Associação do Sofrimento Moral e Síndrome de Burnout em enfermeiros de hospital universitário

Resumo

Objetivo:

analisar a associação entre sofrimento moral e síndrome de Burnout em enfermeiros de hospital universitário.

Método:

estudo descritivo-analítico, realizado com 269 enfermeiros atuantes em um hospital universitário localizado no Rio Grande do Sul, Brasil. A coleta de dados ocorreu de maneira presencial no ano de 2019 por coletadores previamente capacitados. Aplicaram-se questionário sociodemográfico e laboral, Escala Brasileira de Distresse Moral em Enfermeiros e o Inventário Maslach de Burnout. Empregou-se análise estatística descritiva e analítica.

Resultados:

identificou-se associação entre intensidade e frequência de sofrimento moral e suas dimensões com a síndrome de Burnout e suas dimensões. Enfermeiros em baixa realização profissional e alta exaustão emocional apresentaram prevalências mais elevadas para sofrimento moral.

Conclusão:

evidenciou-se a associação entre sofrimento moral e síndrome de Burnout bem como entre suas dimensões. Os resultados sinalizam a necessidade de investigar intervenções urgentes para amenizar as situações e as manifestações do sofrimento moral e a síndrome de Burnout, elaborando estratégias para a saúde dos trabalhadores.

Descritores:
Enfermagem; Sofrimento Psicológico; Esgotamento Psicológico; Saúde do Trabalhador; Hospitais; Enfermeiras e Enfermeiros

Abstract

Objective:

to analyze the association between moral distress and Burnout Syndrome among nurses in a university hospital.

Method:

descriptive, analytical study conducted with 269 nurses working in a university hospital located in Rio Grande do Sul, Brazil. Data were collected in person in 2019 by previously trained collectors. A sociodemographic and employment questionnaire, the Brazilian Scale of Moral Distress in Nurses and the Maslach Burnout Inventory were applied. Descriptive and analytical statistical analysis was used.

Results:

an association was identified between moral distress intensity and frequency and its dimensions with Burnout Syndrome and its dimensions. Nurses with low professional achievement and high emotional exhaustion showed a higher prevalence of moral distress.

Conclusion:

an association between moral distress and Burnout Syndrome, as well as between their dimensions, was evidenced. The results suggest the need to investigate urgent interventions to mitigate the situations and manifestations of moral distress and Burnout Syndrome by developing strategies for workers’ health.

Descriptors:
Nursing; Psychological Distress; Psychological Burnout; Occupational Health; Hospitals; Nurses

Resumen

Objetivo:

analizar la asociación entre sufrimiento moral y síndrome de Burnout en enfermeros de un hospital universitario.

Método:

estudio descriptivo y analítico, realizado en 269 enfermeros que actuaban en un hospital universitario localizado en el estado de Rio Grande del Sur, en Brasil. La recogida de datos se realizó de manera presencial en el año de 2019 por colectores previamente capacitados. Se aplicaron el cuestionario sociodemográfico y laboral, la Escala Brasileña de Estrés Moral en Enfermeros y el Inventario Maslach de Burnout. Se empleó el análisis estadístico descriptivo y analítico.

Resultados:

se identificó asociación entre intensidad y frecuencia de sufrimiento moral y sus dimensiones con el síndrome de Burnout y sus dimensiones. Los enfermeros que tuvieron baja realización profesional y alta extenuación emocional, presentaron prevalencias más elevadas para el sufrimiento moral.

Conclusión:

se evidenció asociación entre sufrimiento moral y síndrome de Burnout así como entre sus dimensiones. Los resultados señalan la necesidad urgente de investigar intervenciones para amenizar las situaciones y las manifestaciones del sufrimiento moral y el síndrome de Burnout, elaborando estrategias para la salud de los trabajadores.

Descriptores:
Enfermería; Estrés Psicológico; Extenuación Psicológica; Salud Laboral; Hospitales; Enfermeras y Enfermeros

Destaques

(1) Houve associação significativa entre sofrimento moral e as dimensões da síndrome de Burnout.

(2) Intensidade e frequência de sofrimento moral foram estão associadas à síndrome de Burnout.

(3) Enfermeiros apresentaram prevalência de sofrimento moral.

(4) Foram encontrados níveis moderados de intensidade e frequência de sofrimento moral

Introdução

O trabalho da enfermagem é considerado essencial devido à sua atuação em diversos contextos da saúde. O processo de trabalho da enfermagem exige de seus trabalhadores concentração e esforço, especialmente, em unidades hospitalares nas quais se observa elevada carga de trabalho causando adoecimento¹ como o desgaste físico e psicológico, além de altos níveis de estresse².

