assistência e da permanência estudantil como um espaço acadêmico-administrativo autônomo e sua elevação à camada mais alta da hierarquia de poderes universitários nas universidades paulistas merecem mais estudos (Dias e Sampaio, 2020DIAS, Carlos E. S. B. & SAMPAIO, Helena (2020), "Serviços de apoio a estudantes em universidades federais no contexto da expansão do ensino superior no Brasil". In: DIAS, Carlos et al. (orgs.). Os serviços de apoio pedagógico aos discentes no ensino superior brasileiro. São Carlos, Pedro & João Editores, pp. 27-60.). Investir em permanência estudantil requer modificação no fluxo de recursos, o que, por sua vez, exige mudança na forma de conceber os usos desses recursos, que deixam de ser percebidos apenas como assistência social para serem pensados como instrumentos de produção da formação de excelência tradicionalmente tratada como missão fundamental desta universidade. Trata-se, em suma, de uma mudança na forma de conceber essa missão no que diz respeito a oferecer “oportunidades para todos”, conforme promete o decreto de criação da USP. Isso não se deu sem lutas.

O caso do Conjunto Residencial da USP (Crusp) é um bom exemplo desse longo processo de institucionalização das políticas de permanência e sua imbricação com a viabilização de recursos. Parte integral do projeto da Cidade Universitária Armando de Salles Oliveira, elaborado em 1961, a construção dos primeiros seis dos doze blocos previstos foi viabilizada pelo aporte pontual de recursos do Governo do Estado estrategicamente captados pela USP quando esse se viu diante da obrigação de alojar os atletas que participariam dos Jogos Pan-Americanos de 1963. Os outros blocos foram construídos posteriormente com recursos da universidade, mas parte importante da área foi destinada a outros fins. Na ausência de uma política de moradia universitária, o uso desses prédios como moradia se tornaria nas décadas seguintes objeto de disputas entre o movimento estudantil e as autoridades universitárias, dando ensejo a vários episódios de ocupação dos mesmos pelos estudantes. Hoje ele se tornou objeto de política específica, que reconhece a moradia estudantil como “parte integrante da política de permanência e pertencimento da USP” (Lanna e Rizzi, 2023LANNA, Ana Lúcia & RIZZI, Ester G. (2023), "O Crusp é moradia estudantil". Jornal da USP, São Paulo, 4 de outubro. https://jornal.usp.br/artigos/o-crusp-e-moradia-estudantil/.
https://jornal.usp.br/artigos/o-crusp-e-...
), e que gerencia habitações em seis dos oito campi, além de bolsas “auxílio moradia”, que visam a subvencionar gastos com aluguel.

Da mesma forma, embora a USP tenha implementado ao longo de sua história um conjunto amplo de apoios, financeiros, de alimentação, transporte e saúde, esses não eram tratados como parte de uma política propriamente acadêmica. Até à criação da Prip, essas iniciativas estavam sob a responsabilidade da Coordenadoria de Assistência Social (Coseas), órgão criado em 1969 para gerenciar esses e outros apoios aos diferentes segmentos da comunidade. Por boa parte desse período, os gastos com esses itens eram indicados de forma dispersa no orçamento da universidade, espalhados por diversas alíneas. Em 2009, estimativas de gastos com permanência aparecem em alínea específica, intitulada Política de Permanência e Formação Estudantil. Prevê-se despender pouco mais de R$ 2.2 mil por estudante (graduação e pós-graduação). Em 2022, prevê-se gastar R$ 3.3 mil, um aumento de pouco mais de 50% em valores ajustados pela inflação. A estimativa do gasto total para 2024 nesta alínea (USP, 2024) representa um aumento real de 20% em relação a 2022. O peso no orçamento passa de 3,0 para 5,1% entre 2009 e 2024.

Como no caso do aumento de vagas e das ações afirmativas, trata-se de uma mudança significativa das condições institucionais. Resta verificar se e como ela afetou a composição do corpo estudantil.

Transformações na composição social do corpo discente

A expansão de vagas e as políticas afirmativas na universidade, como esperado, levaram a uma diversificação importante do corpo estudantil em termos de origem social, gênero e raça.

Para compreender essas transformações, exploramos um conjunto de informações sobre as características sociais dos estudantes ingressantes entre 2000 e 2020, coletadas pela Fundação Universitária para o Vestibular (Fuvest), via questionário socioeconômico preenchido pelo estudante no momento da inscrição no vestibular.

Como a Fuvest não disponibiliza os dados abertos on-line, obtivemos acesso a eles via Lei de Acesso à Informação. Além disso, consultamos os Anuários estatísticos das décadas de 1980, 1990 e 2000 disponíveis para consulta online.

Quem são os estudantes que ingressam na USP antes e depois da expansão das matrículas, da adoção de políticas de ações afirmativas e do desenvolvimento de uma política de permanência ocorridos a partir do início dos anos 2000? Quais são as principais clivagens sociais, de classe, de gênero e raça que caracterizam essa população? Enfim, quais são as permanências e mudanças passíveis de observação a partir dos dados estatísticos?

Para responder a essas perguntas, examinamos, para a população de ingressantes, o nível socioeconômico das famílias a partir de informações sobre a escolaridade dos pais, o tipo de escola cursada no ensino fundamental e médio (se pública ou privada), o gênero, a autodeclaração de raça e a carreira escolhida. Concentramos a discussão que se segue no período entre 2000 e 2020.

