Sofrimento psicológico em estudantes de enfermagem: relação com tempo de tela, alimentação e atividade física

Objetivo:

determinar a prevalência de sintomas de ansiedade e depressão e sua associação com tempo de tela, dieta e atividade física em uma coorte de estudantes de enfermagem.

Método:

estudo descritivo transversal com amostra de 648 estudantes de enfermagem. Utilizou-se a Hospital Anxiety and Depression Scale, a versão curta do International Physical Activity Questionnaire e o Índice Espanhol de Alimentação Saudável. Foram realizados diferentes modelos de regressão linear múltipla para analisar a associação entre sintomas de ansiedade e depressão e tempo de tela, dieta e atividade física.

Resultados:

a prevalência de sintomas de ansiedade e depressão foi de 24,1% e 3,7%, respectivamente. O tempo prolongado de tela (>6 horas por dia), a baixa atividade física e a dieta inadequada foram associados de forma independente e significativa ao aumento da sintomatologia psicológica.

Conclusão:

a saúde mental dos estudantes de enfermagem pode ser beneficiada com a implementação de iniciativas que promovam estilos de vida saudáveis.

Descritores:
Estudantes de Enfermagem; Ansiedade; Depressão; Atividade Motora; Dieta; Estudos Transversais

Objetivo:

determinar la prevalencia de síntomas de ansiedad y depresión, al igual que su asociación con el tiempo de pantalla, la dieta y la actividad física, en una cohorte de estudiantes de enfermería.

Método:

estudio descriptivo y transversal sobre una muestra de 648 estudiantes de enfermería. Se utilizaron la Hospital Anxiety and Depression Scale, la versión corta del International Physical Activity Questionnaire y el Índice de Alimentación Saludable español. Se llevaron a cabo diferentes modelos de regresión lineal múltiple para analizar la asociación entre los síntomas de ansiedad y depresión, y el tiempo de pantalla, la dieta y la actividad física.

Resultados:

la prevalencia de síntomas de ansiedad y depresión fue de 24,1% y 3,7%, respectivamente. El tiempo de pantalla prolongado (>6 horas por día), baja actividad física y dieta inadecuada se asociaron de manera independiente y significativa con una mayor sintomatología psicológica.

Conclusión:

la salud mental de los estudiantes de enfermería podría beneficiarse de implementarse iniciativas que promuevan estilos de vida saludables.

Descriptores:
Estudiantes de Enfermería; Ansiedad; Depresión; Actividad Motora; Dieta; Estudios Transversales

Objective:

to determine the prevalence of anxiety and depression symptoms, as well as their association with screen time, diet and physical activity, in a cohort comprised by nursing students.

Method:

a descriptive and cross-sectional study conducted with a sample of 648 Nursing students. The instruments used were the Hospital Anxiety and Depression Scale, the short version of the International Physical Activity Questionnaire and the Spanish Healthy Eating Index (Índice de Alimentación Saludable Español, IASE). Different multiple linear regression models were performed to analyze the association between anxiety/depression symptoms and screen time, diet and physical activity.

Results:

the prevalence values for anxiety and depression symptoms were 24.1% and 3.7%, respectively. Prolonged screen times (>6 hours a day), low levels of physical activity and inadequate diet were independently and significantly associated with deeper psychological symptoms.

Conclusion:

Nursing students’ mental health might benefit from the implementation of initiatives promoting healthy lifestyles.

Descriptors:
Nursing Students; Anxiety; Depression; Motor Activity; Diet; Cross-Sectional Studies

Destaques:

(1) Sinais de ansiedade e depressão são comuns em estudantes de enfermagem.

(2) Má alimentação, sedentarismo e baixa atividade física são hábitos prevalentes.

(3) Dieta, tempo de tela e atividade física estão relacionados ao sofrimento psicológico.

(4) É necessário acompanhar e promover a saúde mental dos futuros enfermeiros.

Introdução

Os problemas de saúde mental são uma das principais causas de incapacidade e um problema de saúde pública crescente em todo o mundo, devido à progressão da doença, ao aumento da sua prevalência e às dificuldades associadas à sua gestão terapêutica⁽¹⁾. Muitas vezes, os problemas de saúde mental aparecem no início da idade adulta e nessa fase da vida estão associados a uma maior incidência de problemas físicos e emocionais a médio e longo prazo⁽²⁾, dificuldades de inserção no mercado de trabalho⁽³⁾, pior qualidade do sono⁽⁴⁾ ou relações sociais disfuncionais⁽⁵⁾, entre outros.