Esses aspectos podem estar relacionados com situações às quais os enfermeiros são confrontados em relação às questões éticas que acabam causando conflitos e interferindo na qualidade das atividades laborais, pois ocasionam respostas moralmente insatisfatórias³. Situações como estas podem ocasionar sofrimento moral (SM), que ocorre quando o enfermeiro sente-se impedido de realizar o que considera eticamente correto, ou seja, ele identifica o que é adequado para fazer, mas se reconhece impossibilitado de empreender nessa ação⁴. Além disso, o SM é definido como uma resposta psicológica às situações moralmente desafiadoras, tais como as de constrangimento e conflito moral³.

O SM no Brasil, tem sido analisado em diferentes campos de inserção da enfermagem. Em determinados estudos na área hospitalar, constataram-se níveis baixos a médios de SM^5-6. Estudos recentes trazem nível moderado de SM evidenciado por enfermeiros hospitalares⁷, relacionados, principalmente ao ambiente de trabalho como a falta de recursos e a falta de comunicação entre os profissionais⁸. Esses aspectos podem ameaçar a saúde e o bem-estar dos enfermeiros e acarretar seu adoecimento, dificultando sua capacidade de fornecer atendimento seguro, oportuno, eficiente e centrado nas pessoas. Nesses casos, podem haver implicações para o profissional como o desenvolvimento da síndrome de Burnout (SB).

A SB é definida como uma síndrome psicológica caracterizada por três dimensões: exaustão emocional, despersonalização e baixa realização profissional⁹. Esta temática tem sido investigada em serviços de saúde, nos quais os profissionais de saúde são expostos aos altos níveis de estresse no trabalho, demonstrando níveis entre moderado a grave de SB¹⁰. Outro estudo demonstra que a carga de trabalho pode estar relacionada ao alto risco de desenvolvimento de SB entre enfermeiros¹¹.

A relação entre o SM e SB vem sendo apontada na literatura, visto que o desenvolvimento de SM mediante problemas éticos como a dificuldade de tomar decisões corretas, assim como falta de recursos para ofertar assistência adequada aos pacientes causa estresse cuja cronicidade, por sua vez, leva à SB entre enfermeiros. Estudos recentes demonstram uma relação significativa e positiva entre o SM e SB e mostram que o SM está, consistentemente, relacionado à exaustão emocional e à despersonalização^3,12. Percebem-se os principais aspectos do ambiente de trabalho que se relacionam com o SM e a SB, tais como: a obstinação terapêutica, o desrespeito aos direitos do paciente, o constrangimento moral do enfermeiro, a incompetência da equipe de trabalho, a comunicação insuficiente e/ou inadequada, as relações de poder, a insuficiência das condições de trabalho, a sobrecarga de trabalho, a (in)satisfação e a intenção de abandono do trabalho¹³.

Estas situações, muitas vezes, presentes no cotidiano de trabalho despertam inquietações para a elaboração de normas e estratégias resolutivas com vistas à promoção da saúde e da qualidade de vida destes profissionais. O estudo tem como contribuição para a pesquisa e a enfermagem a identificação da associação entre duas variáveis de adoecimento, as quais são relevantes para o contexto hospitalar e podem interferir na saúde dos enfermeiros.

Diante do exposto, apresenta-se como hipótese: O sofrimento moral está associado à síndrome de Burnout entre enfermeiros de um hospital universitário. E, para respondê-la, apresentou-se o seguinte objetivo: analisar a associação entre sofrimento moral e síndrome de Burnout em enfermeiros de hospital universitário.

Método

Delineamento do estudo

Trata-se de um estudo descritivo-analítico e norteado pela ferramenta STROBE (Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology).

Cenário de pesquisa

O estudo foi desenvolvido em um hospital universitário localizado no Rio Grande do Sul, Brasil. A instituição atende 100 % pelo Sistema Único de Saúde e é caracterizada como hospital de ensino, geral, público, de nível terciário. As unidades que fizeram parte desta pesquisa foram: pronto-socorro adulto e pediátrico, clínica médica e cirúrgica, centro obstétrico e unidade ginecológica, unidades de terapia intensiva (adulto, pediátrica, neonatal e cardiológica), ambulatório, setor de hemato-oncologia, pediatria, psiquiatria, centro cirúrgico, centro de materiais e esterilização, sala de recuperação, serviço cardiovascular e setores administrativos.

