RESUMO
Concentramos nossa atenção no fato de que, em um mundo incerto, as expectativas desempenham um papel importante quando são tomadas decisões sobre produção e investimento. Apesar de lidar com problemas diferentes, as decisões sobre produção e investimento estão inter-relacionadas porque, uma vez explicitamente considerada, as decisões de longo prazo devem ser traduzidas em procedimentos de curto prazo. Sugerimos que várias variáveis pudessem ser identificadas como decisões norteadoras do investimento: expectativas sobre rendimentos prospectivos, economia interna e instalações internas não exploradas para diversificar a linha de produção e, finalmente, as condições para financiar novos planos de investimento por dívida.
PALAVRAS-CHAVE:
Pós-keynesianismo; incerteza; investimento
ABSTRACT
We have focused our attention on the fact that in an uncertain world, expectations play an important role when decisions about production and investment are made. In spite of dealing with different problems, decisions about production and investment are interrelated because, once is explicitly considered, long term decisions have to be translated into short term procedures. We suggested that several variables could be identified as guiding investment decisions: expectations about prospective yields, internal savings and unexploited internal facilities to diversify the production line and, finally, the conditions to debt finance new investment plans.
KEYWORDS:
Post-Keynesianism; uncertainty; investment
1. INTRODUÇÃO: NUMA ECONOMIA MONETÁRIA DE PRODUÇÃO
Para os pós-keynesianos, o conceito de economia monetária de produção é definido para descrever uma visão particular das regras de funcionamento de um sistema capitalista moderno. Uma de suas características centrais é o destaque dado ao processo de tomada de decisão num ambiente de incerteza não-probabilística. Nessa economia, decisões tomadas em ambiente de incerteza são a causa de mudanças e não apenas passivos meios de transmissão, transportando comandos do ambiente para agentes individuais. Em particular, decisões tomadas por empresários ou firmas, aqueles que organizam e comandam o processo produtivo, são estratégicas na determinação de sua dinâmica. Uma economia monetária de produção não é apenas uma economia onde a moeda é usada. Keynes definiu, por exemplo, uma economia neutra como aquela em que ...
... os fatores são empregados pelo empresário por dinheiro, mas onde existe um mecanismo de algum tipo que assegura que o valor de troca da renda monetária dos fatores é sempre igual no agregado à proporção de produção corrente à qual corresponderia a parcela do produto numa economia cooperativa ... (Keynes, 1979KEYNES, J.M. (1979) The General Theory and After: a Supplement, Londres: Macmillan, The Collected Writings of John Maynard Keynes, vol. 29., vol. 29, p. 78).
Numa economia monetária1 1 Keynes desenvolveu seu conceito de economia monetária de produção entre a publicação do Tratado sobre a Moeda e a Teoria Geral. Recebeu muitos nomes, tais como economia empresarial, economia monetária de produção e, na Teoria Geral, economia monetária. V. Collected Writings on John Maynard Keynes, vols. 13, 14 e 29. , em contraste, “os empresários empregam os fatores por dinheiro, mas sem o mecanismo mencionado acima”, (Ibid., p. 78). Essas economias estão inclinadas a sofrer flutuações na demanda efetiva (Ibid., p. 80), porque os agentes podem decidir reter moeda ao invés de adquirir bens. Isso ocorre porque:
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a) o futuro é incerto, e os agentes assumem contratos monetários para tentar controlá-lo de alguma forma,
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b) um sistema de obrigações contratuais requer a existência de uma medida padrão para que as obrigações sejam aceitas (moeda de conta), e, portanto,
( ... ) o fato de que contratos são fixados, e salários são usualmente estáveis em termos de dinheiro, sem dúvida, contribui para atrair para o dinheiro um prêmio de liquidez tão alto. A conveniência de reter ativos no mesmo padrão que aquele no qual obrigações futuras serão cobradas e nos termos em que no futuro o custo de vida é esperado ser relativamente estável, é óbvio”. (Keynes, 1936KEYNES, J.M. (1936) The General Theory of Employment, Interest and Money. Nova York, Harcourt Brace and World, 1964., págs. 236-7);
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c) dessa forma, “a posse de moeda dilui nossa inquietude” (Keynes, 1973KEYNES, J.M. (1973) The General Theory and After, Part 1: Preparation. Londres: Macmillan, The Collected Writings of John Maynard Keynes, vol. 13., vol. 14, p. 116), a um custo de retenção praticamente nulo;
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d) e, finalmente,
“É da essência de uma economia monetária que a coisa (ou as coisas) em termos das quais os fatores de produção são recompensados podem ser gastos em algo que não é produção corrente e para a produção do qual a produção corrente não pode ser desviada (exceto em escala limitada), e o valor de troca não é fixo em termos de um artigo de produção corrente para o qual pode ser desviado sem limite.” (Keynes, 1979KEYNES, J.M. (1979) The General Theory and After: a Supplement, Londres: Macmillan, The Collected Writings of John Maynard Keynes, vol. 29., vol. 29, p. 85).
