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Realidade virtual no alívio da dor durante a troca de curativos de feridas crônicas

RESUMO

Objetivo:

Avaliar o efeito da realidade virtual no alívio da dor durante a troca de curativos de feridas crônicas.

Método:

Estudo experimental realizado com 17 participantes, em ambulatório de estomaterapia no Ceará, Brasil, de junho a dezembro de 2019, com utilização de óculos de realidade virtual Oculus Go ®. Coletaram-se informações sociodemográficas, clínicas, de hábitos de vida e sobre as características das lesões. Utilizou-se escala de faces e visual analógica para avaliação da dor, avaliação de aspectos comportamentais, satisfação e incômodo do Oculus Go ®. Utilizaram-se os testes Qui-quadrado, McNemar e Wilcoxon. O estudo foi aprovado sob parecer de nº 2.649.144/2019.

Resultados:

Houve redução da dor na troca de curativo com Oculus Go ®. Os participantes com Oculus Go ® manifestaram menos dor durante (p < 0,001) e após (p < 0,001) a troca de curativos; e apresentaram menor frequência cardíaca antes (p = 0,044) e após (p = 0,001) o procedimento. Houve diferenças significativas entre os grupos nos valores da pressão arterial sistólica (p = 0,012) e diastólica (p = 0,004) após o curativo. A realidade virtual não causou incômodo e os participantes mostraram-se satisfeitos.

Conclusão:

A realidade virtual apresentou efeitos positivos no alívio da dor durante a troca de curativos de feridas crônicas.

DESCRITORES
Realidade Virtual; Imageamento Tridimensional; Dor; Ferimentos e Lesões; Satisfação do Paciente

ABSTRACT

Objective:

To assess the effect of virtual reality in pain relief during chronic wound dressing change.

Method:

This is an experimental study carried out with 17 participants, in a stomatherapy clinic in Ceará, Brazil, from June to December 2019, using the virtual reality glasses Oculus Go®. Sociodemographic and clinical information, as well as of lifestyle, and characteristics of the lesions were collected. A faces scale and a visual analogue scale were used for pain assessment, behavioral aspects assessment, satisfaction, and discomfort with Oculus Go®. The Chi-square, McNemar, and Wilcoxon tests were used. The study was approved under opinion No. 2.649.144/2019.

Results:

There was a reduction in pain during dressing change with Oculus Go®. Participants with Oculus Go® manifested less pain during (p < 0.001) and after (p < 0.001) dressing change; and had lower heart rate before (p = 0.044) and after (p = 0.001) the procedure. There were significant differences between groups in systolic (p = 0.012) and diastolic (p = 0.004) blood pressure values after dressing. Virtual reality did not cause any discomfort and participants were satisfied.

Conclusion:

Virtual reality showed positive effects in pain relief during chronic wound dressing change.

DESCRIPTORS
Virtual Reality; Imaging, Three-Dimensional; Pain; Wounds and Injuries; Patient Satisfaction

RESUMEN

Objetivo:

Evaluar el efecto de la realidad virtual en el alivio del dolor durante el cambio de vendajes de heridas crónicas.

Método:

Estudio experimental realizado con 17 participantes, en ambulatorio de estomaterapia en Ceará, Brasil, de junio a diciembre de 2019, con utilización de gafas de realidad virtual Oculus Go ®. Fue posible reunir informaciones sociodemográficas, clínicas, hábitos de vida y características de las lesiones. Fueron utilizadas la escala de faces y la visual analógica para evaluar el dolor, se realizó una evaluación de aspectos comportamentales, de satisfacción e incómodo del Oculus Go ®. Fueron utilizados los testes Chi-cuadrado, McNemar y Wilcoxon. El estudio fue aprobado bajo la licencia de nº 2.649.144/2019.

Resultados:

Hubo reducción del dolor en el cambio de vendaje con Oculus Go ®. Los participantes con Oculus Go ® manifestaron menos dolor durante (p < 0,001) y después (p < 0,001) del cambio de vendajes; y presentaron menor frecuencia cardíaca antes (p = 0,044) y después (p = 0,001) del procedimiento. Hubo diferencias significativas entre los grupos en los valores de la tensión arterial sistólica (p = 0,012) y diastólica (p=0,004) después del vendaje. La realidad virtual no generó incómodo y los participantes demostraron satisfacción.

Conclusión:

La realidad virtual presentó efectos positivos en el alivio del dolor durante el cambio de vendajes de heridas crónicas.

DESCRIPTORES
Realidad Virtual; Imagenología Tridimensional; Dolor; Heridas y Lesiones; Satisfacción del Paciente

INTRODUÇÃO

As feridas crônicas são lesões que frequentemente estagnam na fase inflamatória ou apresentam fase proliferativa prejudicada, o que promove aumento no tempo de cicatrização, podendo levar meses ou anos(11. Haalboom M. Chronic Wounds: Innovations in Diagnostics and Therapeutics. Curr Med Chem. 2018;25(41):5772-81. DOI: http://dx.doi.org/10.2174/0929867324666170710120556.
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). Embora seja difícil de cicatrizar, uma compreensão da fisiopatologia subjacente e atenção específica podem, muitas vezes, levar a cura bem-sucedida(22. Frykberg RG, Banks J. Challenges in the Treatment of Chronic Wounds. Adv Wound Care (New Rochelle). 2015;4(9):560–82. DOI: http://dx.doi.org/10.1089/wound.2015.0635.
http://dx.doi.org/10.1089/wound.2015.063...
).