Estudantes universitários estão sujeitos a desafios significativos de desenvolvimento social, riscos e transições que aumentam o risco de problemas de saúde mental⁽⁶⁾. Além disso, no caso dos futuros enfermeiros, os estressores podem ser ainda maiores. As práticas clínicas envolvem contato humano próximo baseado em um alto comprometimento emocional, podendo incluir a necessidade de lidar com doenças graves e morte⁽⁷⁾.

Estudos anteriores caracterizaram o sofrimento psicológico por meio da avaliação de depressão e ansiedade em estudantes de enfermagem de todo o mundo, relatando resultados elevados, embora muito díspares^(8-10). Sob este prisma, o acompanhamento e detecção precoce do sofrimento psíquico em estudantes de enfermagem, bem como seus fatores associados, é especialmente importante. Nesse sentido, várias investigações têm observado, tanto na população clínica quanto em adolescentes e jovens, certas associações entre determinados comportamentos e estados de ansiedade e estresse. Dentre eles, uma alimentação inadequada^(11-12) e um estilo de vida sedentário com tempo prolongado no uso de telas^(13-14) parecem estar associados a maior sofrimento psíquico. Pelo contrário, a atividade física parece agir como mecanismo protetor contra ansiedade e depressão. No entanto, essas relações ainda não foram confirmadas em populações específicas, como estudantes universitários e, mais particularmente, estudantes de enfermagem.

Com base nessa problemática, o objetivo deste estudo foi caracterizar o sofrimento psíquico em estudantes de enfermagem em nosso meio, a partir da determinação da prevalência de sintomas de ansiedade e depressão, bem como a associação desses sintomas com o tempo de tela, a atividade física e a qualidade da dieta.

Método

Projeto e localização do estudo

Realizou-se um estudo descritivo transversal sobre uma amostra de estudantes de enfermagem matriculados em uma das duas instituições que ministram esse curso de graduação na Região de Aragão (Espanha): a Universidade de Zaragoza e a Universidade de San Jorge.

População

O cálculo do tamanho amostral mínimo necessário para satisfazer nosso objetivo principal de determinar a prevalência de ansiedade e depressão foi baseado nos resultados recentemente obtidos com a Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) em uma amostra de estudantes de enfermagem do Principado das Astúrias (Norte da Espanha)⁽¹⁵⁾. Dessa forma, para um nível de confiança de 95%, estimou-se uma precisão absoluta de 2% como mínimo necessário de 610 participantes para nosso estudo.

O recrutamento dos participantes e a coleta de dados foram realizados nas salas de aula durante os meses de setembro a novembro de 2022. Assim, em sala de aula os alunos foram informados sobre a natureza e os objetivos do estudo, o caráter voluntário da sua participação e a gestão dos dados obtidos com base no critério de anonimato. De uma população matriculada elegível de 1.182 estudantes, 682 consentiram em participar deste estudo e completaram os questionários solicitados (taxa de resposta: 57,6%). Dos 682 questionários recebidos, 34 foram considerados inválidos (por ausência generalizada de dados ou dados manifestamente irrealistas), sendo por isso excluídos da análise (taxa de rejeição: 5,0%).

Variáveis e instrumentos usados para coleta de dados

O questionário de coleta de dados foi composto por três seções: 1. Dados sociodemográficos e acadêmicos; 2. Estilos de vida e 3. Sintomas psicológicos (ansiedade e depressão). Na primeira seção, elaborada ad hoc, os participantes relataram informações sobre idade, sexo, residência (sozinho, com colegas/com parceiro/a, com pais/familiares), situação profissional (desempregado, empregado em meio período, empregado em período integral), nível econômico percebido (muito baixo/baixo, médio, alto/muito alto), ano letivo e nota média ao longo do curso.