Como consequência, a demanda agregada pode ser inferior à oferta agregada potencial porque parte desta demanda pode ser “desviada” para um bem que é irreprodutível: a moeda. Em outras palavras, a demanda agregada pode ser “deficiente”. Uma economia monetária de produção é caracterizada pelo fato de que a produção é realizada com o objetivo de gerar lucro monetário:
“A explicação para isso é evidente. O emprego pelo empresário de fatores de produção para aumentar seu produto envolve o desembolso, não de produto, mas de dinheiro.” (Keynes, 1979KEYNES, J.M. (1979) The General Theory and After: a Supplement, Londres: Macmillan, The Collected Writings of John Maynard Keynes, vol. 29., vol. 29, p. 82).
Dois princípios pós-keynesianos são aqui estabelecidos: (i) o papel especial que empresários desempenham numa economia monetária; e (ii) a moeda não é neutra.
Moeda e incerteza
Por incerteza entende-se que o futuro é, em termos rigorosos, impossível de ser conhecido. Por isso, para formular planos, os agentes racionais têm de imaginar cenários, escolher um deles e agir conforme sua escolha. Uma vez, porém, que um projeto começa a ser implementado, sua reversão não pode ser obtida sem custos. Isso torna as decisões de produzir e investir irremediavelmente especulativas.
Quando o processo de decisões envolve o comprometimento de recursos por longo período de tempo, as expectativas sobre o futuro desconhecido são talvez o único guia a nortear as decisões. Em consequência, não faz sentido postular que a firma tenha predeterminado uma única trajetória de crescimento, pois sua evolução ao longo do tempo refletirá decisões e avaliações formadas sob condições de incerteza. Se planos se implementam com base nessas expectativas, sua adequação só se confirmará no futuro.
No conceito de economia monetária de produção, a ênfase é posta em como a firma percebe seu ambiente e como reage a mudanças. A racionalidade do comportamento da fama nesse caso está subordinada à visão pessoal do empresário, que é o responsável por decisões que definem a estratégia de desenvolvimento da firma. Numa palavra, numa economia monetária de produção, a questão relevante a discutir é como a firma planeja sua estratégia de crescimento no tempo histórico, que flui de um passado imutável para um futuro conjectural.
Uma vez que a incerteza é considerada, outra característica a distinguir o conceito de economia monetária de produção é o papel desempenhado pela moeda. Moeda na teoria de Keynes não é demandada apenas “por simples conveniência” (Keynes, 1979KEYNES, J.M. (1979) The General Theory and After: a Supplement, Londres: Macmillan, The Collected Writings of John Maynard Keynes, vol. 29., vol. 29, p. 67), mas sendo o mais líquido dos ativos, pode ser demandada por si mesma.2 2 Keynes define incerteza na conhecida passagem do artigo de 1937 (reimpresso em Keynes, 1973, vol. 14, págs. 113-4) onde afirma que incerteza se refere a assuntos que simplesmente não se conhecem. Quando expectativas do futuro são pessimistas, o desejo de liquidez é aumentado, implicando que os fatores de produção podem ficar ociosos, pois a demanda por ativos se desloca para a moeda.
Numa economia monetária, o crescimento da firma envolve dois tipos de decisão. Um diz respeito a quanto investir em ativos fixos, e outro, a como financiar o investimento. O primeiro conjunto de decisões depende de como os empresários veem o futuro de seu negócio; o segundo depende também de como a firma interage com outros agentes econômicos.
A abordagem pós-keynesiana do comportamento da firma numa economia monetária de produção é baseada na hipótese de que a firma irá maximizar sua taxa de crescimento (Penrose, 1980PENROSE, E. (1980) The Theory of Growth of the Firm. White Plains: M.E.Sharpe.) com base nas expectativas dos empresários sobre o futuro. Como o futuro é incerto, a moeda se torna o ativo mais atraente quando expectativas são pessimistas. Um aumento no grau de incerteza significa que mais liquidez é desejada e, portanto, gastos em ativos menos líquidos como bens de capital podem ser adiados (cf. Keynes, 1936KEYNES, J.M. (1936) The General Theory of Employment, Interest and Money. Nova York, Harcourt Brace and World, 1964., págs. 160-1).
Dado este pano de fundo, uma teoria adequada ao estudo do comportamento da firma é necessária, tendo em vista que é o resultado agregado de decisões individuais tomadas em condições de incerteza, o que explica os movimentos agregados da economia.
2. A FIRMA NUMA ECONOMIA COM ESTABILIDADE DE PREÇOS
Em nossa abordagem, “o conceito da firma é aquele de um centro de elaboração de estratégia, tomada ou de revisão de decisões e de gerenciamento ou de executor de política” (Shackle, 1970SACKLE, G.L.S. (1970) Expectation, Enterprise and Profit. Londres: George Allen and Unwin., p. 20.) O principal objetivo da firma é produzir para aumentar os lucros monetários, e, com isso, seu potencial de crescimento.
Na visão pós-keynesiana, a firma é identificada como uma instituição que controla ativos produtivos e que, para colocá-los em ação ou para expandir sua capacidade produtiva, pode absorver recursos da comunidade, através do mercado financeiro. Dessa forma, a firma apresenta uma dupla característica - não apenas transforma recursos reais em produto, mas também recursos financeiros ou excedente. Essa dupla característica da firma é de grande importância para o estudo de seu comportamento, porque é a eficiente administração de ambos os aspectos que assegura sua sobrevivência a longo prazo. O objetivo dessa instituição é sobreviver, o que, num mundo competitivo, significa crescer.
