Acessibilidade / Reportar erro

Concepções e exercícios da autonomia entre os movimentos indígenas e camponeses da América Latina

Conceptions and exercise of autonomy among indigenous and peasant movements in Latin America

Concepciones y ejercicios de la autonomía entre los movimientos indígenas y campesinos de América Latina

Resumo

Neste ensaio, propomos apresentar uma categorização das autonomias elaboradas pelos movimentos indígenas e camponeses na América Latina em três tipos: a) autonomias jurídicas versus autonomias de fato; b) autonomias explícitas versus autonomias implícitas; e c) autonomias (mono)étnicas versus autonomias populares ou de classe. Argumentamos que o debate entre essas diferentes concepções adquire uma possível importância estratégica tanto no diálogo entre as lutas indígenas e camponesas pela defesa dos territórios quanto em uma concepção de autonomia camponesa, apreendida como uma estratégia de luta.

Palavras-chave:
Autonomia; movimentos sociais; campesinato; povos indígenas; América Latina.

Abstract

In this paper we present a categorization of autonomies implemented by indigenous and peasant movements in Latin America into three types: a) juridical versus de facto autonomies; b) explicit versus implicit autonomies; and c) (mono)ethnic versus popular or class-based autonomies. We argue that the debate concerning these different conceptions is of strategic importance both in the dialogue between indigenous and peasant struggles for the defense of territories, and in the question of peasant autonomy, understood as a strategy of struggle.

Keywords:
Autonomy; social movements; peasantry; indigenous peoples; Latin America.

Resumen

En este ensayo proponemos presentar una categorización de las autonomías elaboradas por movimientos indígenas y campesinos de América Latina, en tres tipos: a) autonomías jurídicas versus autonomías de facto; b) autonomías explícitas versus autonomías implícitas y c) autonomías (mono) étnicas versus autonomías populares o de clase. Argumentamos que el debate entre esas diferentes concepciones adquiere una posible importancia estratégica tanto en el diálogo entre luchas indígenas y campesinas con respecto a la defensa de los territorios como en una concepción de autonomía campesina, aprehendida como estrategia de lucha.

Palabras-clave:
Autonomía; movimientos sociales; campesinado; pueblos indígenas; América Latina.

Introdução à reflexão: por que a autonomia?

Neste ensaio, propomos apresentar uma categorização das autonomias elaboradas pelos movimentos indígenas e camponeses na América Latina em três tipos: a) autonomias jurídicas versus autonomias de fato; b) autonomias explícitas versus autonomias implícitas; e c) autonomias (mono)étnicas versus autonomias populares ou de classe. Para isso, partimos de uma pergunta inicial: por que pensar a autonomia baseada em uma categorização? Por considerarmos essencial inscrever a autonomia na história social e política da região, compreendendo-a a partir da diferentes perspectivas das lutas indígenas e camponesas1 1 As reflexões do ensaio incluem pesquisas realizadas (e citadas) por nós, análise dos documentos oficiais dos movimentos mencionados, bem como nosso lugar de atuação teórico-política como pesquisadora e pesquisador militantes em alguns dos movimentos apresentados no artigo. na defesa de seus territórios e dos comuns.

Nesse sentido, o final do século XX foi marcado por dois acontecimentos políticos emblemáticos que contribuíram para uma nova abordagem teórica, epistêmica e analítica no âmbito da teoria crítica contemporânea, notadamente nos estudos de história e geografia agrárias, indigenista, camponesa e da teoria política na América Latina e no Caribe: a) a Campanha 500 Anos de Resistência Indígena, Negra e Popular (1989-1992); b) a insurgência armada do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) em 1994. Um elemento comum entre ambos é o fato de serem o resultado de um amálgama social forjado em lutas históricas seculares, rebeliões e revoluções de caráter indígena e camponês, de questionamento da persistência do colonialismo e da insistência em demarcar a questão agrária e a questão indígena como eixos estruturantes de conflitos e tensões históricos inerentes à natureza do desenvolvimento capitalista na região, e que se agudizam em sua faceta contemporânea do capitalismo por espoliação e de despojo territorial.

No caso das lutas indígenas, as reivindicações históricas incluem o reconhecimento de seus territórios e seus direitos à autodeterminação, suas culturas e línguas, à participação política e, acima de tudo, o direito à autonomia. Embora esse processo tenha uma longa trajetória histórica, o interesse público no debate teórico e político sobre a autonomia alcançou maior visibilidade com a insurgência armada do EZLN. A exigência do reconhecimento da autonomia radical em seus territórios, feita por um exército de homens e mulheres indígenas que declaravam guerra contra o Estado-nação mexicano, foi um dos fenômenos mais marcantes do final do século XX.

Por sua vez, a Campanha 500 Anos de Resistência Indígena, Negra e Popular envolveu organizações de cinco regiões do continente: América do Norte, América Central, Andina, Cone Sul e Caribe, com os objetivos de (Secretaria Operacional, 1992Secretaria Operativa. “Campaña Continental 500 Años de Resistencia Indígena, Negra y Popular, 1992.” https://cutt.ly/aGfd5Gk
https://cutt.ly/aGfd5Gk...
): refletir coletivamente sobre os significados da celebração dos 500 anos da Conquista em um contexto de persistência da questão colonial na contemporaneidade; resgatar a memória histórica para fortalecer a identidade política; retomar formas ancestrais de organização e promover uma agenda política popular; fazer da Campanha um espaço de comunicação, encontros, articulação e construção da unidade política, da solidariedade internacional e da busca da paz e do bem-estar dos povos. Da Campanha nasceram a Via Campesina Internacional (LVC) e a Coordenadora Latino-Americana de Organizações do Campo (CLOC), uma aliança global e regional de lutas agrárias para propor uma agenda teórica e política comum, que proporcionasse uma interpretação crítica e coletiva do atual estágio de desenvolvimento capitalista, ao tempo que se propusesse traçar um conjunto de estratégias e ações em uma articulação global para a reforma agrária, a soberania alimentar e a defesa dos territórios.

Mas por que destacamos esses dois fatos como ponto de partida para situar a autonomia? Como argumentamos em outro artigo (Rosset e Barbosa, 2021ROSSET, Peter Michael; BARBOSA, Lia Pinheiro. Peasant autonomy: the necessary debate in Latin America. Interface: a journal for and about social movements, v. 13, n. 1, p. 46-80, 2021.), a insurgência zapatista fez com que o fantasma da autonomia começasse a assombrar a América Latina, especialmente nas décadas seguintes, quando muitas análises e debates sobre a autonomia indígena foram realizados, em diálogos frutíferos com a tradição anarquista sobre autonomia, mas também provocando duras críticas da tradição marxista e de certos setores da esquerda.

No âmbito desse debate, identificamos três aspectos que merecem ser destacados: a) a forma como a esquerda convencional, em grande medida, não reconheceu as reivindicações relacionadas à autonomia feitas pelos movimentos indígenas (e afrodescendentes) como demandas legítimas, em parte por associar a autonomia aos marcos teórico-políticos do anarquismo, ou mesmo pelo racismo generalizado nas sociedades latino-americanas, do qual a esquerda não está isenta, ainda que inconscientemente; b) uma tendência, relacionada a este aspecto do racismo, de certa supressão étnica (Rivera Cusicanqui, 1999RIVERA CUSICANQUI, Silvia. Sendas y senderos de la ciencia social andina. Disposition: American journal of cultural histories and theories, v. 24, n. 51, p. 149-169, 1999.) no âmbito das ciências sociais e dos debates histórico-políticos das esquerdas, ao considerar que os povos originários não possuem capacidade crítica suficiente para propor uma concepção do exercício da hegemonia, articulada a um paradigma de pensamento próprio e a um projeto político emancipatório. Esta tendência a uma supressão étnica pode ser resultado das assimetrias nas relações estabelecidas entre esses sujeitos e o mundo indígena-camponês, e de um espírito vanguardista que tende a considerar os movimentos indígenas como pré-políticos; c) o desenvolvimento de uma espécie de blindagem para um possível diálogo entre os povos indígenas que lutam pela autonomia e outras organizações populares de camponeses e trabalhadores rurais com uma identidade política mais marxista, uma vez que as tendências mais ortodoxas do marxismo negavam a validez política das identidades étnicas na luta de classes. Apesar da consolidação exitosa da autonomia zapatista, esses aspectos revelam que ainda há uma relutância em discutir a autonomia, para além de suas estruturas teóricas e conceituais.

No entanto, identificamos a necessidade de superar essa relutância e promover o diálogo entre a autonomia indígena e a autonomia camponesa (Rosset e Barbosa, 2021ROSSET, Peter Michael; BARBOSA, Lia Pinheiro. Peasant autonomy: the necessary debate in Latin America. Interface: a journal for and about social movements, v. 13, n. 1, p. 46-80, 2021.). Nosso argumento se baseia em dois eixos: que a autonomia não é uma aposta política exclusiva do anarquismo e dos povos indígenas e/ou de movimentos afrodescendentes (embora com diálogos profundos entre eles), e que a luta camponesa aponta implicitamente - embora não muito explicitamente - na direção da proposta de autonomia, com muitos elementos que estão em diálogo direto com as autonomias indígenas. A pandemia da Covid-19 abriu uma conjuntura particular que destacou as fragilidades e os pontos fortes dos movimentos rurais, fragilidades que poderiam ser abordadas e pontos fortes que poderiam ser fortalecidos, argumentamos, com uma mudança mais autônoma nas estratégias de luta e de construção coletiva de alternativas territoriais (Rosset e Barbosa, 2021ROSSET, Peter Michael; BARBOSA, Lia Pinheiro. Peasant autonomy: the necessary debate in Latin America. Interface: a journal for and about social movements, v. 13, n. 1, p. 46-80, 2021.).

A experiência de uma situação-limite catastrófica, de sobreviver à letalidade de um vírus, está vinculada a um sentido mais amplo e profundo de defesa da vida, especialmente diante do forte argumento, no campo do debate científico, da possível ligação entre ciclos pandêmicos e um modelo de produção em larga escala, como a pecuária industrial. Este modelo produtivo, sujeito à aplicação permanente de agrotóxicos para prevenir e/ou eliminar outra série de contaminações causadas pelo próprio confinamento, promove espaços propícios à circulação de bactérias e vírus suscetíveis a mutações, o que pode culminar em cepas virulentas altamente perigosas, não só para a saúde dos animais, mas para a própria saúde humana (Wallace, 2016WALLACE, Rob. Big farms make big flu. New York: Monthly Review Press, 2016.). Portanto, a pandemia reforça os argumentos políticos dos movimentos indígenas e camponeses acerca da proteção do bioma e da defesa de seus territórios e dos bens comuns, premissas que podem ser vinculadas às autonomias como um mecanismo de defesa e proteção da existência da vida coletiva em contraposição às múltiplas formas de desapropriação provocadas pelo capital (Mora, 2021MORA, Mariana. “Entre la autonomía como ejercicio propositivo y la autonomía a la defensiva, transformaciones de sentidos políticos indígenas frente a la violencia extrema en México”. In: GONZÁLEZ, Miguel; BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli; MARIMÁN, José; ORTIZ-T, Pablo; FUNAKI, Ritsuko (eds..). Autonomías y autogobiernos en la América Diversa. Ecuador: IWGIA, p. 507-534, 2021.).

A incorporação mais recente da autonomia no debate interno das lutas camponesas responde, em grande medida, aos limites e contradições no atendimento das reivindicações, especialmente da reforma agrária, pelos governos progressistas, bem como às consequências da ascensão da extrema direita, sobretudo aquelas relacionadas ao desmonte sistemático das políticas agrárias e à ofensiva violenta em seus territórios, com o aumento dos conflitos agrários. Nesse sentido, por que retomar ou iniciar o debate da autonomia? Podemos dizer que a autonomia representa força, quando a consideramos como o oposto da heteronomia, da dependência, que nada mais é do que fraqueza ou vulnerabilidade. No contexto da pandemia, evidenciam-se fragilidades e vulnerabilidades que são resultado de problemáticas históricas, da pré-existência de uma cultura de dependência de estruturas frágeis tanto dos governos quanto do setor privado, desinteressados dos problemas das comunidades; dependência que impediu o avanço dos movimentos sociais no campo, mesmo com os chamados governos progressistas. Dependência, por exemplo, de partidos políticos eleitoreiros e de orçamentos públicos, que muitas vezes dificultam a construção e/ou o fortalecimento de processos autogeridos de transformação e melhoria substancial da realidade nas áreas rurais. Em países que já enfrentam o autoritarismo populista e neofascista (Borras Jr., 2020BORRAS JR., Saturnino M. Agrarian social movements: the absurdly difficult but not impossible agenda of defeating right-wing populism and exploring a socialist future. Journal of Agrarian Change, v. 1, n. 20, p. 03-36, 2020.; Barbosa, 2020BARBOSA, Lia Pinheiro. Challenges facing Latin American peasant movements under progressive governments and new right-wing parties. Latin America Perspectives, v. 47, n. 5, p. 94-112, 2020.; Scoones et al., 2018SCOONES, Ian, EDELMAN, Marc, BORRAS, Saturnino M., HALL, Ruth, WOLFORD, Wendy; WHITE, Ben. Emancipatory rural politics: Confronting authoritarian populism. The Journal of Peasant Studies, v. 1, n. 45, p. 01-20, 2018.), a dependência de instituições públicas gera ainda mais vulnerabilidade. Todo o contexto político de avanço do autoritarismo populista de direita, crise sanitária, econômica e alimentar, criou as condições para uma abertura ao debate sobre autonomia dentro dos principais movimentos e organizações rurais da América Latina.