A prevalência de feridas crônicas está em aumento constante e frequentemente essas feridas estão associadas a dores significativas, com grande impacto na qualidade de vida(33. Park SH, Ferreira KASL, Santos VLCG. Understanding pain and quality of life for patients with chronic venous ulcers. Wounds [Internet]. 2008 [cited 2021 May 14];20(1):309–11. Available from: http://europepmc.org/article/med/25941830.
http://europepmc.org/article/med/2594183...
). Estudos mostram prevalência entre 0,16 e 1,2%(44. Borges EL, Nascimento Filho HM, Pires Júnior JF. Prevalência de lesões crônicas de município da zona da mata mineira (Brasil). Rev Min Enferm. 2018;22:e-1143. DOI: http://dx.doi.org/10.5935/1415-2762.20180074.
http://dx.doi.org/10.5935/1415-2762.2018...
,55. Heyer K, Herberger K, Protz K, Glaeske G, Augustin M. Epidemiology of chronic wounds in Germany: Analysis of statutory health insurance data. Wound Repair Regen. 2016;24(2):434-42. DOI: http://dx.doi.org/10.1111/wrr.12387.
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) de pessoas com feridas crônicas. Cerca de 80% das pessoas que apresentam feridas relatam algum nível de dor(66. Salvetti MG, Costa IK, Dantas DV, Freitas CC, Vasconcelos QL, Torres GV. Prevalence of pain and associated factors in venous ulcer patients. Rev Dor. 2014;15(1):17-20. DOI: https://doi.org/10.5935/1806-0013.20140005.
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).

A dor experimentada por pessoas com feridas crônicas é persistente, recalcitrante e incapacitante,(77. Woo KY, Sibbald RG. Chronic wound pain: a conceptual model. Adv Skin Wound Care. 2008;21(4):175-88. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/01.ASW.0000305430.01413.2e.
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) e pode ocorrer até mesmo em repouso, de forma contínua ou intermitente, e não cessa apesar do uso de fármacos analgésicos comumente utilizados(66. Salvetti MG, Costa IK, Dantas DV, Freitas CC, Vasconcelos QL, Torres GV. Prevalence of pain and associated factors in venous ulcer patients. Rev Dor. 2014;15(1):17-20. DOI: https://doi.org/10.5935/1806-0013.20140005.
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).

Pessoas com feridas crônicas sentem mais dor durante a realização das trocas de curativos(88. Hua Y, Qiu R, Yao WY, Zhang Q, Chen XL. The Effect of Virtual Reality Distraction on Pain Relief During Dressing Changes in Children with Chronic Wounds on Lower Limbs. Pain Manag Nurs. 2015;16(5):685-91. DOI: https://doi.org/10.1016/j.pmn.2015.03.001.
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). No momento da troca, o trauma na retirada das coberturas primárias para a substituição, procedimentos de limpeza e toques repetidos no leito da lesão são fatores que promovem dor moderada a intensa(99. Gardner SE, Abbott LI, Fiala CA, Rakel BA. Factors associated with high pain intensity during wound care procedures: A model. Wound Repair Regen. 2017;25(4):558-63. DOI: https://doi.org/10.1111/wrr.12553.
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).

A manipulação mecânica durante o procedimento de substituição de curativos estimula nociceptores, que são sensibilizados por meio de receptores sensoriais que respondem a pressão e outros estímulos mecânicos, presentes no leito da ferida, e promove maior estímulo de dor(99. Gardner SE, Abbott LI, Fiala CA, Rakel BA. Factors associated with high pain intensity during wound care procedures: A model. Wound Repair Regen. 2017;25(4):558-63. DOI: https://doi.org/10.1111/wrr.12553.
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).

Dessa forma, a experiência da dor durante a troca de curativos é subjetiva e pode ser influenciada por vários fatores psicológicos. Estudo brasileiro que avaliou a dor em feridas crônicas durante a troca de curativo identificou dor do tipo latejante de intensidade moderada, principalmente durante a retirada do curativo anterior e limpeza do leito da lesão(1010. Oliveira PFT, Tatagiba BSF, Martins MA, Tripple AFV, Pereira LV. Assessment of pain during leg ulcers’ dressing change. Text Context Nursing. 2012;21(4):862-9. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-07072012000400017.
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).

Atualmente, muitos pesquisadores concentram-se principalmente em analgésicos e materiais de curativo para aliviar a dor(88. Hua Y, Qiu R, Yao WY, Zhang Q, Chen XL. The Effect of Virtual Reality Distraction on Pain Relief During Dressing Changes in Children with Chronic Wounds on Lower Limbs. Pain Manag Nurs. 2015;16(5):685-91. DOI: https://doi.org/10.1016/j.pmn.2015.03.001.
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). Contudo, o manejo desse tipo de dor requer a utilização de novos planos de tratamento para atingir analgesia eficaz e redução da necessidade de analgésicos, considerando seus efeitos colaterais e possíveis interações(1111. Spiegel B, Fuller G, Lopez M, Dupuy T, Noah B, Howard A, et al. Virtual reality for management of pain in hospitalized patients: A randomized comparative effectiveness trial. PLoS One. 2019;14(8):e0219115. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0219115.
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).