Definir a firma dessa forma implica que sua interação com o ambiente externo, em seus vários aspectos, deve ser o principal foco de atenção para explicar sua trajetória de crescimento.
A definição pós-keynesiana da firma permite considerá-la atuando em vários mercados, isto é, como diversificada e operando com várias plantas.3 3 Pode-se mencionar que estratégia se refere não apenas às atividades produtivas, mas também aos métodos administrativos. Chendler (1962), por exemplo, descreveu que, numa firma diversificada, algumas decisões são descentralizadas, enquanto outras são tomadas pela administração central. Afirma que “a estrutura segue a estratégia”, significando que a trajetória de crescimento da firma cria uma estrutura organizacional única, estabelecida pelos empresários para tratar com os problemas administrativos colocados pela expansão. No longo prazo, a estrutura administrativa da firma é o resultado de diferentes estratégias adotadas. Penrose (1980) também compartilha essa opinião. Por simplificação, adota-se neste trabalho a hipótese de que as decisões são tomadas por uma única unidade administrativa, dado que a hip6tese não interfere na discussão. Também permite conceber a firma como uma instituição que aloca seus fundos entre ativos produtivos e financeiros e absorve fundos de outros agentes. Como estamos considerando firmas que operam em economias capitalistas modernas, dotadas de instituições financeiras sofisticadas, é razoável supor que diversificam suas aplicações. No entanto, assumimos que atividades produtivas e investimento em atividades que sustentam a participação num mercado de concorrência imperfeita (tais como investimento em propaganda, diferenciação de produto) constituem a principal preocupação da firma.
Num mundo onde o tempo é explicitamente considerado, tomam-se as decisões em condições incertas e, por isso, é preciso levar em conta a possibilidade de ocorrerem erros. Esse é o significado do conceito de tempo histórico, irreversível. Ações passadas não podem ser alteradas e condicionam decisões presentes e ações futuras.
Uma vez tomada uma decisão, sua implementação deve seguir uma sequência dada de eventos, porque a atividade produtiva é uma ordenação de processos conexos que devem se desenrolar ao longo do tempo, implicando um comprometimento gradual de recursos, cuja remuneração, no entanto, só emergirá quando a sequência estiver completa. Desse modo, a liberdade de ação do tomador de decisões é bastante restrita, uma vez que um determinado plano comece a ser implementado. Por outro lado, mesmo quando o plano se completa, a liberdade do agente de iniciar outra ação também é restringida pelas estruturas que ele herda do plano anterior. Como resultado, quando opiniões sobre o presente e o futuro mudam, elas podem levar a uma mudança de comportamento cuja velocidade e sucesso estão condicionados a compromissos passados. Esses compromissos podem ser de duas ordens: uma dada estrutura material ou compromissos financeiros.
Contratos monetários
Uma característica distintiva da produção numa economia monetária é a existência de uma rede de contratos monetários que sustentam a atividade econômica (Davidson, 1978DAVIDSON, P. (1978) Money and the Real World, 2a. edição. Londres: Macmillan.). Isso ocorre porque a firma, como uma unidade produtiva, tem de adquirir matérias-primas e insumos para iniciar o processo produtivo. Da mesma forma, emprega trabalhadores e adianta pagamentos. Mas, como o processo de produção leva tempo, os empresários comprometem recursos monetários antes de auferir receitas. A existência de contratos monetários lhes permite conhecer antecipadamente a quantidade de recursos a serem pagos em datas futuras, oferecendo assim certa estabilidade ao processo produtivo. Quanto mais longa a duração dos contratos, maior será a estabilidade do processo produtivo em termos de custos.
Contratos monetários não conseguem, no entanto, eliminar a incerteza que envolvem as decisões da firma, na medida em que é o comportamento da demanda o grande desconhecido.4 4 Com exceção de produção por encomenda, que se aplica a um conjunto pequeno de bens finais, mais especificamente bens de capital. Uma vez que se conheçam os custos, os empresários devem decidir quanto produzir e quanto cobrar por sua produção, de acordo com suas expectativas sobre o comportamento da demanda.
Expectativas e decisões
Os empresários têm de confiar em suas expectativas sobre o futuro comportamento da demanda, porque a informação do mercado não pode ser completa5 5 Para uma discussão acerca de decisão sob incerteza, ver Carvalho (1988). , Kregel assinala que “produtores não podem saber o que consumidores desejarão comprar no futuro porque os próprios consumidores não sabem” (Kregel, 1980KREGEL, J.A. (1980) “Markets and institutions as feature of a capitalist production system” Journal of Post Keynesian Economics 3(1), págs. 32-48., p. 37). Mercados à vista fornecerão informação aos produtores apenas quando os gastos ocorrerem e os empresários, antes de colocar seus produtos à venda, podem ter apenas uma opinião sobre quanto irão vender.
A ênfase no papel das expectativas é considerada por Penrose, quando afirma que:
“Embora a oportunidade ‘objetiva’ da firma seja limitada pelo que ela é capaz de alcançar, a oportunidade produtiva ‘subjetiva’ é uma questão do que a firma acredita que pode alcançar. ‘Expectativas’ e não fatos ‘objetivos’ são os determinantes imediatos do comportamento da firma ... “ (Penrose, 1980PENROSE, E. (1980) The Theory of Growth of the Firm. White Plains: M.E.Sharpe., p.41). Em outra passagem,
“O ambiente tem sido tratado [em seu estudo] não como um fato ‘objetivo’, mas como uma ‘imagem’ na mente do empresário: a justificativa para esse procedimento é a hipótese de que não é o ambiente ‘como tal’, mas sim o ambiente que o empresário vê, que é o relevante para suas ações. (Ibid., 215).”