População, critérios de seleção e definição da amostra

Todos os 303 enfermeiros atuantes nas unidades da instituição foram convidados a participar do estudo. Adotou-se como critério de inclusão ser enfermeiro com atuação mínima de um mês no hospital pesquisado. Foram excluídos os que estavam de licença ou afastamento por qualquer motivo, durante o período de coleta de dados. Estimou-se, para fins de análise, uma amostra mínima para população finita, considerando-se população de 303 enfermeiros, erro amostral de 5% e percentual estimado de 50%, o que resultou num mínimo de 171 participantes. Definiu-se uma amostragem por conveniência em que todos os que estavam atuando em seus setores foram convidados a participar. A amostra final foi composta por 269 enfermeiros.

Instrumentos utilizados

O instrumento de coleta de dados foi composto por um questionário sociodemográfico e laboral, a Escala Brasileira de Distresse Moral em Enfermeiros (EDME-Br) e pelo instrumento Inventário Maslach de Burnout (IMB). O questionário sociodemográfico e laboral foi construído pelos autores deste estudo, contendo os seguintes itens: sexo, escolaridade, tempo de formação, turno de trabalho e vínculo empregatício [sendo caracterizado o Regime Jurídico Único (RJU): por estabilidade profissional; e o Celetista (CLT) que é caracterizado por ser a relação de trabalho do profissional por contrato, afastamento do trabalho, tempo de trabalho na instituição, horas extras, instituição receptiva ao diálogo, chefia receptiva ao diálogo e intenção de deixar o emprego.

A EDME-Br foi originalmente desenvolvida em contexto brasileiro para enfermeiros hospitalares, apresentando confiabilidade de 0,98¹⁴; a escala já está validada para o Brasil e foi solicitado aos autores a autorização para seu uso. O instrumento é composto por 49 itens com dupla escala Likert de seis pontos para analisar a intensidade e a frequência de SM. Os seis constructos são: “Reconhecimento, poder e identidade profissional” com 11 questões, “Cuidado seguro e qualificado” com 11 questões, “Defesa de valores e direitos” com 8 questões, “Condições de trabalho” com 6 questões, “Infrações éticas” com 6 questões e “Equipes de trabalho” com 7 questões. O instrumento avalia o SM através da mediana e intervalo interquartil em que (0 a 2) indica SM baixo e (2,001 a 6) SM moderado a alto¹⁵.

O IMB foi elaborado em 1981⁹ e adaptado para cultura brasileira em 1995¹⁶, ou seja, o instrumento já está validado para o Brasil e foi solicitado aos autores a autorização para seu uso, em contexto hospitalar com enfermeiros, apresentando 0,89 de confiabilidade. Este instrumento avalia a SB de acordo com três dimensões: exaustão emocional, despersonalização e a baixa realização profissional. O IMB apresenta 22 questões divididas nas três dimensões da escala: Exaustão Emocional, composta por nove questões (1, 2, 3, 6, 8, 13, 14, 16 e 20); Despersonalização, composta por cinco questões (5, 10, 11, 15 e 22) e Baixa Realização Profissional, composta por oito questões (4, 7, 9, 12, 17, 18, 19 e 21).

O instrumento é composto por uma escala Likert de cinco pontos com respostas variando de zero “nunca” a 4 “diariamente”, na qual o participante assinala a frequência com que percebe ou sente-se em relação ao enunciado de cada questão. Os pontos de corte para a divisão das dimensões em alto e baixo foram obtidas pelo percentil 75 para as dimensões exaustão emocional e despersonalização e pelo percentil 25 para a dimensão realização profissional, já que possui o escore reverso.

Coleta de dados

A coleta de dados ocorreu no período de abril a junho de 2019 por coletadores previamente capacitados, todos estudantes da pós-graduação com experiência em pesquisas cientificas e coleta de dados de estudos quantitativos. Os enfermeiros foram abordados em seu ambiente de trabalho, os quais tiveram a opção de responder ao instrumento no momento ou entregá-lo posteriormente, com o agendamento prévio de seu recolhimento. Foram realizadas até três tentativas de busca do instrumento preenchido em dias e horários diferentes. Mediante o preenchimento, os coletadores mantinham-se afastados para maior liberdade dos participantes, aproximando-se somente para o recolhimento dos instrumentos e para sanar dúvidas. Os instrumentos preenchidos foram guardados e protegidos em envelopes lacrados, com o objetivo de manter o sigilo das informações e, posteriormente, entregues ao pesquisador responsável. Aos enfermeiros que aceitaram participar da pesquisa, foram dadas informações acerca dos objetivos e da forma de participação no estudo, riscos e benefícios da pesquisa.

