Comparação do estresse em universitários de enfermagem ingressantes e concluintes do curso

RESUMO

Objetivo:

Comparar o nível de estresse de universitários de enfermagem ingressantes e concluintes do curso.

Método:

Estudo transversal, desenvolvido em uma universidade pública federal, do estado da Bahia, com estudantes que responderam a questionários sobre variáveis sociodemográficas, vida acadêmica e a escala para Avaliação de Estresse em Estudantes de Enfermagem. Para avaliar as relações entre as variáveis empregaram-se os testes do Qui-quadrado de Pearson e Exato de Fisher. Para verificar tendências proporcionais entre variáveis do tipo ordinal e os grupos utilizou-se do Teste Qui-Quadrado de Tendência Linear. O nível de significância estatística foi de 5%.

Resultados:

Participaram 154 estudantes. Houve tendência a maior nível de estresse em estudantes do último ano comparados aos do primeiro, em quatro dos seis domínios: Realização das atividades práticas (p=0,00), Comunicação profissional (p=0,00), Ambiente (p=0,00) e Formação profissional (p=0,00).

Conclusão:

Constatou-se níveis elevados de estresse no último ano. Ressalta-se a necessidade de ampliação da investigação para outros anos do curso, a reflexão institucional sobre os fatores estressores e a adoção de uma política institucional que propicie melhor enfrentamento dos estressores.

DESCRITORES:
Estudantes de Enfermagem; Estresse Psicológico; Fatores de Risco

ABSTRACT

Objective:

To compare stress levels in freshman and senior nursing students.

Method:

A cross-sectional study was carried out in a public federal university of the state of Bahia, with students who answered questionnaires about sociodemographic variables, academic life, and a scale for assessing stress in nursing students. Chi-square and Fisher’s exact tests were applied to analyze the relationship between variables. To assess proportional trends between ordinal variables and groups, a chi-square test for linear trend was applied. The significance level was 5%.

Results:

One hundred and fifty-four students participated in the study. There was a tendency to higher stress levels among students in the last year compared to those in the first year, in four out of six domains: Performance of Practical Activities (p=0.00), Professional Communication (p=0.00), Environment (p=0.00) and Professional Education (p=0.00).

Conclusion:

High levels of stress were observed in students taking the last year. There is a need for broader research that includes other years of the course, an institutional reflection on stress factors and the adoption of an institutional policy that favors a better confrontation of stress factors.

DESCRIPTORS:
Students, Nursing; Stress, Psychological; Risk Factors

RESUMEN

Objetivo:

Comparar el nivel de estrés de universitarios de enfermería de primer año y egresos de la carrera.

Método:

Estudio transversal, desarrollado en una universidad pública federal, del Estado de Bahía, con estudiantes que respondieron a cuestionarios acerca de variables sociodemográficas, vida académica y la escala para la Evaluación de Estrés en Estudiantes de Enfermería. Para valorar las relaciones entre las variables, se emplearon las pruebas de Chi cuadrado de Pearson y Exacta de Fisher. A fin de verificar tendencias proporcionales entre variables del tipo ordinal y los grupos, se utilizó la Prueba Chi cuadrado de Tendencia Lineal. El nivel de significación estadística fue del 5%.

Resultados:

Participaron 154 estudiantes. Hubo tendencia a un mayor nivel de estrés en estudiantes del último año comparados con los del primero, en cuatro de los seis dominios: Realización de las actividades prácticas (p=0,00), Comunicación profesional (p=0,00), Ambiente (p=0,00) y Formación profesional (p=0,00).

Conclusión:

Se constataron niveles elevados de estrés en el último año. Se subraya la necesidad de ampliación de la investigación a otros años de la carrera, la reflexión institucional acerca de los factores de estrés y la adopción de una política institucional que facilite un mejor enfrentamiento de dichos factores.