Como houve mudanças na coleta de informações sobre renda e ocupação dos pais ao longo do período, não foi possível explorar esse dado. Entretanto, sabemos que a maior evidência do alto nível da segregação escolar que caracteriza o Brasil é a forte correlação entre tipo de escola frequentada, se privada ou pública, e o nível socioeconômico das famílias. Usamos, então, a primeira informação como proxy da segunda.

Optamos aqui por explorar a variável escolaridade da mãe, tendo em conta que ela pode ser considerada também como uma proxy de nível socioeconômico das famílias e é, principalmente, um indicador de estilo parental e do uso do tempo na educação das crianças e dos jovens (Lareau, 2003LAREAU, Annette. (2003), Unequal childhoods: Class, race, and family life. Berkeley, University of California Press.; Henri-Panabière, 2021HENRI-PANABIÈRE, Gaële. (2021), "Socialisations temporelles pendant l'enfance et inégalités scolaires". Regards Croisés sur l'Economie, 29 (2): 27-35.). Mães mais escolarizadas conhecem melhor o sistema educacional, seus jogos e armadilhas, o que tende a facilitar a orientação dos percursos escolares das crianças e jovens desde muito antes do vestibular, levando à procura por escolas técnicas públicas ou por esta ou aquela escola pública e privada etc.

A Figura 2 mostra as principais transformações na composição social dos estudantes da USP no período analisado.

FIGURA 2
: Porcentagem de ingressantes por ano de ingresso, segundo algumas características sociodemográficas – 2000-2022

Como vemos, o período foi marcado por duas mudanças substantivas e duas permanências relativas. Por um lado, ainda que o fechamento social da Universidade de São Paulo para estudantes oriundos das camadas menos escolarizadas e com menor renda nunca tenha sido absoluto, uma vez que em 2000, antes da adoção de qualquer ação afirmativa, aproximadamente um quarto dos ingressantes da USP vinha de escolas públicas, esse percentual sobe significativamente ao longo dos anos 2000. Observamos, no entanto, que ele só ultrapassa os 40% dos ingressantes após a adoção das cotas, crescendo nos anos subsequentes.

Outra mudança significativa diz respeito à participação de estudantes pretos, pardos e indígenas na população total de ingressantes, que passa de pouco mais de 7% em 2000 para pouco mais 25% em 2020. Apesar de ocorrer uma inflexão clara na curva a partir da adoção das cotas, observamos que mesmo antes disso há um aumento progressivo na participação desses estudantes no conjunto da população estudantil.

Com relação às permanências relativas, notamos que a proporção de estudantes cujas mães concluíram o ensino superior se altera pouco ao longo do período, mas a tendência é de aumento. Num período em que são implementadas ações para favorecer o ingresso de estudantes oriundos de grupos historicamente menos representados, esse resultado surpreende e merece ser melhor compreendido. Provisoriamente, ele pode ser atribuído, pelo menos em parte, à expansão do ensino superior no período. De fato, a proporção da população com ensino superior no estado de São Paulo passou de 8% em 1991 para 25% em 2022 (IBGE Censo, 2024; Ipea, 2023IPEA. (2023), PNAD, http://ipeadata.gov.br.
http://ipeadata.gov.br...
).

Outra permanência relativa é a participação feminina, que fica mais ou menos estável, aumentando em 2.9% ao longo desses vinte anos. A USP permanece um universo predominantemente masculino, apesar do inegável avanço na escolarização feminina que ocorreu no Brasil e no resto do mundo nas últimas décadas (Beltrão e Alves, 2009BELTRÃO, Kaizô & ALVES, José. (2009), "A reversão do hiato de gênero na educação brasileira no século XX". Cadernos de Pesquisa, 39 (136): 125-156. https://doi.org/10.1590/S0100-15742009000100007.
https://doi.org/10.1590/S0100-1574200900...
).

Para compreender melhor as mudanças na composição da população estudantil, construímos alguns perfis a partir das variáveis gênero, raça e nível de instrução da mãe, permitindo uma análise mais multidimensional desse grupo de estudantes, como mostra a Figura 3.

FIGURA 3
: Porcentagem de ingressantes por ano de ingresso, segundo perfil sociodemográfico obtido pela combinação das variáveis gênero, autodeclaração racial e nível de instrução da mãe (com ou sem Ensino Superior) – 2000-2022

Verificamos aqui que o crescimento do número de estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas foi bastante expressivo e especialmente alto para aqueles, do sexo masculino e feminino, cujas mães não concluíram curso superior. Isso indica maior inclusão de segmentos das camadas médias, provavelmente muitos recém-chegados a essa posição, e de camadas populares. Vemos ainda, na mesma Figura 3, que, à medida que aumenta a proporção de estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas com mães sem o ensino superior, diminui a proporção de estudantes brancos e amarelos com mães sem o ensino superior.

Assim, os dados examinados neste estudo sugerem que o ingresso dos estudantes pretos, pardos e indígenas não alterou, substantivamente, o ingresso dos estudantes brancos e amarelos, cujas mães concluíram o ensino superior, uma vez que sua proporção se manteve relativamente estável ao longo desses últimos vinte anos. Contudo, parece ter contribuído para a redução do número de estudantes amarelos e brancos cujas mães não concluíram o ensino superior, portanto oriundos de famílias de menor nível socioeconômico.