Foi-lhes, ainda, entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o qual foi assinado pelo participante e pesquisador, ficando uma via para cada um dos envolvidos, o que lhes garantia o direito de desistência de sua participação a qualquer momento, sem exposição pública de suas informações.

Análises dos dados

Os dados foram organizados no programa Epinfo^® versão 6.4 com dupla digitação independente e verificação dos erros e inconsistências. Para a análise, foi empregado o software estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 18.0 para Windows. Utilizou-se de estatística descritiva com distribuição de frequência absoluta e relativa para variáveis categóricas e medidas de tendência central e dispersão para variáveis quantitativas.

A distribuição da normalidade foi verificada pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. Realizou-se o teste de Mann-Whitney para identificação da associação entre intensidade e frequência de SM e respectivas dimensões com a síndrome de Burnout e suas dimensões, sendo considerado significativo quando P<0,05. Posteriormente, realizou-se a análise bivariada por meio do teste do Qui-quadrado ou Exato de Fischer, para a identificação de variáveis sociodemográficas e laborais e da síndrome de Burnout associadas ao sofrimento moral, para elencar quais delas iriam compor o modelo de regressão. Assim, empregou-se a regressão de Poisson com variância robusta e ajustada, sendo estimadas as razões de prevalência (RP) e seus intervalos de confiança (IC 95%). O sofrimento moral foi considerado a variável dependente. Incluíram-se nas análises brutas as seguintes variáveis independentes: sexo, horas extras, vínculo empregatício, escolaridade, afastamento do trabalho, intenção de deixar o emprego, turno de trabalho, instituição receptiva ao diálogo, chefia receptiva ao diálogo, exaustão emocional, despersonalização e baixa realização profissional com valor de P<0,20. Na análise ajustada 1 àquelas que apresentaram valor de P<0,15 e, por fim, na análise ajustada 2, as que apresentaram P<0,05. O nível de significância adotado foi de 5%^17-18.

Como forma de analisar a qualidade do modelo de regressão, verificaram-se os indicadores de multicolinearidade por meio do procedimento de regressão linear, medida de tolerância e variance inflation factor (VIF), pelos quais não foi registrada multicolinearidade, em razão dos valores de tolerância e VIF terem se enquadrado em níveis maiores de 0,1 e menores de 5, respectivamente, indicando a adequação do modelo¹⁸.

Aspectos éticos

Foram respeitados todos os preceitos éticos da pesquisa envolvendo seres humanos conforme estabelecido na Resolução 466/12¹⁹. Este estudo faz parte de um projeto matricial intitulado “Sofrimento moral em enfermeiros hospitalares: qual sua relação com clima ético e Burnout?”, o qual foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa local sob parecer de aprovação número 2.764.702.

Resultados

Os participantes do estudo foram 269 enfermeiros, sendo: 88,1% (n=237) do sexo feminino; 69,9% (n=188) com tempo superior a 10 anos de formação e 69,5% (n=187) com mais de quatro anos de trabalho na instituição.

Entre os seis fatores da escala EDME-Br, observaram-se níveis moderados de intensidade e frequência de SM nos itens de três fatores: “Condições de trabalho” o item (10) “Reconhecer que os equipamentos/materiais permanentes disponíveis são insuficientes” - frequência e intensidade: (mediana 4,0/ amplitude interquartil: 2,0); “Cuidado seguro e qualificado” o item (23) “Reconhecer insuficiência de acesso ao serviço para o usuário” - frequência (mediana: 4,0/ amplitude interquartil: 2,0) e intensidade (mediana: 4,0/ amplitude interquartil: 3,0) e “Equipes de trabalho” o item (3) “Vivenciar condições de sobrecarga de trabalho” - frequência e intensidade: (mediana 4,0/ amplitude interquartil: 2,0).

Destaca-se que houve prevalência de alta exaustão emocional e alta despersonalização em 30,9% (n=83) e 24,9% (n=67) respectivamente e de baixa realização profissional em 26,4% (n=71) dos enfermeiros.

A associação entre a intensidade do SM e SB está apresentada na Tabela 1.