DESCRIPTORES:
Estudiantes de Enfermería; Estrés Psicológico; Factores de Riesgo

INTRODUÇÃO

O estresse é considerado um fator predisponente, desencadeante ou coadjuvante de múltiplas doenças^1)-(3. A presença desse fenômeno tem sido evidenciada em diversos cursos da área da saúde^{4)- (6}, especialmente nos de graduação em enfermagem, em que os estudantes vivenciam situações potencialmente estressoras ao longo do processo de formação acadêmica intra e extraclasse⁷.

Estudos têm evidenciado que a vida acadêmica corresponde a um período no qual os estudantes são expostos a diversos fatores que podem desencadear situações estressoras e prejudicar a saúde e a qualidade de vida^{1), (7)- (8}, pois precisam gerenciar a vida pessoal e social, as demandas acadêmicas e a preparação para a carreira profissional⁷. Além disso, a passagem da formação universitária para o mundo do trabalho demanda decidir onde e quando iniciar a carreira profissional e assumir responsabilidades financeiras⁹.

Os ingressantes no curso universitário podem estar expostos a níveis de estresse diferentes dos concluintes. Parece que aqueles que chegam à universidade vivenciam situações de estresse para se adaptar ao novo ambiente e à nova condição, com novas obrigações escolares, responsabilidades do processo de formação universitária, necessidade de organização de tarefas, adaptação do aluno a critérios e formas de avaliação, entre outras⁷. Embora os estudantes concluintes também estejam expostos a fatores semelhantes, podem interagir com uma gama maior de situações estressoras por estarem mais preocupados com a futura inserção no mercado de trabalho, inseridos nos campos de prática, expostos ao enfretamento de conflitos com outros profissionais e à competitividade com os colegas de turma⁹. Estudantes do último ano apontaram como situações estressoras e causadoras de desgaste físico a angústia, o medo e a insegurança para a elaboração do trabalho de conclusão de curso, a ampla carga horária prática, o desenvolvimento das atividades práticas, preocupações relacionadas à inserção no mercado de trabalho, dificuldades de relacionamento interpessoal com colegas da classe e o gerenciamento do tempo entre estudo e vida familiar^{10)- (11}.

Diante do exposto, mostra-se relevante a prevenção e minimização do estresse em universitários de enfermagem durante todo o período de formação acadêmica, fazendo-se necessário, para isso, a identificação do nível de estresse e dos principais estressores acadêmicos, em diferentes fases de formação acadêmica. No entanto, em busca na literatura, verificou-se escassez de estudos comparativos que abrangessem o nível de estresse entre ingressantes e concluintes do curso.

Com base no exposto, o presente estudo objetivou comparar o nível de estresse de universitários de enfermagem ingressantes e concluintes do curso.

MÉTODO

TIPO DE ESTUDO

Estudo transversal realizado em um curso de graduação em enfermagem de uma universidade pública, em Salvador, Bahia, Brasil.

COLETA DE DADOS

No período da coleta de dados, 187 estudantes estavam matriculados no curso, 106 no primeiro e 81 no último ano letivo. Entre esses, 154 aceitaram participar do estudo e atenderam aos critérios de inclusão, como idade mínima de 18 anos e ambos os sexos. Foram critérios de exclusão os estudantes matriculados em componentes curriculares de outros anos do curso. Desse modo, constituíram a amostra 91 estudantes do primeiro ano, e 63 do último ano.

Todos os estudantes foram abordados em sala de aula, com horário previamente agendado no colegiado do curso, havendo a apresentação das pesquisadoras e explicação dos objetivos e procedimentos da pesquisa.

Na coleta de dados foram utilizados três instrumentos, os quais foram respondidos pelos estudantes, em sala de aula, com duração média de 30 minutos. O instrumento sobre dados sociodemográficos incluiu questões fechadas e semiestruturadas sobre variáveis como idade em anos, sexo, raça/cor autodeclarada, situação conjugal, renda familiar mensal e despesa pessoal mensal. O formulário referente a variáveis da vida acadêmica foi constituído por questões fechadas sobre o ano em curso, procedência do ensino médio, forma de ingresso na universidade, carga horária cursada no semestre, número de dias da semana e de turnos na escola e atividades realizadas extraclasse.

