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Grau de monopólio e determinação de preços em Kalecki: uma apreciação crítica

Degree of monopoly and pricing in Kalecki: a critical assessment

RESUMO

Este artigo examina as raízes históricas e a consistência lógica da teoria de Kalecki sobre o grau de monopólio e determinação de preços em uma estrutura de insumo-produto. Mostra que a teoria Kaleckiana de preços é aberta na medida em que não fornece nenhuma explicação sistemática sobre a determinação das margens de lucro dos indivíduos. Além disso, mostra que a margem de lucro para a economia como um todo não depende das condições de concorrência. Uma maneira consistente de fechar o sistema seria determinar a margem média através da taxa marxiana de lucros e dos preços do oligopólio como desvios dos preços de produção.

PALAVRAS-CHAVE:
Análise marxista; monopólio; determinação de preços, mark-up

ABSTRACT

This article examines the historical roots and logical consistency of Kalecki’s theory of degree of monopoly and price determination in an input-output framework. It shows that the Kaleckian theory of prices is open in so far as it does not provide any systematic explanation about the determination of individuals mark-ups. Besides, it shows that the mark-up for the economy as a whole does not depend on the conditions of competition. A consistent way to close the system would be to determine the average mark-up through the Marxian rate of profits and the oligopoly prices as deviations from prices of production.

KEYWORDS:
Marxist analysis; monopoly, price determination; mark-up

O objetivo deste artigo é analisar um elemento-chave na teoria econômica de Michal Kalecki: a hipótese de que os empresários determinam os preços a partir de um mark-up sobre custos, tendo como base o “grau de monopólio” de suas firmas. Apesar de vários autores já terem examinado essa questão de diversas formas (veja-se, por exemplo, Riach, 1971RIACH, P. A. (1971) “Kalecki’s ‘Degree of Monopoly’ Reconsidered”. Australian Economic Papers, 10, 50-60. ; Eichner, 1973EICHNER, A. (1973) “A Theory of the Determination of the Mark-up Under Oligopoly”. The Economic Journal, 83, 1184-2000. e 1976EICHNER, A. (1976) The Megacorp and Oligopoly. Cambridge: Cambridge University Press. ; Azimakopulos, 1975AZIMAKOPULOS, P. (1975) “A Kaleckian Theory of Income Distribution”. Canadian Journal of Economics, 8(3), 313-33. ; Mainwaring, 1977MAINWARING, L. (1977) “Monopoly Power, Income Distribution and Price Determination”. Kyklos, 30, 674-90. ; Sylos-Labini, 1979SYLOS-LABINI, P. (1979) “Prices and Income Distribution in Manufacturing Industry”. Journal of Post-Keynesian Economics, 11(1), 3-25. ; Cowling, 1982COWLING, K. (1982). Monopoly Capitalism. Nova York: John Wiley & Sons. ; Basile e Salvadori, 1984-85BASILE, L.; SALVATORI, N. (1984-85). ‘’Kalecki’s Pricing Theory’’. Journal of Post Keynesian Economics, 7, 249-62. ; Sawyer, 1985SAWYER, M. (1985) The Economics of Michal Kalecki. Nova York: Sharpe. ; Kriesler, 1987KRIESLER, P. (1987) Kalecki’s Microanalysis. Nova York: Cambridge University Press. ), apenas alguns o fizeram à luz da análise de insumo-produto (veja-se Roemer, 1981ROEMER, J. E. (1981) Analytical Foundations of Marxian Economic Theory. Cambridge: Cambridge University Press. e Semmler, 1984SEMMLER, W. (1984). Competition, Monopoly and Differential Profit Rates. Nova York: Columbia University Press. ).

O estudo desdobra-se em dois planos. No primeiro, examinam-se as raízes históricas da teoria kaleckiana de preços, procurando-se salientar suas principais características. No segundo, procura-se verificar a sua consistência lógica, no contexto de uma economia multissetorial.