Enquanto isso, o movimento indígena e sua intelectualidade orgânica argumentam, com veemência, a proposta política da autonomia territorial (Burguete Cal y Mayor, 2018BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli. “La autonomía indígena: la polisemia de un concepto. A modo de prólogo”. In: LÓPEZ, Pavel López; GARCÍA GUERRERO, Luciana (eds.). Movimientos indígenas y autonomías en América Latina: escenarios de disputa y horizontes de posibilidad. Buenos Aires: CLACSO, p. 11-22, 2018.; García Guerrero; Monasterio Mercado, 2022GARCÍA GUERRERO, Luciana; MONASTERIO MERCADO, Fátima (coords.). Luchas territoriales por las autonomías indígenas en Abya Yala. Diálogo de Saberes desde la Amazonía sur, Bolivia. Buenos Aires: Editorial El Colectivo, 2022.), a partir de suas próprias ontologias e epistemologias, uma proposta que é reafirmada todos os dias, tanto nas autonomias realmente vivenciadas quanto em suas elaborações teóricas (Escobar, 2020ESCOBAR, Arturo. Desde abajo, por la izquierda y con la Tierra.” El País, Serie Desafíos Latinoamericanos, n. 7, 2020. https://elpais.com/elpais/2016/01/17/contrapuntos/1453037037_145303.html [Acessado em julho de 2020].
https://elpais.com/elpais/2016/01/17/con...
; Burguete Cal y Mayor, 2018BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli. “La autonomía indígena: la polisemia de un concepto. A modo de prólogo”. In: LÓPEZ, Pavel López; GARCÍA GUERRERO, Luciana (eds.). Movimientos indígenas y autonomías en América Latina: escenarios de disputa y horizontes de posibilidad. Buenos Aires: CLACSO, p. 11-22, 2018.). E depois de três décadas desde a Campanha 500 Anos de Resistência Indígena, Negra e Popular, a criação da LVC/CLOC e a insurgência do EZLN, vemos possibilidades de diálogo entre as concepções de autonomia indígena e camponesa, semeadas em uma temporalidade histórica mais longa, porém de colheitas de nossa história recente.

A proposta de autonomia indígena não é a mesma que a proposta de autonomia mais visível, que é a do anarquismo, embora em certos temas e momentos elas dialoguem entre si (Rosset e Barbosa, 2021ROSSET, Peter Michael; BARBOSA, Lia Pinheiro. Peasant autonomy: the necessary debate in Latin America. Interface: a journal for and about social movements, v. 13, n. 1, p. 46-80, 2021.). Argumentamos que, embora a luta pela autonomia seja fundamental para a história camponesa (Chayanov, Sevilla Guzmán, Wolf, van der Ploeg, Hellman e Fox), parte da relutância em discutir a autonomia por parte das organizações camponesas decorre de mal-entendidos anteriores entre o movimento camponês e o anarquismo urbano e de classe média, que se transferem para o debate atual. Também de uma tendência a subestimar as lutas indígenas, conforme mencionamos. Nesse sentido, é importante observar que a proposta de autonomia indígena tem outras raízes ontológicas e epistêmicas, enraizadas no campo e na vida indígena-camponesa e, portanto, não deveria gerar a mesma rejeição (Baronnet, 2010BARONNET, Bruno. Zapatismo y educación autónoma: de la rebelión a la dignidad indígena. Sociedade e Cultura, v. 2, n. 13, p. 247-258, 2010.; Baronnet et. al. 2011BARONNET, Bruno, MORA BAYO, Mariana; STAHLER-SHOLK, Richard. (eds). Luchas “muy otras” Zapatismo y autonomía en las comunidades indígenas de Chiapas. México: CIESAS/UNACH, 2011.; Mora, 2017MORA, Mariana. Kuxlejal Politics: Indigenous Autonomy, Race, and Decolonizing Research in Zapatista Communities. Austin: University of Texas, 2017.). Essas raízes históricas são anteriores à Conquista e estão relacionadas às formas de coabitar seus territórios e às formas de organização comunitária (Escobar, 2020ESCOBAR, Arturo. Desde abajo, por la izquierda y con la Tierra.” El País, Serie Desafíos Latinoamericanos, n. 7, 2020. https://elpais.com/elpais/2016/01/17/contrapuntos/1453037037_145303.html [Acessado em julho de 2020].
https://elpais.com/elpais/2016/01/17/con...
). A própria concepção do Abya Yala como um território transfronteiriço também representava outras formas de organização política, sociocultural e econômica.

Com base nessas reflexões iniciais, consideramos fundamental uma categorização das autonomias elaboradas pelos movimentos indígenas e camponeses na América Latina. Argumentamos que o debate entre essas diferentes concepções adquire uma possível importância estratégica para o movimento camponês mais amplo, que inclui camponeses, povos indígenas, afrodescendentes, trabalhadores rurais, sem-terra, nômades, pescadores artesanais, ribeirinhos, povos da floresta e habitantes de pequenas comunidades urbanas espalhadas pelo campo. Acreditamos que a proposta da autonomia pode oferecer perspectivas para liberar todo o potencial dos movimentos sociais rurais na América Latina. Consideramos que as autonomias territoriais, comunitárias, coletivas, camponesas e indígenas, embora parciais, implícitas em vez de explícitas e relativas, podem fortalecer sujeitos sociais com grande potencial político para enfrentar a expansão do capital por espoliação no campo, ao tempo que propicia uma consciência crítica de ser sujeitos coletivos com um caráter de classe (“em si”) e com “potencial revolucionário” (Shanin, 1970SHANIN, Theodor. Class and revolution. Journal of Contemporary Asia, v.1, n. 2, p. 22-35, 1970.).

Autonomia como categoria de análise

De acordo com Araceli Burguete Cal y Mayor,2 2 Comentário realizado em uma aula, no dia 10 de julho de 2019, sobre “Autonomía, y Resistencia en México,” no seminário de doutorado “Procesos de Autonomía Territorial,” coordenado pela Dra. Carla Zamora e pelo Dr. Peter Rosset, no Doutorado em “Ciencias en Ecología y Desarrollo Sustentable” do El Colegio de la Frontera Sur (ECOSUR), em Chiapas, México. devemos evitar usar a autonomia zapatista, bastante completa e explícita, como unidade de medida para definir se um determinado processo é autônomo ou não. Nessa direção, a autonomia deve ser assumida como uma categoria de análise que nos permite identificar os aspectos autônomos implícitos em maior ou menor grau, sem correr o risco de desqualificar muitos processos que não são diretamente equivalentes a autonomias radicais, como a do zapatismo, mas que fazem parte de processos autônomos. Ela sugere o uso da autonomia como uma categoria de análise no sentido da pesquisa social, e nós acrescentaríamos a autonomia como um elemento de (re)construção coletiva de alternativas, no sentido dos próprios movimentos.

Ao situar a abordagem histórica da autonomia, encontramos na tradição europeia seu significado como um conceito de luta, ou seja, de um projeto histórico-social de autonomia presente na história desses países (CASTORIADIS, 1999CASTORIADIS, Cornelius. Figuras de lo pensable. Madrid: Frónesis, 1999.). Também identificamos uma abordagem similar no pensamento europeu, nas correntes de pensamento social agrário, populista, libertário e anarquista, e nas correntes heterodoxas do pensamento marxista (Sevilla Guzmán, 2006SEVILLA GUZMÁN, Eduardo. Desde el pensamiento social agrario. Córdoba: ISEC, 2006., 2011SEVILLA GUZMÁN, Eduardo. Sobre los orígenes de la agroecología en el pensamiento marxista y libertario. La Paz: Plural editors, 2011.; Shanin, 1983SHANIN, Theodor. Late Marx and the Russian Road. New York: Monthly Review Press, 1983.; Modonesi, 2011MODONESI, Massimo. “El Concepto de la autonomía en el marxismo contemporáneo”. In: ADAMOVSKY, Ezequiel et al. Pensar las autonomías. Alternativas de emancipación al capital y el Estado. México: Sísifo Ediciones, Bajo Tierra, p. 19-47, 2011., 2014MODONESI, Massimo. Subalternity, Antagonism, Autonomy: Constructing the Political Subject. London: Pluto, 2014.). Na América Latina, a autonomia tem raízes em outras ontologias e epistemologias (Escobar 2020ESCOBAR, Arturo. Desde abajo, por la izquierda y con la Tierra.” El País, Serie Desafíos Latinoamericanos, n. 7, 2020. https://elpais.com/elpais/2016/01/17/contrapuntos/1453037037_145303.html [Acessado em julho de 2020].
https://elpais.com/elpais/2016/01/17/con...
), embora tenham dialogado com as tradições europeias (Modonesi, 2014MODONESI, Massimo. Subalternity, Antagonism, Autonomy: Constructing the Political Subject. London: Pluto, 2014.). De acordo com Holloway (2015HOLLOWAY, John. “Pensar la esperanza, pensar la crisis”. In: SANDOVAL ÁLVAREZ, Rafael (ed.). Pensar desde la Resistencia Anticapitalista y la Autonomía. México: CIESAS, p. 87-97, 2015., p. 115, 117):

Para los indígenas, los campesinos, los sectores populares y afros de América Latina…no hay nada que pueda asemejarse a una tradición de lucha por las libertades como la que existió en las ciudades europeas a partir del siglo XIII […] En América Latina, estamos ante otra genealogía: las rebeliones de Tupac Amaru y Tupac Katari, las revoluciones de Zapata y Pancho Villa, la revolución de Haití, los quilombos y el cimarronaje […] son los precursores de quienes hoy luchan por la libertad. Todas esas luchas fueron aplastadas a sangre y fuego, o brutalmente aisladas como sucedió con Haití después de 1804… [Hoy] las autonomías de los pueblos indios, negros y mestizos, [tienden] a ser autonomías integrales. Las Juntas de Buen Gobierno zapatistas, los cabildos nasa del Cauca, las expresiones autónomas mapuche, deben abordar todos los aspectos de la vida, desde la producción de alimentos hasta la justicia y el poder. Es por eso que no son parte de la sociedad capitalista hegemónica sino otra cosa, porque más allá del grado de desarrollo que tengan, apuntan en otra dirección.

Uma história de longo prazo teria que começar com a conquista europeia das nações indígenas nas Américas. Durante muito tempo, houve uma combinação tensa de povos subjugados pelos colonizadores europeus, guerras de conquista e resistência - incluindo povos que até hoje afirmam nunca terem sido conquistados (como os Shuar do Equador, os Yaqui do México, etc.), povos não contactados (como os Mashco-Piro no Peru), povos com os quais as coroas europeias haviam assinado tratados e povos conquistados que se rebelaram (por exemplo, a Guerra das Castas em Yucatán no México), até mesmo declarando-se Repúblicas (por exemplo, a República de Yucatán). Nesse sentido, o período histórico da conquista prefigurava um palimpsesto territorial, em que, embora houvesse territórios conquistados, também havia aqueles que lutavam para manter suas formas originais de existência territorial, ainda que na condição de povos conquistados.

Até certo ponto poderíamos dizer que os “territórios indígenas” contemporâneos representam uma combinação do “que restou após a conquista” e dos redutos, deslocamentos e locais de realocação forçada habitados e defendidos por diferentes povos. A longa história da trajetória da autonomia tem sido marcada por constantes revoltas e rebeliões nas quais as autonomias emergem, seja de forma explícita, com declarações de autonomia, ou de forma implícita. Além disso, essas expressões prístinas de autonomia não foram exclusivas dos “povos originários”, pois também se revelaram na resistência histórica dos povos camponeses mestiços e dos povos escravizados de origem africana (por exemplo, no Brasil, Canudos, Caldeirão, República do Palmares, Sete Povos das Missões Orientais e Cangaço).

Como argumentamos, o ciclo de lutas no final do século XX, como a insurgência zapatista, a Campanha 500 Anos de Resistência Indígena, Negra e Popular, a formação da LVC/CLOC, além de múltiplas rebeliões no Equador e na Bolívia (décadas de 1980 e 1990), conduziu ao debate sobre a autonomia como viabilidade política no campo dos processos de resistência em defesa do território (Gutiérrez-Aguilar, 2008; Martínez Torres e Rosset, 2010MARTÍNEZ TORRES, María Elena; ROSSET, Peter Michael. La Vía Campesina: The birth and evolution of a transnational social movement. The Journal of Peasant Studies, v. 37, n. 1, p. 149-75, 2010., 2014MARTÍNEZ TORRES, María Elena; ROSSET, Peter Michael. Diálogo de saberes in La Vía Campesina: food sovereignty and agroecology. The Journal of Peasant Studies, v. 41, n. 6, p. 979-97, 2014.; Barbosa, 2015BARBOSA, Lia Pinheiro. Educación, resistencia y movimientos sociales: la praxis educativo-política de los Sin Tierra y de los Zapatistas. México: LIBRUNAM, 2015., 2017bBARBOSA, Lia Pinheiro. Legados e rupturas da Revolução Soviética desde as lutas sociais na América Latina. Tensões Mundiais, v. 13, n. 24, p. 107-138, 2017b., 2019aBARBOSA, Lia Pinheiro. “Paradigma Epistêmico do Campo e a construção do conhecimento na perspectiva dos movimentos indígenas e camponeses na América Latina”. In: DOS SANTOS, Arlete; COELHO, Lívia Andrade; OLIVEIRA, Júlia Maria da Silva (eds.). Eduação e Movimentos Sociais. Análises e desafios. Jundiaí: Paco Editorial, p. 279-299, 2019a.,bBARBOSA, Lia Pinheiro. El Popol Wuj na contemporânea luta indígena Mesoamericana. Tensões Mundiais, 15(28), p. 75-102, 2019b.).

O movimento indígena é um sujeito político constituinte desse ciclo de lutas que, na realidade, vem ocorrendo há mais de 500 anos de resistência (López Barcenas, 2007LÓPEZ BARCENAS, Francisco. Autonomías indígenas en América Latina. México: Centro de Orientación y Asesoría a Pueblos Indígenas, 2007.; Burguete Cal y Mayor et. al., 2011BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli; ORTIZ-T, William Villa; CHIRIF, Pablo; GARCÍA, Alberto; XAVIER, Albó. Movimientos indígenas en América Latina. Resistencias y nuevos modelos de integración. Dinamarca: IWGIA, 2011.; Prezia, 2015PREZIA, Benedito. História da resistência indígena. 500 anos de luta. São Paulo: Expressão Popular, 2015.). Caracterizados por um tecido social e organizacional baseado na vida comunitária e na defesa do território, a presença dos movimentos indígenas confere outros significados à luta social, uma vez que propõem um projeto político de caráter histórico e que incorpora dimensões ontológicas e epistêmicas fundamentais. Em sua narrativa política, eles recuperam a memória histórica de suas cosmovisões, as matrizes do seu pensamento filosófico, e os conceitos que derivam de suas línguas originárias, que demarcam um paradigma onto-epistêmico próprio que fundamenta a natureza de suas reivindicações, suas práticas e seu projeto político (Barbosa, 2017bBARBOSA, Lia Pinheiro. Legados e rupturas da Revolução Soviética desde as lutas sociais na América Latina. Tensões Mundiais, v. 13, n. 24, p. 107-138, 2017b.; 2019aBARBOSA, Lia Pinheiro. “Paradigma Epistêmico do Campo e a construção do conhecimento na perspectiva dos movimentos indígenas e camponeses na América Latina”. In: DOS SANTOS, Arlete; COELHO, Lívia Andrade; OLIVEIRA, Júlia Maria da Silva (eds.). Eduação e Movimentos Sociais. Análises e desafios. Jundiaí: Paco Editorial, p. 279-299, 2019a.,bBARBOSA, Lia Pinheiro. El Popol Wuj na contemporânea luta indígena Mesoamericana. Tensões Mundiais, 15(28), p. 75-102, 2019b.; 2022BARBOSA, Lia Pinheiro. Onto-Epistemic Paradigm of the Countryside and Social Theory: What Do Popular Movements of Latin America and the Caribbean Teach Us? Educational Studies, v. 58, n. 5-6, p. 620-640, 2022.). Embora a autonomia seja uma exigência política que perpassa a histórica luta indígena, ela se torna mais explícita e alcança uma materialidade mais sólida nesse ciclo de lutas. Nesse sentido, a explicitação das raízes histórico-políticas de sua resistência permitiu que os povos indígenas não fossem suplantados como sujeitos construtores de autonomia.