Por fim, podemos notar que a desigualdade de gênero no ingresso é maior entre estudantes brancos e amarelos do que entre os estudantes negros, independente do nível de escolarização das mães. É sobretudo entre os estudantes ingressantes brancos e amarelos que notamos as maiores diferenças de gênero, com uma forte distância nas curvas de ingresso de estudantes do sexo masculino e feminino, em benefício dos estudantes do sexo masculino, independentemente do nível de escolaridade das mães.

Pela sua importância na descrição das mudanças na população estudantil da USP, o atributo escolaridade das mães merece ser melhor explorado. Os gráficos da Figura 4 mostram como variou a população de estudantes em função da escolaridade da mãe em cada grupo racial, evidenciando a ocorrência de movimentos similares, ainda que com intensidades diferentes.

FIGURA 4
: USP – Proporção de ingressantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas (gráfico da superior) e brancos (gráfico inferior) por ano de ingresso, segundo a escolaridade da mãe, 2000-2020

No caso dos ingressantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas e dos ingressantes brancos, é possível notar uma diminuição pronunciada do grupo cujas mães concluíram apenas o ensino fundamental, o que segue a tendência da população brasileira. Nota-se também uma diminuição leve do grupo cujas mães concluíram o ensino superior. No entanto, isso ocorre ao mesmo tempo que aumenta a proporção de estudantes cujas mães concluíram uma pós-graduação. Ao mesmo tempo, ocorre um aumento do grupo cujas mães concluíram o ensino médio, mais pronunciado entre os estudantes autodeclarados pretos, pardos e indígenas. O saldo líquido é o aumento da proporção de estudantes oriundos de famílias mais escolarizadas.

Examinamos, em seguida, como evoluiu a participação de estudantes autodeclarados pretos, pardos ou indígenas em alguns cursos selecionados. O objetivo foi compreender, em particular, o que aconteceu nos cursos socialmente mais seletivos. Na Figura 5 temos um dendrograma que apresenta um agrupamento dos cursos listados segundo o perfil de ingressantes pretos, pardos e indígenas ao longo do período estudado. As linhas à esquerda unem cursos mais parecidos entre si. São identificados dois grandes grupos. Na parte superior da figura, encontram-se alguns dos cursos que se mostraram mais impermeáveis a esse grupo de estudantes, isto é, que pouco mudaram sua composição ao longo do período de expansão de vagas e de bonificação. Essa parte da figura indica que tal impermeabilidade só foi reduzida com a adoção de cotas. Na parte inferior, encontram-se alguns cursos particularmente permeáveis a esse grupo de estudantes. Observa-se que não se chega a uma proporção próxima de 40% do conjunto de estudantes, mesma proporção na população do estado de São Paulo em 2022, em todos eles e, nos casos em que isso ocorre, trata-se de uma mudança recente. Parte desses ingressaram por ampla concorrência.

FIGURA 5
: Proporção de ingressantes que se declaram pretos, pardos ou indígenas segundo o ano de ingresso, o curso (cursos selecionados) e o turno (D – diurno, N – noturno)

Apresentamos, por fim, os resultados de uma análise de correspondências que permite examinar a extensão das transformações ocorridas na USP comparando três momentos: 2000, 2010 e 2020. As unidades de estudo são os cursos, e as variáveis consideradas foram gênero, autodeclaração de cor, tipo de escola do ensino médio e nível de escolaridade da mãe.

Algo em comum nessa comparação entre três momentos da história da USP é que as variáveis com maior contribuição para diferenciar os estudantes ingressantes ao longo de todo o período são o nível de escolaridade da mãe, o tipo de escola em que os ingressantes concluíram o ensino médio e o gênero. Porém, a importância dessa contribuição mudou no período mais recente.

Em 2000 (Figura 6), a primeira dimensão corresponde a 40,6% da variabilidade dos dados, e notamos duas nuvens de correlações importantes. À esquerda do gráfico, observa-se a associação entre mães com ensino superior e estudantes que concluíram o ensino médio em escolas privadas. No extremo oposto, identificamos uma forte correlação entre estudantes que cursaram integralmente o ensino médio na rede pública, mães com ensino fundamental e estudantes pretos, pardos e indígenas. Essa oposição estrutura a primeira dimensão e traduz a grande desigualdade de nível socioeconômico na população estudantil. Isso quer dizer que, em 2000, havia uma associação extremamente forte entre, por um lado, os cursos que recebiam ampla maioria de estudantes vindos de escolas privadas, com mães que tinham concluído o ensino superior e, por outro lado, aqueles ocupados por estudantes pretos, pardos e indígenas, vindos de escolas públicas, com mães que concluíram o ensino fundamental. Os filhos de mães com ensino médio e os estudantes brancos estavam por toda parte e por isso, ocupam essa posição intermediária no diagrama.

FIGURA 6
: Biplot obtido a partir da Análise de Correspondência Múltipla para os dados dos ingressantes de 2000. Variáveis consideradas nas análises: Gênero, Cor, Tipo de escola do Ensino Médio e Níveis de Escolaridade da Mãe

Essa primeira dimensão opõe cursos como Medicina (Med), Engenharia (Eng), Administração (Adm) e Direito (Dir) diurnos, que tendem a conduzir ao exercício das profissões liberais ou à alta gestão, localizados à esquerda do gráfico, a cursos como Pedagogia, Letras e Geografia noturnos, à direita do gráfico, que conduzem ao magistério. Vemos, assim, como os cursos de licenciatura foram, até os anos 2000, a grande porta de entrada para os ingressantes cujas mães concluíram apenas o ensino fundamental. Nesse extremo do gráfico, a menor escolaridade das mães aparece muito associada a estudantes pretos, pardos e indígenas, e àqueles que concluíram o ensino médio em escolas públicas. Essa é a estrutura de acesso à Universidade de São Paulo que as políticas de expansão de vagas, as ações afirmativas e os investimentos na permanência buscaram alterar.