Isto implica que, apesar de relevante, o conteúdo empírico da tese kaleckiana não será examinado. Como se sabe, são inúmeras as tentativas de se encontrar suporte empírico, tanto para a tese de que o capitalismo moderno é dominado por oligopólios, quanto para a concepção oposta, segundo a qual os mercados e o comportamento empresarial continuam a ser, essencialmente, competitivos (veja-se Bain, 1951BAIN, J. S. (1951) “Relation of Profit Rate to Industry Concentration. American Manufacturing 1936-40”. Quarterly Journal of Economics, 65(3), 293-324. ; Schartzman, 1959SCHWARTZMAN, D. (1959) “The Effect of Monopoly on Price”. Journal of Political Economy, 67, 352-62. ; Yordon, 1961YORDON, W. J. (1961) “Industrial Concentration and Price Flexibility in Inflation: Price Response Rates in Fourteen Industries, 1947-1958”. Review of Economics and Statistics, 43(3), 287-94.; Eckstein e Fromm, 1969ECKSTEIN, O; FROMM, O. (1968) “The Price Equation”. The American Economic Review, 58(5), 1159-83. ; Philips, 1969PHILIPS, L. (1969) “Business Pricing Policies and Inflation - Some Evidence from E.E.C. Countries”. Journal of Industrial Economics, 18(1), 1-14. ; Stigler e Kindahl, 1970STIGLER, G. J.; KINDAHL, J. K. (1973) “Industrial Prices as Administered by Dr. Means”. American Economic Review, 63(3), 717-21. ; Godley e Nordhaus, 1972GODLEY, W.; NORDHAUS, W. D. (1972) “Pricing in the Trade Cycle”. The Economic Journal, 82(327), 853-82. ; Qualls, 1972QUALLS, D. (1972) “Concentration, Barriers to Entry, and Long Run Economic Profit Margins”. Journal of Industrial Economics, 20(2), 146-58. e 1974QUALLS, D. (1974) ‘’Stability and Persistence of Economic Profit Margins in Highlty Concentrated Industries”. Economic Journal, 40(4), 604-12. ; Ripley e Segal, 1973RIPLEY, F.; SEGAL, L. (1973) “Price Determination in 395 Manufacturing Industries”. The Review of Economics and Statistics, 55(3), 263-71. ; Weston, Lustgarten e Grottke, 1974WESTON, J. F.; LUSTGARTEN, S.; GROTTKE, N. (1974) “The Administred Price Thesis Denied”. American Economic Review 64(1), 232-34. ; Lustgarten, 1975LUSTGARTEN, S. (1975) “Administered Inflation: a Reappraisal”. Economic Inquiry, 13, 191-206. ; Means, 1976MEANS, G. C. (1976) “The Administered-Price Thesis Reconfirmed”. The American Economic Review, 62, 292-306. ; McEnally, 1976McENALLY, R. W. (1976) “Competitien and Dispersion in Rates of Return: a Note’’. The Journal of Industrial Economics, 25(1), 69-75. ; Sylos-Labini, 1979SYLOS-LABINI, P. (1979) “Prices and Income Distribution in Manufacturing Industry”. Journal of Post-Keynesian Economics, 11(1), 3-25. ; Ros, 1980ROS, J. (1980) “Pricing in the Mexican Manufacturing Sector”. Cambridge Journal of Economics, 4, 211-31. ). Contudo, a maioria desses estudos toma o mecanismo neoclássico de formação de preços, ou a noção neoclássica de concorrência, como ponto de partida para o estudo do comportamento monopolista, o que significa que são de pouco uso para os propósitos deste artigo, que assume como concorrencial toda economia na qual prevalece a tendência à equalização da taxa de lucro entre os setores. Além disso, qualquer uma das posições a respeito da natureza da concorrência no capitalismo moderno é compatível com os resultados do presente artigo, no qual se analisam os requerimentos formais de uma teoria de preços baseados na imposição de mark-up sobre custos.

Este ensaio compreende cinco partes. Nas seções 1, 2 e 3 analisam-se, ainda que sumariamente, as três versões da teoria kaleckiana do grau de monopólio e formação de preços; na seção 4 compara-se sua última versão dessa teoria com a determinação de preços de produção e da taxa média de lucro em Marx. Finalmente, na última seção, apresentam-se as conclusões pertinentes.