Na segunda seção, foram avaliados o tempo de tela, a qualidade da dieta e a atividade física. O tempo de tela foi avaliado por meio da pergunta: “Em um dia típico, quanto tempo você gasta usando dispositivos de tela (smartphone, tablet, computador, televisão, etc.)?”. Com base nas respostas a esta pergunta, os participantes foram categorizados em 3 grupos por tempo de uso (<3 horas/dia, 3-6 horas/dia, >6 horas/dia).

A atividade física foi avaliada por meio do International Physical Activity Questionnaire Short Form (IPAQ-SF). O IPAQ-SF fornece informações sobre a intensidade, frequência e duração da atividade física realizada nos últimos 7 dias. Este questionário fornece informações quantitativas e qualitativas sobre a atividade física realizada. Na análise quantitativa, a unidade de medida é o equivalente metabólico da tarefa (Metabolic Equivalent of Task, MET) por semana, sendo 1 MET o consumo de energia derivado do nível metabólico de repouso. No estudo qualitativo, o protocolo oficial de interpretação do instrumento⁽¹⁶⁾ permite classificar a população em 3 níveis de atividade (baixo, moderado, alto). O IPAQ-SF foi validado para a população universitária espanhola, apresentando correlação satisfatória (0,69) com o acelerômetro⁽¹⁷⁾.

A alimentação dos participantes foi avaliada por meio do Índice Espanhol de Alimentação Saudável (IASE)⁽¹⁸⁾. Esta ferramenta é uma adaptação do Healthy Eating Index⁽¹⁹⁾ para o contexto espanhol de acordo com as recomendações da Sociedade Espanhola de Nutrição Comunitária. O índice consiste em 10 itens (escala de pontuação de 0 a 10) para uma faixa de pontuação final que varia de 0 a 100 pontos. Com base na pontuação obtida, os participantes são categorizados da seguinte forma: pontuação >80 (alimentação saudável), entre 50 e 80 pontos (alimentação que precisa de mudanças) e <50 pontos (alimentação inadequada). Trata-se de um questionário muito utilizado na população universitária espanhola^(20-21). Embora esse questionário não tenha sido validado até o momento na população universitária espanhola, o questionário original do Healthy Eating Index foi validado por meio de biomarcadores plasmáticos, mostrando níveis de correlação satisfatórios que variam de um mínimo de r=0,23 (para cereais) a um máximo de r=0,71 para a variedade de alimentos⁽²²⁾.

Por último, os sintomas de depressão e ansiedade foram avaliados com a escala HADS⁽²³⁾, uma escala originalmente concebida para a população clínica, mas atualmente amplamente utilizada e comprovadamente útil no contexto comunitário. A HADS é composta por duas subescalas de 7 itens: HADS Depressão e HADS Ansiedade. Cada item é pontuado em uma escala Likert de 4 pontos (0 = Nunca a 3 = Quase sempre); para uma pontuação global em cada subescala variando de 0 a 21. A partir desse resultado, participantes com pontuação ≥8 foram considerados com possível depressão e ansiedade, e aqueles com pontuação ≥11 nas respectivas subescalas foram considerados com provável depressão e ansiedade⁽²⁴⁾. Este questionário mostrou propriedades ótimas para triagem de ansiedade e depressão em seu estudo de validação na população espanhola^(25-26).

Análise de dados

A análise descritiva das características da amostra (sociodemográficas, acadêmicas, relacionadas com estilos de vida e sintomas psicológicos) é apresentada por meio da média e desvio padrão para as variáveis quantitativas e do número e porcentagem para as variáveis categóricas. A comparação bivariada dessas características segundo o sexo foi realizada por meio do teste t de Student para as variáveis quantitativas e do teste do χ² (ou exato de Fisher quando aplicável) para as variáveis categóricas.

Além disso, vários modelos de regressão linear múltipla foram executados para determinar o grau de associação entre tempo de tela, atividade física, dieta e sintomas de ansiedade e depressão, tanto para a população total quanto por sexo. Os modelos realizados na amostra total foram ajustados por idade, sexo, situação econômica, nota média, ano letivo, residência, situação laboral e por tempo de tela e alimentação (para a atividade física) ou atividade física e alimentação (para o tempo de tela) ou atividade física e tempo de tela (para dieta). Os modelos desagregados por sexo foram ajustados por idade, situação econômica, situação acadêmica (Grade Point Average – GPA), ano letivo, residência e status de emprego e por tempo de tela e dieta (para atividade física) ou atividade física e dieta (para tempo de tela) ou atividade física e tempo de tela (para dieta). Todos os cálculos foram realizados no programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 23.0, aceitando-se como estatisticamente significativos valores de p<0,05.