Tabela 1
Índices da associação da intensidade do Sofrimento Moral e Síndrome de Burnout em enfermeiros (n=269). Rio Grande do Sul, Brasil, 2019

		F1 -RPI*			F2 -CSQ†			F3 -DVD‡			F4 -CT§			F5 -IE||			F6 -ET¶			SM Geral**
	N ††	Md ‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||
EE¶¶	Baixo (186)	2,81	2,55	4823,0||||	3,36	2,11	6040,0	2,18	2,88	6263,0	3,83	2,00	5240,5||||	2,75	3,04	5723,0||||	3,14	1,86	4727,5||||	3,02	2,04	5171,0||||
	Alto (83)	4,00	1,91		4,00	1,91		3,00	2,63		4,66	1,67		3,66	2,67		4,14	1,86		3,84	1,74
DP***	Baixo (202)	2,95	2,36	4708,0||||	3,36	2,09	5280,0	2,25	2,88	5171,0	3,83	2,00	5178,5|	2,66	2,88	5209,5	3,21	1,86	4669,5||||	3,07	2,01	4780,0||||
	Alto (67)	3,81	1,55		3,90	2,00		3,37	2,50		4,66	1,67		3,66	2,33		4,00	1,57		3,77	1,69
RP †††	Baixo (71)	3,54	1,55	5136,0||||	3,90	1,91	5831,0	2,75	1,88	5946,5	4,33	1,67	5967,5	3,33	1,83	6216,0	3,71	1,71	5469,5	3,63	1,39	5654,0
	Alto (198)	3,00	2,36		3,36	2,20		2,31	3,03		3,83	2,17		3,00	3,54		3,28	1,89		3,13	2,20
SB‡‡‡	Ausente (250)	3,09	2,18	1144,5||||	3,40	2,18	1442,5|	2,37	2,88	1699,5	4,00	2,00	1673,5	3,00	2,86	1602,0	3,28	1,75	1257,5||||	3,20	1,95	1314,0||||
	Presente (19)	4,36	1,27		4,36	1,36		3,37	2,88		4,66	1,50		4,00	2,00		4,57	1,57		4,13	1,27

• *F1 -RPI = Fator 1 - Reconhecimento, poder e identidade profissional; ^†F2 -CSQ = Fator 2 - Cuidado seguro e qualificado; ^‡F3 -DVD = Fator 3 - Defesa de valores e direitos; ^§F4 -CT = Fator 4 - Condições de trabalho; ^||F5 -IE = Fator 5 - Infrações éticas; ^¶F6 -ET = Fator 6 - Equipes de trabalho; **SM = Sofrimento moral; ^††N = Número; ^‡‡Md = Mediana; ^§§IIQ = Intervalo interquartil; ^||||Mann Whitney U = significância P < 0,01; ^¶¶EE = Exaustão emocional; ***DP = Despersonalização; ^†††RP = Baixa realização profissional; ^‡‡‡SB = Síndrome de Burnout

Houve associação entre a intensidade de SM, as dimensões exaustão emocional, a despersonalização e a baixa realização profissional, em que os enfermeiros com alto exaustão emocional e alta despersonalização apresentaram maior intensidade de SM, tanto para escala geral quanto para os seis fatores. Já os enfermeiros com baixa realização profissional com presença de Burnout apresentaram maior intensidade de SM no Fator 1 - Reconhecimento, poder e identidade profissional, no Fator 2 - Cuidado seguro e qualificado, no Fator 6 - Equipes de trabalho e na escala geral de SM.

A associação entre a frequência de SM e SB está apresentada na Tabela 2.

Tabela 2
Índices da associação da frequência do SM e SB em enfermeiros (n=269). Rio Grande do Sul, Brasil, 2019

		F1-RPI*			F2 -CSQ†			F3-DVD‡			F4 -CT§			F5 -IE||			F6 -ET¶			SM Geral**
	N††	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||	Md‡‡	IIQ§§	U||||
EE¶¶	Baixo (186)	2,09	2,00	4112,0||||	3,00	1,68	5700,0||||	1,37	1,63	5169,0||||	3,83	1,71	5246,0||||	2,00	2,00	5066,0||||	2,85	1,57	4647,0||||	2,56	1,44	4405,0||||
	Alto(83)	3,27	1,73		3,63	2,00		2,25	2,13		4,33	1,33		3,00	2,33		3,85	1,43		3,42	1,36
DP***	Baixo (202)	2,18	1,91	4468,5||||	3,00	1,73	4635,0||||	1,37	1,66	4694,0||||	4,00	2,00	5464,0	2,08	1,88	4974,5||||	3,00	1,57	4570,5||||	2,65	1,43	4421,5||||
	Alto (67)	3,27	2,00		3,63	2,09		2,25	2,50		4,16	1,67		3,00	1,83		3,85	1,43		3,30	1,33
RP†††	Baixo (71)	3,18	1,82	4709,5||||	3,72	1,82	4900,0||||	2,12	1,75	4953,0||||	4,16	1,50	5921,5	2,66	1,67	5767,0|	3,57	1,71	5133,0||||	3,23	1,06	4881,5||||
	Alto (198)	2,18	2,18		3,00	1,73		1,37	1,88		4,00	2,00		2.16	2,17		3,00	1,61		2,60	1,57
SB‡‡‡	Ausente (250)	2,31	2,02	905,5||||	3,04	1,82	1135,0||||	1,50	1,75	1270,5||||	4,00	1,88	1538,5	2,16	1,88	1351,5|	3,00	1,71	1098,5||||	2,73	1,41	978,0||||
	Presente (19)	4,09	1,55		4,54	1,64		2,50	2,63		4,83	1,17		3,33	1,17		4,00	1,86		3,68	1,39