Novos esforços têm sido feitos para desenvolver terapias não farmacológicas para modulação da dor, que afetem os fatores psicológicos, incluindo tecnologias emergentes inovadoras, como é o caso da Realidade Virtual (RV)(1111. Spiegel B, Fuller G, Lopez M, Dupuy T, Noah B, Howard A, et al. Virtual reality for management of pain in hospitalized patients: A randomized comparative effectiveness trial. PLoS One. 2019;14(8):e0219115. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0219115.
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,1212. Freitas DM, Spadoni VS. A realidade virtual é útil para manejo da dor em pacientes submetidos a procedimentos médicos? Einstein (São Paulo). 2019;17(2):1-3. DOI: https://doi.org/10.31744/einstein_journal/2019MD4837.
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) que tem sido apontada como uma tecnologia com potencial de servir como tratamento não farmacológico para a dor(1313. Lier EJ, Oosterman JM, Assmann R, Vries M, Van Goor H. The effect of Virtual Reality on evoked potentials following painful electrical stimuli and subjective pain. Sci Rep. 2020;10(1):1-10. DOI: https://doi.org/10.1038/s41598-020-66035-4.
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).

A RV é um aparato tecnológico que promove interação entre humanos e ambiente virtual, fornecendo ao usuário um lugar digital onde ele pode ser colocado e viver uma experiência sintética, mas realista(1212. Freitas DM, Spadoni VS. A realidade virtual é útil para manejo da dor em pacientes submetidos a procedimentos médicos? Einstein (São Paulo). 2019;17(2):1-3. DOI: https://doi.org/10.31744/einstein_journal/2019MD4837.
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).

A RV caracteriza-se como uma abordagem de distração, baseada na psicologia imersiva e envolvente, com capacidade de desviar a atenção dos nociceptores, e consequentemente, das percepções dolorosas, por meio da distração visual e auditiva, que faz com que usuários não prestem atenção ao estímulo da dor, por estarem imersos em outro cenário virtual(1414. Kucyi A, Davis KD. The dynamic pain connectome. Trends Neurosci. 2015;38(2):86-95. DOI: https://doi.org/10.1016/j.tins.2014.11.006.
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).

A RV diminui as amplitudes de processamento do córtex cerebral após estímulos dolorosos, que estão relacionados à modulação precoce de estímulos sensoriais, associados à percepção dos estímulos nociceptivos e processamento da dor. Assim, o objetivo da tecnologia de RV é fornecer aos usuários uma sensação de presença em ambiente simulado e produzir uma experiência imersiva que possa distrair o processamento cortical dos estímulos dolorosos(1313. Lier EJ, Oosterman JM, Assmann R, Vries M, Van Goor H. The effect of Virtual Reality on evoked potentials following painful electrical stimuli and subjective pain. Sci Rep. 2020;10(1):1-10. DOI: https://doi.org/10.1038/s41598-020-66035-4.
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).

Geralmente, os sistemas de RV são compostos por hardware (fones de ouvido, óculos, luvas, computadores e dispositivos móveis) e softwares que oferecem um ambiente de RV em múltiplos contextos, como praias, florestas, parques de diversão, entre outros, tornando-se uma ferramenta relevante de baixo custo e promissora para o manejo da dor(1212. Freitas DM, Spadoni VS. A realidade virtual é útil para manejo da dor em pacientes submetidos a procedimentos médicos? Einstein (São Paulo). 2019;17(2):1-3. DOI: https://doi.org/10.31744/einstein_journal/2019MD4837.
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).

Estudos consultados inferem que a RV apresentou eficácia no alívio da dor em pessoas submetidas a procedimentos dolorosos, como troca de curativos de pós-operatórios(1515. Ding J, He Y, Chen L, Zhu B, Cai Q, Chen K, et al. Virtual reality distraction decreases pain during daily dressing changes following haemorrhoid surgery. J Int Med Res. 2019;47(9):4380-88. DOI: https://doi.org/10.1177/0300060519857862.
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) e queimaduras(1616. Scapin SQ, Echevarría-Guanilo ME, Fuculo Junior PRB, Martins JC, Barbosa MV, Pereima MJL. Use of virtual reality for treating burned children: case reports. Rev Bras Enferm. 2017;70(6):1291-5. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0575.
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). Isso reporta a relevância de utilizar novas tecnologias de RV que possam contribuir com a “distração” dos nociceptores durante a substituição de curativos e, assim, reduzir os níveis de dor.

No entanto, até o momento, não foram evidenciados estudos referentes ao impacto ou eficácia da RV no alívio da dor durante a troca de curativos em adultos com feridas crônicas, o que torna fundamental o desenvolvimento de publicações, levando em consideração o bem-estar do paciente e uma nova estratégia autônoma dos profissionais de saúde para minimização da dor. O estudo reverbera na hipótese de que o uso da RV durante a troca de curativos de feridas crônicas favorece o alívio da dor.

O objetivo do estudo foi avaliar o efeito da realidade virtual no alívio da dor durante a troca de curativos de feridas crônicas.

MÉTODO

Desenho do Estudo

Estudo experimental com comparação intrasujeitos, de desenho pré e pós-teste, com grupo comparativo randomizado e rotativo, do tipo cross-over, para avaliação do efeito da RV. Neste estudo, o efeito desejado é a redução da dor durante a troca de curativos por meio do uso de RV.