Para conhecer o nível de estresse, utilizou-se da Escala para “Avaliação de Estresse em Estudantes de Enfermagem” (AEEE) validada por Costa e Polak em 2009¹², composta de 30 itens, agrupados em seis domínios e elaborada no formato tipo Likert, com quatro níveis de resposta, variando de 0 a 3: 0 (não vivencio a situação), 1 (não me sinto estressado com a situação), 2 (me sinto pouco estressado com a situação) e 3 (me sinto muito estressado com a situação). O instrumento define escores para cada domínio, o qual é obtido pela soma dos pontos atribuído a cada um dos itens. Para o cálculo dos escores, realiza-se a soma do número correspondente à intensidade de estresse pontuada pelos participantes nos itens presentes em cada domínio. O domínio com maior pontuação é considerado predominante e com maior intensidade de estresse. O domínio 1, Realização de Atividades Práticas, relaciona-se ao conhecimento instrumental do estudante para a realização de procedimentos e os sentimentos envolvidos na oferta do cuidado ao cliente; o domínio 2, Comunicação Profissional, retrata as dificuldades sentidas pelo estudante na comunicação e na interação com os profissionais e as situações conflitantes que dessas emergem; o domínio 3, Gerenciamento do Tempo, concerne às dificuldades dos estudantes em conciliar a vida pessoal com as exigências da grade curricular; o domínio 4, Ambiente, refere-se às dificuldades no acesso aos campos de estágio e à universidade, além do desgaste com o meio de transporte utilizado; o domínio 5, Formação Profissional, diz respeito à preocupação do estudante com o conhecimento adquirido na formação acadêmica e o impacto deste na sua vida profissional, e o domínio 6, Atividade Teórica, retrata a dificuldade dos estudantes com o conteúdo programático e a metodologia de ensino adotada¹².

ANÁLISE E TRATAMENTO DOS DADOS

Os dados foram analisados no STATA versão 12.0. Foram realizadas análises descritivas mediante uso de distribuições de frequências absolutas (n) e relativas (%), uni e bivariadas, médias e desvio-padrão. Para avaliar a magnitude das associações entre as variáveis de interesse, empregaram-se os testes Qui-quadrado de Pearson e Exato de Fisher. Para verificar tendências proporcionais entre as variáveis do tipo ordinal e os grupos, foi utilizado o Teste Qui-Quadrado de Tendência Linear. O nível de significância estatística adotado foi 5%. A consistência interna das respostas ao Instrumento AEEE foi verificada pelo coeficiente Alfa de Cronbach, para avaliar a força da correlação entre as respostas, considerando: valores entre 0,70 e 0,90 - boa consistência interna, abaixo de 0,70 - fraca consistência interna e acima de 0,90 - alta concordância.

ASPECTOS ÉTICOS

O estudo obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia, parecer n.º 356.038 de 2013, e obedeceu aos preceitos éticos emanados na Resolução 466/12, do Conselho Nacional de Saúde. Aqueles que aceitaram participar do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

RESULTADOS

Dos 154 estudantes, 91 (59,1%) cursavam o primeiro, e 63 (40,9%) o último ano. O sexo feminino prevaleceu no último (83 - 91,2%) e no primeiro ano (55 - 87,3%), sendo as essas variáveis independentes.

A média de idade foi de 22,4 anos, predominando a faixa etária de 20 a 24 anos tanto para o primeiro (45 - 49,5%) como para o último (36 - 57,1%) anos. Não havia estudantes de 18 a 19 anos no último ano, mas 39 (42,8%) nessa faixa etária cursavam o primeiro ano. Além disso, a maior proporção de estudantes com mais de 25 anos estava no último ano. As variáveis idade e ano em curso foram dependentes.

Os estudantes se autodeclaram predominantemente da raça/cor negra no primeiro (72 - 79,2%) e no último ano (49 - 77,8%), sendo essas variáveis independentes.