Nesse sentido, a capacidade da firma de tirar vantagem das oportunidades de mercado que consegue perceber no ambiente externo é o elemento responsável por seu desenvolvimento. Na visão de Penrose, a experiência e o conhecimento pessoal do corpo de diretores de uma firma são vistos como parte dos recursos internos com os quais a firma conta.
Expectativas de curto e longo prazo
Até aqui mencionamos expectativas sem distinguir entre expectativas de curto e longo prazo. De acordo com Keynes (1936KEYNES, J.M. (1936) The General Theory of Employment, Interest and Money. Nova York, Harcourt Brace and World, 1964., capítulo 5), expectativas de curto prazo estão relacionadas ao preço a ser cobrado quando a produção é colocada no mercado. Antes de o processo produtivo se iniciar, os empresários têm uma expectativa de quanto os consumidores gastarão na compra de seus produtos. O mesmo vale para o setor de bens de produção. Expectativas de longo prazo referem-se aos retornos esperados quando a capacidade adicional está sendo construída.6 6 A definição de Keynes de eficiência marginal de capital também enfatiza o papel das expectativas. V. Keynes, 1936, capítulo II.
Keynes centrou-se nas expectativas de preço porque assumiu mercados operando em concorrência perfeita. Uma formulação mais geral deveria considerar também expectativas em relação à curva de demanda para o produto.
Keynes não estabeleceu uma relação estável entre fatos e o estado das expectativas. Estas - especialmente as de longo prazo - são variáveis autônomas, sendo responsáveis por mudanças na trajetória da economia. Expectativas de curto prazo desempenham um papel mais passivo na teoria de Keynes, na medida em que orientam ações baseadas em hábitos e comportamento convencional.
Uma variável importante a considerar quando se discutem expectativas é o estado de confiança. Nas palavras de Keynes, “seria bobagem, quando formando nossas expectativas, atribuir um peso grande a assuntos muito incertos” (Keynes, 1936KEYNES, J.M. (1936) The General Theory of Employment, Interest and Money. Nova York, Harcourt Brace and World, 1964., p. 148), e, portanto, é o grau de confiança nas expectativas que também determina o esforço que terá de ser feito para implementar decisões de produzir e investir.
Dada a importância dessa variável, podemos supor que a realização das expectativas de curto prazo pode aumentar o grau de confiança nas expectativas de longo prazo, especialmente lembrando que a implementação de planos de longo prazo é feita, passo a passo, através de atividades de curto prazo.
Há várias formas porque se pode estudar essa relação. Para nosso propósito - a análise do crescimento da firma - interessa em particular discutir como se obtêm fundos no curto prazo para financiar planos de investimento. A sustentação financeira do investimento é, talvez, o principal canal de ligação entre o curto e o longo prazo.
Fundos para investimento podem ser obtidos internamente à firma ou no mercado financeiro. Fundos internos são os lucros retidos que dependem, dados os custos, das receitas recebidas pelas firmas. A firma deve, assim, tomar decisões quanto ao volume de produção e, se a concorrência não é perfeita, quanto ao preço a cobrar. Discutiremos primeiramente como se tomam decisões de produção e precificação e, a seguir, como se formulam decisões de investir.
3. DECISÕES DE PRODUÇÃO
As decisões sobre produção envolvem a consideração de curtos períodos de tempo e, portanto, os empresários as tomam com base em suas expectativas de curto prazo sobre o comportamento do mercado. Na Teoria Geral, de Keynes, dado um ambiente competitivo, os empresários decidem sobre uma certa quantidade a ser produzida e, se expectativas não são cumpridas, os preços deverão se alterar para ajustar a oferta à demanda (Cf. Amadeo, 1986AMADEO, E. (1986) “Teoria e método nos primórdios da macroeconomia: a revolução keynesiana e a análise do multiplicador”, Texto para Discussão 143, PUC-RJ - Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.). De acordo com Keynes, “empresários buscarão fixar o volume de emprego num nível que esperam maximizar o excesso de receita sobre o custo dos fatores”. (Keynes, 1936KEYNES, J.M. (1936) The General Theory of Employment, Interest and Money. Nova York, Harcourt Brace and World, 1964., págs. 24-5.) O processo de ajuste entre a oferta planejada e a demanda realizada envolve mudanças no nível de working capital, que Keynes define como:
“( ... ) o agregado de bens (e o custo do working capital como o custo dos bens agregados) em curso de produção, manufatura, transporte e venda, incluindo estoques mínimos, quer seja de matéria-prima ou de bens acabados, como os requeridos para evitar riscos de interrupção do processo ou para suprir irregularidades sazonais ... “ (Keynes, 1971KEYNES, J.M. (1971) A Treatise on Money vol. 2: The Applied Theory of Money. Londres: Macmillan, The Collected Writings of John Maynard Keynes. vol. 6., vol. 6, págs. 104-5, sua ênfase).