Se a primeira dimensão é socioeconômica, a segunda dimensão explica 32,7% da variabilidade dos dados, e a variável com maior contribuição é o gênero. Em 2000, isso opunha cursos como Terapia Ocupacional (TO) e Fonoaudiologia (Fono) diurnos, mais femininos, a cursos como Filosofia (Fil) noturno e Ciência da Computação (CC) diurno, mais masculinos. Observamos também que a discrepância entre a variabilidade explicada por cada dimensão é a menor observada no período, sendo de 40,6% para a primeira dimensão e 32,75 para a segunda, indicando que ambas as dimensões, socioeconômica e de gênero, condicionavam o acesso às carreiras.

Essa situação se mantém em 2010, com discretas alterações. Na Figura 7, vemos que as variáveis mães que concluíram o ensino superior e estudantes vindos da escola privada estão fortemente correlacionadas, à esquerda do gráfico. No outro extremo, à direita, nota-se a associação entre mães que concluíram o ensino fundamental e a conclusão do ensino médio na rede pública. Os estudantes pretos, pardos e indígenas se deslocam ligeiramente em direção ao centro do gráfico, indicando a maior penetração desse grupo nos cursos à esquerda do gráfico. As mães com ensino médio, que, em 2000, estavam situadas levemente à esquerda, se deslocam para o lado direito do gráfico, posicionando-se entre os estudantes brancos de um lado, e pretos, pardos e indígenas de outro, possivelmente porque muitos desses últimos têm mães com maior escolaridade do que em 2000, talvez resultado do aumento geral da escolarização da população brasileira nos anos precedentes. A maior presença de mães com o ensino médio expressa também a chegada à USP, com maior força, de famílias de classe média baixa, tanto brancas como negras2 2 . De acordo com estudos anteriores, a posse do diploma de ensino médio está associada, na cidade de São Paulo, a domicílios com renda entre 5 e 10 salários mínimos, mas também àqueles de 2 e 5 salários mínimos. Esse capital escolar intermediário distingue tanto as regiões da cidade ocupadas predominantemente pelos domicílios de renda mais alta, como diferencia as periferias mais precárias das intermediárias. Ver Perosa, Lebaron e Leite, 2015. . As mães com ensino médio são em geral filhas de trabalhadores manuais que conseguem prolongar a escolarização e com isso escapar dos trabalhos manuais para compor parte do grande contingente de mulheres que entram no mercado de trabalho em posições intermediárias do setor de serviços (cabeleireiras, vendedoras, recepcionistas, secretárias etc.) (Perosa e Dantas, 2017PEROSA, Graziela & DANTAS, Adriana S. R. (2017), "A escolha da escola privada em famílias dos grupos populares". Educação & Pesquisa, 43 (4): 987-1004, https://doi.org/10.1590/S1517-9702201704177976.
https://doi.org/10.1590/S1517-9702201704...
).

FIGURA 7
: Biplot obtido a partir da Análise de Correspondência Múltipla para os dados dos ingressantes de 2010. Variáveis consideradas nas análises: Gênero, Cor, Tipo de escola do Ensino Médio e Níveis de Escolaridade da Mãe

Isso dito, vemos que a estrutura do espaço em 2010 se parece bastante com a de 2000, indicando que as políticas de bonificação tiveram, de fato, pouco efeito sobre as características sociais do corpo estudantil. A primeira dimensão corresponde a 45,9% da variabilidade, e a variável com maior contribuição é a escolaridade da mãe, fortemente correlacionada ao tipo de escola em que os estudantes concluíram o ensino médio, seja pública ou privada. Os extremos desse espaço opõem cursos como Administração e Direito diurno e noturno, Medicina (Med), Engenharia (Eng) e mesmo Ciências Sociais (CS) diurno a, notadamente, Licenciatura em Ciências da Natureza (LCN) diurno e noturno, Geografia (Geo) e Letras noturnos, ambas formações que conduzem ao magistério.

Observa-se que o curso Sistemas de Informação (SI) do período noturno, oferecido pela EACH, encontra-se nessa mesma região do espaço e muito próximo ao polo masculino. Diferente das demais licenciaturas, mais mistas, esse curso parece falar à imaginação dos homens com mães menos escolarizadas e egressos de escolas públicas, pois oferece uma porta de entrada para as ocupações do aquecido setor tecnológico, com a promessa de ascensão social. Ao mesmo tempo, alguns cursos que podem ter sido pensados para favorecer a entrada de estudantes trabalhadores, como Direito (Dir) e Ciências Atuariais (CA) noturnos, estavam ocupados por estudantes com características similares aos cursos mais prestigiados do diurno.

A segunda dimensão é definida pelo sexo dos ingressantes e explica 38,4% da variabilidade dos dados. Ela opõe cursos predominantemente mais masculinos no alto do diagrama, como Ciências Econômicas (CE) noturno, Sistemas de Informação (SI) diurno e noturno, e mesmo Filosofia (Fil), tanto diurno quanto noturno, a cursos tradicionalmente femininos, como Pedagogia (Ped), Obstetrícia (Obs) e Terapia Ocupacional (TO) diurno, Fonoaudiologia (Fono) e Têxtil e Moda (TM) diurnos.