Houve maior proporção de solteiros, estando 44 (48,3%) do primeiro ano e 21 (33,3%) do último sem parceiro fixo. Já os solteiros com parceiro fixo estavam em maior proporção no último ano (45 - 49,5% vs. 34 - 53,9%). Essas variáveis foram dependentes.

A renda familiar mensal mais frequente para o primeiro e último ano foi de 3 a 5 salários (30 - 32,9% e 24 - 38,1%), seguida de nove ou mais (22 - 24,1% e 15 - 23,8%), sendo os grupos homogêneos. No primeiro ano foi mais frequente a despesa pessoal inferior a um salário mínimo (52 - 57,1% vs. 25 - 39,7%), e, no último ano, foi de um a dois (26 - 26,8% vs. 27 - 42,8%), com diferença borderline entre os grupos.

Maior percentual do primeiro ano (89 - 97,8%) frequentava o curso de 5 a 6 dias por semana comparado ao do último ano (33 - 52,4%), sendo essas variáveis dependentes. Houve predomínio da realização de atividade extraclasse para o grupo do primeiro (87 - 95,6%) e do último ano (58 - 92,1%), e os grupos foram homogêneos quanto a essa variável. Verificou-se carga horária semestral maior ou igual a 400 horas tanto no primeiro (89 - 97,8%) quanto no último ano (32 - 50,8%). No entanto, maior proporção de estudantes no último ano possuía carga horária menor que 400 horas em relação ao primeiro ano (2 - 2,2% vs. 31 - 49,2%), havendo relação estatisticamente significante entre essa variável e ano em curso.

A consistência interna dos domínios do AEEE foi estimada pelo Alfa de Cronbach, obtendo-se o valor de 0,76 para o domínio 1 (Realização das Atividades Práticas), 0,80 para o domínio 2 (Comunicação Profissional), 0,68 para o domínio 3 (Gerenciamento do Tempo), 0,75 para o domínio 4 (Ambiente), 0,79 para o domínio 5 (Formação Profissional) e 0,59 para o domínio 6 (Atividade Teórica). A correlação entre os itens nos domínios 1, 2, 4, 5 mostrou-se boa, com um alfa superior a 0,70; no domínio 2, a correlação entre os itens foi mais forte (alfa=0,80). Nos domínios 3 e 6, a correlação entre os itens foi mais baixa (alfa < 0,70).

Quanto ao nível de estresse, os dados da Tabela 1 mostram tendência a um maior nível em estudantes do último ano comparados aos do primeiro, em quatro dos seis domínios: Realização das Atividades Práticas, Comunicação Profissional, Ambiente e Formação Profissional.

Tabela 1
Classificação dos níveis de estresse entre estudantes de enfermagem do primeiro e último ano letivo segundo domínios da AEEE - Salvador, BA, Brasil, 2017.

Domínios	Nível de classificação da intensidade de estresse						valor de p(a)
	1o ano			Último ano
	Baixo	Médio	Alto/Muito Alto	Baixo	Médio	Alto/Muito Alto
	n (%)	n (%)	n (%)	n (%)	n (%)	n (%)
Realização das Atividades Práticas	71 (78,0)	11 (12,1)	9 (9,9)	26 (41,3)	24 (38,1)	13 (20,6)	0,00
Itens: 4, 5, 7, 9, 12, 21
Comunicação Profissional	74 (81,3)	7 (7,7)	10 (11,0)	20 (31,7)	17 (27,0)	26 (41,2)	0,00
Itens: 6, 8, 16, 20
Gerenciamento do Tempo	53 (58,2)	26 (28,6)	12 (13,2)	35 (55,6)	19 (30,2)	9 (14,3)	0,80
Itens: 3, 18, 23, 26, 30
Ambiente	64 (70,3)	20 (22,0)	7 (7,7)	23 (36,5)	15 (23,8)	25 (39,6)	0,00
Itens: 11, 22, 24, 29
Formação Profissional	65 (71,4)	8 (8,8)	18 (19,8)	15 (23,8)	7 (11,1)	41 (65,1)	0,00
Itens: 1, 15, 17, 19, 25, 27
Atividade teórica	42 (46,1)	37 (40,7)	12 (13,2)	41 (65,1)	16 (25,4)	6 (9,5)	0,06
Itens: 2, 10, 13, 14, 28

• ^(a) Teste de Tendência Linear.
• Nota: (n=154).