Está claro que um aumento na produção representará um aumento no investimento em working capital e vice-versa. Se a demanda não se comporta como esperado, o investimento em working capital compensará essas mudanças, num primeiro momento, mas as ampliará em seguida.
Além de definir working capital, Keynes define liquid capital, que é o excesso de estoque sobre o working capital. Na realidade, é o liquid capital que flutua quando as expectativas de demanda são desapontadas. Isso significa que, antes que os preços mudem para ajustar a oferta à demanda, o nível de working capital (incluindo o liquid capital) varia e, somente no período seguinte de produção, as decisões sobre a quantidade a ser ofertada serão revistas.
Estoques excessivos pressionam preços para baixo, dado o carrying cost de manter os estoques acima do nível desejado. De acordo com Keynes, o excesso de estoque implica a avaliação de que os preços futuros serão maiores que os preços à vista para cobrir os custos de retenção. Se os preços futuros são dados (isto é, são atrelados ao preço de oferta do bem), os preços à vista terão de cair para induzir o decréscimo da produção. Da mesma forma, se os estoques são menores que o desejado, os preços à vista deverão crescer para estimular um aumento na produção. Numa situação de normalidade, preços à vista são maiores que preços futuros (isto é chamado backwardation), pois o primeiro “inclui a remuneração para o risco de o preço flutuar durante o período de produção, enquanto o preço futuro exclui essa remuneração” (Ibid., p. 128).
O nível de estoque, portanto, irá mudar quando as expectativas sobre o futuro comportamento dos preços em relação ao preço corrente mudarem. Quando a economia sofre um choque inflacionário, os estoques serão acumulados, dado que as expectativas serão as de que preços futuros serão maiores que os correntes.
Em resumo, para Keynes, as decisões de produção são tomadas baseadas na relação entre preço à vista e preço futuro. Essa relação deve flutuar para adequar a oferta à demanda. Quando ocorrem erros de previsão, mudanças no estoque afetam preços e mudanças nos preços afetam lucros e, portanto, expectativas. Está implícito nesse raciocínio que mercados operam em regime de concorrência perfeita. Quando se consideram mercados oligopólicos, o mecanismo se altera. Não haverá a flutuação efetiva dos preços correntes, mas apenas a nocional, isto é, a avaliação dos empresários de quanto o preço corrente deveria flutuar para restabelecer a relação adequada com o preço normal dobem.
4. DECISÕES DE PREÇO
Na teoria pós-keynesiana moderna, decisões de preço estão ligadas a decisões de investimento. Essa ligação é estabelecida porque os recursos para financiar a expansão da firma devem ser obtidos, pelo menos em parte, dos lucros - um dos componentes do preço-, além de também assegurar os meios de pagar dívidas contraídas pela parte do investimento financiada com recursos externos.
Segundo Davidson (1978DAVIDSON, P. (1978) Money and the Real World, 2a. edição. Londres: Macmillan.), quando os empresários produzem com antecipação ao mercado, ou seja, o nível da demanda não é conhecido, pode ser impossível para a firma determinar, de antemão, qual a combinação de volume de produção e preço unitário que maximizará sua receita. Em tais casos, os empresários podem escolher um “retomo estratégico sobre um volume padrão de produção” como critério para fixação de preço; ou seja, a fixação de um mark-up. Já quando a firma produz sob encomenda, um comportamento que maximizar o lucro pode ser mais racional, dado que se podem estimar as receitas com maior grau de precisão. Não se espera, contudo, que ambas as formas de comportamento ocorram dessa maneira simples, mas provavelmente combinadas.
Aceitando a hipótese de que o comportamento mais usual é o da escolha de um mark-up para obter “retorno estratégico sobre um volume padrão de produção”, a questão que se coloca então é o que determina esse retorno estratégico. Na literatura pós-keynesiana sobre modelos de determinação de preço, tem se dado crescente ênfase à necessidade de fundos para expansão como a principal motivação da firma para fixar seu preço. (V. por exemplo, Harcourt e Kenyon, 1976HARCOURT, G. e KENYON, P (1976) “Pricing and investment decisions”, Kyklos 29(3). Também como capítulo 8 in P. Kerr, ed. (1982) The Social Science Imperialists and Other Essays: Selected Essays of G.C.Harcourt. Londres, Boston: Routledge and K. Paul.). Isso significa que a firma irá, através da sua decisão de preço, buscar aumentar seu fluxo de caixa para sustentar seus planos de investimento. De acordo com Eichner, por exemplo,
“ ... uma mudança no nível de preço da indústria é considerada uma função, dado o custo constante, de uma mudança na taxa de crescimento do investimento em relação à taxa de geração de fundos internos”. (Eichner, 1976EICHNER, A. (1976) The Megacorp and Oligopoly. Nova York: M.E.Sharpe., pág. 2.)
Nesse sentido, uma decisão de preço incorpora uma decisão sobre a taxa à qual a firma irá crescer no longo prazo. Como hipótese será considerado que a firma tentará crescer à maior taxa possível ou, pelo menos, tentará manter sua participação no mercado.