Cenário

O estudo foi desenvolvido em ambulatório de estomaterapia no estado do Ceará, Brasil. O referido ambulatório é referência para 13 cidades localizadas na região do Maciço de Baturité.

População

A população-alvo foi representada por pessoas com feridas crônicas, as quais apresentam processo de cicatrização difícil, ultrapassando a duração de seis semanas, frequentemente dolorosas e que apresentam complexidade no alívio da dor(1717. Markova A, Mostow EN. US skin disease assessment: ulcer and wound care. Dermatol Clin. 2012;30(1):107-11. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.det.2011.08.005.
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).

Desse modo, foi efetuado o cálculo para amostras finitas e adotou-se o percentual de 1,2% e calculou-se 80%(66. Salvetti MG, Costa IK, Dantas DV, Freitas CC, Vasconcelos QL, Torres GV. Prevalence of pain and associated factors in venous ulcer patients. Rev Dor. 2014;15(1):17-20. DOI: https://doi.org/10.5935/1806-0013.20140005.
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) deste percentual para chegar à expectativa de frequência para o cálculo amostral (0,96%). Considerando margem de erro de 5% e nível de confiança de 95%, chegou-se ao N de sujeitos para o estudo de 15 participantes.

Foram incluídas no estudo pessoas de idade igual ou superior a 18 anos, com feridas crônicas e presença de dor leve, intensa ou moderada e que tivessem disponibilidade para comparecer no ambulatório em dias pré-estabelecidos.

Foram considerados como critérios de exclusão não ter acuidade auditiva (surdos) avaliada por meio do Índice Percentual de Reconhecimento de Fala (IPRF);(1818. Calais LL, Russo ICP, Borges ACLC. Desempenho de idosos em um teste de fala na presença de ruído. Pró-Fono Revista de Atualização Científica [Internet]. 2008 [cited 2021 Mar 22];20(3):147-52. Available from: https://www.scielo.br/pdf/pfono/v20n3/02.pdf.
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) não ter acuidade visual suficiente (pessoas com baixa visão e não videntes) avaliada por meio da Escala de Snellen; sonolência; estar sob efeito de álcool ou drogas e lesões à altura dos olhos. Destaca-se que o uso de lentes corretivas não impossibilitou o uso do Oculus Go ®, o qual é adaptável por cima dos óculos, apesar de serem projetados para funcionar melhor em pessoas com visão perfeita. Ademais, problemas com baixa capacidade auditiva foram corrigidos com seleção de volume máximo dos sons do Oculus Go ®. Após aplicação dos critérios de elegibilidade, 17 pessoas participaram do estudo. Não houve perdas amostrais.

Após considerar a amostra randomizada e rotativa, cada indivíduo foi identificado por uma letra grega (alfa, beta… ómicron) para evitar códigos que pudessem ser associados à identificação de cada grupo. Foram montados dois grupos (controle e intervenção) e cada um desses grupos passou por duas observações, uma com uso de RV e outra sem RV, caracterizando o cross-over.

No primeiro momento, foi realizada a randomização, em que cada participante teve 50% de chance de se enquadrar em qualquer um dos dois grupos montados, sendo a seleção de cada grupo realizada pela opção “aleatório” presente no programa Excel 2019. Após a realização do sorteio para definir onde cada participante seria alocado inicialmente, realizava-se o curativo conforme protocolo do ambulatório, sendo que um dos grupos utilizou o dispositivo para RV e o outro não fez o seu uso. No segundo momento, houve inversão entre os membros dos grupos em que os participantes do grupo intervenção passaram a compor o grupo controle e os participantes do grupo controle foram alocados para o grupo de intervenção. Dessa forma, todos os sujeitos tiveram a oportunidade de participar da intervenção. O tempo transcorrido entre as duas observações foi de sete dias.

A intervenção ocorreu por meio da utilização de óculos reprodutores de imagem tridimensional e som estereofônico Oculus Go ®, que possuem duas telas com resolução 2560 x 1440, painéis LCD, lentes com o mesmo campo de visão e áudio espacial integrado em 3D que causa o efeito de imersão sonora. O Oculus Go ® rastreava os movimentos dos usuários por meio de visão computacional, que permitiu experiência imersiva em lugares paradisíacos e realísticos, a saber: Praias (Baía de Wineglass e 12 apóstolos, ambas na Austrália; Tropical Beach Escape, Filipinas; Fern Bern e Fantail Falls, Nova Zelândia), Campo (Northern Lights, Estados Unidos; Forest Creek, Alemanha; Terraços de arroz, Filipinas) e Parque Nacional (Glenn Canyon, Estados Unidos), com imagens de vídeo em 360° e sons espaciais específicos de cada lugar. Cada participante foi previamente consultado sobre o cenário de preferência.

A ocasião da troca de curativos foi escolhida para a utilização da RV, considerando que esse é o momento que apresenta maior intensidade dolorosa, devido ao manuseio da lesão(99. Gardner SE, Abbott LI, Fiala CA, Rakel BA. Factors associated with high pain intensity during wound care procedures: A model. Wound Repair Regen. 2017;25(4):558-63. DOI: https://doi.org/10.1111/wrr.12553.
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,1010. Oliveira PFT, Tatagiba BSF, Martins MA, Tripple AFV, Pereira LV. Assessment of pain during leg ulcers’ dressing change. Text Context Nursing. 2012;21(4):862-9. DOI: https://doi.org/10.1590/S0104-07072012000400017.
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). Vale ressaltar que os pacientes não recebiam analgésicos antes das trocas de curativos e eram orientados a não ingerir medicamentos analgésicos 24 horas antes de virem à consulta, exceto, em caso de indicação médica devido a dor persistente.