No Domínio 1, Realização das Atividades Práticas, observou-se maior tendência a níveis mais elevados de estresse em estudantes do último quando comparados aos do primeiro ano (p=0,00). Predominou o baixo nível de estresse em estudantes do primeiro ano (71 - 78,0%) e, embora esse nível tenha também predominado no último ano (26 - 41,3%), observaram-se frequências mais elevadas de níveis médio e alto/muito alto de estresse nos concluintes.

No Domínio 2, Comunicação Profissional, também se constatou tendência a maior nível de estresse em estudantes em fase final do curso (p=0,00). Houve maior proporção de baixo nível de estresse em estudantes do primeiro ano, enquanto naqueles do último ano verificou-se maior proporção de níveis alto e muito alto de estresse.

No Domínio 3, Gerenciamento do Tempo, não houve tendência a maior nível de estresse entre os dois grupos. Notou-se que mais da metade dos estudantes do primeiro e último ano pontuou baixo nível de estresse, seguido do médio.

No Domínio 4, Ambiente, constatou-se tendência a níveis mais elevados de estresse no último ano (p=0,00). Houve predomínio de baixo nível de estresse no primeiro ano e de alto/muito alto nível nos estudantes do último ano.

No Domínio 5, Formação Profissional, também foi verificada maior tendência para níveis mais elevados de estresse nos estudantes em fase de conclusão do curso (p=0,00). Predominou baixo nível de estresse no primeiro ano e níveis alto/muito alto no último ano.

No Domínio 6, Atividade Teórica, predominou tanto para estudantes do primeiro como do último ano o baixo e médio nível de estresse. Todavia, uma maior proporção do baixo nível foi identificada no último ano (p=0,06).

DISCUSSÃO

O presente estudo enfocou o nível de estresse em uma população jovem e com predomínio de mulheres, pois a presença feminina em cursos de Enfermagem ainda prevalece, mesmo após a inserção de homens na profissão^{7), (13)- (14}.

Investigação sobre características sociodemográficas de universitários de enfermagem identificou um perfil predominantemente jovem, na faixa etária entre 20 e 24 anos, semelhante a este estudo¹⁵. A identificação de maior proporção de estudantes em faixa etária maior no último ano pode ser justificada pelo tempo decorrido do curso, tendo em vista a sua duração, de 5 anos.

Os universitários eram majoritariamente solteiros, contudo, uma maior proporção do último ano tinha companheiro(a) fixo(a), o que pode relacionar-se ao fato de que pessoas com mais idade tentem estreitar os laços afetivos e consolidar um relacionamento mais sério, constituir família, entre outras transições importantes que coincidem também com a transição dos últimos períodos acadêmicos para a fase da vida profissional⁹.

A prevalência de autodeclarados negros justifica-se pela realização do estudo no estado da Bahia, região marcada pela origem afrodescendente, uma vez que Salvador é a cidade com o maior número deles fora da África¹⁶.

A renda prevalente foi de três a cinco salários mínimos, e a despesa pessoal mensal inferior a um salário. Estudo com universitários de enfermagem evidenciou renda mensal semelhante, mencionando que o fato de o curso ser integral, com mais de um turno preenchido com atividades acadêmicas¹⁴, diminui as chances de o estudante trabalhar e aumentar sua renda^{14), (17}.