Pode-se definir então a ligação entre decisões de preço e de financiamento do investimento em capital fixo. Numa perspectiva analítica, o preço estabelecido por uma firma é identificado como um preço estratégico em oposição à ideia de preço competitivo (Shapiro, 1981SHAPIRO, N. (1981) “Pricing and the growth of the firm”. Journal of Post Keynesian Economic 4(1), págs. 85-100.). A ideia de preço estratégico incorpora o aspecto financeiro da decisão de preço e enfatiza os limites de estabelecer preços muito altos em mercados competitivos. Os empresários gostariam de poder cobrar preços altos para financiar seu processo de acumulação; contudo, quanto mais alto o preço corrente, menores serão as barreiras à entrada em seus mercados. Num cenário dinâmico, esse é o dilema que os empresários devem enfrentar.7 7 Eichner cita três fontes de problemas que conterão o anseio de fixar preços muito altos da grande empresa (megacorp): o efeito substituição, o fator entrada e a intervenção governamental (Eichner, 1976, capítulo 3).
De acordo com Sylos-Labini (1969SYLOS-LABINI, P. (1969) Oligopoly and Technical Progress. Cambridge, Massachusetts: Harvard University Press.), quando os empresários fixam preços, são mais influenciados pelas reações de seus rivais do que pelo comportamento dos consumidores. Firmas líderes em seus mercados não devem aumentar muito seus preços, mesmo se a curva da demanda permitir (demanda inelástica), porque isso induziria novas firmas a entrar no mercado, ou firmas já existentes a expandir capacidade. O dilema aqui é recolocado em termos do relativamente estreito leque de opções que as firmas líderes têm quando fixam seus preços. O dilema pode também ser colocado cm termos do custo implícito que a firma incorre quando escolhe aumentar a taxa de acumulação interna através da decisão de preço.8 8 As firmas que não são líderes são supostas como produzindo com custos mais altos que a firma líder, e urna vez que o preço é lixado, suas margens de lucro dependerão do comportamento da líder. Sylos-Labini (1969) distingue dois tipos de comportamento de preço que a firma líder pode assumir: a) para evitar a entrada de novas firmas no mercado pode dar um “preço de exclusão”, que nega a novos concorrentes uma taxa de lucro mínima; ou b) pode fixar um preço para eliminar as firmas existentes no mercado. Nesse caso, o “preço de eliminação” seria fixado abaixo do custo médio da firma.
A decisão de preço irá variar também de acordo com o grau de maturidade do mercado. Em mercados maduros, um pequeno número de firmas domina, com uma capacidade de produção que excede a capacidade do mercado, como resultado da concorrência que eliminou firmas marginais num processo de melhoria da produtividade e aumento da capacidade produtiva. Uma vez que essa fase já foi ultrapassada, o aspecto competitivo do preço é atenuado, dado que a lógica da competição interfirma assume outras formas (por exemplo, a diferenciação do produto) e as firmas sobreviventes podem tirar vantagem de sua posição. Como coloca Ong,
“[a firma] agora desfruta de uma taxa mais alta e mais segura de retorno, colhendo os ganhos de produtividade através de mark-ups mais altos. Sua maior oferta de fundos garante que os recursos internos se expandam, o que pode resultar numa desestabilização da indústria madura, a invasão de outros mercados, ou o desenvolvimento de novas indústrias”. (Ong, 1981ONG, N.P. (1981) “Target pricing, competition and growth”, Journal of Post Keynesian Economics 4(l), págs. 101-116., p.113).
Uma política de preço estratégico é um comportamento típico para firmas operando em tais mercados e, de acordo com Ong, isso significa que há entre as firmas um movimento solidário quando fixam seus preços. A base para esse comportamento é o reconhecimento comum da necessidade de aumentar fundos internos para financiar o desenvolvimento de novos produtos e a capacidade do mercado de absorver um aumento no preço sem prejudicar as vendas.
Apesar da situação financeira mais vantajosa que mercados maduros oferecem, o ritmo mais lento de crescimento desses mercados limita o crescimento da firma.9 9 A firma manterá sua participação cm mercados maduros se crescer à mesma taxa que o mercado. Se a firma cresce à taxa maior que a expansão do mercado, então sua participação aumentará, aumentando o grau de concentração. Steindl (1976) assinala que, nesse caso, a capacidade potencial da firma para crescer pode aumentar porque domina novas técnicas de produção, que permitem reduzir seus custos de produção cm relação a seus concorrentes. Se essa tendência for muito marcante, o grau de “concentração absoluto” irá aumentar, dado que as firmas menos eficientes serão eliminadas. Mas, se tais inovações não ocorrerem e se a firma não adotar uma postura agressiva cm relação ao mercado, então deverá investir cm outros mercados para continuar a crescer. Diversificação é a forma mais comum de crescimento e, nesse sentido, implica dizer que as firmas irão alocar seus recursos internos de mercados mais maduros para mercados novos, onde a competição via preço desempenha papel mais importante.10 10 Isso não quer dizer que a firma, uma vez estabelecida com mercados maduros, deixará de investir. Para manter sua posição no mercado, é necessário que continue a investir cm seu desenvolvimento. Um incentivo à entrada de novos competidores é a existência de oportunidades que não são plenamente exploradas.