1. FORMAÇÃO DE PREÇOS EM “OS DETERMINANTES DA DISTRIBUIÇÃO DA RENDA NACIONAL’’

Em 1938, foi publicado o primeiro artigo de Kalecki, em inglês, sobre a formação de preços e distribuição de renda, “The Determinants of Distribution of National Income” (Kalecki, 1938)KALECKI, M. (1938) “The Determinants of Distribution of the National Income”. Econometrica, 6, 97-112. . Um ano depois, apareceu uma forma revisada do mesmo (Kalecki, 1939). Esses artigos caracterizam a fase inicial de desenvolvimento da microeconomia kaleckiana. Examinando-os, não é difícil de se concluir que eles pertencem à então contemporânea Teoria da Concorrência Imperfeita (TCI), cujo ponto de partida deveu-se a Robinson (1932ROBINSON, J. (1932) ‘’Imperfect Competition and Failling Supply Price’’. The Economic Journal, 42, 544-54. , 1933) e Chamberlin (1933CHAMBERLIN, E. H. (1933) The Theory of Monopolistic Competition. Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1962. ).

A TCI representa uma tentativa de conciliar a abordagem de oferta/demanda com retornos crescentes e com o fenômeno generalizado das grandes corporações. De acordo com a TCI, a firma individual (i) faz face a uma curva de demanda decrescente, implicando que a igualação do custo marginal (CMg) à receita marginal (RMg) resulta em que os preços (p) passam a depender da elasticidade da demanda (e):

P i = CMg i ε i / ε i - 1 (1)

Outro importante elemento na TCI é o conceito de equilíbrio. Enquanto o equilíbrio de curto prazo da firma significa identidade entre CMg e RMg, o equilíbrio de longo prazo da indústria requer, além da identidade acima, que os preços sejam iguais ao custo médio (CMe). Essa última condição implica que todas as firmas auferem somente lucros normais.

A esse respeito, a TCI assume que, embora as firmas estabeleçam seus preços tendo em vista a elasticidade da demanda, o fluxo de capitais entre as indústrias promove a igualação das taxas de lucro. Assim, caso as firmas de uma indústria estejam auferindo lucros acima (abaixo) do normal, haverá um movimento de entrada (saída) de capitais para o (do) setor, reduzindo (aumentando) a demanda dos produtos de cada empresa em particular. Como consequência, a elasticidade da demanda sofrerá alterações, até que o preço e o custo médio (que inclui o lucro “normal”) sejam iguais.

Finalmente, outro importante elemento derivado da TCI e que nos interessa de perto é o conceito de grau de monopólio, assim como definido por Lerner. Comparando a formação de preços em concorrência perfeita e em concorrência imperfeita, Lerner (1934)LERNER, A. (1934) “The Concept of Monopoly and the Measurement of Monopoly Power”. Review o fEconomic Studies, 1, 157-75. argumenta que a renda de monopólio representa o excesso do preço sobre o custo marginal, o que significa que é possível definir o grau de monopólio de uma indústria(µ) como:

µ = ( p CMg ) / p (2)

Considerando uma situação de equilíbrio, tem-se:

µ = 1 / ε (3)

A importância da TCI para a teoria kaleckiana de preços reside no fato de que Kalecki, explicitamente, usa o conceito de Lerner de grau de monopólio e a condição de equilíbrio a longo prazo, segundo a qual o preço iguala o custo médio. Assim, a primeira equação kaleckiana de preços pode ser expressa como:

p = CMe = [ 1 / ( 1 µ ) ] CMg = [ ε / ( ε l ) ] CMg (4)

Aceitando a ideia kaleckiana que o custo variável é constante até plena utilização da capacidade instalada na maior parte das indústrias, e adotando-se a hipótese simplificadora de que o custo marginal de overhead é nulo, pode-se expressar os custos marginais como custos primários (custos de mão-de-obra empregada na produção por unidade de produto (w) e custos de matérias-primas por unidade de produto (m)). Como resultado, tem-se:

p = [ 1 / ( 1 µ ) ] ( w + m ) = [ ε / ( ε l ) ] ( w + m ) (5)

Apesar de sua explícita inspiração na TCI, é preciso salientar que a análise kaleckiana contém alguns elementos de diferente matiz, entre os quais se destaca sua hipótese a respeito da constância do custo marginal na indústria manufatureira. Segundo Kalecki, essa hipótese “é possível somente com a existência de monopólio ou concorrência imperfeita” (Kalecki, 1938, p. 102)KALECKI, M. (1938) “The Determinants of Distribution of the National Income”. Econometrica, 6, 97-112. .