Já em 2020 (Figura 8), essa situação se inverte. Decresce a importância do nível socioeconômico, medido aqui pela escolaridade das mães, e ganha relevância a dimensão de gênero. Os extremos do espaço opõem os cursos femininos, à esquerda, aos cursos predominantemente masculinos, à direita. A escolaridade da mãe e o tipo de escola de ensino médio dos ingressantes estruturam o espaço em uma segunda dimensão, agora menos importante do que nos anos anteriores.

FIGURA 8
: Biplot obtido a partir da Análise de Correspondência Múltipla para os dados dos ingressantes de 2020. Variáveis consideradas nas análises: Gênero, Cor, Tipo de escola do Ensino Médio e Níveis de Escolaridade da Mãe

A primeira dimensão é responsável por explicar 58,2% da variabilidade dos dados, e a variável com maior contribuição é o gênero. Os cursos tradicionalmente femininos são ainda mais homogêneos do que os cursos masculinos, indicando que é maior o número de mulheres que ingressam em cursos masculinos do que de homens que buscam os cursos femininos. Isso opõe, nessa dimensão, cursos como Obstetrícia (Obs), Fonoaudiologia (Fono), Terapia Ocupacional (TO) e Pedagogia (Ped), por exemplo, a cursos como Engenharias e Sistemas de Informação e Ciências Econômicas, diurno e noturno, assim como Ciências Atuariais noturno. Observa-se que Filosofia diurno e noturno permanecem predominantemente masculinos.

A segunda dimensão é responsável por explicar 23,9% da variabilidade dos dados, e a variável nível de instrução da mãe foi a que apresentou maior contribuição. A discrepância entre a variabilidade explicada de cada uma das duas dimensões aumentou bastante, chegando a 34,6%. Em 2000, a diferença entre as duas primeiras dimensões (nível socioeconômico e gênero) era muito menor, da ordem de 7,9%. Isso significa que a contribuição das variáveis socioeconômicas para o ingresso diminuiu consideravelmente. O que surpreende é o fortalecimento da antiga clivagem de gênero no acesso aos cursos, num momento em que as hierarquias de gênero têm sido fortemente desafiadas. A dificuldade em superar essa fronteira está intimamente associada aos tabus reificados pelo sistema de gênero e às diferenças de remuneração e poder que estruturam a hierarquia das profissões. Compreende-se, assim, que as mulheres se dirijam mais às profissões masculinas do que os homens às profissões femininas.

Observações finais

Como mostra nossa análise, a USP de 2020 não é mais a dos anos 1990. Muita coisa mudou. Este artigo registra algumas dessas mudanças e permite inferir o complexo trabalho político que as tornou possíveis e que outros estudos têm se encarregado de analisar (Garcia e Carlotto, 2013GARCIA, Sylvia. G. & CARLOTTO, Maria C. (2013), "Tensões e contradições do conceito de organização aplicado à universidade: o caso da criação da USP-Leste". Avaliação: Revista Avaliação da Educação Superior, 18 (3): 657-684. https://doi.org/10.1590/S1414-40772013000300008.
https://doi.org/10.1590/S1414-4077201300...
; Carlotto, 2014).

A universidade cresceu, e as mudanças organizacionais mencionadas acima contribuíram para alterar a composição geral do corpo estudantil. Por meio das estatísticas de ingresso, notamos o aumento da proporção de estudantes que concluíram o ensino médio em escolas públicas. Ainda assim, permanece alto o percentual de estudantes cujas mães concluíram o ensino superior, indicando uma seleção social ainda alta. Notamos, no entanto, que, entre os estudantes pretos, pardos e indígenas, cresceu a proporção de estudantes cujas mães não concluíram o ensino superior. Isso indica outro bom resultado da política de cotas, que tem beneficiado estudantes negros e indígenas de diferentes camadas sociais, atingindo aqueles de origem popular, mas também os recém-chegados nas camadas médias.

Observamos, em particular, o efeito importante da política de cotas sobre a diversificação racial dos cursos. Vemos também como a enorme expansão de vagas dos anos 1990-2010 teve uma contribuição relativamente modesta para essas mudanças, se comparada à política de reserva de vagas. Nessa universidade, como em muitas outras, a democratização do ensino depende não apenas da expansão, mas também de dispositivos de reserva de vagas, capazes de acelerar uma mudança estrutural há muito reivindicada. Apenas a adoção de cotas alcançou diminuir as barreiras nos cursos mais impermeáveis e mesmo naqueles historicamente mais permeáveis. Graças a isso, a população de ingressantes em 2020 é mais diversa socialmente, mais negra e um pouco mais feminina.

Constatamos que a clivagem de classe dos cursos diminuiu e observamos que, graças ao modelo de cotas adotado, que reserva vagas em todos os cursos, não está ocorrendo uma segmentação de base racial. No entanto, há alguns limites que talvez não seja possível à universidade resolver. A proporção de mulheres nessa população ainda é inferior à de homens, e o sistema de gênero se afirmou mais recentemente como o mais importante orientador do fluxo de estudantes pelos diferentes cursos, a despeito dos importantes avanços da escolarização feminina que estão ocorrendo no Brasil e no mundo. Além disso, se a proporção de ingressantes pretos, pardos e indígenas triplicou entre 2000 e 2020, chegando a 26,1%, ela ainda se mantinha, em 2020, bem abaixo dos 40,2% que correspondem à sua proporção na população paulista segundo o Censo de 2022 (os dados de 2020 não estão disponíveis).