• *F1 -RPI = Fator 1 - Reconhecimento, poder e identidade profissional; ^†F2 -CSQ = Fator 2 - Cuidado seguro e qualificado; ^‡F3 -DVD = Fator 3 - Defesa de valores e direitos; ^§F4 -CT = Fator 4 - Condições de trabalho; ^||F5 -IE = Fator 5 - Infrações éticas; ^¶F6 -ET = Fator 6 - Equipes de trabalho; **SM = Sofrimento moral; ^††N = Número; ^‡‡Md = Mediana; ^§§IIQ = Intervalo interquartil; ^||||Mann Whitney U:significância P < 0,01; ^¶¶EE = Exaustão emocional; ***DP = Despersonalização; ^†††RP = Baixa realização profissional; ^‡‡‡SB = Síndrome de Burnout

Houve associação entre a frequência de SM, as dimensões exaustão emocional, despersonalização e baixa realização profissional, em que enfermeiros com alta exaustão emocional, alta despersonalização e baixa realização profissional apresentaram maior frequência de SM tanto para escala geral quanto para os seis fatores.

Com o intuito de avaliar as associações encontradas entre o SM, SB e as variáveis sociodemográficas e laborais, são apresentadas na Tabela 3 as prevalências e associações bruta e ajustada por meio da Regressão de Poisson.

Tabela 3
Análise de regressão bruta e ajustada do Sofrimento moral, relacionada a variáveis sociodemográficas e laborais e às dimensões da Síndrome de Burnout. (n=269). Rio Grande do Sul, Brasil, 2019

Variável	RPb*	IC †(95%)	p‡	RPaj1§	IC†(95%)	p‡	RPaj2||	IC†(95%)	p‡
Sexo
Feminino	1,065	0,970-1,171	0,118
Masculino	1	-
Horas-extras
Sim	1,054	1,001-1,110	0,045	1,032	0,979-1,087	0,243
Não	1	-		1	-
Vínculo empregatício
RJU¶	1,067	1,016-1,120	0,009	1,066	1,014-1,121	0,012	1,074	1,024-1,127	0,003
CLT**	1	-		1	-		1	-
Escolaridade
Graduação	1,085	0,959- 1,228	0,195
Especialização	0,992	0,874-1,125	0,895
Mestrado	0,964	0,814-1,143	0,677
Doutorado	1	-
Afastamento do trabalho
Sim	1,039	0,988- 1,092	0,13	1,017	0,970- 1,067	0,486
Não	1	-		1	-
Intenção de deixar o emprego
Sim	1,089	1,042-1,138	0,0001	1,054	1,005-1,104	0,029	1,064	1,017-1,114	0,008
Não	1	-		1	-		1	-
Turno de trabalho
Manhã	1,098	1,011-1,193	0,026	1,096	1,011-1,118	0,026	1,093	1,010-1,182	0,027
Tarde	1,027	0,937-1,125	0,574
Noite	1,021	0,936-1,113	0,642
Misto	1	-		1	-		1	-
Instituição receptiva ao dialogo
Sim	1,064	1,003-1,130	0,041	1,014	0,956-1,075	0,646
Não	1	-		1	-
Chefia receptiva ao dialogo
Sim	1,012	0,939-1,090	0,75
Não	1	-
Exaustão Emocional
Baixo	1
Alto	1,110	1,064-1,158	1,082	1,035-1,131	<0,001		1,089	1,044-1,137	<0,001
Despersonalização
Baixo	1,092	1,045-1,140	0,000	1,035	0,988-1,084	0,143
Alto	1	-		1	-
Baixa Realização profissional
Baixo	1,119	1,076-1163	0,000	1,082	1,040-1,126	<0,001	1,098	1,057-1,141	<0,001
Alto	1	-		1	-		1	-