O curativo foi realizado por meio de técnica asséptica com uso de luvas cirúrgicas. Utilizou-se protocolo próprio do ambulatório, que compreende a remoção das coberturas para substituição, limpeza do leito da lesão com soluções líquidas (soro fisiológico a 0,9% e polihexanida em temperatura ambiente), desbridamento instrumental conservador com lâmina de bisturi de carbono n° 15, inserção da cobertura primária e oclusão secundária da lesão conforme indicação de enfermeiro especialista em estomaterapia e dermatologia. Todos os curativos foram realizados pelo mesmo enfermeiro (não cego para curativos e aplicação da intervenção). A realização das trocas de curativos durou em média 22 minutos. Um segundo enfermeiro era responsável por coletar os dados do estudo.

Coleta de Dados

A coleta de dados ocorreu de junho a dezembro de 2019 no ambulatório de estomaterapia, o qual possui duas salas com boa iluminação e equipamento de ar-condicionado com controle remoto, para permitir a temperatura padrão de 26ºC em todos os atendimentos. Utilizou-se formulário com informações sociodemográficas (idade, sexo, raça, ocupação, escolaridade); características clínicas e hábitos de vida (diabetes mellitus, hipertensão arterial, tabagismo e etilismo), características das lesões (tipo de pele – saudável, muito fina, seca, descorada, úmida ou com edema); tipo de ferida (úlcera venosa, úlcera arterial, lesão por pressão, úlcera neurotrófica, pé diabético ou outra); aparência (necrosada, infectada, granulada ou epitelizada); borda (eritema, calor, endurecida, rompimento, descamada ou seca); descolamento da borda (presente ou ausente); tratamento tópico (hidrogel, papaína, alginato de cálcio, hidrofibra com prata, colagenase, ácidos graxos essenciais, sulfadiazina de prata ou outras coberturas sem componente ou medicamento com substância analgésica); e tipo de dor (aguda não-cíclica – durante o desbridamento, aguda cíclica – durante a remoção da cobertura e dor crônica – persistente e constante). Todas as características das lesões foram avaliadas por enfermeiro especialista em estomaterapia e dermatologia.

Foi utilizada a Escala de Dor de Faces(1919. Pereira LV, Sousa FAEF. Mensuração e avaliação da dor pós-operatória: uma breve revisão. Rev Latino Am Enfermagem [Internet]. 1998 [cited 2021 May 14];6(3):77-84. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rlae/v6n3/13894.pdf.
https://www.scielo.br/pdf/rlae/v6n3/1389...
) para avaliação da dor (nenhuma, leve, moderada, incômoda, intensa e insuportável). Os níveis de dor foram mensurados pela Escala Visual Analógica (EVA)(2020. Martinez JE, Grassi DC, Marques LG. Análise da aplicabilidade de três instrumentos de avaliação de dor em distintas unidades de atendimento: ambulatório, enfermaria e urgência. Rev Bras Reumatol [Internet]. 2011 [cited 2021 May 14];51(4):299-308. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rbr/v51n4/v51n4a02.pdf.
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) de zero a dez (0 = sem dor e 10 = maior dor possível) dois minutos antes de começar o curativo, após o desbridamento e imediatamente após a finalização do procedimento completo. Questionou-se ainda qual a maior e menor intensidade da dor que o paciente sentiu nas últimas 24 horas.

Os dados clínicos (frequência cardíaca, pressão arterial sistólica e diastólica, temperatura e saturação de oxigênio) foram avaliados 60 segundos antes de começar o curativo e imediatamente após sua finalização. Realizou-se avaliação qualitativa de aspectos comportamentais (presença ou ausência de sinais vocais, expressão facial típica de dor, movimentação alterada do corpo, postura de proteção e localização da dor) e alterações fisiológicas (palidez e sudorese) durante o curativo.

Após a finalização completa dos curativos avaliou-se a satisfação ao usar o Oculus Go ® durante o procedimento, por meio de escala tipo likert de cinco pontos (1 – muito insatisfeito; 2 – um pouco satisfeito; 3 – sastisfeito; 4 – muito satisfeito; 5 – bastante satisfeito)(2121. Souza MC, Biazini PLA, Furuta DT, Moliterno AH, Uliam NR, Oliveira DF, et al. A influência da realidade virtual sobre a velocidade da marcha e avaliação da satisfação de indivíduos com doença de Parkinson. Colloq Vitae. 2020;12(3):1-9. DOI: https://doi.org/10.5747/cv.2020.v12.n3.v304.
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). Por considerar a hipótese de que o uso de equipamento na cabeça dos pacientes poderia deixá-los incomodados, também foi avaliado o incômodo ao usar o Oculus Go ® por meio da escala tipo likert de cinco pontos (1 – nada incomodado; 2 – um pouco incomodado; 3 – incomodado; 4 – muito incomodado; 5 – bastante incomodado).