Considerações éticas

Antes do início do estudo, obteve-se a autorização do Comitê de Ética em Pesquisa Clínica de Aragão. Desde o início, os participantes foram informados sobre os objetivos, a metodologia, os riscos potenciais derivados de sua participação no estudo e a possibilidade de deixar o estudo a qualquer momento. Depois disso, e antes da coleta de dados, todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Resultados

Características da amostra

Um total de 648 estudantes de enfermagem compôs a amostra final do estudo. A média de idade dos participantes foi de 21,7 anos e o sexo feminino foi predominante (84,2%). A maioria estava matriculada no 2º ou 3º ano do curso (50,3%), morava com os pais/família (60,2%), percebia seu nível econômico como médio (85,2%) e não exercia atividade remunerada (76,9%). Por sexo não foram observadas diferenças significativas em relação à idade, ano e nota acadêmicos e situação empregatícia. Porém, os homens foram mais propensos do que as mulheres a morarem sozinhos (p<0,05) (Tabela 1).

Tabela 1 -
Características dos participantes (n=648). Zaragoza, AR, Espanha, 2022

Variável	Total (n=648)	Sexo feminino (n=546)	Sexo masculino (n=102)	p
Idade (média±desvio padrão)	21,7±4,7	21,6±4,7	22,1±4,3	0,345
Residência
Mora sozinho	48 (7,4%)	30 (5,5%)	18 (17,6%)	0,001
Mora com colegas/parceiro	210 (32,4%)	180 (33,0%)	30 (29,4%)
Mora com os pais/parentes	390 (60,2%)	336 (61,5%)	54 (52,9%)
Ano acadêmico
1º ano	163 (25,1%)	131 (24,0%)	32 (31,3%)	0,288
Anos intermediários	326 (50,3%)	279 (51,1%)	47 (46,0%)
Último ano	159 (24,5%)	136 (24,9%)	23 (22,5%)
Nota média (média±desvio padrão)	7,1±0,6	7,1±0,6	7,0±0,5	0,085
Nível econômico percebido
Muito baixo/Baixo	66 (10,2%)	60 (11,0%)	6 (5,9%)	0,011
Médio	552 (85,2%)	456 (83,5%)	96 (94,1%)
Alto/Muito alto	30 (4,6%)	30 (5,5%)	0 (0,0%)
Situação empregatícia
Sem trabalho remunerado	498 (76,9%)	420 (76,9%)	78 (76,5%)	0,794
Trabalho em tempo integral	30 (4,6%)	24 (4,4%)	6 (5,9%)
Trabalho em tempo parcial	120 (18,5%)	102 (18,7%)	18 (17,6%)

Atividade física, tempo de tela e dieta

A qualidade da dieta dos participantes, avaliada pelo IASE, mostrou-se ruim. Até 93,5% deles relataram uma dieta inadequada ou com necessidade de mudanças. O tempo em frente da tela foi elevado (5,8 horas por dia, em média), sendo que a grande maioria dos participantes (72,2%) referiu tempos diários superiores a 3 horas. 51,9% dos participantes relataram baixa atividade física e apenas 23,1% alta atividade. Por sexo, os homens apresentaram uma alimentação não tão negativa, com maiores escores no IASE e maior probabilidade de seguir uma alimentação saudável. Eles também apresentaram menor uso de dispositivos de tela e maior disposição para praticar atividade física, fatores evidenciados por sua maior taxa metabólica semanal e pela maior proporção de homens com atividade física moderada e alta (p<0,05) (Tabela 2).