Por fim, importa notar que a mudança na composição social do contingente estudantil leva a outras mudanças que não foram analisadas neste artigo, mas que são facilmente percebidas por quem circula pela USP e exigem melhor estudo. Um dos egressos ouvidos para este trabalho observou que “ela gera uma interdição a certas formas de violência simbólica que eram absolutamente naturalizadas nas interações dos professores com os estudantes nos anos 1990” e que “seriam um escândalo hoje, certamente na faculdade, e, em alguns casos, escândalo de jornal”. Faz-se referência aqui à expressão do juízo professoral, de resto tão bem analisada por Pierre Bourdieu e Monique de Saint Martin (1998), em comentários depreciativos ou jocosos que assumiam, mais do que indagavam sobre a distância dos estudantes da cultura escolar, como o modo de ler e falar sobre textos, autores e tópicos ou lacunas em conhecimentos tratados como básicos nas áreas de exatas, por exemplo. Refere-se também às falas que contribuíam para explicitar a distância dos estudantes com relação à cultura que professores/as da época consideravam legítima, como certa literatura não escolar e o domínio do inglês, por exemplo, experiências que só podiam ser vivenciadas por sorte do nascimento em famílias que dispunham dos recursos materiais e simbólicos para disponibilizá-las aos filhos ou, por proximidade, aos afilhados e acólitos, mesmo no caso daqueles que tiveram a sorte de contar com estruturas públicas como as escolas técnicas ou as bibliotecas que favoreceram o acesso (Almeida, W., 2007).

Na mesma direção, crescem hoje, nessa universidade pós-cotas, mais negra e mais feminina, reivindicações para que ela repense o conteúdo e as formas de ensino, tanto no sentido de diversificar autores e perspectivas quanto de se adotarem pedagogias centradas no estudante. Embora mudanças nos currículos tenham sido constantes desde 1934, elas podem estar aquém do debate especializado sobre as pedagogias do ensino superior e, provavelmente, aquém das demandas, antigas e novas, dos estudantes.

Esse é um desafio particularmente importante para uma comunidade universitária que já investiu tanta energia e recursos para a transformação do recrutamento e das condições de ensino, inclusive implantando o que considera ser “o maior programa de permanência estudantil do país” (USP, 2024, p. 6). Tal programa, por enquanto circunscrito ao apoio material, ainda não contemplando iniciativas de apoio pedagógico, pode não ser suficiente para eliminar os mecanismos que levam à produção de “excluídos no interior” (Bourdieu e Champagne, 2001BOURDIEU, Pierre & CHAMPAGNE, Patrick. (2001), "Os excluídos do interior". In: BOURDIEU, Pierre. A miséria do mundo. Petrópolis, RJ, Vozes.).