Quanto à carga horária, embora tenha sido superior a 400 horas para ambos os grupos, convém ressaltar que o último ano apresentou carga horária em campo de estágio expressivamente maior do que o primeiro ano: a carga horária prática, no local do estudo, foi de 323 horas no primeiro ano e de 918 horas no último ano. Inclusive verificou-se que o número de dias e turnos que os estudantes do último ano frequentavam a universidade era menor do que os do primeiro ano, tendo em vista a ida diretamente para as instituições de saúde onde desenvolviam as atividades práticas.

Este estudo ratifica outras investigações que evidenciaram que o estresse está presente desde o período inicial da formação profissional, na medida em que o estudante se depara com situações desafiadoras que interferem no processo de aprendizado e nas condições de saúde^{12), (17}. Neste estudo, constatou-se tendência a maior nível de estresse em estudantes do último ano comparados aos do primeiro ano em quatro dos seis domínios da escala, os quais se referiram à Realização das Atividades Práticas, Comunicação Profissional, Ambiente e Formação Profissional.

No domínio Realização das Atividades Práticas, o maior nível de estresse foi constatado em estudantes do último ano, o que se deve possivelmente ao fato de estarem mais expostos às atividades em campo clínico, uma vez que no currículo vigente na instituição de estudo a carga horária em atividades práticas é inferior para os discentes do primeiro ano do curso. Outra razão pode ser associada ao fato de que são exigidas competências e habilidades práticas mais complexas, assim como maior responsabilidade com o avanço da formação ao longo do curso. Esses dados mostram que, mesmo com a experiência prévia dos estudantes, o nível de estresse nesse grupo ainda é alto. Diferentemente dos achados deste estudo, outra investigação mostrou que o nível de estresse no domínio Realização de Atividades Práticas foi mais elevado no sexto semestre, comparado ao sétimo e ao nono semestres, indicando que o avanço na formação reduz a insegurança no cuidado direto ao cliente¹⁸.

No domínio Comunicação Profissional também predominou o baixo nível de estresse em estudantes do primeiro ano, enquanto naqueles do último ano verificou-se tendência a maior nível. Tal fato pode estar associado à maior permanência dos estudantes do último ano em campo de prática e, portanto, em interação mais constante com a equipe de saúde, bem como pela maior sensibilidade de perceberem a trama das relações em seu entorno devido a experiências pregressas e às exigências do processo de formação na coordenação do processo de cuidar em enfermagem. A comunicação e a relação com colegas e com a equipe de saúde representam alto nível de estresse aos universitários de enfermagem, pois são em geral jovens, sendo possível que apresentem menos experiência no trato direto com pessoas e maior dificuldade em lidar com as questões assistenciais junto aos profissionais de saúde. Acrescenta-se a isso que a competitividade na busca pelo conhecimento e as diferenças individuais entre colegas de curso também podem ser causas de conflitos no contexto assistencial¹³. O nível de estresse de alto a muito alto identificado nesse domínio para quase metade dos estudantes do último ano salienta a importância de o processo de formação desenvolver junto a eles estratégias positivas para o enfrentamento do estresse inerente ao relacionamento com a equipe de saúde.

No Domínio 3, Gerenciamento do Tempo, mais da metade dos estudantes do primeiro e do último ano pontuaram baixo nível de estresse, não havendo tendência a maior nível entre os dois grupos, o que indica que possivelmente existe um certo equilíbrio entre o tempo despendido para estar com familiares, para o convívio social, lazer, descanso e as demandas das atividades acadêmicas. Estudo que avaliou o nível de estresse em estudantes de todos os períodos de um curso de graduação em enfermagem, utilizando a mesma escala de estresse, verificou predominância de baixo nível de estresse (60,4%), corroborando os achados desta investigação¹⁹.

No Domínio 4, Ambiente, o predomínio de baixo nível de estresse no primeiro ano e a tendência a níveis mais elevados no último ano mostrou que os estudantes concluintes estavam mais expostos a estressores, como a distância entre a faculdade e os campos de prática e o local de moradia e a dependência de transporte público para chegar às instituições de saúde. Evidencia-se situações de estresse provocadas pela mobilidade urbana comprometida, pelo tempo perdido em longos congestionamentos. Outra investigação confirma esses achados, pois esse domínio foi considerado de maior estresse para os discentes que tinham aulas práticas em bairros mais afastados da universidade e que utilizavam mais o transporte coletivo²⁰.