Análise e Tratamento dos Dados

Os dados foram tabulados em planilha de Excel e analisados por meio do software SPSS versão 24. Para as variáveis qualitativas foram calculadas frequência absoluta e relativa. As variáveis quantitativas foram resumidas por meio das estatísticas: média, desvio padrão, quartis, mínimo e máximo. A comparação dos dados obtidos com e sem o uso do RV foram realizadas por meio dos testes Qui-quadrado e McNemar para variáveis do tipo qualitativas e de Wilcoxon para quantitativas. Para todos os procedimentos inferenciais foi adotado um nível de significância de 5%.

Aspectos Éticos

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, sob parecer de nº 2.649.144/2019, seguiu as recomendações da Resolução n.º 466/12, do Conselho Nacional de Saúde, e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Houve predomínio de participantes do sexo masculino (15/88,2%), aposentados (11/64,7%), autodeclarados pardos (10/58,8%) e com ensino fundamental incompleto (10/58,8%). Identificou-se, respectivamente, que 58,8% (n = 10) e 70,6% (n = 13) dos participantes tinham diagnóstico de diabetes mellitus e hipertensão arterial sistêmica. Etilismo e tabagismo não foram hábitos frequentes.

Em relação à avaliação da ferida, houve predominância de participantes com úlceras neuropáticas por diabetes (5/29,4%) e úlceras venosas (5/29,4%), com presença de necrose de liquefação (9/52,9%). O tipo de pele predominante foi a pele com edema (8/47,1%) e úmida (7/41,2%). A dor aguda não-cíclica (durante o desbridamento) foi predominante (10/58,8%).

Na avaliação clínica, houve identificação de participantes com hiperceratose (11/64,7%), lipodermatoesclerose (10/58,8%), claudicação (8/47,1%) e calosidades (07/41,2%). A borda da lesão apresentava eritema e calor em 41,2% (n = 10). O tratamento tópico mais utilizado foi hidrofibra com prata (6/35,3%) e alginato de cálcio (4/23,5%).

Na avaliação dos sinais vitais e escores de dor antes de iniciar o curativo, houve diferença significativa na comparação entre os grupos em relação à frequência cardíaca (p = 0,044), conforme a Tabela 1.

Table 1.
Sinais vitais e dor antes da troca do curativo, segundo o grupo com RV e sem RV – Redenção, CE, Brasil, 2020.

Os dados da Tabela 2 mostram que a avaliação comportamental durante as trocas de curativos apresentou diferenças significantes na expressão facial típica de dor (p = 0,016) e postura de proteção (p = 0,031) na comparação entre grupos. A tabela mostra ainda que os aspectos fisiológicos de expressão facial típica de dor, movimentação alterada do corpo, postura de proteção, sudorese e palidez não demonstraram diferença estatística entre os grupos. Os participantes que utilizaram a RV durante a troca de curativos apresentaram menos dor, quando comparados com o grupo sem RV (Tabela 2).

Table 2.
Aspectos comportamentais, fisiológicos e dor durante a troca de curativo, segundo o grupo com RV e sem RV – Redenção, CE, Brasil, 2020.

A análise da frequência cardíaca após a troca de curativo revelou diferença estatística significativa (p = 0,001) entre os grupos com e sem RV (Tabela 3). Também houve diferenças significativas entre os dois grupos em relação aos valores da pressão arterial sistólica (p = 0,012) e pressão arterial diastólica (p = 0,004) após a finalização do curativo. O grupo que utilizou RV apresentou menos dor após o curativo, com diferença significativa.

Table 3.
Sinais vitais e dor após a troca de curativo, segundo o grupo com RV e sem RV – Redenção, CE, Brasil, 2020.

Os dados da Tabela 4 mostram que a maioria dos participantes ficou bastante satisfeita em utilizar o Oculus Go® durante a troca do curativo (64,7%). Ademais, 94,1% não sentiram nenhum incômodo em utilizar a intervenção.

Table 4.
Satisfação e incômodo do uso da realidade virtual – Redenção, CE, Brasil, 2020.

DISCUSSÃO

No presente estudo, identificou-se que os participantes que utilizaram a RV apresentaram menos dor durante e após a troca de curativos. Estudos consultados corroboram esse achado(1212. Freitas DM, Spadoni VS. A realidade virtual é útil para manejo da dor em pacientes submetidos a procedimentos médicos? Einstein (São Paulo). 2019;17(2):1-3. DOI: https://doi.org/10.31744/einstein_journal/2019MD4837.
https://doi.org/10.31744/einstein_journa...
,2222. Furness PJ, Phelan I, Babiker NT, Fehily O, Lindley SA, Thompson AR. Reducing Pain During Wound Dressings in Burn Care Using Virtual Reality: A Study of Perceived Impact and Usability With Patients and Nurses. J Burn Care Res. 2019;40(6):878-85. DOI: https://doi.org/10.1093/jbcr/irz106.
https://doi.org/10.1093/jbcr/irz106...
). Pesquisadores holandeses identificaram que a intensidade de dor durante a substituição de curativos em crianças e adultos foram estatisticamente menores com o uso de RV(2323. Faber AW, Patterson DR, Bremer M. Repeated use of immersive virtual reality therapy to control pain during wound dressing changes in pediatric and adult burn patients. J Burn Care Res. 2013;34(5):563-8. DOI: https://doi.org/10.1097/BCR.0b013e3182777904.
https://doi.org/10.1097/BCR.0b013e318277...
). Outro estudo(1515. Ding J, He Y, Chen L, Zhu B, Cai Q, Chen K, et al. Virtual reality distraction decreases pain during daily dressing changes following haemorrhoid surgery. J Int Med Res. 2019;47(9):4380-88. DOI: https://doi.org/10.1177/0300060519857862.
https://doi.org/10.1177/0300060519857862...
) com escopo similar demonstrou que a RV imersiva foi eficaz como ferramenta de distração da dor durante a troca de curativo.