Referências Bibliográficas

  • AGUIAR, Márcio M. & PIOTTO, Débora C. (2018), "Desigualdade à brasileira: capital étnico-racial no acesso ao ensino superior". Educação, 41 (3): 478-491. https://doi.org/10.15448/1981-2582.2018.3.24897
    » https://doi.org/10.15448/1981-2582.2018.3.24897
  • ALMEIDA, Ana Maria F. (2004), "Língua nacional, competência escolar e posição social". In: ALMEIDA, Ana Maria F.; CANÊDO, Letícia Bicalho; GARCIA, Afrânio Raul & BITTENCOURT, Agueda Bernardete (orgs.). Circulação internacional e formação internacional das elites Campinas, Editora da Unicamp, pp. 29-46.
  • ALMEIDA, Ana Maria F. (2007), "A noção de capital cultural é útil para se pensar o Brasil?". In: ZAGO, Nadir & PAIXÃO, Lea (orgs.). Sociologia da educação brasileira: Pesquisa e realidade brasileira Petrópolis, Vozes, pp. 44-59.
  • ALMEIDA, Ana Maria F. (2008), "O assalto à educação pelos economistas". Tempo Social, 20 (1): 163-178. https://doi.org/10.1590/S0103-20702008000100008
    » https://doi.org/10.1590/S0103-20702008000100008
  • ALMEIDA, Ana Maria F. (2015), The changing strategies of social closure in elite education in Brazil. In: VAN ZANTEN, Agnès; BALL, Stephen J. & DARCHY-KOECHLIN, Brigitte. Elites, Privilege, and excellence: The national and global redefinition of educational advantage, Londres, Routledge.
  • ALMEIDA, Ana Maria F. & ERNICA, Maurício. (2015), "Inclusão e segmentação social no Ensino Superior público no Estado de São Paulo (1990-2012)". Educação & Sociedade, 36 (130): 63-83. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302015139672
    » https://doi.org/10.1590/ES0101-73302015139672
  • ALMEIDA, Wilson M. (2007), "Estudantes com desvantagens econômicas e educacionais e fruição da universidade". Caderno CRH, 20 (49): 35-46. https://doi.org/10.1590/S0103-49792007000100004
    » https://doi.org/10.1590/S0103-49792007000100004
  • BARBOSA, Maria Lígia & PIRES, André. (2022), "Uma análise exploratória sobre seleção e inclusão no Ensino Superior brasileiro: do mérito herdado ao mérito relacional". Pro-posições, 33 https://doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0070
    » https://doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0070
  • BELTRÃO, Kaizô & ALVES, José. (2009), "A reversão do hiato de gênero na educação brasileira no século XX". Cadernos de Pesquisa, 39 (136): 125-156. https://doi.org/10.1590/S0100-15742009000100007
    » https://doi.org/10.1590/S0100-15742009000100007
  • BONTEMPI JR., Bruno. (2011), "Do Instituto de Educação à Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo". Cadernos de Pesquisa, 41 (142): 188-207.
  • BOURDIEU, Pierre & CHAMPAGNE, Patrick. (2001), "Os excluídos do interior". In: BOURDIEU, Pierre. A miséria do mundo Petrópolis, RJ, Vozes.
  • BOURDIEU, Pierre & SAINT MARTIN (1998), "As categorias do juízo professoral". In: BOURDIEU, Pierre. (2001), A miséria do mundo Petrópolis, RJ, Vozes.
  • CARLOTTO, Maria C. (2018), "A universidade vista 'a certa distância': a estrutura social da USP e sua representação simbólica". Política & Sociedade, 17 (38). https://doi.org/10.5007/2175-7984.2018v17n38p224
  • CARVALHAES, Flávio & COSTA RIBEIRO, Carlos A. (2018), "Estratificação horizontal da educação superior no Brasil: desigualdades de classe, gênero e raça em um contexto de expansão educacional". Tempo Social, 31 (1): 195-233.
  • CARVALHO, José Jorge. (2007), "O confinamento racial do mundo acadêmico brasileiro". Padê: Estudos em Filosofia, 1 (1).
  • CASTRO, Jorge A. de (2009), "Evolução e desigualdade na educação brasileira". Educação & Sociedade, 30 (108): 673-697. https://doi.org/10.1590/S0101-73302009000300003
    » https://doi.org/10.1590/S0101-73302009000300003
  • CORTI, Ana Paula. (2016), Ensino Médio em São Paulo: a expansão das matrículas nos anos 1990. Educação & Realidade, 41(1): 41-68. https://doi.org/10.1590/2175-623655996
    » https://doi.org/10.1590/2175-623655996
  • DAFLON, Verônica T.; FERES JR., João & CAMPOS, Luiz A. (2013), "Ações afirmativas raciais no ensino superior público brasileiro: um panorama analítico". Cadernos de Pesquisa, 43 (148): 302-327. https://doi.org/10.1590/S0100-15742013000100015
    » https://doi.org/10.1590/S0100-15742013000100015
  • DANTAS, Adriana S. R. (2019), "A USP da periferia: a participação política contribuindo para descontruir as lógicas espaciais". Geofronter, 2 (5). https://periodicosonline.uems.br/index.php/GEOF/article/view/3621
    » https://periodicosonline.uems.br/index.php/GEOF/article/view/3621
  • DIAS, Carlos E. S. B. & SAMPAIO, Helena (2020), "Serviços de apoio a estudantes em universidades federais no contexto da expansão do ensino superior no Brasil". In: DIAS, Carlos et al. (orgs.). Os serviços de apoio pedagógico aos discentes no ensino superior brasileiro São Carlos, Pedro & João Editores, pp. 27-60.
  • FERES JR., João. (2017), “O lugar do mérito no debate sobre as cotas raciais”. Jornal da USP. https://jornal.usp.br/especial/o-lugar-do-merito-no-debate-sobre-as-cotas-raciais”
    » https://jornal.usp.br/especial/o-lugar-do-merito-no-debate-sobre-as-cotas-raciais”
  • FERES JR., João et al. (2011), “A ação afirmativa no ensino superior brasileiro”. Levantamento das políticas de ação afirmativa (GEMAA). Rio de Janeiro, Iesp-Uerj, pp. 1-20.
  • GARCIA, Sylvia. G. & CARLOTTO, Maria C. (2013), "Tensões e contradições do conceito de organização aplicado à universidade: o caso da criação da USP-Leste". Avaliação: Revista Avaliação da Educação Superior, 18 (3): 657-684. https://doi.org/10.1590/S1414-40772013000300008
    » https://doi.org/10.1590/S1414-40772013000300008
  • HENRI-PANABIÈRE, Gaële. (2021), "Socialisations temporelles pendant l'enfance et inégalités scolaires". Regards Croisés sur l'Economie, 29 (2): 27-35.
  • IBGE. (2024), Sistema IBGE de Recuperação Automática - Sidra. Censo Populacional, https://sidra.ibge.gov.br/tabela/7135
    » https://sidra.ibge.gov.br/tabela/7135