Autonomias jurídicas versus Autonomias de fato

A questão da autonomia indígena na história contemporânea surgiu vinculada com o debate sobre autodeterminação, entre as décadas de 1960 e 2000, motivado pelo direito normativo da ONU e pelos processos de libertação nacional e descolonização em países africanos, asiáticos e árabes. Iniciou-se um ciclo de luta jurídica no direito internacional, com a obtenção de documentos de referência, como a Primeira Resolução da ONU sobre descolonização, o Artigo 169 da OIT e a Carta da ONU sobre Direitos Indígenas, que se baseavam no reconhecimento do direito à autodeterminação dos povos. Esse ciclo deu origem a questões como a reivindicação de Nacionalidades Indígenas e Estados Plurinacionais (por exemplo, Bolívia e Equador). A última parte desse ciclo foi de pressão para a incorporação e ratificação, nas Constituições, desses direitos conquistados. Uma convergência importante que se originou na parte legalista foi, por exemplo, na Colômbia, com as Reservas Indígenas, as Zonas de Reserva Camponesa e os Conselhos Comunitários de Afrodescendentes, estes últimos com maior debate sobre autonomia.

A ausência do Estado em muitos territórios indígenas, juntamente com a opressão histórica, a expropriação territorial e a discriminação dos povos indígenas, criaram as condições históricas para que a bandeira da autonomia fosse levantada, tornando-se o núcleo duro de seu projeto sociopolítico (Díaz Polanco, 1997DÍAZ POLANCO, Héctor. La rebelión zapatista y la autonomía. México: Siglo XXI Editores, 1997.). No discurso político dos povos indígenas, não se trata de uma rejeição da modernidade e de seu legado, mas de uma abertura ao diálogo e ao reconhecimento dos povos indígenas como um sujeito coletivo com direitos iguais, em uma perspectiva coletiva, da mesma forma que a modernidade reconheceu e garantiu os direitos individuais (Dávalos, 2005DÁVALOS, Pablo. “Movimientos indígenas en América Latina: el derecho a la palabra”. In: DÁVALOS, Pablo (compilador). Pueblos indígenas, Estado y Democracia. Buenos Aires: CLACSO, p. 17-33, 2005.).

Díaz Polanco (1997)DÍAZ POLANCO, Héctor. La rebelión zapatista y la autonomía. México: Siglo XXI Editores, 1997. identifica duas posições principais sobre a autonomia: 1) como um sistema jurídico-político com o objetivo de redimensionar a nação com base em novas relações entre os povos indígenas, os setores socioculturais e o Estado, e 2) a concepção de autonomia como algo próximo à autarquia ou à auto-absorção. Definir o conceito de autonomia a partir de uma perspectiva indígena é uma tarefa complexa, pois não existe um modelo unívoco e a própria autonomia se manifesta de distintas formas e em diferentes escalas entre diferentes povos. Cada vez mais, a autonomia se revela como um conceito polissêmico, em que são os movimentos indígenas que se empenham em lhe dar um significado para além do jurídico, uma vez que engendra projetos de mudança social que fazem parte de um projeto de vida que articula a população local em seu território e para além dele, no sentido de transformar as relações sociais internas e a política cultural local (Burguete Cal y Mayor, 2018BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli. “La autonomía indígena: la polisemia de un concepto. A modo de prólogo”. In: LÓPEZ, Pavel López; GARCÍA GUERRERO, Luciana (eds.). Movimientos indígenas y autonomías en América Latina: escenarios de disputa y horizontes de posibilidad. Buenos Aires: CLACSO, p. 11-22, 2018.; Makaran et al., 2019MAKARAN, Gaya, LÓPEZ, Pabel; WAHREN, Juan (eds.). Vuelta a la autonomía. Debates y experiencias para la emancipación social desde América Latina. México: Bajo Tierra, 2019.; López y Rivas, 2020LÓPEZ y RIVAS, Gilberto. Pueblos indígenas en tiempos de la Cuarta Transformación. México: Bajo Tierra, 2020., Modonesi, 2011MODONESI, Massimo. “El Concepto de la autonomía en el marxismo contemporáneo”. In: ADAMOVSKY, Ezequiel et al. Pensar las autonomías. Alternativas de emancipación al capital y el Estado. México: Sísifo Ediciones, Bajo Tierra, p. 19-47, 2011.).

Entre os principais elementos da autonomia indígena, destacamos: 1) Defesa e reconstituição dos territórios; 2) Reafirmação da identidade cultural e política como povos originários/indígenas; 3) (Re)constituição de suas próprias instituições políticas, sejam elas governos indígenas, governos próprios ou governos comunais (Burguete Cal y Mayor, 2018BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli. “La autonomía indígena: la polisemia de un concepto. A modo de prólogo”. In: LÓPEZ, Pavel López; GARCÍA GUERRERO, Luciana (eds.). Movimientos indígenas y autonomías en América Latina: escenarios de disputa y horizontes de posibilidad. Buenos Aires: CLACSO, p. 11-22, 2018.). A partir das ontologias e epistemologias dos povos indígenas, três princípios são centrais para a autonomia: o princípio da inter-relação, o princípio da complementaridade e o princípio da reciprocidade (Redón Monzón, 2003RENDÓN MONZÓN, Juan José. La comunalidad. Modos de vida en los pueblos indios. México: CONACULTA, 2003.). Burguete Cal y Mayor (2018BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli. “La autonomía indígena: la polisemia de un concepto. A modo de prólogo”. In: LÓPEZ, Pavel López; GARCÍA GUERRERO, Luciana (eds.). Movimientos indígenas y autonomías en América Latina: escenarios de disputa y horizontes de posibilidad. Buenos Aires: CLACSO, p. 11-22, 2018., p. 18) afirma que a autonomia “no opera sobre un cuerpo social como totalidad, sino sobre ciertas dimensiones de la vida social.” Portanto, a autonomia pode se manifestar na organização do território com base em uma estrutura jurídica e em um governo autônomo construído coletivamente, em seus diferentes níveis, comunitário, municipal ou regional, em que o diálogo com a institucionalidade estatal pode ser aberto, ou expresso em uma forma mais radical, como a autonomia zapatista, sem reconhecimento estatal.

O fundamental a considerar nesse ciclo de luta, que ainda está em curso, é o fato de que o movimento indígena latino-americano conseguiu articular a reivindicação da autonomia em um sentido emancipatório, vinculada à luta pela descolonização (Burguete Cal y Mayor, 2018BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli. “La autonomía indígena: la polisemia de un concepto. A modo de prólogo”. In: LÓPEZ, Pavel López; GARCÍA GUERRERO, Luciana (eds.). Movimientos indígenas y autonomías en América Latina: escenarios de disputa y horizontes de posibilidad. Buenos Aires: CLACSO, p. 11-22, 2018.). Como projeto político, as autonomias significam construir seus próprios governos com poderes e competências específicas para a organização social e política em seus territórios (López Barcenas, 2007LÓPEZ BARCENAS, Francisco. Autonomías indígenas en América Latina. México: Centro de Orientación y Asesoría a Pueblos Indígenas, 2007.).

O avanço de uma concepção de autonomia como projeto político provocou temor nos Estados nacionais e respostas imediatas, seja no sentido de reprimir os processos autônomos, como foi o caso da Guatemala e do México (com a presença militar e paramilitar sitiando os territórios autônomos), seja com dispositivos legais de cooptação por meio do reconhecimento do caráter pluricultural da sociedade, como na Bolívia e no Equador (García Guerrero; Monasterio Mercado, 2022GARCÍA GUERRERO, Luciana; MONASTERIO MERCADO, Fátima (coords.). Luchas territoriales por las autonomías indígenas en Abya Yala. Diálogo de Saberes desde la Amazonía sur, Bolivia. Buenos Aires: Editorial El Colectivo, 2022.). Díaz Polanco (1997)DÍAZ POLANCO, Héctor. La rebelión zapatista y la autonomía. México: Siglo XXI Editores, 1997. chama isso de estratégia de indigenismo etnófago, ou seja, ao mesmo tempo em que reconhece a existência de identidades culturais, busca miná-las ou absorvê-las na estrutura institucional do Estado. Observa-se uma apropriação do discurso indígena pelos Estados nacionais, porém com um esvaziamento de seu conteúdo original, sobretudo em sua dimensão política. E quando os Estados nacionais criam autonomias legais “étnicas”, como as reservas na Colômbia (Herrera Arango, 2017HERRERA ARANGO, Johana. La tenencia de tierras colectivas en Colombia: Datos y tendencias. CIFOR Info Brief, n. 203, p, 01-08, 2017.), em territórios coabitados por populações de outras etnias, ou quando, dentro de regiões autônomas, demarcam os territórios de alguns grupos, mas não de outros, como na Costa Atlântica da Nicarágua (del CID Lucero, 2015DEL CID LUCERO, Víctor Manuel. Territorialidad y conflictos interétnicos en la Costa Caribe de Nicaragua. Revista nuestrAmérica, v. 3, n. 05), p. 93-104, 2015.; Fuentes Sánchéz, 2019FUENTES SÁNCHEZ, Waldo Lao. Autonomías indígenas: resistencias y luchas por el reconocimiento en México y Nicaragua. Buenos Aires: Editorial El Colectivo, 2019.), geram - às vezes intencionalmente, suspeita-se - o risco de conflito e violência interétnicos.

No México, por exemplo, a longa história do indigenismo, especialmente no período pós-revolucionário, é uma expressão de como o Estado adotou essa ideologia como um fator definidor de um projeto nacional, no qual a implementação de políticas integracionistas, assimilacionistas, paternalistas e assistencialistas constituiu a maneira de resolver a questão indígena e a etnia como um sinal de atraso e um obstáculo à modernidade. O indigenismo como política de Estado estabeleceu, em suma, uma integração dos povos indígenas por meio de sua assimilação à nacionalidade dominante e da homogeneização cultural e linguística (López y Rivas, 2020LÓPEZ y RIVAS, Gilberto. Pueblos indígenas en tiempos de la Cuarta Transformación. México: Bajo Tierra, 2020.; González Salina, 2016GONZÁLEZ SALINA, Omar Fabián. La utopía de forjar una sola raza para la nación. Mestizaje, indigenismo e hispanofilia en el México posrevolucionario. Revista Historia y Memoria, n. 13, p. 302-330, 2016.; Korbaek; Sánaro Rentería, 2007KORBAEK; Leif; SÁNARO RENTERÍA, Miguel Ángel. El indigenismo en México: antecedentes y actualidad. Ra Ximhai, v. 3, n. 1, p.195-224, 2007.).

No entanto, apesar do avanço das autonomias legais, para os movimentos indígenas, a construção da autonomia não representa uma luta para “assumir o governo” e se instalar no poder. O intuito é construir, ao interior das comunidades, contrapoderes capazes de convertê-los em sujeitos políticos com capacidade de tomar decisões no âmbito comunitário. Portanto, os povos indígenas buscam dispersar o poder (López Barcenas, 2007LÓPEZ BARCENAS, Francisco. Autonomías indígenas en América Latina. México: Centro de Orientación y Asesoría a Pueblos Indígenas, 2007.) a fim de permitir o exercício direto da autonomia na comunidade. A autogestão e as experiências autônomas de autogoverno estão presentes na história política recente de todos os países latino-americanos. No entanto, a insurgência do EZLN destaca uma forma radical de exigir e construir a autonomia explícita como um projeto político, sociocultural e ético, tornando-se a experiência autônoma com maior ressonância nacional e internacional. No entanto, consideramos que o zapatismo não é tanto uma ruptura, mas sim uma continuidade histórica de autonomias em uma perspectiva indígena.

No campo dos debates entre autonomias legais e autonomias de fato, o zapatismo ocupa um lugar de destaque, tanto por exigir o reconhecimento de uma autonomia radical e de fato quanto por, na prática, oferecer a versão mais completa, explícita e radical de autonomia indígena que conhecemos no mundo contemporâneo.3 3 Por esse motivo, parece-nos importante apresentar, ainda que brevemente, as diretrizes da autonomia zapatista. A identidade política do zapatismo articula os seguintes elementos (Barbosa, 2015BARBOSA, Lia Pinheiro. Educación, resistencia y movimientos sociales: la praxis educativo-política de los Sin Tierra y de los Zapatistas. México: LIBRUNAM, 2015.; 2017bBARBOSA, Lia Pinheiro. Legados e rupturas da Revolução Soviética desde as lutas sociais na América Latina. Tensões Mundiais, v. 13, n. 24, p. 107-138, 2017b.): 1. descendência direta dos povos maias; 2. formação política de dupla matriz: uma a partir das organizações indígenas existentes na região, que já haviam sido organizadas tanto pelos maoístas quanto pela Teologia da Libertação, e outra a partir da guerrilha guevarista da FLN; 3. Inspirado no pensamento revolucionário latino-americano; 4. Inspirado no marxismo; e 5. Incorpora a memória histórica da política mexicana, como a Revolução Mexicana de 1910 e o Movimento Estudantil de 1968. Ao levantar-se em armas, os zapatistas se posicionaram contra o NAFTA e denunciaram a situação de extrema pobreza em que viviam os povos indígenas, a exigência de seu reconhecimento como sujeitos de direitos e a convocação de uma nova assembleia constituinte da sociedade civil mexicana. A trajetória política zapatista foi marcada por diferentes momentos, desde a tentativa de diálogo com o Estado, com os Acordos de San Andrés, até a ruptura total e o anúncio da autonomia radical em seus territórios.