A redução da dor durante as trocas de curativos se deve ao desvio da atenção do usuário das sensações dolorosas, pela distração visual e auditiva promovida pela RV. Duas funções primordiais da RV são a distração e a criação de sensação de presença em local simulado. A distração espairece o usuário da situação do mundo real, como procedimentos indutores de dor, e a sensação de presença em local simulado permite que o usuário “experimente” cenário projetado que simuladamente retira-o do ambiente de tratamento(2424. Yeung AWK, Tosevska A, Klager E, Eibensteiner F, Laxar D, Stoyanov J, et al. Virtual and Augmented Reality Applications in Medicine: Analysis of the Scientific Literature. J Med Internet Res. 2021;23(2):e25499. DOI: https://doi.org/10.2196/25499.
https://doi.org/10.2196/25499...
).

Assim, a RV é caracterizada exclusivamente como imersiva e envolvente, integrando muitas experiências sensoriais e, assim, capta maior grau de atenção da pessoa que a usa, reduzindo a percepção da dor, podendo então ser utilizada como complemento útil para a analgesia não farmacológica na substituição de curativos(1515. Ding J, He Y, Chen L, Zhu B, Cai Q, Chen K, et al. Virtual reality distraction decreases pain during daily dressing changes following haemorrhoid surgery. J Int Med Res. 2019;47(9):4380-88. DOI: https://doi.org/10.1177/0300060519857862.
https://doi.org/10.1177/0300060519857862...
,2525. Esumi R, Yokochi A, Shimaoka M, Kawamoto E. Virtual reality as a non-pharmacologic analgesic for fasciotomy wound infections in acute compartment syndrome: a case report. J Med Case Rep. 2020;14(1):1-7. DOI: https://doi.org/10.1186/s13256-020-02370-4.
https://doi.org/10.1186/s13256-020-02370...
,2626. Ahmadpour N, Randall H, Choksi H, Gao A, Vaughan C, Poronnik P. Virtual Reality interventions for acute and chronic pain management. Int J Biochem Cell Biol. 2019;114(105568):1-4. DOI: https://doi.org/10.1016/j.biocel.2019.105568.
https://doi.org/10.1016/j.biocel.2019.10...
). Esse dado infere a relevância da utilização da RV antes de se iniciar o procedimento até a sua finalização, deixando o paciente mais relaxado e tranquilo durante a limpeza, desbridamento e substituição das coberturas de sua lesão, principalmente em feridas crônicas, as quais são frequentemente dolorosas, e necessitam de troca de curativo de forma periódica.

Um estudo na China(1515. Ding J, He Y, Chen L, Zhu B, Cai Q, Chen K, et al. Virtual reality distraction decreases pain during daily dressing changes following haemorrhoid surgery. J Int Med Res. 2019;47(9):4380-88. DOI: https://doi.org/10.1177/0300060519857862.
https://doi.org/10.1177/0300060519857862...
) demonstrou que o efeito de alívio da dor da RV foi mais significativo durante o procedimento de troca de curativo em comparação com antes ou depois da troca, corroborando os achados apresentados.

Os participantes que receberam óculos de RV apresentaram menor frequência cardíaca e menor pressão arterial sistólica e diastólica antes e após a troca dos curativos. Estudos anteriores(88. Hua Y, Qiu R, Yao WY, Zhang Q, Chen XL. The Effect of Virtual Reality Distraction on Pain Relief During Dressing Changes in Children with Chronic Wounds on Lower Limbs. Pain Manag Nurs. 2015;16(5):685-91. DOI: https://doi.org/10.1016/j.pmn.2015.03.001.
https://doi.org/10.1016/j.pmn.2015.03.00...
,2727. Gershon J, Zimand E, Pickering M, Rothbaum BO, Hodges L. A pilot and feasibility study of virtual reality as a distraction for children with cancer. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 2004;43(10):1243-9. DOI: https://doi.org/10.1097/01.chi.0000135621.23145.05.
https://doi.org/10.1097/01.chi.000013562...
) demonstraram redução significativa da frequência cardíaca de participantes que usaram RV em comparação com o grupo controle. Já a redução da pressão arterial sistólica e diastólica pode estar relacionada ao fato de que a oferta da RV antes de começar o curativo auxilia na redução da ansiedade e medo da dor, por meio da distração, o que minimiza o tempo de pensamentos na dor que poderá sentir quando iniciar o procedimento, deixando-os mais tranquilos(1616. Scapin SQ, Echevarría-Guanilo ME, Fuculo Junior PRB, Martins JC, Barbosa MV, Pereima MJL. Use of virtual reality for treating burned children: case reports. Rev Bras Enferm. 2017;70(6):1291-5. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0575.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016...
,2828. Sahin G, Basak T. The Effects of Intraoperative Progressive Muscle Relaxation and Virtual Reality Application on Anxiety, Vital Signs, and Satisfaction: A Randomized Controlled Trial. J Perianesth Nurs. 2020;35(3):269-76. DOI: https://doi.org/10.1016/j.jopan.2019.11.002.
https://doi.org/10.1016/j.jopan.2019.11....
).