Baseando-se nessa teoria de preços, Kalecki deriva algumas conclusões a respeito da distribuição da renda nacional. Com efeito, multiplicando-se ambos os lados da equação (5) pelo output correspondente, obtém-se o valor bruto da produção setorial. Agregando-se todos os setores, tem-se o valor bruto da produção industrial. Considerando-se, então, somente a indústria manufatureira, e manipulando-se os resultados da agregação anterior, obtém-se a participação dos salários na renda como função do grau de monopólio (µ) e da razão entre os custos de matérias-primas e os custos salariais (M/W):

W / Y = ( 1 µ ) / ( 1 + µ ( M / W ) ] (6)

Uma análise crítica dessa primeira teoria de preços de Kalecki é capaz de mostrar seus diversos problemas. O primeiro consiste em que Kalecki não parece perceber que a ideia de um custo marginal crescente se baseia na hipótese de substitubilidade entre os fatores de produção, com rendimentos marginais decrescentes. Assim, por contraste, a constância do custo marginal depende do abandono dessa hipótese, e não, como o quer Kalecki, da natureza da concorrência. Como consequência, a comparação kaleckiana entre concorrência perfeita e concorrência imperfeita fica inteiramente comprometida. Isso, por sua vez, torna inválida a teoria de Kalecki de distribuição de renda, uma vez que, como se pode verificar fazendo-se µ igual a zero na equação (6), a participação dos lucros na renda torna-se nula quando se assume concorrência perfeita, o que é absurdo.

Finalmente, é de se salientar que Kalecki participa, juntamente com os teóricos da TCI, da indeterminação dos preços no longo prazo: desde que no longo prazo os preços de equilíbrio incluem uma taxa “normal” de lucros, e desde que não existe forma não-circular de se determinar o seu montante dentro de uma abordagem de oferta/demanda (veja-se Garegnani, 1987GAREGNANI, P. (1987) “Quantity of Capital”. In EATWELL, J. The New Palgrave: A Dictionary of Economic Theory and Doctrine. Londres: Macmillan, no prelo. ), o sistema de preços resulta indeterminado.

2. DETERMINAÇÃO DE PREÇOS EM “A CURVA DE OFERTA DE UMA INDÚSTRIA EM CONDIÇÕES DE CONCORRÊNCIA IMPERFEITA”

Em seu artigo “The Supply Curve of an Industry under Imperfect Competition”KALECKI, M. (1940). ‘’The Supply Curve of an Industry under Imperfect Competition’’. Review of Economic Studies, 7, 91-112. , publicado em 1940, Kalecki trabalha com duas situações diferentes: uma economia em condições de “concorrência imperfeita pura” e uma economia oligopolizada. No primeiro caso, a hipótese de maximização de lucros conduz à seguinte equação de preços:

P i = 1 / [ 1 ( l / ε i ) ] Cmg i (7)

que é igual à equação (1), com a única diferença de que agora a análise é desenvolvida em termos de firmas, em lugar de indústrias. A elasticidade da demanda (e) é concebida como função da razão entre o preço cobrado pela firma i e o preço médio da indústria, razão que depende, segundo Kalecki, do grau de imperfeição do mercado.

Em contraste com o caso da economia em condições de ‘’concorrência imperfeita pura”, Kalecki define o grau de monopólio como o quociente entre a receita marginal e o custo marginal:

μ 1 = p i [ 1 ( 1 / ε i ) ] / CMg i (8)

Como consequência, tem-se:

p i = μ i 1 / [ 1 ( 1 / ε i ) ] CMg i ; (9)

ou, incluindo-se os custos de venda dos produtos (s.), obtém-se:

p i = μ i [ 1 / [ 1 ( 1 / ε i ) μ i s i ] } CMg i (10)

Como na versão anterior, essa nova tentativa kaleckiana de formular uma teoria coerente de determinação de preços esbarra em problemas e contradições.