Produto, expressão e materialização de um longo processo histórico de resistência dos povos indígenas em toda a América Latina, o zapatismo nomeou a autonomia pela primeira vez em 1995, na Terceira Declaração da Selva Lacandona (Harvey, 1998HARVEY, Neil. The Chiapas Rebellion: The Struggle for Land and Democracy. Durham, NC: Duke University Press, 1998.; Barbosa, 2015BARBOSA, Lia Pinheiro. Educación, resistencia y movimientos sociales: la praxis educativo-política de los Sin Tierra y de los Zapatistas. México: LIBRUNAM, 2015.). Em 1998, a autonomia foi incorporada ao seu projeto político com a criação dos Municípios Rebeldes Autônomos Zapatistas (MAREZ). O zapatismo tem duas estruturas de comando: uma civil, representada pelo Comitê Clandestino Revolucionário Indígena Clandestino - Comando Geral (CCRI-CG) e uma militar, o exército, ou EZLN propriamente dito. Em 2003, o zapatismo anunciou uma nova etapa do projeto de autonomia, com a criação dos Caracóis (centros regionais de autogoverno), as Juntas de Bom Governo (JBG) e a estruturação do Governo Autônomo, representados, respectivamente, por (Barbosa, 2015BARBOSA, Lia Pinheiro. Educación, resistencia y movimientos sociales: la praxis educativo-política de los Sin Tierra y de los Zapatistas. México: LIBRUNAM, 2015.; 2016BARBOSA, Lia Pinheiro. “Educação rebelde e autônoma na práxis revolucionária zapatista”. In: REBUÁ, Eduardo; SILVA, Pedro (eds). Educação e filosofia da práxis: reflexões de início de século. Rio de Janeiro: Letra Capital, p. 48-79, 2016.): 1. No nível local, os agentes autônomos e comissionados, que são as autoridades em cada comunidade; 2. No nível municipal, há as autoridades do município, responsáveis por articular a dinâmica da vida comunitária nas comunidades que compõem o município autônomo; 3. Em 2003, havia cinco Caracóis e estes foram ampliados, em 2019, com mais onze, também chamados de Centros de Resistência Autônoma e Rebeldia Zapatista (CRARZ). Todas as instâncias de autogoverno são coletivas e rotativas.

A estrutura da autonomia definida em 2003 durou duas décadas. Nessa estrutura, as JBGs eram acompanhadas pelo CCRI-CG, para evitar qualquer ato de corrupção, arbitrariedade, injustiça, intolerância e desvio do princípio zapatista do mandar obedecendo. Esse princípio está diretamente relacionado à forma zapatista de participação política, à construção de uma democracia de base, em que o povo concede sua voz aos órgãos representativos dentro do Movimento - JBG, Conselhos Autônomos, CCRI-CG - para comandar, mas em obediência ao povo, às suas decisões consensuais nas assembleias (Subcomandante Insurgente Marcos, 2003Subcomandante Insurgente Marcos. “Chiapas, la treceava estela: una muerte.”, 2003. Disponível em: https://enlacezapatista.ezln.org.mx/2003/07/21/chiapas-la-treceava-estela-segunda-parte-una-muerte/
https://enlacezapatista.ezln.org.mx/2003...
; Stahler Scholk, 2007STAHLER-SHOLK, Richard. Resisting neoliberal homogenization: The Zapatista Autonomy Movement. Latin American Perspectives, 153, p. 48-63, 2007.; EZLN, 2013Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN). Resistencia Autónoma. Cuaderno de texto de primer grado del curso “La libertad según l@s Zapatistas”. México, 2013., 2019Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN). “Y rompimos el cerco. Comunicado del CCRI-CG del EZLN.” Disponível em: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2019/08/17/comunicado-del-ccri-cg-del-ezln-y-rompimos-el-cerco-subcomandante-insurgente-moises/
http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2019/...
; Brancaleone, 2015BRANCALEONE, Cassio. Teoria Social, democracia e autonomia. Uma interpretação da experiência de autogoverno zapatista. Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2015.; Starr et al, 2011STARR, Amory; MARTÍNEZ TORRES, María Elena; ROSSET, Peter Michael. Participatory democracy in action: practices of the Zapatistas and the Movimento Sem Terra. Latin American Perspectives, v. 38 (176-1), p. 102-119, 2011.; Baronnet, 2010BARONNET, Bruno. Zapatismo y educación autónoma: de la rebelión a la dignidad indígena. Sociedade e Cultura, v. 2, n. 13, p. 247-258, 2010.; Baronnet et al., 2011BARONNET, Bruno, MORA BAYO, Mariana; STAHLER-SHOLK, Richard. (eds). Luchas “muy otras” Zapatismo y autonomía en las comunidades indígenas de Chiapas. México: CIESAS/UNACH, 2011.; Mora, 2017MORA, Mariana. Kuxlejal Politics: Indigenous Autonomy, Race, and Decolonizing Research in Zapatista Communities. Austin: University of Texas, 2017.).

Ao final de 2023, o Movimento Zapatista emitiu uma série de comunicados para dar a conhecer a nova estrutura da autonomia Zapatista (EZLN, 2023Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN). Novena Parte: la Nueva Estructura de la Autonomía Zapatista. Disponível em: https://enlacezapatista.ezln.org.mx/2023/11/12/novena-parte-la-nueva-estructura-de-la-autonomia-zapatista/
https://enlacezapatista.ezln.org.mx/2023...
): 1. Governo Autônomo Local (GAL) - núcleo principal de condução da autonomia, coordenado por agentes e comissariados autônomos definidos a partir da assembleia. Cada GAL está responsável pelo funcionamento das estruturas autônomas (escolas, clínicas, etc.), bem como pela relação estabelecida com as comunidades não zapatistas e outras organizações; 2. Coletivos de Governos Autônomos Zapatistas (CGAZ) - são criados de acordo com a complexidade de suas necessidades, problemas e desafios, com o intuito de convocar, quando necessário, a assembleia de autoridades de cada comunidade para fins de tomada de decisões e deliberações; 3. Assembleias de Coletivos de Governos Autônomos Zapatistas (ACGAZ) - estão atrelados ao GAL.

Esta nova estrutura da autonomia é fruto de uma década de reflexões, balanços e debates internos sobre os acertos, fragilidades e desafios na trajetória de construção e consolidação da autonomia Zapatista. Nesta reorganização, há uma maior horizontalidade na estrutura e na coordenação da autonomia nos territórios, uma vez que é transferida dos MAREZ e das JBG para a base comunitária nas comunidades, representada pelo GAL.

Na consolidação de seu projeto político, os zapatistas especificam sete eixos, por eles denominados de “resistência autônoma” (EZLN, 2013Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN). Resistencia Autónoma. Cuaderno de texto de primer grado del curso “La libertad según l@s Zapatistas”. México, 2013.): resistência econômica, resistência ideológica, resistência psicológica, resistência cultural, resistência política, resistência social e resistência à presença militar e paramilitar. Em três décadas, os diferentes aspectos da autonomia zapatista são palpáveis: autogoverno, educação autônoma, saúde comunitária autônoma, agroecologia, justiça e autodefesa autônomas, comunicação e cultura autônomas, organização econômica nas comunidades, nas regiões autônomas e, até mesmo, inter-regionalmente, trabalho coletivo, bem como a participação ativa de mulheres e jovens. No trabalho coletivo, há coletivos locais responsáveis pela gestão de cooperativas, lojas, produção agropecuária, segurança local, meios de comunicação e cultura, entre outros. Chama a atenção o fato de que todas as tarefas assumidas dentro da estrutura do governo autônomo, bem como nos aspectos que estruturam a autonomia, são realizadas sem receber salário, ou seja, por meio do compromisso da comunidade com todas as atividades que estão vinculadas à reprodução material e sociocultural da vida em seus territórios.

A experiência zapatista nos permite colocar a autonomia em movimento como uma categoria de análise para matizar essas diferenciações, que não se limitam a uma demarcação da autonomia em termos jurídicos, de defesa do território e do direito à autodeterminação a partir de uma perspectiva exclusivamente étnica, mas também estão relacionadas à natureza mais ampla do projeto político que sustenta o compromisso com a autonomia e seus sujeitos. Nesse sentido, o elemento mais importante da autonomia zapatista é sua natureza de “autonomia popular” e não de autonomia étnica, apesar de ser um movimento indígena (Barbosa e Rosset, 2023BARBOSA, Lia Pinheiro; ROSSET, Peter Michael. Aprendizajes del Movimiento Zapatista. De la Insurgencia Armada a la Autonomía Popular. Buenos Aires: CLACSO, 2023.). As regiões e comunidades autônomas zapatistas dão tratamento igual a todas as etnias que nelas residem, tzotziles, tseltales, choles, tojolobales, mestiços etc., diferentemente de certas autonomias jurídicas mencionadas acima e, também, das propostas de autonomia de vários outros movimentos indígenas na América Latina. Se compararmos a autonomia zapatista com as autonomias jurídicas na América Latina, podemos ver as deficiências em termos de cooptação e desmobilização das últimas, em comparação com a evidente radicalidade das primeiras.

Entretanto, há outra comparação que vale a pena mencionar. Assim como a maioria das autonomias legais (com algumas exceções, como as Zonas de Reserva Campesina na Colômbia), a maioria das outras propostas que poderiam ser chamadas de “radicais” são de natureza étnica, como é o caso da Coordinadora Arauco-Malleco (CAM), um movimento de autonomia armada no Chile, que reivindica a autonomia mapuche (CAM, 2022Coordinadora Arauco-Malleco (CAM). Chem Ka Rakiduam. Pensamiento y Acción de la CAM. Chile. Coordinadora Arauco-Malleco, 2022.). Isso nos conduz a uma pergunta: o que acontecerá com outros grupos étnicos “subalternos” dentro de regiões autônomas “governadas” por outro grupo étnico “subalterno”? Essa foi a base das diferenças entre a Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador (CONAIE) e a Confederação Nacional de Organizações Camponesas, Indígenas e Negras (FENOCIN) nos debates, há alguns anos atrás, entre a plurinacionalidade da CONAIE (o Estado dividido em nações étnicas) e a proposta de interculturalidade da FENOCIN (territórios compartilhados entre camponeses, indígenas e negros), como explica Altmann (2013)ALTMANN, Philipp. Una breve historia de las organizaciones del Movimiento Indígena del Ecuador. Antropología: Cuadernos de Investigación, v. 12, p. 105-121, 2013.. Em contrapartida, embora o EZLN seja um movimento indígena, no sentido de ter uma base majoritariamente maia, sua autonomia não é étnica, mas sim popular, comunitária ou de classe (Barbosa e Rosset, 2023BARBOSA, Lia Pinheiro; ROSSET, Peter Michael. Aprendizajes del Movimiento Zapatista. De la Insurgencia Armada a la Autonomía Popular. Buenos Aires: CLACSO, 2023.). Não há caracoles tzotzil ou chol, mas autogovernos regionais que representam e governam todos que reconhecem e se identificam com a autonomia zapatista.

Da mesma forma, a experiência zapatista nos permite colocar em perspectiva a existência de autonomias de jure, seu alcance e desafios em relação à organização formal do Estado, e até mesmo as possibilidades de exercer a territorialidade como condição para propor alternativas, conforme analisado por García Guerrero e Monasterio Mercado (2022)GARCÍA GUERRERO, Luciana; MONASTERIO MERCADO, Fátima (coords.). Luchas territoriales por las autonomías indígenas en Abya Yala. Diálogo de Saberes desde la Amazonía sur, Bolivia. Buenos Aires: Editorial El Colectivo, 2022.. A partir desses prismas analíticos, encontramos outras experiências muito interessantes em suas formas de exercício da autonomia, como o caso de Cherán K'eri, no México (Linares et. al., 2022LINARES, Malelly et. al. Memorias de la autonomía indígena de Cherán K’erí. In: GARCÍA GUERRERO, Luciana; MONASTERIO MERCADO, Fátima (eds.). Luchas territoriales por las autonomías indígenas en Abya Yala. Diálogo de Saberes desde la Amazonía sur. Bolívia. Buenos Aires: Editorial El Colectivo, p. 179-193, 2022.), o Território Indígena Multiétnico do Bosque de Chimanes, na Bolívia (Monasterio Mercado, 2022MONASTERIO MERCADO, Fátima. “La lucha por la autonomía de los pueblos amazónicos del Territorio Indígena Multiétnico del Bosque de Chimanes”. In: GARCÍA GUERRERO, Luciana; MONASTERIO MERCADO, Fátima (eds.). Luchas territoriales por las autonomías indígenas en Abya Yala. Diálogo de Saberes desde la Amazonía sur. Bolivia. Buenos Aires: Editorial El Colectivo, p. 87-104, 2022.), as lutas mapuches (Zibechi; Martínez, 2020ZIBECHI, Raúl; MARTÍNEZ Martínez, Edgars (eds.). Repensar el Sur. Las luchas del Pueblo Mapuche. México: Cátedra Guadalajara; Buenos Aires: CLACSO, 2020.) ou mesmo a experiência da Coordinadora Arauco Malleco (CAM, 2022Coordinadora Arauco-Malleco (CAM). Chem Ka Rakiduam. Pensamiento y Acción de la CAM. Chile. Coordinadora Arauco-Malleco, 2022.).

Burguete Cal y Mayor (2005)BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli. “Una década de autonomías de facto en Chiapas (1994-2004): los límites”. In: DÁVALOS, Pablo (eds.). Pueblos indígenas, Estado y Democracia. Buenos Aires: CLACSO, 2005, p. 239-278. contrasta as autonomias de fato com as autonomias de jure, ou seja, autonomias de direito, argumentando que as autonomias de fato são formas de resistência indígena que desafiam o Estado e questionam a legitimidade e a legalidade de suas instituições. Nesse sentido, tomam a decisão de romper com a ordem jurídica do Estado e buscam construir suas próprias instituições. O zapatismo, portanto, é uma expressão emblemática da autonomia de fato.

Autonomia camponesa como proposta de luta para os movimentos sociais do campo

Embora, como vimos, haja uma abordagem importante da autonomia indígena nas ontologias dos povos originários do Abya Yala, podemos encontrar semelhanças no apoio mútuo, coletivismo, comunalidade, solidariedade, ética e economia moral das comunidades camponesas tradicionais e comunais, ou seja, nas autonomias e aspectos autonômicos da comunidade e cultura camponesas. Como argumentamos (Rosset e Barbosa, 2021ROSSET, Peter Michael; BARBOSA, Lia Pinheiro. Peasant autonomy: the necessary debate in Latin America. Interface: a journal for and about social movements, v. 13, n. 1, p. 46-80, 2021.), na tradição europeia de estudos sobre o campesinato, seja durante o período czarista do século XIX, no pensamento e movimento diversificado e complexo do narodnismo, que deu origem às correntes marxistas, anarquistas e populistas russas, grande parte do debate centrou-se no campesinato e nas questões revolucionárias: o campesinato tem potencial revolucionário ou não; é uma classe em si e para si?