Tabela 2 -
Atividade física, tempo de tela e alimentação dos participantes (n=648). Zaragoza, AR, Espanha, 2022

Variável	Total (n=648)	Sexo feminino (n=546)	Sexo masculino (n=102)	p
Dieta
Índice de Alimentação Saudável (média±desvio padrão)	54,7±14,7	53,6±13,9	60,8±17,1	0,000
Dieta saudável	42 (6,5%)	30 (5,5%)	12 (11,8%)	0,000
Dieta que precisa de mudanças	342 (52,8%)	276 (50,5%)	66 (64,7%)
Dieta inadequada	264 (40,7%)	240 (44,0%)	24 (23,5%)
Tempo de tela
Horas diárias (média±desvio padrão)	5,8±1,7	5,9±1,8	5,4±1,5	0,007
<3 horas/dia	180 (27,8%)	138 (25,3%)	42 (41,2%)	0,001
3-6 horas/dia	378 (58,3%)	324 (59,3%)	54 (52,9%)
>6 horas/dia	90 (13,9%)	84 (15,4%)	6 (5,9%)
Atividade física
METs*-semana (média±desvio padrão)	2178,7±1802,3	2040,2±1626,6	2920,1±2423,4	0,001
Atividade física baixa	336 (51,9%)	300 (54,9%)	36 (35,3%)	0,001
Atividade física moderada	162 (25,0%)	132 (24,2%)	30 (29,4%)
Atividade física alta	150 (23,1%)	114 (20,9%)	36 (35,3%)

Metabolic Equivalent of Task

Sintomas ansiosos e depressivos

As pontuações médias nas escalas HADS-A e HADS-D foram 8,34±3,30 e 4,12±2,82, respectivamente. Apenas 47,2% dos participantes não apresentaram nenhum tipo de sintoma compatível com ansiedade, sendo os sintomas de ansiedade confirmados em até 24,1% dos participantes. Em relação à depressão, 88% dos participantes não apresentaram sintomas depressivos e apenas 3,7% relataram sintomas compatíveis com depressão (Tabela 3). Por sexo, os escores obtidos na HADS mostraram maiores traços de ansiedade no sexo feminino e depressão no masculino (p<0,05). A probabilidade de encontrar depressão clínica grave foi ligeiramente maior no grupo feminino.

Tabela 3 -
Sintomas de ansiedade e depressão na amostra (n=648). Zaragoza, AR, Espanha, 2022

Variável	Total (n=648)	Sexo feminino (n=546)	Sexo masculino (n=102)	P
Escore HADS-A* (média±desvio padrão)	8,34±3,30	8,39±3,39	8,05±2,74	0,010
Sem ansiedade	306 (47,2%)	258 (47,3%)	48 (47,1%)	0,000
Possível ansiedade	186 (28,7%)	138 (25,3%)	48 (47,1%)
Ansiedade	156 (24,1%)	150 (27,5%)	6 (5,9%)
Escore HADS-D† (média±desvio padrão)	4,12±2,82	4,07±2,91	4,41±2,26	0,106
Sem depressão	570 (88,0%)	486 (89,0%)	84 (82,4%)	0,018
Possível depressão	54 (8,3%)	36 (6,6%)	15 (14,7%)
Depressão	24 (3,7%)	24 (4,4%)	3 (2,9%)

Hospital Anxiety and Depression Scale-AnxietyHospital Anxiety and Depression Scale-Depression

Associação entre atividade física, tempo de tela, dieta e sintomas psicológicos

Os três modelos de análise multivariada (para o total e por sexo) realizados para avaliar a associação entre atividade física, tempo de tela, dieta e sintomas ansiosos demonstraram que baixa atividade física, alto tempo de tela (>6 horas) e alimentação não saudável (dieta carente de mudanças e dieta inadequada) estão associados de forma estatisticamente significativa com pontuações mais altas na escala de ansiedade HADS-A. Esses hábitos se mantêm tanto para a amostra em geral quanto na análise desagregada por sexo. A capacidade preditiva desses 3 modelos variou de 19,5% a 67,4% (Tabela 4).

Tabela 4 -
Regressão linear múltipla dos fatores associados ao escore HADS-A* (n=648). Zaragoza, AR, Espanha, 2022