  • INEP. (2023), "Censo da Educação Superior 2022: divulgação dos resultados". Inep, https://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2022/apresentacao_censo_da_educacao_superior_2022.pdf, consultado em 02/02/2024.
    » https://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2022/apresentacao_censo_da_educacao_superior_2022.pdf
  • IPEA. (2023), PNAD, http://ipeadata.gov.br
    » http://ipeadata.gov.br
  • LANNA, Ana Lúcia & RIZZI, Ester G. (2023), "O Crusp é moradia estudantil". Jornal da USP, São Paulo, 4 de outubro. https://jornal.usp.br/artigos/o-crusp-e-moradia-estudantil/
    » https://jornal.usp.br/artigos/o-crusp-e-moradia-estudantil/
  • LAREAU, Annette. (2003), Unequal childhoods: Class, race, and family life Berkeley, University of California Press.
  • LIMA, Márcia. (2010), "Desigualdades raciais e políticas públicas: ações afirmativas no governo Lula". Novos Estudos Cebrap, (87), 77-95. https://doi.org/10.1590/S0101-33002010000200005
    » https://doi.org/10.1590/S0101-33002010000200005
  • LIMA, Márcia & ABDAL, Alexandre. (2007), "Educação e trabalho: a inserção dos ocupados de nível superior no mercado formal". Sociologias, 17: 216-238.
  • PEROSA, Graziela. (2019), Espaço social, relações de gênero e dinâmicas da oferta escolar em São Paulo. Tese de livre-docência, Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo.
  • PEROSA, Graziela; SANTOS, Gislene A. & MENNA-BARRETO, Luiz. (2011), "Desafios da expansão do ensino superior: a USP no lado Leste da cidade". In: MAGALHÃES, Valéria & SANTHIAGO, Ricardo (eds.). Memória e diálogo: Escutas da Zona Leste, visões sobre a história oral. São Paulo, Letra e Voz, pp. 41-60.
  • PEROSA, Graziela & COSTA, Taline L. (2015), "Uma democratização relativa? Um estudo sobre o caso da expansão da Unifesp". Educação & Sociedade, 36 (130): 117-137. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302015140518
    » https://doi.org/10.1590/ES0101-73302015140518
  • PEROSA, Graziela; LEBARON, Frédéric, LEITE, Cristiane K. da S. (2015). "O espaço das desigualdades educativas no município de São Paulo". Pro-posições, 26 (2), 99-118. https://doi.org/10.1590/0103-7307201507705
    » https://doi.org/10.1590/0103-7307201507705
  • PEROSA, Graziela & DANTAS, Adriana S. R. (2017), "A escolha da escola privada em famílias dos grupos populares". Educação & Pesquisa, 43 (4): 987-1004, https://doi.org/10.1590/S1517-9702201704177976
    » https://doi.org/10.1590/S1517-9702201704177976
  • PEROSA, Graziela & SOARES, Alessandro S. (2021), "Educación superior privada: las paradojas de la expansión educativa brasileña". Propuesta Educativa, (55): 15-33.
  • PIOTTO, Débora C. & NOGUEIRA, Maria Alice. (2016), "Incluindo quem? Um exame de indicadores socioeconômicos do Programa de Inclusão Social da USP". Educação e Pesquisa, 42 (3), 625-649. https://doi.org/10.1590/S1517-9702201609134896
    » https://doi.org/10.1590/S1517-9702201609134896
  • REIS, Maurício Cortez. (2023), Trabalhadores com ensino superior: área de formação, ocupação e diferencial de rendimentos em relação aos trabalhadores com Ensino médio. Ipea: Texto para Discussão 2861. http://dx.doi.org/10.38116/td2861
    » http://dx.doi.org/10.38116/td2861
  • SAMPAIO, Helena. (2014), "Diversidade e diferenciação no ensino superior no Brasil: conceitos para discussão". Revista Brasileira de Ciências Sociais, 29 (84): 43-55.
  • SAMPAIO, Helena; LIMONGI, Fernando & TORRES, Haroldo. (2000), Equidade e heterogeneidade no ensino superior brasileiro, Brasília, Inep. https://shorturl.at/grvCS
    » https://shorturl.at/grvCS
  • SÃO PAULO. (1934), Decreto n. 6.283 de 25 de janeiro 1934. Cria a Universidade de São Paulo e dá outras providências. https://www.leginf.usp.br/antigo/criacao/decreto6283.htm
    » https://www.leginf.usp.br/antigo/criacao/decreto6283.htm
  • SCHWARTZMAN, Simon. (2006), "A universidade primeira do Brasil: entre intelligentsia, padrão internacional e inclusão social". Estudos Avançados, 20 (56): 161-189. https://www.revistas.usp.br/eav/article/view/10128
    » https://www.revistas.usp.br/eav/article/view/10128
  • SCHWARTZMAN, Simon & BALBACHEVSKY, Elizabeth. (2014), "Research and teaching in a diverse institutional environment: converging values and diverging practices in Brazil". In: AARREVAARA, Timo & FINKELSTEIN, Martin. Teaching and research in contemporary higher education. Dordrecht, Springer, pp. 221-235.
  • SENKEVICS, Adriano S. & MELLO, Ursula M. (2019), "O perfil discente das universidades federais mudou pós-Lei de Cotas?". Cadernos de Pesquisa, 49 (172), 184-208. https://doi.org/10.1590/198053145980
    » https://doi.org/10.1590/198053145980
  • SETTON, M. da G. (1999), "A divisão interna do campo universitário: uma tentativa de classificação". Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 80 (196). https://doi.org/10.24109/2176-6681.rbep.80i196.985
    » https://doi.org/10.24109/2176-6681.rbep.80i196.985
  • USP. (1987-2023), Anuários estatísticos, https://uspdigital.usp.br/anuario/AnuarioControle
    » https://uspdigital.usp.br/anuario/AnuarioControle
  • 2
    . De acordo com estudos anteriores, a posse do diploma de ensino médio está associada, na cidade de São Paulo, a domicílios com renda entre 5 e 10 salários mínimos, mas também àqueles de 2 e 5 salários mínimos. Esse capital escolar intermediário distingue tanto as regiões da cidade ocupadas predominantemente pelos domicílios de renda mais alta, como diferencia as periferias mais precárias das intermediárias. Ver Perosa, Lebaron e Leite, 2015.
  • 1
    . Este trabalho contou com apoio do CNPq (Proc. n. 312793/2022-7).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2024

Histórico

  • Recebido
    21 Fev 2024
  • Aceito
    27 Fev 2024
Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo Av. Prof. Luciano Gualberto, 315, 05508-010, São Paulo - SP, Brasil - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: temposoc@edu.usp.br