Nessa tradição, Mariátegui (1928MARIÁTEGUI, José Carlos. Siete ensayos de interpretación de la realidad peruana. México: ERA, 1928., 1982MARIÁTEGUI, José Carlos. Obras. Tomo II. La Habana: Casa de las Américas, 1982.), o marxista peruano, é uma referência central, ao postular que, na América Latina, a classe revolucionária não era o minúsculo proletariado industrial, mas o grande campesinato indígena.4 4 Na nota 67, na edição do livro "Siete ensayos de interpretación de la realidad peruana" (Sete ensaios de interpretação da realidade peruana) (Mariátegui, 2008), chega a construir um extenso argumento sobre a evidência histórica do comunismo inca com base na análise do ayullu no mundo andino. Por sua vez, Eric Wolf (1966WOLF, Erick R. Peasants. London: Prentice-Hall, 1966., 1969WOLF, Erick R. Peasant Wars of the Twentieth Century. New York: Harper & Row, 1969.) analisou as características da comunidade camponesa e o papel protagônico do campesinato nas revoluções do século XX. Conforme Wolf (1969)WOLF, Erick R. Peasant Wars of the Twentieth Century. New York: Harper & Row, 1969., o campesinato tem “tendências anarquistas naturais”, uma posição que ecoa no trabalho de James Scott (1998SCOTT, James. Seeing Like a State: How Certain Schemes to Improve the Human Condition Have Failed. New Haven, CT: Yale University Press, 1998., 2009SCOTT, James. The Art of Not Being Governed: An Anarchist History of Upland Southeast Asia. New Haven, CT: Yale University Press, 2009.). Shanin (2018)SHANIN, Theodor. Marxism and the vernacular revolutionary traditions. The Journal of Peasant Studies, v. 7, n. 45, p. 1151-1176, 2018. nos ensina que, durante o mesmo século, não foi o marxismo ortodoxo “não camponês” que teve maior êxito na condução de processos revolucionários, mas os marxismos heterodoxos de líderes como Mao Tsé-Tung e Ho Chi Minh, que se hibridizaram com ontologias e epistemologias locais, que Shanin denomina como “a vernácula”, na maioria das vezes composta por uma base camponesa.

Para Veltmeyer (2019)VELTMEYER, Henry. Resistance, class struggle and social movements in Latin America: contemporary dynamics. Journal of Peasant Studies, v. 6, n. 46, p. 1264-1285, 2019., a nova geoeconomia do capital, de mudança na dinâmica da reprodução ampliada do capital na América Latina, a partir do neoextrativismo, transformou as formas específicas que a luta de classes assume na atual conjuntura. Isso significa que as zonas de interesse estratégico do capital estão agora voltadas para os territórios dos povos do campo, com o avanço do agronegócio, da mineração, dos parques eólicos, solares, etc. A luta de classes, que antes se expressava principalmente por meio de questões salariais e de acesso à terra, agora se expressa cada vez mais em termos de defesa coletiva do território e da comunidade. Em um sentido similar, Barkin e Sánchez (2019)BARKIN, David; SÁNCHEZ, Alejandra. The communitarian revolutionary subject: new forms of social transformation. Third World Quarterly, v. 8, n. 41, p. 1421-1441, 2019. identificam um “sujeito revolucionário comunitário”, que é o sujeito coletivo e comunitário. Um elemento adicional que o caracteriza é sua capacidade de liderar “el camino de nuevas rutas para el progreso social, formulando estrategias para mejorar su calidad de vida, controlar sus sistemas productivos, defender sus territorios y conservar su patrimonio natural” (Barkin, 2019BARKIN, David. Sujeto revolucionario comunitario: fortaleciendo sociedades post-capitalistas. Ideias, v. 10, p. 01-41, 2019., p.15).

Recuperar esse debate é fundamental para situar a concepção de autonomia camponesa, especialmente em como ela pode se estender dos níveis parciais e relativos do uso de práticas agroecológicas em vez de insumos químicos comprados, até o autogoverno e a autodefesa local e territorial. Argumentamos que a autonomia camponesa é compatível com a autonomia indígena, compartilha raízes e sujeitos com ela, pode dialogar com a autonomia zapatista, aprender com ela e inspirar-se nela, inclusive quando exija melhores políticas públicas para o campo e participe em frentes políticas contra o fascismo, ou até mesmo apoie uma campanha eleitoral, sem ceder sua autonomia (política) aos políticos e seus partidos.

A autonomia camponesa propõe mudanças profundas de caráter antissistêmico e coloca em discussão eixos importantes de seu conceito de autonomia, a partir da perspectiva da soberania: soberania alimentar, territorial, hídrica, eólica, forrageira, etc. Vejamos agora como está se configurando o debate sobre a autonomia camponesa, com base na experiência da CLOC/LVC, um movimento social transnacional que reúne 115 organizações5 5 Organizações presentes em todos os países da América Latina e do Caribe, o que nos dá um amplo espectro do debate teórico e político sobre autonomia conduzido pela CLOC/LVC nos contextos nacional e regional. de indígenas, camponeses, afrodescendentes, trabalhadores rurais e comunidades tradicionais.

Para apresentar a autonomia como uma proposta de luta dos movimentos sociais rurais contemporâneos na América Latina, é importante nos situarmos no início da terceira década do século XXI. Passamos por todo o processo de implementação do neoliberalismo, do qual emergiu uma geração de mobilização social e de movimentos populares contra as políticas neoliberais. Das revoltas antineoliberais e antiglobalização surgiram, em diferentes países da região, governos às vezes definidos de “esquerda” ou “progressistas”, embora uma análise crítica os coloque mais como “neopopulistas” e “nacionalistas” (Vergara Camus; Kay, 2017). Na maioria dos casos, não conseguiram escapar do rentismo histórico do Estado, em que as rendas do neoextrativismo lhes permitiram um modelo baseado na conciliação de classes - pactos político-econômicos com setores importantes do capital nacional e transnacional - com medidas populistas de contenção social, como transferências diretas de dinheiro para setores vulneráveis e extensão de crédito para consumo das massas (Barbosa, 2020BARBOSA, Lia Pinheiro. Challenges facing Latin American peasant movements under progressive governments and new right-wing parties. Latin America Perspectives, v. 47, n. 5, p. 94-112, 2020.; Rosset, 2018ROSSET, Peter Michael. América Latina y la conciliación de clases. La Jornada, 19 de agosto de 2018. Disponível em: https://www.jornada.com.mx/2018/08/19/opinion/022a1mun
https://www.jornada.com.mx/2018/08/19/op...
; Bautista Segales, 2020BAUTISTA SEGALES, Rafael. Pensar el mundo desde Bolivia. Kaosenlared,https://kaosenlared.net/pensar-el-mundo-desde-bolivia/ [acessado em julho de 2020].
https://kaosenlared.net/pensar-el-mundo-...
; Machado; Zibechi, 2017MACHADO, Decio; ZIBECHI, Raúl. Cambiar el mundo desde arriba: los límites del progresismo. México: Bajo Tierra, 2017; Gudynas, 2015GUDYNAS, Eduardo. La identidad del progresismo, su agotamiento y los relanzamientos de las izquierdas. América Latina en Movimiento, 2015 Disponível em: https://www.alainet.org/es/articulo/172855 [Acessado em dezembro de 2020].
https://www.alainet.org/es/articulo/1728...
; Mazzeo, 2018MAZZEO, Miguel. ¿Es posible un nuevo «ciclo progresista» en Nuestra América? Rebelión, 2018. Disponível em: https://rebelion.org/es-posible-un-nuevo-ciclo-progresista-en-nuestra-america/ [Acessado em dezembro de 2020].
https://rebelion.org/es-posible-un-nuevo...
; Svampa, 2016SVAMPA, Maristella. Debates Latinoamericanos: Indianismo, Desarrollo, Dependencia y Populismo. Buenos Aires: Edhasa, 2016.).

No campo, embora as organizações camponesas tenham obtido importantes concessões (programas públicos de aquisição de alimentos, créditos e investimentos, programas educacionais etc.), no cômputo geral, o período foi marcado por enormes avanços na transnacionalização das economias nacionais (Barbosa, 2020BARBOSA, Lia Pinheiro. Challenges facing Latin American peasant movements under progressive governments and new right-wing parties. Latin America Perspectives, v. 47, n. 5, p. 94-112, 2020.), nas áreas dedicadas às atividades do capital extrativista, incluindo “desertos verdes” de soja, concessões de mineração, parques eólicos etc. (Rosset, 2018ROSSET, Peter Michael. América Latina y la conciliación de clases. La Jornada, 19 de agosto de 2018. Disponível em: https://www.jornada.com.mx/2018/08/19/opinion/022a1mun
https://www.jornada.com.mx/2018/08/19/op...
), tudo à custa de adentrar, cada vez mais, nos territórios dos diferentes povos do campo, indígenas e afrodescendentes (LVC, 2017aLA VÍA CAMPESINA (LVC). Struggles of La Via Campesina for Agrarian Reform and the Defense of Life, Land and Territories. Harare: La Vía Campesina, 2017a.,bLA VÍA CAMPESINA (LVC). Las Luchas de La Vía Campesina por la Reforma Agraria, la Defensa de la Vida, la Tierra y los Territorios. 2017b. Disponível em: https://viacampesina.org/es/las-luchas-la-via-campesina-la-reforma-agraria-la-defensa-la-vida-la-tierra-los-territorios/ [Acessado em julho de 2020]
https://viacampesina.org/es/las-luchas-l...
), ou seja, o avanço quase incontrolável da acumulação por espoliação (Harvey, 2004HARVEY, David. The ’new’ imperialism: accumulation by dispossession. Socialist Register, 40, p. 63-87, 2004.). De acordo com Giraldo (2020GIRALDO, Omar Felipe. “El desmoronamiento de la creencia en el Estado: buen vivir y autonomía de los pueblos”, In: MORA, Aura Isabel (ed.). Buenos vivires y transiciones. La vida dulce, la vida bella, la vida querida, la vida sabrosa, la vida buena, la vida en plenitud: convivir en armonía. Bogotá: Uniminuto, 2020, p. 57-86., p. 62), as organizações se apriosonaram a “una izquierda que en el discurso combatía la fase neoliberal del capitalismo, pero no al capitalismo en sí mismo”.

Uma grande parte da esquerda, incluindo uma parte significativa dos movimentos sociais rurais agrupados na CLOC/LVC, envolveu-se, de uma forma ou de outra, no processo político institucional, demandando e administrando programas de apoio público, recebendo orçamentos e investimentos em escolas e cooperativas. Entretanto, de certa forma foram “capturados” nas armadilhas do processo eleitoral, aderindo às lógicas dos partidos políticos eleitorais, sob um argumento de que, se não se reelegem, se perde o financiamento público dos programas conquistados pelos movimentos. Por um lado, os movimentos e as organizações receberam benefícios concretos, embora muito limitados em comparação com a generosidade do investimento público destinado ao agronegócio e à mineração e, por outro lado, sofreram tanto a depredação de suas terras, territórios e bens naturais quanto um declínio notável em sua capacidade de mobilização. Os programas assistencialistas desmobilizaram as bases e o relacionamento com a esquerda institucional no poder sempre significou deixar de lado as críticas e as demandas “radicais” para “não fazer o jogo da direita”.

Muitos dos principais quadros políticos dos movimentos e das organizações se envolveram na administração altamente burocrática dos programas públicos para o campo, de tal forma que houve, em muitos casos, um descuido do trabalho político-organizativo com as próprias bases e, mais ainda, com outros setores com os quais os movimentos deveriam estar fazendo trabalho de base e educação política. O golpe de misericórdia veio com a (re)ascensão e, em muitos casos, com a chegada ao poder da extrema direita, um contexto no qual os movimentos populares e a esquerda em geral se viram com pouca capacidade de mobilização para enfrentar a direita e, em alguns países, o fascismo. A opção de aproveitar os recursos públicos para criar escolas, processos agroecológicos, cooperativas etc. gerou ou consolidou a dependência de comunidades e organizações do setor público e de políticos “amigos”, de tal forma que, quando a direita chegou ao poder e cortou subsídios, orçamentos, créditos e contratos de compra comprometidos pelos governos, muitos processos ficaram à deriva ou à beira do colapso, por carecer de suficiente força, independente e autônoma para se manter sem o apoio do governo (Rosset e Altieri, 2017ROSSET, Peter; ALTIERI, Miguel. Agroecology: Science and Politics. Halifax: Fernwood, 2017., 2018ROSSET, Peter Michael. América Latina y la conciliación de clases. La Jornada, 19 de agosto de 2018. Disponível em: https://www.jornada.com.mx/2018/08/19/opinion/022a1mun
https://www.jornada.com.mx/2018/08/19/op...
; Giraldo; McCune, 2019GIRALDO, Omar Felipe; MCCUNE, Nills. Can the state take agroecology to scale? Public policy experiences in agroecological territorialization from Latin America. Agroecology and Sustainable Food Systems, v. 7, n. 43, p. 785-809, 2019.). Giraldo e McCune (2019)GIRALDO, Omar Felipe; MCCUNE, Nills. Can the state take agroecology to scale? Public policy experiences in agroecological territorialization from Latin America. Agroecology and Sustainable Food Systems, v. 7, n. 43, p. 785-809, 2019. concluem que os movimentos e as organizações, em certa medida, erraram por confiar mais no que Spinoza (2001)SPINOSA, Baruch, Ethics. Hertford, UK: Wordsworth Editions, 2001. chama de potestade (poder externo) do que na construção de potência (força interna). Em um debate mais contemporâneo, essa potência está ligada ao conceito de poder constitutivo, na análise de Negri (2015)NEGRI, Antonio. El poder constituyente. Ensayo sobre las alternativas de la modernidad. Madrid: Traficantes de Sueños, 2015., em que o conteúdo da potência constitutiva das lutas latino-americanas é a vida. Para Vergara-Camus e Kay (2017VERGARA-CAMUS, Leandro; KAY, Cristóbal. The agrarian political economy of left-wing governments in Latin America: agribusiness, peasants, and the limits of neo-developmentalism. Journal of Agrarian Change, v. 2, n. 17, p. 415-437, 2017., p. 434-435), “el acceso al Estado no dio resultados más concretos que la construcción de la autonomía desde abajo y fuera del Estado”.