Variável	Total†	Sexo feminino‡	Sexo masculino‡
	Coeficiente B (Intervalo de confiança de 95%)	Coeficiente B (Intervalo de confiança de 95%)	Coeficiente B (Intervalo de confiança de 95%)
Atividade física (Grupo de referência: Atividade física moderada)
Atividade física baixa	0,633 (0,039 ; 1,227)§	0,451 (-0,192 ; 1,094)	2,359 (0,543 ; 4,175)§
Atividade física alta	-0,955 (-1,886 ; -0,097)§	-0,452 (-1,246 ; 0,343)	-3,142 (-4,268 ; -2,016)§
Tempo de tela (Grupo de referência: 3-6 horas/dia)
<3 horas/dia	0,083 (-0,651 ; 0,818)	0,398 (-0,393 ; 1,189)	-3,391 (-4,401 ; -2,381)§
>6 horas/dia	1,507 (0,701; 2,311)§	1,232 (0,622 ; 1,841)§	2,705 (1,044 ; 4,366)§
Dieta (Grupo de referência: Dieta saudável)
Dieta que precisa de mudanças	1,409 (0,415 ; 2,404)§	0,895 (-0,292 ; 2,082)	3,911 (2,565 ; 5,256)§
Dieta inadequada	1,919 (0,886 ; 2,953)§	1,342 (0,138 ; 2,546)§	8,582 (6,774 ; 10,390)§
Coeficiente R2 (R2 corrigido)	0,209 (0,195)	0,244 (0,229)	0,710 (0,674)

Hospital Anxiety and Depression Scale-Anxiety^†‡§

Em relação à associação entre atividade física, tempo de tela, dieta e sintomas depressivos, os diferentes modelos de regressão linear múltipla desenvolvidos mostraram que mais tempo de tela (>6 horas) e uma dieta distante das recomendações (dieta com necessidade de mudanças e dieta inadequada) associaram-se, de forma estatisticamente significativa, a maiores pontuações na HADS-D. O comportamento dessas associações foi semelhante entre o grupo feminino e masculino. Porém, apenas para o grupo masculino, foi observada associação inversa entre atividade física e depressão. Assim, quanto maior o nível de atividade física, menores os sintomas depressivos (menor o escore HADS-D) no sexo masculino. A capacidade preditiva desses modelos variou de 20% a 78% (Tabela 5).

Tabela 5 -
Regressão linear múltipla dos fatores associados ao escore HADS-D* (n=648). Zaragoza, AR, Espanha, 2022

Variável	Total†	Sexo feminino‡	Sexo masculino‡
	Coeficiente B (Intervalo de confiança de 95%)	Coeficiente B (Intervalo de confiança de 95%)	Coeficiente B (Intervalo de confiança de 95%)
Atividade física (Grupo de referência: Atividade física moderada)
Atividade física baixa	0,369 (-0,307 ; 1,033)	0,551 (-0,010 ; 1,113)	-0,437 (-1,668 ; 0,793)
Atividade física alta	-0,658 (-1,210 ; 0,131)	0,004 (-0,690 ; 0,697)	-3,101 (-3,864 ; -2,338)§
Tempo de tela (Grupo de referência: 3-6 horas diárias)
<3 horas/dia	-0,116 (-0,759 ; 0,527)	0,053 (-0,479 ; 0,586)	-0,854 (-1,979 ; 0,271)
>6 horas/dia	0,862 (0,172 ; 1,552)§	0,696 (0,005 ; 1,387)§	1,588 (0,904 ; 2,273)§
Dieta (Grupo de referência: Dieta saudável)
Dieta que precisa de mudanças	1,553 (0,716 ; 2,390)§	1,918 (0,882 ; 2,955)§	0,020 (-0,891 ; 0,932)
Dieta inadequada	1,653 (0,784 ; 2,523)§	1,869 (0,818 ; 2,921)§	1,419 (0,194 ; 2,644)§
Coeficiente R2 (R2 corrigido)	0,231 (0,217)	0,215 (0,199)	0,803 (0,779)