O primeiro problema diz respeito à natureza do produto. Como foi dito anteriormente, nessa nova versão a análise é desenvolvida em termos de firmas, em lugar de indústrias. Isso representa um importante passo, uma vez que a mesma noção de concorrência imperfeita e diferenciação de produto tornam problemático tratar a demanda num nível mais agregado. De mais a mais, o uso da elasticidade da demanda na determinação de preços requer, de algum modo, aceitar a diferenciação de produto (veja-se Robinson, 1933, e Chamberlin, 1933CHAMBERLIN, E. H. (1933) The Theory of Monopolistic Competition. Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1962. ). Entretanto, a definição de grau de imperfeição do mercado requer o conceito de indústria, o qual implica homogeneidade de produto. Em outras palavras, a formulação kaleckiana parece envolver, implicitamente, duas hipóteses contraditórias a respeito da natureza do produto.

Estreitamente relacionada com esse problema está a questão da subjacente noção de equilíbrio. Como foi salientado anteriormente, a equalização entre receita marginal e custo marginal, através da elasticidade da demanda, na medida em que o preço se identifica com o custo médio, implica ambos, equilíbrio de curto e de longo prazos. Entretanto, o novo conceito de grau de monopólio rejeita, explicitamente, a identidade entre receita marginal e custo marginal. A razão alegada, emprestada da Moderna Teoria do Oligopólio (MTO) (veja-se Hall e Hitch, 1939HALL, R. L.; HITCH, C. J. (1939) ‘’Price Theory and Business Behaviour’’. Oxford Economic Papers, 2, 12-45. ), é a descontinuidade da função de receita marginal, devido ao fato de a curva de demanda ser quebrada. Mas isso deixa a elasticidade de demanda sem nenhum papel na determinação de preços e não tem significado mantê-la, a não ser que os deslocamentos da mesma curva de demanda continuem sendo governados pelo excesso da taxa de lucro em relação a seu nível “normal”. Mas, em equilíbrio de longo prazo (taxa efetiva igual à taxa “normal” de lucros), o grau de monopólio é igual a um, e está-se de volta à formulação de Robinson/Lerner. Então, para se manter a coerência, deve-se eliminar um desses dois elementos da equação de preços ou (i ou µi. No primeiro caso, está-se de volta à TCI no que diz respeito à formação de preços; no segundo, está-se nos domínios exclusivos da MTO.

Suponha-se que a segunda hipótese seja verdadeira. Segue que a equação (2) prevalece, mas não a equação (3). Isso significa aceitar o caso de’ ‘oligopólio puro”, e a questão-chave consiste em como se determina µ. Contudo, Kalecki não fornece nenhuma explicação sistemática sobre isso, mas apenas pistas esparsas. Inicialmente, Kalecki afirma que µ é determinada pela razão entre P; e CMg;. Mas isso constitui uma tautologia, a não ser que µi seja determinado por outros fatores que não a razão em si mesma. A única pista que Kalecki fornece é que µi pode surgir como resultado de um “acordo tácito” entre os empresários, o que, nem de longe, constitui uma teoria sobre sua determinação.

Como se pode ver, a microeconomia de “A Curva de Oferta de uma Indústria em Condições de Concorrência Imperfeita’’ pode ser concebida como um compromisso entre a TCI e a MTO em relação à determinação de preços. Como resultado, a formulação kaleckiana apresenta complicações inerentes às duas abordagens. Mais do que isso, parece plausível supor que Kalecki viu-se preso nas dificuldades oriundas de sua tentativa de apresentar uma teoria geral de preços que pudesse explicar cada uma das diferentes abordagens como um caso particular. As contradições que surgem dessa tentativa manifestam-se na incapacidade de Kalecki de fornecer uma explicação não tautológica do conceito de grau de monopólio.

3. DETERMINAÇÃO DE PREÇOS NA “TEORIA DA DINÂMICA ECONÔMICA”

Em sua “Theory of Economic Dynamics” (1954)KALECKI, M. (1954) Theory of Economic Dynamic, Allen & Unwin. , Kalecki concebe a formação de preços da firma como baseada no custo primário médio (que supomos ser igual ao custo marginal) e no inter-relacionamento com os preços de outras empresas produzindo produtos similares:

p i = m i CMG i + N i p (11)

onde mi e ni são coeficientes positivos que “refletem o grau de monopólio” da firma i.