Entretanto, na conjuntura política contemporânea da América Latina, as organizações camponesas e indígenas são interpeladas cada vez mais à construção de autonomias territorializadas (Barbosa et. al., 2023BARBOSA, Lia Pinheiro; SOTO, Oscar; GONZÁLEZ TERREROS, María Isabel; MARTÍNEZ NAVARRETE, Edgars. “Autonomías territoriales indígenas y campesinas en América Latina Tensiones, disputas y avances frente a los gobiernos de derecha”. In: SAÑUDO PAZOS, María Fernanda et. al. Estado, democracia y movimientos sociales: persistencias y emergencias en el siglo XXI. Buenos Aires: CLACSO, p. 463-511, 2023.). De acordo com Giraldo (2020)GIRALDO, Omar Felipe. “El desmoronamiento de la creencia en el Estado: buen vivir y autonomía de los pueblos”, In: MORA, Aura Isabel (ed.). Buenos vivires y transiciones. La vida dulce, la vida bella, la vida querida, la vida sabrosa, la vida buena, la vida en plenitud: convivir en armonía. Bogotá: Uniminuto, 2020, p. 57-86., os críticos da proposta de autonomia argumentam que não é viável renunciar à recuperação do Estado, ou seja, a uma disputa hegemônica por suas instituições públicas, considerando-as como a única estratégia política viável. Nesse sentido, o antropólogo marxista López y Rivas (2011)LÓPEZ y RIVAS, Gilberto. “Autonomías indígenas, poder y transformaciones sociales en México”. In: HOPKINS, Alicia; PIÑEDA, César Enrique (eds.). Pensar las autonomías Alternativas de emancipación al capital y el Estado. México: Bajo Tierra, p. 103-115 2011. argumenta que a construção da autonomia nos territórios não implica necessariamente a renúncia à pressão e ao diálogo com o Estado, embora implique a formação e o fortalecimento de um sujeito coletivo mais forte no confronto com o Estado.

Atribuímos grande importância à capacidade de desmontar a aparente contradição e exclusão mútua entre a preocupação com o Estado, o governo e as políticas públicas e a proposta de autonomia, pelo menos em suas versões de autonomias relativas e parciais. Em termos do movimento camponês latino-americano, acreditamos que não é um erro se preocupar com o Estado, embora seja um erro fetichizar o Estado, permitindo que os ciclos eleitorais descarrilhem processos territoriais mais autônomos, conduzindo a pequenas e grandes concessões a políticos e partidos com o intuito de atrair programas e financiamentos, que muitas vezes decepcionam (e muitas vezes geram níveis perigosos de dependência). Argumentamos que a disputa hegemônica da dimensão pública do Estado não pode se distanciar da centralidade do trabalho de base, da formação política e dos aspectos de autossuficiência e autonomia territorial e local. Sim, para combater o fascismo, na esfera política; sim, para exigir outras políticas educacionais para o campo (por exemplo), mas, ao mesmo tempo, sim, para construir autonomia nos territórios.

No âmbito da CLOC/LVC, identificamos uma tentativa de início de diálogo entre a autonomia indígena e a possibilidade de autonomia camponesa. Há uma tendência interna entre as organizações indígenas da Guatemala, com a adesão de algumas do Peru e da Bolívia, em relação a um sentido ancestral de conceber a política em termos comunitários. No documento preparatório para o 7º Congresso da CLOC/LVC, realizado em Cuba, em 2019, as organizações indígenas enfatizaram a perspectiva dos povos originários com relação às contradições dos Estados nacionais e definiram os principais eixos de suas ontologias e epistemologias no que concerne à sua concepção de luta política e de um novo paradigma civilizacional (CLOC, 2019Coordinadora Latinoamericana de Organizaciones del Campo (CLOC). 7º Congreso Continental CLOC-LVC. Cuba: Documento de Trabajo. Mimeo, 2019., p. 49):

El aporte de los pueblos originarios no constituye ninguna tercera vía entre el capitalismo y el socialismo, por el contrario, la cosmovisión, cultura y valores de los pueblos originarios no se puede realizar en sociedades dominadas por el capitalismo que por naturaleza ha demostrado que es antagónico a la visión y práctica de los pueblos indígenas. Lo que claramente estamos planteando es que el caudal de las luchas de los pueblos originarios con una trayectoria con unos centenares de años, se conjugue con el caudal de luchas por la construcción del socialismo y en esa síntesis propia, el socialismo del siglo XXI sea un socialismo comunitario, con raíz y proyección de los pueblos originarios y en armonía con la Madre Naturaleza.

Nessa direção, autonomia significa romper com o sistema de dominação e opressão da sociedade capitalista, imperialista, colonial, racista e patriarcal (CLOC, 2019Coordinadora Latinoamericana de Organizaciones del Campo (CLOC). 7º Congreso Continental CLOC-LVC. Cuba: Documento de Trabajo. Mimeo, 2019.). Da mesma forma, no debate político interno da CLOC/LVC, as organizações de base indígenas problematizam o fato de que a autonomia não se limita aos termos da Convenção 169 da OIT, da Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, da Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos e de instrumentos jurídicos semelhantes. Em suas palavras (CLOC, 2019Coordinadora Latinoamericana de Organizaciones del Campo (CLOC). 7º Congreso Continental CLOC-LVC. Cuba: Documento de Trabajo. Mimeo, 2019., p. 45), “no se trata únicamente de contar con un estatuto de autonomía, donde los pueblos originarios se autogobiernen, pero bajo una tutela.” Aqui nos parece fundamental recuperar a reflexão de Silvia Cusicanqui (apudHALE, 2007HALE, Charles R. Rethinking Indigenous Politics in the Era of the ‘Indio Permitido’. , 2007. Disponível em: https://nacla.org/article/rethinking-indigenous-politics-era-indio-permitido [Acessado em abril de 2023].
https://nacla.org/article/rethinking-ind...
) sobre o “índio permitido”, ou seja, aquele reconhecido pelo Estado como sujeito apenas de direitos étnicos e culturais, mecanismo indigenista utilizado para dividir e domesticar os movimentos indígenas.

Hale (2007)HALE, Charles R. Rethinking Indigenous Politics in the Era of the ‘Indio Permitido’. , 2007. Disponível em: https://nacla.org/article/rethinking-indigenous-politics-era-indio-permitido [Acessado em abril de 2023].
https://nacla.org/article/rethinking-ind...
argumenta que, no âmbito das reformas multiculturais, os parâmetros para a definição dos direitos (e a quem se destinam) são estabelecidos pela sobreposição dos direitos culturais aos direitos políticos, sendo estes últimos mais enfáticos na demanda por transformações estruturais relacionadas ao mundo do trabalho e à defesa territorial. Na perspectiva do multiculturalismo neoliberal, o “índio permitido” será aquele que pode exigir exclusivamente o reconhecimento de suas línguas e da diversidade étnico-cultural, mas nunca aquele que exigir reparação histórica pela desapropriação, autonomia e autodeterminação de seus territórios, ou mesmo ocupar espaços de poder.

Conscientes da abordagem tutelar do Estado, a LVC (não apenas na América Latina) destaca como desafios (LVC, 2016LA VÍA CAMPESINA (LVC). “Conferencia Internacional de la Reforma Agraria: Declaración de Marabá’, 2016.” Disponível em: https://viacampesina.org/es/conferencia-internacional-de-la-reforma-agraria-declaracion-de-maraba/ [Acessado em julho de 2020].
https://viacampesina.org/es/conferencia-...
, p. 07-09):

Seguir ajustando e innovando tácticas…Tenemos nuevos enfoques -como el enfoque territorial- y nuevas estrategias, como la construcción de espacios autónomos, la autonomía relativa y auto-abasto, y la masificación de la agroecología popular. Repensar la relación entre nuestros movimientos populares, el Estado, los partidos políticos y los procesos electorales, de acuerdo con la historia y coyuntura distinta de cada país, combatiendo la erosión generalizada de los mecanismos nacionales e internacionales de derechos humanos. Transformar la lucha por la tierra en la lucha por el territorio […] profundizando una agroecología más “autónoma,” en base al rescate de saberes ancestrales y nuestros propios recursos e insumos locales.

Consideramos que a CLOC e a LVC são o espaço ideal para o diálogo entre autonomias e outras visões e epistemes presentes no Movimento (Martínez Torres e Rosset, 2014MARTÍNEZ TORRES, María Elena; ROSSET, Peter Michael. Diálogo de saberes in La Vía Campesina: food sovereignty and agroecology. The Journal of Peasant Studies, v. 41, n. 6, p. 979-97, 2014.; Rosset, 2015ROSSET, Peter Michael. Epistemes rurales y la formación agroecológica en La Vía Campesina. Ciencia y Tecnología Social, n. 2, p. 01-10, 2015.). Não é apenas a parte indígena que contribui para essa possível construção. Organizações camponesas não indígenas, como o Movimento de Pequenos Agricultores (MPA), do Brasil, propõem a diversidade e o modo camponês de ser, viver e produzir, com elementos em comum com os princípios da autonomia indígena (da Silva, 2014DA SILVA, Valter Israel. Classe Camponesa: modo de ser, de viver e de produzir. Porto Alegre: Padre Josimo, 2014.). De acordo com a CLOC (2019Coordinadora Latinoamericana de Organizaciones del Campo (CLOC). 7º Congreso Continental CLOC-LVC. Cuba: Documento de Trabajo. Mimeo, 2019., p.55), “La cultura campesina se basa en las relaciones cotidianas con la naturaleza, en la espiritualidad, en el conocimiento empírico amplio, en la oralidad y la práctica, en la familia y comunidad, en las relaciones de cooperación diversificada…”

A dimensão territorial é um elemento comum entre a autonomia indígena e a autonomia camponesa, ou seja, o direito coletivo de pertencer a um território como espaço de reprodução social e material da vida, de disputa de poder e de construção do poder popular. Nesse sentido, o território é onde as epistemes que compõem a CLOC/LVC podem chegar a um acordo em favor de propostas autônomas, e é aí que reside o desafio de transformar a luta pela terra em luta pelo território (Barbosa, 2023BARBOSA, Lia Pinheiro. “Lo territorial, lo comunitario y los comunes frente al despojo extractivista en América Latina: aproximaciones al debate teórico-político de la CLOC-VÍA CAMPESINA”. In: BASTOS AMIGO, Santiago; MARTÍNEZ NAVARRETE, Edgars. Colonialismo, comunidad y capital. Pensar el despojo, pensar América Latina. México: Cátedra Jorge Alonso / Bajo Tierra Ediciones, p. 323-351, 2023.).

Deve-se mencionar que o debate ainda é muito incipiente e que muitas das vertentes de autonomia presentes nos movimentos camponeses são mais comumente chamadas de “soberanias” (soberania alimentar, soberania energética, soberania hídrica, soberania forrageira, etc.), e as semelhanças e diferenças entre soberanias e autonomias devem ser exploradas. Entretanto, o termo autonomia está emergindo gradualmente, especialmente nos discursos camponeses de defesa territorial e agroecologia, e nos próprios projetos educativos e nas escolas do campo. Um exemplo disso foi o ciclo interno do “Seminário de Agroecologia e Metodologia ‘de Camponesa a Camponês a Camponesa a Camponês’ nos assentamentos de reforma agrária popular do MST-Ceará”, no Brasil, que ocorreu entre novembro e dezembro de 2020. Durante o seminário, foi debatida a urgência de se discutir a autonomia camponesa como estratégia de defesa dos territórios camponeses diante da violenta ofensiva do capital em seus territórios.

Ao apresentarmos o debate sobre a autonomia camponesa, vale a pena destacar experiências concretas de seu exercício e construção, o que nos permite situar formas implícitas de autonomia. Nesse sentido, o caso do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no Brasil, é muito relevante. Se definirmos autonomia em termos “absolutos”, poderíamos dizer que os zapatistas lutam pela autonomia e que sua proposta é autônoma. Por outro lado, poderíamos dizer que o MST não é um movimento autônomo, pois disputa recursos públicos dentro da estrutura do Estado burguês. Mas estaríamos cegos para as muitas vertentes implícitas de autonomia que o MST de fato exibe, e de suas lutas para aumentar seu grau de autonomia em muitos aspectos (Vergara Camus, 2014VERGARA CAMUS, Leandro. Land and Freedom: The MST, the Zapatistas and Peasant Alternatives to Neoliberalism. London: Zed Books, 2014.). O MST não luta para ter suas próprias escolas em seus próprios territórios e com seu próprio currículo? Até mesmo escolas autônomas! (Barbosa, 2015BARBOSA, Lia Pinheiro. Educación, resistencia y movimientos sociales: la praxis educativo-política de los Sin Tierra y de los Zapatistas. México: LIBRUNAM, 2015.; 2017aBARBOSA, Lia Pinheiro. Educação do Campo [Education for and by the countryside] as a political project in the context of the struggle for land in Brazil. The Journal of Peasant Studies, v. 44, n. 1, p. 118-143, 2017a.). Essa é uma luta pela autonomia educacional. O MST não está lutando para transformar sua produção em uma produção agroecológica que não dependa de insumos externos? É uma luta por “autonomia em relação ao capital”, em suas próprias palavras (MST, 2016Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). “Jornada de Agroecologia reafirma necessidade de construir espaços de resistência e autonomia frente ao capital.” 2016. Disponível em: https://mst.org.br/2016/08/02/jornada-de-agroecologia-reafirma-necessidade-de-construir-espacos-de-resistencia-e-autonomia-frente-ao-capital/ [Acessado em julho de 2020].
https://mst.org.br/2016/08/02/jornada-de...
). O MST não luta pelo autogoverno em seus acampamentos e assentamentos, com base na organicidade e coordenação das famílias (Miranda; Cunha, 2013MIRANDA, Roberto de Sousa; CUNHA, Luís Henrique Hermínio. A estrutura organizacional do MST: lógica política e lógica prática. Caderno CRH, v. 26, n. 68, p. 363-376, 2013.; Starr et al., 2011STARR, Amory; MARTÍNEZ TORRES, María Elena; ROSSET, Peter Michael. Participatory democracy in action: practices of the Zapatistas and the Movimento Sem Terra. Latin American Perspectives, v. 38 (176-1), p. 102-119, 2011.)? Essa é a luta pelo autogoverno como elemento central da autonomia.

Na realidade, a estrutura organizativa do MST em suas diferentes instâncias - Direção Nacional, Direção Estadual, Brigadas, Setores, Núcleos de Base e Coletivos - que articulam uma coordenação política em nível local, estadual, regional e nacional, pode ser considerada, em si mesma, como uma espécie de autogoverno autônomo nos territórios camponeses do MST, uma vez que possui organicidade e autonomia na gestão dos processos socioculturais, produtivos e político-econômicos nos acampamentos, nos assentamentos de reforma agrária e na relação desses territórios com aliados e outras entidades externas. Da mesma forma, a participação em todos esses órgãos é coletiva, rotativa e com paridade de gênero.