Percebeu-se que os participantes que usaram RV tiveram menor expressão facial típica de dor e postura de proteção durante a troca de curativos, tornando-os mais colaborativos com o procedimento de retirada da cobertura e limpeza da lesão. A utilização da RV pode aperfeiçoar a troca dolorosa de curativos e melhorar a colaboração do paciente durante o procedimento, com menor exaustão dos profissionais de saúde e menor tempo gasto a cada curativo, já que o paciente torna-se mais tranquilo e colaborativo(1616. Scapin SQ, Echevarría-Guanilo ME, Fuculo Junior PRB, Martins JC, Barbosa MV, Pereima MJL. Use of virtual reality for treating burned children: case reports. Rev Bras Enferm. 2017;70(6):1291-5. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0575.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016...
). Além disso, a RV pode reduzir a dependência farmacológica nesse público e minimizar os custos de saúde.

Após o término do curativo, além de redução da dor, a pressão arterial sistólica e diastólica também foi significativamente menor no grupo que utilizou RV. Estudo consultado sugere conexão entre dor aguda ou crônica e alterações cardiovasculares, que podem interferir na frequência cardíaca e volume sistólico(2929. Chiang HL, Huang YC, Lin HS, Chan MH, Chia YY. Hypertension and Postoperative Pain: A Prospective Observational Study. Pain Res Manag. 2019;(8946195):1-6. DOI: https://doi.org/10.1155/2019/8946195.
https://doi.org/10.1155/2019/8946195...
).

Os resultados do estudo corroboram o efeito positivo da RV sobre os dados clínicos dos pacientes, durante as trocas de curativos de feridas crônicas, colaborando para o êxito do procedimento. Tais achados reforçam a importância de os profissionais de saúde que lidam com o tratamento de feridas utilizarem essa tecnologia, visto que pessoas com feridas crônicas podem sentir dor persistente e debilitante que não pode ser tratada adequadamente com analgésicos comuns e que afeta negativamente o momento da troca dos curativos(3030. Acevedo P. Successful treatment of painful chronic wounds with amniotic and umbilical cord tissue: A case series. SAGE Open Med Case Rep. 2020;8(1):1-6. DOI: https://doi.org/10.1177/2050313X20910599.
https://doi.org/10.1177/2050313X20910599...
).

Vale ressaltar que a troca de curativos é parte essencial do tratamento de feridas, uma vez que contribui com a manutenção de ambiente limpo, livre de agente patogênico e com umidade fisiológica.

O uso do Oculus Go ® para imersão auditiva e visual durante a troca de curativo não gerou incômodo nos participantes e a maioria mostrou-se satisfeita durante este estudo. Um estudo mostrou maior satisfação, dos usuários que apresentaram redução da dor, com o uso da RV do que ao assistir televisão(1111. Spiegel B, Fuller G, Lopez M, Dupuy T, Noah B, Howard A, et al. Virtual reality for management of pain in hospitalized patients: A randomized comparative effectiveness trial. PLoS One. 2019;14(8):e0219115. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0219115.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.021...
).

A satisfação dos participantes ao usar Oculus Go ® pode contribuir para a melhoria da qualidade do atendimento, devido a sua praticidade na colocação e remoção, sem causar efeito adverso durante o uso, sendo, portanto, bem aceito pelos usuários(1111. Spiegel B, Fuller G, Lopez M, Dupuy T, Noah B, Howard A, et al. Virtual reality for management of pain in hospitalized patients: A randomized comparative effectiveness trial. PLoS One. 2019;14(8):e0219115. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0219115.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.021...
,1616. Scapin SQ, Echevarría-Guanilo ME, Fuculo Junior PRB, Martins JC, Barbosa MV, Pereima MJL. Use of virtual reality for treating burned children: case reports. Rev Bras Enferm. 2017;70(6):1291-5. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0575.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016...
). Pesquisa recente demonstrou que a utilização de RV não culminou em eventos adversos nos participantes(1111. Spiegel B, Fuller G, Lopez M, Dupuy T, Noah B, Howard A, et al. Virtual reality for management of pain in hospitalized patients: A randomized comparative effectiveness trial. PLoS One. 2019;14(8):e0219115. DOI: https://doi.org/10.1371/journal.pone.0219115.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.021...
).

As características dos participantes deste estudo podem limitar a generalização dos resultados para outras populações, visto que foram coletados em uma região geográfica específica. Ademais, avaliaram-se os efeitos da RV em uma única troca de curativos. Apesar dessas limitações, o presente estudo apresenta contribuições importantes para o estado da arte, e os resultados podem ter implicações importantes para a assistência às pessoas com feridas crônicas. Pesquisas futuras com outros estudos mais robustos, com amostras maiores, em seguimento com várias trocas de curativos são necessárias para determinar se os resultados atuais se replicam.

CONCLUSÃO

O uso de RV apresentou efeito positivo no alívio da dor durante e após a troca de curativos de feridas crônicas. A RV promoveu a distração da percepção álgica durante a substituição de coberturas, com diferenças significativas na frequência cardíaca, pressão arterial sistólica e diastólica antes e após a troca de curativos, refletindo em melhores aspectos comportamentais e fisiológicos durante a troca. A RV não causou incômodo e os participantes mostraram-se satisfeitos com seu uso.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Set 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    20 Nov 2020
  • Aceito
    12 Jul 2021
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