• *RPb = Razão de Prevalência bruta (P < 0,20); ^†IC = Intervalo de confiança (95%); ^‡p = significância; ^§RPja1= Razão de Prevalência ajustada (P<0,15) SM + horas extras + afastamento + receptiva ao diálogo+ despersonalização; ^||RPja2= SM + vínculo empregatício + intenção de deixar o emprego + turno + desgaste emocional + realização profissional (P < 0,05). ^¶RJU = Regime Jurídico Único; **CLT = Celetista

Depois da realização da análise ajustada, evidenciou-se que enfermeiros com atividades laborais no turno da manhã, com vínculo empregatício de Regime Jurídico Único (RJU) e com intenção de deixar o emprego apresentaram, respectivamente, uma prevalência mais elevada de 9%, 7% e 6% para o SM quando comparados às demais variáveis. Observa-se, ainda que enfermeiros com baixa realização profissional e alta exaustão emocional apresentaram, respectivamente, uma prevalência mais elevada de 9% e 8% para o SM.

Discussão

Este estudo demonstrou associação entre o SM e SB bem como entre suas respectivas dimensões, constatando que a alta exaustão emocional, a alta despersonalização e a baixa realização profissional estão relacionadas ao exercício do compartilhamento de decisões entre os enfermeiros e seus colegas, além da deliberação moral mediante situações difíceis de serem resolvidas, o que vem a comprometer a saúde do trabalhador³.

Neste sentido, considerando o modelo de regressão, observou-se que as maiores prevalências de SM estavam entre os enfermeiros do turno da manhã, com vínculo de trabalho RJU, intenção de deixar o emprego, alta exaustão emocional e baixa realização profissional.

Os enfermeiros atuantes no turno de trabalho da manhã tinham maior prevalência para o SM devido à sobrecarga de trabalho conforme as diversas rotinas que ocorrem neste turno, como os banhos, curativos, visitas médicas, além das interferências internas e intercorrências clínicas²⁰. Os profissionais com vínculo de trabalho RJU tinham maior prevalência para o SM devido à falta de estabilidade que este contrato proporciona aos seus colaboradores²¹. Corroborando esses fatos, observou-se na literatura que os profissionais de contrato RJU, mesmo mediante a estabilidade que o emprego fornece, têm maior probabilidade de sair do emprego por questões de sobrecarga de trabalho e, consequentemente, maior vivência de sofrimento psíquico e exaustão emocional²².

A intenção de deixar o emprego é justificada pela maior prevalência de SM e alguns fatores podem interferir, como: longas jornadas de trabalho, salários reduzidos e dificuldade de relacionamento com outros profissionais. Dessa forma, percebe-se que os enfermeiros que trabalham por um período acima de 40 horas semanais têm maior propensão a deixar o emprego se comparados com enfermeiros que possuem uma carga horária de trabalho inferior ou igual a 40 horas semanais²³, evidenciando que cada aumento na frequência de SM pode dobrar as chances da intenção de sair do emprego²⁴.

A alta exaustão emocional entre os profissionais da enfermagem pode estar relacionada à gravidade dos pacientes e à ampliação da carga de trabalho e à escassez de recursos humanos²⁵. A rotina de trabalho destes profissionais abrange a sobrecarga física e emocional, os déficits de recursos humanos e materiais, a baixa valorização e a falta de incentivo ao desenvolvimento profissional³.

A baixa realização profissional reflete uma autoavaliação negativa do desempenho e motivação de atuação, evidenciando um declínio do sentimento de competência e produtividade, causando prejuízos ao ambiente de trabalho²⁶. Dessa forma, estes profissionais sentiam-se incapazes de desenvolver tarefas, estando menos satisfeitos com o trabalho mediante a desvalorização de seu rendimento laboral²⁷.

Os achados indicaram que o fator “Condições de trabalho”, que se refere aos problemas relacionados aos recursos materiais e equipamentos disponíveis inadequados, são riscos para o surgimento de conflitos éticos, prejudicando a qualidade da assistência e, consequentemente, sendo um preditor para o SM, estes achados expressam a ocorrência de SM em ambientes de trabalho^5,15.

O fator “Cuidado seguro e qualificado” indicou problemas na insuficiência de acesso ao serviço e às ações educativas, acolhimento inadequado e prejuízos ao cuidado, demandas de continuidade do cuidado não atendidas e falta de resolutividade das ações de saúde. Os profissionais estão propensos a desenvolver sintomas de desgaste emocional e físico devido ao ambiente de trabalho que envolve demandas complexas, expectativas do cuidado ao paciente e poucos recursos disponíveis para atender de forma adequada²⁸.