Ao situar essas experiências, concluímos que, na realidade, as organizações camponesas e indígenas estão exercendo vertentes de autonomia, o que prepara o terreno para este debate. Nesse sentido, propomos algumas vertentes de autonomia que poderiam ser analisadas em seus graus e em uma ampla gama de processos, organizações e movimentos: Autonomia política e autogoverno; Autonomia produtiva; Autonomia alimentar; Autonomia econômica e economia local; Autonomia educativa; Autodefesa de comunidades e territórios; Autonomia em saúde; e Autonomia solidária. A essas, pode-se acrescentar a autonomia na administração da justiça, característica do zapatismo e de muitas comunidades indígenas tradicionais.

Esses exemplos deixam claro que a autonomia e, em particular, suas vertentes e graus, podem servir como categorias de análise para interpretar qualquer processo de luta social e construção coletiva. É importante reiterar que a autonomia não é absoluta, mas relativa a uma condição de dependência total (van der Ploeg 2008VAN DER PLOEG, Jan Douwe. The New Peasantries. Struggles for autonomy and sustainability in an era of empire and globalization. London: Earthscan, 2008., 2010VAN DER PLOEG, Jan Douwe. Nuevos Campesinos: Campesinos e Imperios Alimentarios. Madrid: Icaria, 2010.). Por exemplo, uma produção agroecológica de alimentos pode ser mais ou menos autônoma em relação ao mercado de insumos agrícolas, dependendo da tecnologia utilizada (Rosset e Martínez Torres, 2012ROSSET, Peter Michael; MARTÍNEZ TORRES, María Elena. Rural social movements and agroecology: context, theory, and process. Ecology and Society, v. 17, n. 3, p. 01-17, 2012.). Ou, de acordo com Gazolla e Schneider (2007)GAZOLLA, Márcio; SCHNEIDER, Sérgio. A produção da autonomia: os “papéis” do autoconsumo na reprodução social dos agricultores familiares. Revista Estudos Sociedade e Agricultura, n. 15, p. 89-122, 2007., na medida em que uma família ou comunidade camponesa atende seu consumo de alimentos com sua própria produção, ela terá maior autonomia em relação ao contexto social e econômico. A esse aspecto, poderíamos acrescentar maior autonomia política, no sentido de não ser tão vulnerável a chantagens políticas externas se pelo menos tiver algo para comer.

Com base no exposto, podemos ver como os diferentes aspectos da autonomia se concretizam não apenas nas experiências realizadas pela luta indígena latino-americana, mas também na luta articulada pelo movimento camponês, que, às vezes, por não se chamar explicitamente de autonomia, não tem plena consciência de que se trata de uma perspectiva comum que fortalece os processos de defesa do território, reforma agrária popular, soberania alimentar, base da luta camponesa.

Considerações finais

Neste ensaio, procuramos apresentar alguns argumentos que consideramos pertinentes na apreensão da autonomia no debate teórico-político contemporâneo: 1) que a autonomia não constitui um conceito e uma práxis exclusivos do anarquismo, uma vez que se expressa na luta histórica do movimento indígena, inclusive com elementos que são anteriores à configuração do debate autonomista de origem europeia; 2) que, ao ser assumida como categoria de análise, nos permite identificar diferentes planos e vertentes da autonomia, conduzindo a uma abertura teórico-analítica e política no reconhecimento de sua potência nas diferentes lutas que estão em curso, especialmente na história política recente da América Latina; 3) justamente por identificarmos essas diferentes vertentes, destacamos a construção de um conceito de autonomia e seus exercícios que emerge dos movimentos camponeses, prefigurando um conceito de autonomia camponesa.

Acreditamos que as lutas indígenas e camponesas da transição de séculos (do XX ao XXI) nos desafiam a superar a relutância em debater a autonomia na perspectiva do campo popular, processo que significa, sobretudo, reconhecer esses sujeitos históricos como sujeitos de sua própria história e com capacidade crítica para elaborar uma concepção de projeto político rumo à emancipação. Nessa direção, esperamos que as reflexões tecidas neste artigo possam contribuir para o aprendizado, especialmente o nosso, a partir da perspectiva dos movimentos, na construção cotidiana e desafiadora de um mundo onde cabem muitos mundos.

  • Como citar este artigo

    BARBOSA, Lia Pinheiro; ROSSET, Peter Michael. Concepções e exercícios da autonomia entre os movimentos indígenas e camponeses da América Latina. Revista NERA, v. 27, n. 2, e9944, abr.-jun., 2024.
  • 1
    As reflexões do ensaio incluem pesquisas realizadas (e citadas) por nós, análise dos documentos oficiais dos movimentos mencionados, bem como nosso lugar de atuação teórico-política como pesquisadora e pesquisador militantes em alguns dos movimentos apresentados no artigo.
  • 2
    Comentário realizado em uma aula, no dia 10 de julho de 2019, sobre “Autonomía, y Resistencia en México,” no seminário de doutorado “Procesos de Autonomía Territorial,” coordenado pela Dra. Carla Zamora e pelo Dr. Peter Rosset, no Doutorado em “Ciencias en Ecología y Desarrollo Sustentable” do El Colegio de la Frontera Sur (ECOSUR), em Chiapas, México.
  • 3
    Por esse motivo, parece-nos importante apresentar, ainda que brevemente, as diretrizes da autonomia zapatista.
  • 4
    Na nota 67, na edição do livro "Siete ensayos de interpretación de la realidad peruana" (Sete ensaios de interpretação da realidade peruana) (Mariátegui, 2008), chega a construir um extenso argumento sobre a evidência histórica do comunismo inca com base na análise do ayullu no mundo andino.
  • 5
    Organizações presentes em todos os países da América Latina e do Caribe, o que nos dá um amplo espectro do debate teórico e político sobre autonomia conduzido pela CLOC/LVC nos contextos nacional e regional.