Em relação ao Domínio 5, Formação Profissional, o predomínio do baixo nível de estresse no primeiro ano e a tendência a níveis mais elevados nos estudantes em fase de conclusão do curso podem ser justificados pelo fato de os concluintes estarem numa fase da formação em que há maior preocupação com a futura inserção no mercado de trabalho, maior valorização da assimilação de conhecimentos teóricos e práticos para o exercício profissional, a antecipação da vivência de situações que se aproximam mais do papel do enfermeiro, entre outras razões. Outros estudos também evidenciaram baixo nível de estresse relacionado à Formação Profissional nos primeiros semestres, no entanto, há um maior de estresse à medida que o estudante de enfermagem avança nos períodos da graduação, uma vez que aumenta sua preocupação com o término do curso e com sua futura atuação não mais como discente, mas sim como enfermeiro¹⁹.

No Domínio 6, Atividade teórica, o maior nível de estresse identificado nos ingressantes pode ser relacionado ao fato de que ao iniciar o curso sentem-se mais inseguros em realizar provas, cumprir as atividades acadêmicas, além da maior dificuldade de assimilação de conteúdo teórico pela pouca vivência nos campos de prática. A maioria dos estudantes do último ano vivenciou pouco as situações de estresse expressas nos itens desse domínio, podendo este fato estar relacionado à maior carga horária concentrada nas atividades práticas, em detrimento das avaliações e atividades teóricas. Outro estudo evidenciou que o grau de dificuldade relacionado ao conteúdo programático e a metodologia de ensino foram percebidos como menor fonte de estresse quanto mais avançada a série do estudante¹⁹.

Os resultados desta investigação evidenciaram que é um desafio para as instituições de ensino ajudar os universitários de enfermagem a enfrentar com menor nível de estresse os estressores relacionados a exigências administrativas das instituições de saúde, ao processo de trabalho em enfermagem, assim como os associados ao desempenho das atividades de liderança e assistenciais que os colocam em interação com conflitos éticos com pessoas em condições críticas de saúde no contexto de ambientes que apresentam condições precárias para o exercício profissional. É preciso oferecer a oportunidade de diálogo com os universitários de enfermagem sobre os estressores presentes no processo de formação e ajudá-los na adoção de estratégias de enfrentamento que minimizem o sofrimento e potencializem o desempenho acadêmico.

Destacam-se como limitações deste estudo poucas pesquisas sobre a temática, comparando universitários ingressantes e concluintes do curso, assim como o desenho transversal e a utilização da amostragem por conveniência, não permitindo estabelecer relações de causa e efeito. Além disso, o estudo foi desenvolvido em uma única universidade pública do estado da Bahia.

Assim, o estudo aponta a necessidade de ampliação da investigação para os demais anos do curso, bem como a permanência de uma política institucional que assegure o controle de estressores no processo de formação de estudantes.

Sugere-se ainda a ampliação da amostra para a avaliação do nível de estresse em estudantes de enfermagem de todos os semestres do curso e de escolas privadas, em diversas regiões do país, para que os resultados possam ser confrontados com outras características sociodemográficas, acadêmicas e comportamentais. Outras pesquisas poderão abranger estudantes universitários das diversas áreas do conhecimento.

CONCLUSÃO

Houve predomínio de níveis mais elevados de estresse em estudantes do último ano comparados aos do primeiro ano em quatro dos seis domínios da AEEE, a saber: Realização das Atividades Práticas, Comunicação Profissional, Ambiente e Formação Profissional.

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• Apoio financeiro Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Processo n. 309092/2015-9.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  03 Jun 2019
• Data do Fascículo
  2019

Histórico

• Recebido
  16 Jul 2017
• Aceito
  31 Out 2018