Hospital Anxiety and Depression Scale-Depression^†‡§

Discussão

O objetivo desta pesquisa foi examinar a prevalência de ansiedade e depressão em uma amostra de estudantes de enfermagem espanhóis e sua associação com tempo de tela, atividade física e qualidade da dieta. Foi possível detectar uma elevada prevalência de comportamentos de risco para a saúde, baixo nível de atividade física (51,9%), má alimentação (40,7%) e tempo de tela prolongado (13,9%) nos futuros enfermeiros do nosso meio. Esses valores são semelhantes aos obtidos anteriormente em amostras de universitários espanhóis^(27-28). É alta a prevalência de estilos de vida pouco saudáveis que, no caso dos estudantes de enfermagem, merecem dupla consideração. Por um lado, hábitos não saudáveis predizem problemas de saúde para esses jovens a médio e longo prazo. Por outro lado, a equipe de enfermagem é referência em educação em saúde e promoção de estilos de vida saudáveis. Nesse sentido, a literatura anterior sugere que os comportamentos dos profissionais de saúde influenciam suas práticas de promoção⁽²⁹⁾. Deve-se notar que esses comportamentos foram associados ao sofrimento psíquico. Assim, a alta atividade física foi inversamente associada à presença de sintomas de depressão e ansiedade. Essa é uma relação previamente relatada em várias populações⁽³⁰⁾ e que pode ser corroborada do ponto de vista neurobiológico pelo efeito ativador da atividade física sobre o sistema endocanabinoide e o fator neurotrófico derivado do cérebro⁽³¹⁾.

Uma alta atividade física foi inversamente associada à presença de sintomas de depressão e pesquisas anteriores mostraram associações significativas entre hábitos alimentares saudáveis (ingestão calórica moderada, tomar café da manhã ou não fazer lanches, entre outros) e ingestão de certos alimentos e nutrientes (vegetais e frutas, ácidos graxos poli-insaturados, certos minerais ou vitaminas, entre outros) e boa saúde psicológica^(32-33). Na mesma linha, a qualidade da dieta de nossos participantes foi forte e inversamente associada à presença de ansiedade e depressão.

Por fim, o alto tempo de tela (>6 horas por dia) foi associado a piores resultados de saúde mental em nossa amostra. O tempo de tela é atualmente uma variável de interesse, pois fornece dois tipos de informação. Por um lado, informações sobre o uso/uso excessivo de novas tecnologias; por outro, é uma medida indireta da presença de um estilo de vida sedentário. Nesse sentido, o uso excessivo de novas tecnologias baseadas em telas (redes sociais, smartphones, etc.) e seu hábito sedentário associado já foram relacionados ao sofrimento psíquico, especialmente na população jovem^(34-35).

Uma metanálise recente publicada em 2022, com uma amostra agregada de mais de 100.000 indivíduos, determinou uma prevalência de sintomas de depressão e ansiedade entre universitários de 33,6% e 39,0%, respectivamente⁽³⁶⁾. A comparação destes valores com os obtidos em estudos transversais, como neste caso, é difícil dada a heterogeneidade dos contextos socioeconómicos e a variedade de instrumentos de diagnóstico utilizados. De qualquer forma, esses números são superiores aos observados em nossa amostra de estudantes de enfermagem, na qual aproximadamente um quarto dos participantes apresentou algum tipo de sofrimento psíquico, com maior prevalência de sintomas de ansiedade (24,1%) em relação aos sintomas depressivos (3,7%). Esses resultados parecem contrariar a teoria de que os estudantes da área de saúde têm níveis mais altos de sofrimento psicológico do que outros estudantes porque estão sujeitos a um número maior de estressores, incluindo o contato com a doença e a morte⁽³⁷⁾.

Vários estudos analisaram anteriormente a prevalência de sofrimento psíquico em estudantes de enfermagem com resultados muito heterogêneos dependendo do país de origem dos participantes. Por exemplo, no Canadá, sintomas de depressão e ansiedade foram observados em 32% e 39% dos estudantes, respectivamente⁽³⁸⁾. Diferente dos obtidos na Turquia (sintomas de depressão em 55,5% e ansiedade em 50,9%)⁽³⁹⁾, Brasil (sintomas de depressão em 54,2% e ansiedade em 40,1%)⁽⁴⁰⁾, Japão (sintomas de depressão em 18,3% e ansiedade em 34,6%)⁽⁴¹⁾ ou Arábia Saudita (sintomas de depressão em 43,3% e ansiedade em 37,2%)⁽⁴²⁾, entre outros. Em geral, são valores superiores aos obtidos neste estudo. Uma possível explicação para a menor prevalência de sofrimento psíquico em nossa amostra pode ser o momento da coleta de dados. Embora a maior parte da literatura recente sobre sofrimento psíquico em estudantes de enfermagem se limite ao período de confinamento e aos efeitos da pandemia de COVID-19, este estudo determina os sintomas psicológicos em um momento de euforia pós-pandêmica após a eliminação na Espanha de todas as restrições.