No caso da indústria, pode-se concluir de (10) que:

p = [ m / ( 1 n ) ] CMg (12)

onde:

m / ( 1 n ) = f ( µ ) (13)

Baseado nessa equação de preços, Kalecki define o grau médio de oligopólio, que se constitui numa importante variável de seu sistema macroeconômico.

Como se pode verificar, Kalecki parece abandonar a sua formulação tautológica do conceito de grau de monopólio, na medida em que a determinação de µ parece ser exógena ao sistema. Entretanto, desde que Kalecki não fornece nenhuma explicação sistemática a respeito de como se determina o grau de monopólio, sua teoria de preços está longe de ser completa, carecendo de um dos elementos indispensáveis para tal.

4. “FECHANDO” A TEORIA KALECKIANA DE PREÇOS

Como se viu anteriormente, a teoria kaleckiana de preços é aberta, na medida em que não explica a determinação do grau de monopólio, elemento crucial na formação de preços. Sendo assim, muitas interpretações podem ser avançadas, no sentido de “fechar” o seu sistema teórico.

Parece-nos que existem, basicamente, três possibilidades de se completar a teoria kaleckiana de preços. A primeira consiste em se seguir as suas ideias gerais, determinando-se o grau de monopólio a partir da MTO. A segunda significa derivar µ a partir do sistema marxista de preços de produção. Finalmente, pode-se construir uma teoria de preços de monopólio como desvios dos preços de produção. Em qualquer caso, porém, há de se considerar a formação de preços no contexto de uma economia multissetorial, na qual o produto de uma indústria é, em muitos casos, um insumo de uma outra.

Adotando-se, pois, uma abordagem do tipo insumo-produto, pode-se expressar a equação kaleckiana de preços como:

p = [ p A + a n ( w ) ] ( k ) (14)

onde A é a matriz de coeficientes técnicos; a0 é o vetor de coeficientes de trabalho; (w) é a matriz diagonal de taxas de salário por setor; e (k) é a matriz diagonal de mark-ups. Note-se que o mark-up da indústria j pode ser expresso, segundo Kalecki, como:

k j = m j / ( 1 n j ) = f ( μ j ) (15)

Uma abordagem baseada na MTO seria conceber µi como estando determinado pela presença de barreiras à entrada de capitais no setor j, que evitariam o processo de equalização da taxa de lucro entre os setores. Isto significa que, para se determinar os efeitos da presença de barreiras à entrada, é necessário considerar a determinação de kj em condições de mobilidade do capital (em outras palavras, em condições de concorrência). Para tal, pode-se recorrer ao uso da equação marxista de preços de produção, cuja consistência formal é conhecida (veja-se o Apêndice 1):

p = p A + a n ( w ) + p ( δ ) K + r [ p A + a n ( w ) ] ( t ) + p K ] (16)

onde r representa a taxa de lucro médio; (t) a matriz diagonal do tempo de circulação do capital circulante; K a matriz dos coeficientes de capital fixo; e (d) a matriz de coeficientes de depreciação do capital fixo.

Usando-se a equação (16) pode-se determinar o mark-up “competitivo’’ do setor j (h) como:

hi = { r [ ( pA . j + w j a j ) t j + pK . j ) + p ( δ ) K . j ) / ( pA . j + w j a j ) (17)

A ideia básica de Kalecki parece ser que hj ≠. kj, uma vez que kj. é função de µj. Assim, pode-se esperar que a presença de barreiras à entrada nos setores oligopolizados cause rj > r, e a ausência de tais barreiras nos setores competitivos signifique rj ≤ r. Mais do que isso, de acordo com Kalecki, o mark-up ‘’médio’’ da economia, k, é o produto da agregação dos mark-ups individuais, resultando no “grau médio de oligopólio” da economia, µ. A resultante taxa média de lucro do sistema, portanto, é função das taxas individuais de lucro, determinadas pelos diferentes graus de monopólio, não dependendo da taxa homogênea de lucro, determinada no sistema marxista de preços de produção. Em outras palavras, tem-se:

r = f ( k ) = f ( µ ) = f ( k j ) = f ( μ j ) (18)