O fator “Equipes de trabalho” apresentou problemas em relação ao número insuficiente de profissionais para atender à demanda, além da sobrecarga de trabalho e médicos despreparados. Em concordância com esses resultados, estudo brasileiro demonstrou resultados semelhantes, visto que este fator apresentou maiores medianas de intensidade e frequência de SM se comparado aos demais, uma vez que, numa equipe, o número inadequado de profissionais ocasiona a sobrecarga de trabalho e, consequentemente, não poderá haver o devido cuidado para o paciente¹⁵.

Neste estudo, demonstrou-se associação entre a intensidade (P < 0,001) e a frequência (P < 0,001) de SM e as dimensões da SB. Em unidades de cuidado intensivo, os enfermeiros apresentaram grau de médio a alto desgaste emocional e de despersonalização, se comparado àqueles que trabalham em unidades de internação²⁹. Por sua vez, isso pode estar associado à exposição dos enfermeiros às intensas jornadas de trabalho, sentimento de desmotivação em realizar as tarefas e à dificuldade em relacionar-se com colegas e pacientes, levando à vivência de maior intensidade de SM³⁰. No que concerne a relação entre a frequência de situações de SM e as dimensões SB, demonstra-se que, nesta perspectiva, estudos sinalizam a necessidade de medidas resolutivas para amenizar o adoecimento entre os enfermeiros³¹ bem como a sua interferência na qualidade do cuidado ofertado³².

Conforme mostra a literatura, em relação à enfermagem atuante em ambiente hospitalar e na atenção básica de Punta Arenas, quase a metade destes profissionais de saúde apresentaram níveis baixos ou médios de realização profissional³³. Em estudo realizado foi possível observar que a realização profissional influencia negativamente o SM, mostrando que quanto maior a realização profissional menor é o SM³⁴. A baixa realização profissional no trabalho pode ser descrita como uma sensação de que pouco tem sido alcançado, provocando a diminuição da motivação e do sentimento de realização³⁰.

Configura-se como limitação deste estudo a questão de este ter sido realizado somente em um único hospital, o que dificulta a generalização dos resultados.

Entretanto, ele contribui para o avanço do conhecimento na área da enfermagem mediante a avaliação da associação da frequência e da intensidade do SM e as dimensões da SB. Mediante este resultado, sinaliza-se a necessidade da elaboração de ações que promovam a redução aos agravos à saúde do trabalhador, abordando estratégias para melhor organização institucional, dimensionamento pessoal e de recursos materiais para que se possa fornecer uma assistência segura e qualificada.

Sugere-se, para publicações futuras, a realização de estudos que abranjam os demais profissionais da saúde em diferentes contextos e serviços bem como, de acordo com o que foi percebido, estudos de intervenção que venham trazer soluções para as instituições.

Conclusão

Com base na análise deste estudo, evidenciou-se a associação entre o SM e SB bem como entre suas dimensões nas quais a intensidade e a frequência de SM estavam associadas à alta exaustão emocional, alta despersonalização e baixa realização profissional. Verificou-se, ainda, que enfermeiros do turno da manhã, Regime Jurídico Único e intenção de deixar o emprego com baixa realização profissional e alta exaustão emocional, apresentaram prevalências mais elevadas para o SM.

Os resultados do presente estudo sinalizam a necessidade de investigar intervenções urgentes para amenizar as situações e as manifestações do SM e da SB, elaborando estratégias para a saúde dos trabalhadores. Espera-se que o presente estudo contribua para a compreensão e o alerta sobre a importância das implicações do SM e da SB na saúde do trabalhador, assim como no cuidado ofertado ao paciente.

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• Trabalho acadêmico associado

  Artigo extraído da dissertação de mestrado “Sofrimento moral e síndrome de Burnout em enfermeiros de um hospital universitário”, apresentada à Universidade Federal de Santa Maria, Departamento de Enfermagem, Santa Maria, RS, Brasil.

• Financiamento

  O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) - Código de Financiamento 001 e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - Edital Universal, processo nº 422701/2018-1, Brasil.

Editado por

Editora Associada

Maria Lúcia do Carmo Cruz Robazzi

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  30 Jan 2023
• Data do Fascículo
  Jan-Dec 2023

Histórico

• Recebido
  08 Mar 2022
• Aceito
  14 Jul 2022