Em mercados novos, as firmas tentarão fixar o preço de tal forma que excluam, no longo prazo, seus concorrentes (o preço de exclusão, na terminologia de Sylos-Labini). Assim, como observa Levine, o objetivo da firma não é o de maximizar o lucro sobre a produção corrente, mas “construir uma posição de mercado que pode realizar lucros no longo prazo” (Levine, 1981LEVINE, D. (1981) Economic Theory: The System of Economic Relations as a Whole. Londres: Routledge and Kegan Paul., p. 186). Numa fase inicial do investimento, a nova mercadoria pode representar uma perda líquida de recursos para a firma, dado que os custos de produção podem exceder as receitas. Mas o objetivo é alterar essa situação o quanto antes e transformar o preço da nova mercadoria num preço que satisfaça ambas as condições de aumentar o potencial de financiamento da firma e de permitir o desenvolvimento do mercado (market development), na terminologia de Levine.
Além da acumulação interna de fundos através de decisões de preço para financiar o investimento, a firma pode obter recursos externamente para complementar seus recursos internos. A extensão na qual a firma irá combinar as fontes alternativas de recursos dependerá de sua avaliação sobre os custos incorridos com cada fonte. Os fundos internos obtidos através de decisões de preço apresentam o risco da firma de perder sua posição de mercado. Mas, além de seus próprios recursos, a firma pode obter fundos através de empréstimos e lançamento de ações.
Tomar emprestado significa que a firma assume contratos de dívida, correndo o risco de se tomar insolvente. O custo explícito desta escolha é a taxa de juros. O lançamento de ações, por outro lado, implica o comprometimento de pagar dividendos e implicitamente traz o risco de o grupo de direção da firma perder seu controle. Em resumo, a firma, vista como um todo, irá atuar em vários mercados com diferentes graus de maturidade, e seu sucesso dependerá de quão eficientemente tira vantagem das condições de cada mercado para fortalecer sua posição financeira e para preservar ou aumentar seu domínio no mercado.11 11 Dependendo do grau de maturidade de cada mercado, mudanças no custo de produção terão impactos diferentes sobre as receitas das firmas. Em mercados novos emergentes, onde a posição da firma ainda não está bem estabelecida, um aumento nos custos pode não ser repassado aos preços, enquanto em mercados maduros provavelmente será. No caso de um decréscimo nos custos, firmas buscando desenvolver seus mercados provavelmente usarão a oportunidade para reduzir os preços e ampliar seus mercados. Em mercados maduros, o resultado poderia ser a manutenção do preço e, consequentemente, um aumento nos lucros da firma. Escolhas e decisões são inevitáveis porque, para sobreviver no longo prazo, a firma precisa expandir sua capacidade.
5. DECISÕES DE INVESTIMENTO
Uma firma acumula ativos para aumentar sua capacidade de criar e controlar riqueza. Para maximizar sua capacidade de acumular, adquirirá um conjunto de ativos, alguns dos quais imateriais, como a boa vontade dos consumidores, que servem de instrumentos para as atividades de produção e distribuição da firma.
A teoria keynesiana enfatiza o estudo das decisões de acumular ativos fixos de capital, ou seja, a planta industrial e os equipamentos. A principal característica desses ativos é a longa duração, que permite que sobrevivam por muitos períodos de produção. Por esta razão, a decisão de adquiri-los não pode se basear apenas em expectativas de ganhos no futuro imediato. Ao contrário, a decisão de investir em ativos fixos é baseada em expectativas de longo prazo. Esse ponto de partida tem duas implicações principais na teoria do investimento de Keynes: (i) é a interpretação subjetiva que predomina sobre os dados correntes quando decisões de investimento são tomadas; (ii) expectativas de longo prazo são fundamentalmente independentes, em sua formação, de expectativas de curto prazo.
O primeiro ponto está relacionado ao papel da escolha do empresário numa economia monetária. Dados sobre as condições presentes (ou passadas) podem não ser suficientes para determinar as condições futuras se inovações de qualquer tipo são possíveis. Nesse caso, o empresário que toma as decisões tem de imaginar possibilidades futuras para escolher um plano. Imaginação, por definição, é um atributo subjetivo.
O segundo ponto está relacionado à “natureza das expectativas de longo prazo que ... não podem ser conferidas a intervalos curtos à luz de resultados alcançados” (Keynes, 1936KEYNES, J.M. (1936) The General Theory of Employment, Interest and Money. Nova York, Harcourt Brace and World, 1964., p. 51). Nesse sentido, Keynes atribuiu mais importância ao “estado de confiança em expectativas de longo prazo” como variável relevante para sustentar decisões de investimento, mais que a condições objetivas de longo prazo, que são desconhecidas do tomador de decisões à época em que as decisões são tomadas. Essa ênfase é fundamental na teoria do investimento de Keynes e leva a outro conceito relevante: a convenção, que sustenta algumas decisões de longo prazo.
A escolha sobre como os recursos disponíveis para investimento deveriam ser alocados (se no aumento da capacidade produtiva ou se em diferenciação de produto, por exemplo) depende da avaliação da firma sobre seus ganhos futuros. Num mundo de incerteza, a escolha de investir em ativos menos líquidos irá demonstrar um elevado grau de confiança no futuro e vice-versa. Como moeda e ativos financeiros são vistos, numa economia monetária, como ativos que competem com ativos fixos, o ritmo dos investimentos em ativos de capital dependerá do estado das expectativas. Assim, expectativas sobre a lucratividade da aplicação e a preferência pela liquidez são os guias para a implementação de planos de investimento. A firma, dados os seus recursos, escolherá sua trajetória de crescimento de acordo com sua percepção do ambiente externo. Pode tanto investir em seu próprio mercado para manter a posição contra pressões competitivas, como investir em novos mercados através da integração vertical ou diversificação da linha de produção. A pressão competitiva irá em grande parte determinar a escolha do plano de investimento.