Contudo, não é difícil de se verificar que a hipótese de que cada setor determina a sua margem de lucro a partir de seu poder monopolístico pode-se mostrar inconsistente quando se considera o sistema econômico como um todo. Isso porque, em primeiro lugar, a configuração de preços nos setores oligopolísticos pode ser tal que implique preços abaixo dos custos de produção para os setores não-oligopolizados. Uma situação como essa poderia surgir, por exemplo, quando as empresas de um setor “competitivo” compram e vendem para setores oligopolizados. Em segundo lugar, a constelação de preços pode ser tal que a taxa de salário real compatível não cubra os custos de subsistência da mão-de-obra. Matematicamente, essas possibilidades revelam-se pelo fato de que a solução da equação (14), quando não se tem um sistema sobredeterminado, pode requerer salários reais abaixo do nível de subsistência, ou mesmo negativos (veja-se o Apêndice 2).

Com isso restam, fundamentalmente, duas alternativas. Ou as equações (16) e (17) prevalecem, e está-se no mundo marxista “competitivo”, ou há de se construir uma teoria na qual a taxa média de lucro seja determinada de acordo com a equação marxista (16), embora o mark-up individual k. possa se desviar de seu nível “competitivo” h., devido à presença de barreiras à entrada de capitais (veja-se o Apêndice 3). No entanto, de acordo com esta última alternativa, a existência de alguns setores onde k > h implica, necessariamente, na existência de outros setores onde h > k, o que significa que os desvios se cancelam no sistema em sua totalidade. Segue-se que (pelo menos no caso de uma economia onde todos os setores são básicos) a média das taxas setoriais de lucro - e, portanto, o “grau médio de monopólio” - não depende das condições de concorrência, sendo função, como no sistema marxista, da taxa “competitiva” determinada pelas condições técnicas de produção e pelo nível do salário real. Em outras palavras, o conceito de “grau médio de oligopólio” não faz sentido, a não ser como uma tautologia, não se verificando a relação de causalidade contida em (18).

5. CONCLUSÃO

Conclui-se que a teoria kaleckiana de formação de preços através da imposição de um mark-up sobre custos, determinado a partir do grau de monopólio da firma, carece de alguns elementos centrais, o que a impede de ser uma formulação completa e consistente. Em particular, a tese kaleckiana segundo a qual o grau de monopólio da economia como um todo resulta da agregação de mark-ups individuais parece falsa. Uma base não circular para uma teoria de determinação de preços com base em mark-ups pode ser encontrada tanto na teoria marxista de preços de produção quanto no conceito de barreiras à entrada, que explicariam os desvios dos mark-ups efetivos em relação aos mark-ups determinados em condições de concorrência. Em qualquer dos casos, no entanto, os preços de produção precisam ser previamente determinados, representando uma etapa logicamente anterior à determinação de “preços de oligopólio”.

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  • 1
    JEL Classification: E11; B24; D42.

APÊNDICE 1. CONSISTÊNCIA FORMAL DA EQUAÇÃO MARXISTA DE PREÇOS

Considerando-se uma economia em concorrência (isto é, onde prevalece a tendência à igualação das taxas setoriais de lucro), e adotando-se a hipótese simplificadora de que a taxa de salário é única para todo o sistema econômico, a taxa de lucro r determina-se como o inverso da maior raiz característica a que solve a seguinte equação:

det [ σI ( A * + K ) ( I A * ( δ ) K ) - 1 ] = det [ σI B ] = 0 (Al.1)

onde A* = A + ban e b representa a cesta de consumo dos trabalhadores.

A produtividade física do sistema econômico garante que σmax < 1, o que equivale a dizer que r > 0, uma vez que se tem

r = ( 1 / σ max ) 1 (A1.2)

Uma vez tendo-se obtido r, determina-se p, que corresponde ao vetor característico associado a a. Assumindo-se que a matriz B é irredutível, segue-se que, de acordo com o teorema de Perron-Frobenius para matrizes irredutíveis não-negativas (veja-se Pasinetti, 1977PASINETTI, L. (1977) Lectures on the Theory of Production. Nova York: Columbia University Press. , p. 268-74), p é positivo. A equação marxista de preços competitivos, portanto, pode ser expressa como:

p = ( p A + a n ( w ) ) ( h ) (A1.3)

onde

( w ) = w I = pb (Al .4)

e (h) determina-se de acordo com a equação (17), onde wj = w.