Esta pesquisa tem algumas limitações que precisam ser apontadas. Em primeiro lugar, a amostra foi inteiramente retirada de um único local, a Região de Aragão, o que pode suscitar dúvidas na extrapolação dos resultados para a população global de estudantes de enfermagem espanhóis. No entanto, os perfis de gênero e idade dos participantes deste estudo coincidem com os existentes na maioria dos programas de treinamento de enfermagem espanhóis. Em segundo lugar, nosso desenho transversal permite apenas estabelecer associações e não relações causais. Pesquisas futuras com delineamento longitudinal poderiam fornecer uma melhor base para a compreensão das associações observadas neste estudo, especialmente em relação a como os comportamentos relacionados à saúde dos estudantes de enfermagem podem afetar sua saúde psicológica e vice-versa. Apesar dessas limitações, vários fatores nos fazem acreditar que nossos resultados podem ser úteis e servir de ponto de partida para futuras iniciativas de promoção da saúde mental no contexto universitário. A utilização de procedimentos de coleta de dados normalizados, o uso de questionários validados tanto para avaliação de sintomas psicológicos como para determinação de comportamentos relacionados com a saúde e a plausibilidade das associações estabelecidas suportam esta hipótese.

Até o momento, este é o primeiro estudo que analisa os sintomas de depressão e ansiedade e sua associação com vários comportamentos relacionados à saúde em uma grande amostra de estudantes de enfermagem espanhóis. Os resultados obtidos neste estudo relatam uma prevalência considerável de sofrimento psíquico e comportamentos não saudáveis nesses estudantes, o que requer atenção dos responsáveis pela formulação de políticas de saúde e das autoridades universitárias. Sob esse prisma, impõe-se a implantação, no ambiente universitário, de novas atividades de acompanhamento e promoção da saúde mental e dos hábitos de saúde. Atualmente, os alunos geralmente têm acesso a determinados serviços de apoio, como serviços de tutoria ou aconselhamento estudantil. Porém, estes não são específicos para uma determinada disciplina nem são baseados em evidências científicas. Nesse sentido, alguns autores sugerem algumas estratégias capazes de minimizar o sofrimento psíquico, como intervenções comportamentais⁽⁴³⁾, mindfulness⁽⁴⁴⁾ ou programas de mentoring⁽⁴⁵⁾. Além disso, estudantes de enfermagem submetidos a situações estressantes em suas práticas profissionais podem se beneficiar da integração de cenários de simulação no programa acadêmico. Esses espaços podem ajudar os estudantes de enfermagem a ganhar confiança, antecipar situações e desenvolver estratégias de enfrentamento eficazes para seu desempenho futuro em situações emocionalmente complexas⁽⁴⁶⁾.

Conclusão

Os resultados deste estudo mostram uma prevalência considerável de sintomas de depressão e ansiedade em estudantes de enfermagem espanhóis. Além disso, esses sintomas estão associados a baixa atividade física, tempo prolongado de tela e dieta pouco saudável. Esses dados sugerem dois problemas importantes para o futuro. O primeiro diz respeito à saúde dos futuros enfermeiros a médio e longo prazo. O segundo diz respeito ao desempenho profissional futuro dos enfermeiros, que pode ser prejudicado por uma menor promoção da saúde dos pacientes (não é possível promover com tanta veemência algo que não se pode cumprir) e por uma maior exposição ao fenômeno do burnout, mais prevalente em profissionais com uma situação psicológica de base menos favorável. Essas previsões denotam a importância da implementação de estratégias de promoção da saúde e da saúde mental no ambiente universitário.

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• Como citar este artigo

  Ramón-Arbués E, Granada-López JM, Satústegui-Dordá PJ, Echániz-Serrano E, Sagarra-Romero L, Antón-Solanas I. Psychological distress in nursing students: relationship with screen time, diet and physical activity. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2023;31:e3960 [cited ano mês dia]. Available from: URL . https://doi.org/10.1590/1518-8345.6746.3960
• Todos os autores aprovaram a versão final do texto.

Editado por

Editora Associada:

Lorena Chaparro-Diaz

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  21 Jul 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  01 Mar 2023
• Aceito
  08 Maio 2023