Referências

  • ALTMANN, Philipp. Una breve historia de las organizaciones del Movimiento Indígena del Ecuador. Antropología: Cuadernos de Investigación, v. 12, p. 105-121, 2013.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro. Educación, resistencia y movimientos sociales: la praxis educativo-política de los Sin Tierra y de los Zapatistas. México: LIBRUNAM, 2015.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro. “Educação rebelde e autônoma na práxis revolucionária zapatista”. In: REBUÁ, Eduardo; SILVA, Pedro (eds). Educação e filosofia da práxis: reflexões de início de século. Rio de Janeiro: Letra Capital, p. 48-79, 2016.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro. Legados e rupturas da Revolução Soviética desde as lutas sociais na América Latina. Tensões Mundiais, v. 13, n. 24, p. 107-138, 2017b.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro. Educação do Campo [Education for and by the countryside] as a political project in the context of the struggle for land in Brazil. The Journal of Peasant Studies, v. 44, n. 1, p. 118-143, 2017a.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro. El Popol Wuj na contemporânea luta indígena Mesoamericana. Tensões Mundiais, 15(28), p. 75-102, 2019b.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro. “Paradigma Epistêmico do Campo e a construção do conhecimento na perspectiva dos movimentos indígenas e camponeses na América Latina”. In: DOS SANTOS, Arlete; COELHO, Lívia Andrade; OLIVEIRA, Júlia Maria da Silva (eds.). Eduação e Movimentos Sociais. Análises e desafios. Jundiaí: Paco Editorial, p. 279-299, 2019a.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro. Challenges facing Latin American peasant movements under progressive governments and new right-wing parties. Latin America Perspectives, v. 47, n. 5, p. 94-112, 2020.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro. Onto-Epistemic Paradigm of the Countryside and Social Theory: What Do Popular Movements of Latin America and the Caribbean Teach Us? Educational Studies, v. 58, n. 5-6, p. 620-640, 2022.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro. “Lo territorial, lo comunitario y los comunes frente al despojo extractivista en América Latina: aproximaciones al debate teórico-político de la CLOC-VÍA CAMPESINA”. In: BASTOS AMIGO, Santiago; MARTÍNEZ NAVARRETE, Edgars. Colonialismo, comunidad y capital. Pensar el despojo, pensar América Latina. México: Cátedra Jorge Alonso / Bajo Tierra Ediciones, p. 323-351, 2023.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro; SOTO, Oscar; GONZÁLEZ TERREROS, María Isabel; MARTÍNEZ NAVARRETE, Edgars. “Autonomías territoriales indígenas y campesinas en América Latina Tensiones, disputas y avances frente a los gobiernos de derecha”. In: SAÑUDO PAZOS, María Fernanda et. al. Estado, democracia y movimientos sociales: persistencias y emergencias en el siglo XXI Buenos Aires: CLACSO, p. 463-511, 2023.
  • BARBOSA, Lia Pinheiro; ROSSET, Peter Michael. Aprendizajes del Movimiento Zapatista. De la Insurgencia Armada a la Autonomía Popular. Buenos Aires: CLACSO, 2023.
  • BARKIN, David. Sujeto revolucionario comunitario: fortaleciendo sociedades post-capitalistas. Ideias, v. 10, p. 01-41, 2019.
  • BARKIN, David; SÁNCHEZ, Alejandra. The communitarian revolutionary subject: new forms of social transformation. Third World Quarterly, v. 8, n. 41, p. 1421-1441, 2019.
  • BARONNET, Bruno. Zapatismo y educación autónoma: de la rebelión a la dignidad indígena. Sociedade e Cultura, v. 2, n. 13, p. 247-258, 2010.
  • BARONNET, Bruno, MORA BAYO, Mariana; STAHLER-SHOLK, Richard. (eds). Luchas “muy otras” Zapatismo y autonomía en las comunidades indígenas de Chiapas. México: CIESAS/UNACH, 2011.
  • BAUTISTA SEGALES, Rafael. Pensar el mundo desde Bolivia. Kaosenlared,https://kaosenlared.net/pensar-el-mundo-desde-bolivia/ [acessado em julho de 2020].
    » https://kaosenlared.net/pensar-el-mundo-desde-bolivia/
  • BORRAS JR., Saturnino M. Agrarian social movements: the absurdly difficult but not impossible agenda of defeating right-wing populism and exploring a socialist future. Journal of Agrarian Change, v. 1, n. 20, p. 03-36, 2020.
  • BRANCALEONE, Cassio. Teoria Social, democracia e autonomia. Uma interpretação da experiência de autogoverno zapatista Rio de Janeiro: Azougue Editorial, 2015.
  • BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli. “Una década de autonomías de facto en Chiapas (1994-2004): los límites”. In: DÁVALOS, Pablo (eds.). Pueblos indígenas, Estado y Democracia. Buenos Aires: CLACSO, 2005, p. 239-278.
  • BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli. “La autonomía indígena: la polisemia de un concepto. A modo de prólogo”. In: LÓPEZ, Pavel López; GARCÍA GUERRERO, Luciana (eds.). Movimientos indígenas y autonomías en América Latina: escenarios de disputa y horizontes de posibilidad Buenos Aires: CLACSO, p. 11-22, 2018.
  • BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli; ORTIZ-T, William Villa; CHIRIF, Pablo; GARCÍA, Alberto; XAVIER, Albó. Movimientos indígenas en América Latina. Resistencias y nuevos modelos de integración Dinamarca: IWGIA, 2011.
  • CASTORIADIS, Cornelius. Figuras de lo pensable Madrid: Frónesis, 1999.
  • Coordinadora Arauco-Malleco (CAM). Chem Ka Rakiduam. Pensamiento y Acción de la CAM. Chile Coordinadora Arauco-Malleco, 2022.
  • Coordinadora Latinoamericana de Organizaciones del Campo (CLOC). 7º Congreso Continental CLOC-LVC Cuba: Documento de Trabajo. Mimeo, 2019.
  • DA SILVA, Valter Israel. Classe Camponesa: modo de ser, de viver e de produzir Porto Alegre: Padre Josimo, 2014.
  • DÁVALOS, Pablo. “Movimientos indígenas en América Latina: el derecho a la palabra”. In: DÁVALOS, Pablo (compilador). Pueblos indígenas, Estado y Democracia. Buenos Aires: CLACSO, p. 17-33, 2005.
  • DEL CID LUCERO, Víctor Manuel. Territorialidad y conflictos interétnicos en la Costa Caribe de Nicaragua. Revista nuestrAmérica, v. 3, n. 05), p. 93-104, 2015.
  • DÍAZ POLANCO, Héctor. La rebelión zapatista y la autonomía México: Siglo XXI Editores, 1997.
  • Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN). “Y rompimos el cerco. Comunicado del CCRI-CG del EZLN.” Disponível em: http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2019/08/17/comunicado-del-ccri-cg-del-ezln-y-rompimos-el-cerco-subcomandante-insurgente-moises/
    » http://enlacezapatista.ezln.org.mx/2019/08/17/comunicado-del-ccri-cg-del-ezln-y-rompimos-el-cerco-subcomandante-insurgente-moises/
  • Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN). Resistencia Autónoma. Cuaderno de texto de primer grado del curso “La libertad según l@s Zapatistas México, 2013.
  • Ejército Zapatista de Liberación Nacional (EZLN). Novena Parte: la Nueva Estructura de la Autonomía Zapatista. Disponível em: https://enlacezapatista.ezln.org.mx/2023/11/12/novena-parte-la-nueva-estructura-de-la-autonomia-zapatista/
    » https://enlacezapatista.ezln.org.mx/2023/11/12/novena-parte-la-nueva-estructura-de-la-autonomia-zapatista/
  • ESCOBAR, Arturo. Desde abajo, por la izquierda y con la Tierra.” El País, Serie Desafíos Latinoamericanos, n. 7, 2020. https://elpais.com/elpais/2016/01/17/contrapuntos/1453037037_145303.html [Acessado em julho de 2020].
    » https://elpais.com/elpais/2016/01/17/contrapuntos/1453037037_145303.html
  • FUENTES SÁNCHEZ, Waldo Lao. Autonomías indígenas: resistencias y luchas por el reconocimiento en México y Nicaragua Buenos Aires: Editorial El Colectivo, 2019.
  • GARCÍA GUERRERO, Luciana; MONASTERIO MERCADO, Fátima (coords.). Luchas territoriales por las autonomías indígenas en Abya Yala. Diálogo de Saberes desde la Amazonía sur, Bolivia. Buenos Aires: Editorial El Colectivo, 2022.
  • GAZOLLA, Márcio; SCHNEIDER, Sérgio. A produção da autonomia: os “papéis” do autoconsumo na reprodução social dos agricultores familiares. Revista Estudos Sociedade e Agricultura, n. 15, p. 89-122, 2007.
  • GIRALDO, Omar Felipe. “El desmoronamiento de la creencia en el Estado: buen vivir y autonomía de los pueblos”, In: MORA, Aura Isabel (ed.). Buenos vivires y transiciones. La vida dulce, la vida bella, la vida querida, la vida sabrosa, la vida buena, la vida en plenitud: convivir en armonía. Bogotá: Uniminuto, 2020, p. 57-86.
  • GIRALDO, Omar Felipe; MCCUNE, Nills. Can the state take agroecology to scale? Public policy experiences in agroecological territorialization from Latin America. Agroecology and Sustainable Food Systems, v. 7, n. 43, p. 785-809, 2019.
  • GONZÁLEZ SALINA, Omar Fabián. La utopía de forjar una sola raza para la nación. Mestizaje, indigenismo e hispanofilia en el México posrevolucionario. Revista Historia y Memoria, n. 13, p. 302-330, 2016.
  • GUDYNAS, Eduardo. La identidad del progresismo, su agotamiento y los relanzamientos de las izquierdas. América Latina en Movimiento, 2015 Disponível em: https://www.alainet.org/es/articulo/172855 [Acessado em dezembro de 2020].
    » https://www.alainet.org/es/articulo/172855
  • HALE, Charles R. Rethinking Indigenous Politics in the Era of the ‘Indio Permitido’. , 2007. Disponível em: https://nacla.org/article/rethinking-indigenous-politics-era-indio-permitido [Acessado em abril de 2023].
    » https://nacla.org/article/rethinking-indigenous-politics-era-indio-permitido
  • HARVEY, David. The ’new’ imperialism: accumulation by dispossession. Socialist Register, 40, p. 63-87, 2004.
  • HARVEY, Neil. The Chiapas Rebellion: The Struggle for Land and Democracy. Durham, NC: Duke University Press, 1998.
  • HERRERA ARANGO, Johana. La tenencia de tierras colectivas en Colombia: Datos y tendencias. CIFOR Info Brief, n. 203, p, 01-08, 2017.
  • HOLLOWAY, John. “Pensar la esperanza, pensar la crisis”. In: SANDOVAL ÁLVAREZ, Rafael (ed.). Pensar desde la Resistencia Anticapitalista y la Autonomía México: CIESAS, p. 87-97, 2015.
  • LA VÍA CAMPESINA (LVC). “Conferencia Internacional de la Reforma Agraria: Declaración de Marabá’, 2016.” Disponível em: https://viacampesina.org/es/conferencia-internacional-de-la-reforma-agraria-declaracion-de-maraba/ [Acessado em julho de 2020].
    » https://viacampesina.org/es/conferencia-internacional-de-la-reforma-agraria-declaracion-de-maraba/
  • LA VÍA CAMPESINA (LVC). Struggles of La Via Campesina for Agrarian Reform and the Defense of Life, Land and Territories. Harare: La Vía Campesina, 2017a.
  • LA VÍA CAMPESINA (LVC). Las Luchas de La Vía Campesina por la Reforma Agraria, la Defensa de la Vida, la Tierra y los Territorios 2017b. Disponível em: https://viacampesina.org/es/las-luchas-la-via-campesina-la-reforma-agraria-la-defensa-la-vida-la-tierra-los-territorios/ [Acessado em julho de 2020]
    » https://viacampesina.org/es/las-luchas-la-via-campesina-la-reforma-agraria-la-defensa-la-vida-la-tierra-los-territorios/
  • LINARES, Malelly et. al. Memorias de la autonomía indígena de Cherán K’erí. In: GARCÍA GUERRERO, Luciana; MONASTERIO MERCADO, Fátima (eds.). Luchas territoriales por las autonomías indígenas en Abya Yala. Diálogo de Saberes desde la Amazonía sur. Bolívia. Buenos Aires: Editorial El Colectivo, p. 179-193, 2022.
  • LÓPEZ BARCENAS, Francisco. Autonomías indígenas en América Latina. México: Centro de Orientación y Asesoría a Pueblos Indígenas, 2007.
  • LÓPEZ y RIVAS, Gilberto. “Autonomías indígenas, poder y transformaciones sociales en México”. In: HOPKINS, Alicia; PIÑEDA, César Enrique (eds.). Pensar las autonomías Alternativas de emancipación al capital y el Estado. México: Bajo Tierra, p. 103-115 2011.
  • LÓPEZ y RIVAS, Gilberto. Pueblos indígenas en tiempos de la Cuarta Transformación México: Bajo Tierra, 2020.
  • KORBAEK; Leif; SÁNARO RENTERÍA, Miguel Ángel. El indigenismo en México: antecedentes y actualidad. Ra Ximhai, v. 3, n. 1, p.195-224, 2007.
  • MACHADO, Decio; ZIBECHI, Raúl. Cambiar el mundo desde arriba: los límites del progresismo. México: Bajo Tierra, 2017
  • MAKARAN, Gaya, LÓPEZ, Pabel; WAHREN, Juan (eds.). Vuelta a la autonomía. Debates y experiencias para la emancipación social desde América Latina México: Bajo Tierra, 2019.
  • MARIÁTEGUI, José Carlos. Siete ensayos de interpretación de la realidad peruana. México: ERA, 1928.
  • MARIÁTEGUI, José Carlos. Obras. Tomo II. La Habana: Casa de las Américas, 1982.
  • MARTÍNEZ TORRES, María Elena; ROSSET, Peter Michael. La Vía Campesina: The birth and evolution of a transnational social movement. The Journal of Peasant Studies, v. 37, n. 1, p. 149-75, 2010.
  • MARTÍNEZ TORRES, María Elena; ROSSET, Peter Michael. Diálogo de saberes in La Vía Campesina: food sovereignty and agroecology. The Journal of Peasant Studies, v. 41, n. 6, p. 979-97, 2014.
  • MAZZEO, Miguel. ¿Es posible un nuevo «ciclo progresista» en Nuestra América? Rebelión, 2018. Disponível em: https://rebelion.org/es-posible-un-nuevo-ciclo-progresista-en-nuestra-america/ [Acessado em dezembro de 2020].
    » https://rebelion.org/es-posible-un-nuevo-ciclo-progresista-en-nuestra-america/
  • MIRANDA, Roberto de Sousa; CUNHA, Luís Henrique Hermínio. A estrutura organizacional do MST: lógica política e lógica prática. Caderno CRH, v. 26, n. 68, p. 363-376, 2013.
  • MODONESI, Massimo. “El Concepto de la autonomía en el marxismo contemporáneo”. In: ADAMOVSKY, Ezequiel et al. Pensar las autonomías. Alternativas de emancipación al capital y el Estado. México: Sísifo Ediciones, Bajo Tierra, p. 19-47, 2011.
  • MODONESI, Massimo. Subalternity, Antagonism, Autonomy: Constructing the Political Subject. London: Pluto, 2014.
  • MONASTERIO MERCADO, Fátima. “La lucha por la autonomía de los pueblos amazónicos del Territorio Indígena Multiétnico del Bosque de Chimanes”. In: GARCÍA GUERRERO, Luciana; MONASTERIO MERCADO, Fátima (eds.). Luchas territoriales por las autonomías indígenas en Abya Yala. Diálogo de Saberes desde la Amazonía sur. Bolivia. Buenos Aires: Editorial El Colectivo, p. 87-104, 2022.
  • MORA, Mariana. Kuxlejal Politics: Indigenous Autonomy, Race, and Decolonizing Research in Zapatista Communities Austin: University of Texas, 2017.
  • MORA, Mariana. “Entre la autonomía como ejercicio propositivo y la autonomía a la defensiva, transformaciones de sentidos políticos indígenas frente a la violencia extrema en México”. In: GONZÁLEZ, Miguel; BURGUETE CAL y MAYOR, Araceli; MARIMÁN, José; ORTIZ-T, Pablo; FUNAKI, Ritsuko (eds..). Autonomías y autogobiernos en la América Diversa. Ecuador: IWGIA, p. 507-534, 2021.
  • Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). “Jornada de Agroecologia reafirma necessidade de construir espaços de resistência e autonomia frente ao capital.” 2016. Disponível em: https://mst.org.br/2016/08/02/jornada-de-agroecologia-reafirma-necessidade-de-construir-espacos-de-resistencia-e-autonomia-frente-ao-capital/ [Acessado em julho de 2020].
    » https://mst.org.br/2016/08/02/jornada-de-agroecologia-reafirma-necessidade-de-construir-espacos-de-resistencia-e-autonomia-frente-ao-capital/
  • NEGRI, Antonio. El poder constituyente. Ensayo sobre las alternativas de la modernidad. Madrid: Traficantes de Sueños, 2015.
  • PREZIA, Benedito. História da resistência indígena. 500 anos de luta. São Paulo: Expressão Popular, 2015.
  • RENDÓN MONZÓN, Juan José. La comunalidad. Modos de vida en los pueblos indios. México: CONACULTA, 2003.
  • RIVERA CUSICANQUI, Silvia. Sendas y senderos de la ciencia social andina. Disposition: American journal of cultural histories and theories, v. 24, n. 51, p. 149-169, 1999.
  • ROSSET, Peter Michael. Epistemes rurales y la formación agroecológica en La Vía Campesina. Ciencia y Tecnología Social, n. 2, p. 01-10, 2015.
  • ROSSET, Peter Michael. América Latina y la conciliación de clases. La Jornada, 19 de agosto de 2018. Disponível em: https://www.jornada.com.mx/2018/08/19/opinion/022a1mun
    » https://www.jornada.com.mx/2018/08/19/opinion/022a1mun
  • ROSSET, Peter Michael; BARBOSA, Lia Pinheiro. Peasant autonomy: the necessary debate in Latin America. Interface: a journal for and about social movements, v. 13, n. 1, p. 46-80, 2021.
  • ROSSET, Peter; ALTIERI, Miguel. Agroecology: Science and Politics Halifax: Fernwood, 2017.
  • ROSSET, Peter Michael; MARTÍNEZ TORRES, María Elena. Rural social movements and agroecology: context, theory, and process. Ecology and Society, v. 17, n. 3, p. 01-17, 2012.
  • ROSSET, Peter Michel, MARTÍNEZ TORRES, María Elena; HERNÁNDEZ NAVARRO, Luís. Zapatismo in the Movement of Movements. Development, v. 48, n. 2, p. 35-41. 2005.
  • SCOTT, James. Seeing Like a State: How Certain Schemes to Improve the Human Condition Have Failed. New Haven, CT: Yale University Press, 1998.
  • SCOTT, James. The Art of Not Being Governed: An Anarchist History of Upland Southeast Asia. New Haven, CT: Yale University Press, 2009.
  • Secretaria Operativa. “Campaña Continental 500 Años de Resistencia Indígena, Negra y Popular, 1992.” https://cutt.ly/aGfd5Gk
    » https://cutt.ly/aGfd5Gk
  • SEVILLA GUZMÁN, Eduardo. Sobre los orígenes de la agroecología en el pensamiento marxista y libertario. La Paz: Plural editors, 2011.
  • SEVILLA GUZMÁN, Eduardo. Desde el pensamiento social agrario Córdoba: ISEC, 2006.
  • SCOONES, Ian, EDELMAN, Marc, BORRAS, Saturnino M., HALL, Ruth, WOLFORD, Wendy; WHITE, Ben. Emancipatory rural politics: Confronting authoritarian populism. The Journal of Peasant Studies, v. 1, n. 45, p. 01-20, 2018.
  • SHANIN, Theodor. Class and revolution. Journal of Contemporary Asia, v.1, n. 2, p. 22-35, 1970.
  • SHANIN, Theodor. Late Marx and the Russian Road New York: Monthly Review Press, 1983.
  • SHANIN, Theodor. Marxism and the vernacular revolutionary traditions. The Journal of Peasant Studies, v. 7, n. 45, p. 1151-1176, 2018.
  • SPINOSA, Baruch, Ethics. Hertford, UK: Wordsworth Editions, 2001.
  • STAHLER-SHOLK, Richard. Resisting neoliberal homogenization: The Zapatista Autonomy Movement. Latin American Perspectives, 153, p. 48-63, 2007.
  • STARR, Amory; MARTÍNEZ TORRES, María Elena; ROSSET, Peter Michael. Participatory democracy in action: practices of the Zapatistas and the Movimento Sem Terra. Latin American Perspectives, v. 38 (176-1), p. 102-119, 2011.
  • Subcomandante Insurgente Marcos. “Chiapas, la treceava estela: una muerte.”, 2003. Disponível em: https://enlacezapatista.ezln.org.mx/2003/07/21/chiapas-la-treceava-estela-segunda-parte-una-muerte/
    » https://enlacezapatista.ezln.org.mx/2003/07/21/chiapas-la-treceava-estela-segunda-parte-una-muerte/
  • SVAMPA, Maristella. Debates Latinoamericanos: Indianismo, Desarrollo, Dependencia y Populismo. Buenos Aires: Edhasa, 2016.
  • VAN DER PLOEG, Jan Douwe. The New Peasantries. Struggles for autonomy and sustainability in an era of empire and globalization London: Earthscan, 2008.
  • VAN DER PLOEG, Jan Douwe. Nuevos Campesinos: Campesinos e Imperios Alimentarios. Madrid: Icaria, 2010.
  • VELTMEYER, Henry. Resistance, class struggle and social movements in Latin America: contemporary dynamics. Journal of Peasant Studies, v. 6, n. 46, p. 1264-1285, 2019.
  • VERGARA CAMUS, Leandro. Land and Freedom: The MST, the Zapatistas and Peasant Alternatives to Neoliberalism. London: Zed Books, 2014.
  • VERGARA-CAMUS, Leandro; KAY, Cristóbal. The agrarian political economy of left-wing governments in Latin America: agribusiness, peasants, and the limits of neo-developmentalism. Journal of Agrarian Change, v. 2, n. 17, p. 415-437, 2017.
  • WALLACE, Rob. Big farms make big flu. New York: Monthly Review Press, 2016.
  • WOLF, Erick R. Peasants. London: Prentice-Hall, 1966.
  • WOLF, Erick R. Peasant Wars of the Twentieth Century. New York: Harper & Row, 1969.
  • ZIBECHI, Raúl; MARTÍNEZ Martínez, Edgars (eds.). Repensar el Sur. Las luchas del Pueblo Mapuche. México: Cátedra Guadalajara; Buenos Aires: CLACSO, 2020.
O processo de editoração deste artigo foi realizado por Lorena Izá Pereira e Camila Ferracini Origuela.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    26 Jun 2023
  • Revisado
    28 Dez 2023
  • Aceito
    02 Fev 2024
Universidade Estadual Paulista (UNESP) CEP: 19060-900, +55 (18) 3229-5664 - Presidente Prudente - SP - Brazil
E-mail: revista.nera@gmail.com