APÊNDICE 2. CONSISTÊNCIA FORMAL DA EQUAÇÃO KALECKIANA DE PREÇOS

Considerando-se apenas as indústrias básicas, e adotando-se a hipótese simplificadora de uma taxa homogênea de salário para a economia como um todo, a equação kaleckiana de preços pode ser expressa como:

p = ( p A + w a n ) ( k ) (A2.1)

onde p e w são as incógnitas, uma vez que, de acordo com Kalecki, (k) é determinado pelo grau de monopólio de cada setor da economia.

Para efeito de simplificação, considerando-se fixa a composição do salário real, tem-se:

w = a p d (A2.2)

onde ad significa a cesta de consumo dos trabalhadores, cuja composição, dada por d, é invariável. Observe-se que o nível do salário real depende do valor do escalar a.

Substituindo-se (A2.2) em (A2.l) obtém-se:

p [ I ( A + a d a n ) ( k ) ] = 0 (A2.3)

o que implica que:

det [ I ( A + σ d a n ) ( k ) ] = 0 (A2.4)

Examinando-se a equação característica acima, conclui-se que, caso o nível do salário real (a) seja determinado exogenamente (pelo nível de subsistência, por exemplo), o sistema está sobredeterminado, uma vez que a matriz (A + uda) (k) tem a unidade como sua maior raiz característica, o que entra em contradição com a determinação autônoma de seus elementos. Em segundo lugar, caso a seja determinado pela equação (A2.4), nada garante que seja maior do que o correspondente ao salário real de subsistência, ou mesmo que seja positivo.

Conclui-se, pois, que a determinação de (k) exclusivamente através do poder de mercado (ou “grau de monopólio”) das empresas é logicamente inconsistente, pois pode levar a resultados absurdos.

APÊNDICE 3. DETERMINAÇÃO DE PREÇOS EM REGIME DE OLIGOPÓLIO

É interessante observar que, a partir da determinação da taxa homogênea de lucro r e dos preços de produção em regime de concorrência (veja-se o Apêndice 1), é possível construir uma teoria de preços de oligopólio. Por preços de oligopólio se entende preços que se desviam dos preços de concorrência, isto é, preços de equilíbrio que resultam da presença de barreiras à entrada de capitais, as quais impedem a equalização das taxas de lucro entre os diversos setores da economia.

Novamente, a equação (simplificada) de preços é:

p = ( p A + w a n ) ( k ) (A3. l)

onde:

w = pb (A3.2)

Para que (A3.1) tenha solução, a unidade precisa ser a maior das raízes características da matriz C = (A + b an) (k), desde que, das equações (A3 .1) e (A3.2) obtém-se:

det [ I ( A + b a n ) ( k ) ] = det [ I C ] = 0 (A3.3)

e a necessidade de p ser positivo requer, de acordo com o teorema de Perron-Frobenius, que p seja o vetor característico associado com a maior raiz característica de C.

Condições suficientes para que o requerimento acima se verifique seriam:

  • 1a) min kj = 1;

  • 2a) max kj = hj.

Contudo, essas condições conduzem ao estranho resultado de que a taxa média de lucro do sistema econômico em regime de oligopólio seria menor do que a taxa homogênea que seria obtida em regime de concorrência.

Uma outra alternativa seria admitir as seguintes condições:

  • la) min kj = 1;

  • 2a) se kj ≤ hi,j = 1, ... ,g, então tem-se que

ki ~ hi,i = (g + 1), ... ,n, (n representa o número de setores da economia), de forma a se obter det [I - C] = 0.

De qualquer modo, fica claro que o nível médio da margem de lucro para a economia como um todo, assim como os mark-ups setoriais, considerados em seu conjunto, são função da taxa homogênea de lucro:

k = f ( k ) = f ( r ) (A3.4)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    1991
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