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Trabalho Cessante

Ceasing labour

ARTIGO

Trabalho Cessante

Ceasing labour

José de Souza Martins

Professor do Departamento de Sociologia da FFLCH–USP

RESUMO

Ensaio fotográfico sobre a desativação e o desmonte, em 2001, da Fábrica de Linhas "Pavão", fundada em 1916.

Palavras–chave: desindustrialização; história industrial; sociologia visual; fotografia; trabalho.

ABSTRACT

Photographic essay of the deactivation and dismantling, in 2001, of the Pavão Thread Industry which was founded in 1916.

Keywords: de–industrialization, industrial history, visual sociology, photography, labour.

Última jornada

Ensaio fotográfico


Figuras 2 a 5









Figura 16


Figura 20


Nota de rodapé

Foi quase no final da manhã de 4 de novembro de 2001. Alberto Siuffi, industrial, químico e fotógrafo premiado, convidava–me para fotografar o desmonte das máquinas da Fábrica de Linhas "Pavão", na Vila Pompéia, de sua família, fundada por seu pai em 1916. Tudo aconteceria em poucas horas, alertou–me. Saí correndo.

A velha fábrica chegara a ter cem operárias nos bons momentos. Fornecera linhas para bordado e costura a consumidores espalhados por todo o país. Os produtos chegavam até remotos povoados das margens do rio Amazonas, ao Uruguai e à Argentina. Empresas estrangeiras venceram a miúda e sorrateira concorrência do dia a dia. Golias triunfara.

Em poucas horas, máquinas desmontadas, outras colocadas sobre caminhões para serem levadas embora. Numa área lateral do terreno, engrenagens e peças amontoadas aguardavam o momento de serem levadas para o ferro–velho. Uma indústria de 85 anos e duas gerações de industriais reduzida a um monturo. Em pouco tempo, a empresa que comprou o terreno construirá ali um prédio de apartamentos.

As contradições de uma longa história estão sintetizadas nas imagens desse momento crucial, revelador, o momento da última jornada de trabalho, a jornada fatal e derradeira da (des)produção, a jornada do desmonte, das últimas gotas de suor na fronte do trabalhador, para demolir os meios de produção (e de sua reprodução). Elas se propõem na visualidade dramática e espontânea daquele momento: as pessoas falavam quase em voz baixa, não havia a algazarra própria de situações em que o ato do trabalho especial é concretizado por um grupo que atua numa grande proximidade física de corpos, na construção da força física coletiva necessária para demolir aquilo que é maior do que um homem. Aquele era um cenário de pessoas pensativas.

Utilizei uma câmera manual, para melhor interagir com a penumbra e o silêncio. Utilizei, também, uma objetiva de 50mm para ficar no mesmo nível visual do objeto. Fotografei com a luz natural da semiobscuridade do ambiente. Comecei com um filme de sensibilidade ISO400, mas para enfrentar o ambiente escuro mudei para um ISO1600. Nos cenários mais iluminados pela luz natural que vinha pelas janelas, voltei ao ISO400. Com esses recursos foi possível fotografar aproximadamente do mesmo modo que pessoas viam e os objetos eram naturalmente vistos: pouca profundidade de campo e visão concentrada nos, às vezes, quase vultos que se moviam contra a luz precária que entrava pelas aberturas dos salões.

Recebido para publicação em fevereiro/2002

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Nov 2007
  • Data do Fascículo
    Maio 2002
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