As expectativas de retorno e o grau de confiança são influências autônomas em relação a eventos correntes. Contudo, ocorrências de curto prazo influenciarão a implementação de decisões de longo prazo. Joan Robinson observou que, como as condições presentes não são suficientes para determinar decisões de investimento, estratégias específicas serão adotadas pelos agentes econômicos no curto prazo, que não estarão necessariamente relacionadas aos valores esperados no longo período:
“Mudanças de longo prazo ocorrem em situações de curto prazo. Mudanças no produto, emprego e preços, ocorrendo com um dado estoque de capital, são mudanças de curto prazo; enquanto mudanças no estoque de capital, na força de trabalho e nas técnicas de produção são mudanças de longo prazo, ( ... ) Uma dada situação de curto prazo contém em si mesma uma tendência de mudança a longo prazo” (Robinson, 1969ROBINSON, J. (1969) The Accumulation of Capital. Londres: Macmillan ; 3a. edição., p. 180).
Além das expectativas, a decisão de investir é afetada pela disponibilidade de recursos.
6. RECURSOS INTERNOS E EXTERNOS
De acordo com Penrose (1980PENROSE, E. (1980) The Theory of Growth of the Firm. White Plains: M.E.Sharpe.), podem-se destacar duas fontes de recursos internos que influenciam as decisões de investimento em ampliação de capacidade produtiva: poupança interna e facilidades operacionais adquiridas através do funcionamento normal da firma. Kalecki (1971KALECKI, M. (1971) Selected essays in the Dynamics of the Capitalist Economy. Cambridge: Cambridge University Press., capítulo 10), entre outros autores, considera a poupança bruta das firmas como “relacionada estreitamente à acumulação interna de capital”. Mas, além de explorar os recursos internos, a firma pode diversificar sua produção entrando em novos mercados, ou seja, expandir suas atividades através da diversificação. Penrose sugere que recursos ociosos na firma oferecem um forte incentivo à expansão e diversificação. Em sua visão, nem sempre é possível à firma utilizar todos os recursos a plena capacidade. Por um lado, os recursos de que a firma necessita para produzir constituem um pacote de possíveis serviços, os quais, em geral, “são obtidos em quantidades discretas” (Penrose, 1980PENROSE, E. (1980) The Theory of Growth of the Firm. White Plains: M.E.Sharpe., p. 67). Dado que a firma tentará empregar seus recursos da forma mais lucrativa possível,
“Disto se segue, então, que, na medida em que a expansão pode prover um meio de usar os serviços de seus recursos de forma mais lucrativa do que vinham sendo usados, a firma tem um incentivo para expandir, ou, alternativamente, à medida que nem todos os recursos estão sendo utilizados completamente em operações correntes, há um incentivo para a firma encontrar uma forma de utilizá-los mais intensamente” (lbid., p. 67).
A conclusão é que o uso pleno dos recursos pode exigir alguma diversificação das atividades, e Penrose reconhece que ...
“ ... produtos derivados e outros tipos de produção conjunta têm na realidade fornecido uma base importante para a expansão de algumas firmas, uma vez que a administração se libere do esforço de expandir a linha principal da firma” (lbid., p. 71).
Recursos externos influenciam decisões de investimento através de mudanças no grau de endividamento da firma. Steindl (1976STEINDL, J. (1976) Maturity and Stagnation in American Capitalism. Nova York: Monthly Review Press, 2a. edição.), baseado no princípio do risco crescente de Kalecki, assume que a poupança externa disponível para a firma será usada para aumentar a capacidade produtivas, caso esses recursos possam ser combinados com os fundos internos na proporção aceitável pela firma. Se essa proporção não é considerada “segura”, mesmo os fundos internos não serão empregados em investimento de ativos fixos, se demandarem a complementação de recursos externos.
Em suma, a firma, sob pressão competitiva externa, terá sempre um incentivo para crescer. Numa economia trabalhando com contratos monetários, a decisão de investimento envolverá dois tipos de avaliação:
-
de um lado, empresários, considerando seus recursos e sua percepção do ambiente externo, formularão seus planos de investimento baseados em expectativas de longo prazo. Embora a formação de expectativas de longo prazo seja independente das expectativas de curto prazo, o grau de confiança nas expectativas de longo prazo é influenciado pela validação das expectativas de curto prazo, as quais podem ou não confirmar a adequabilidade da decisão adotada. É a divergência entre os valores de curto e longo prazo que levará a economia a se mover de uma posição de curto prazo para outra;
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por outro lado, como a implementação de planos de investimento implica o comprometimento de recursos financeiros hoje contra um futuro incerto, a escolha de como financiar nova capacidade representa outra importante dimensão do processo de decisão de investimento.12 12 V., por exemplo, Robinson (1959) discutindo o impacto de mudanças na taxa de juros sobre planos de investimentos. Como observa Steindl, a firma escolherá um grau desejável de endividamento, o qual, de acordo com Penrose, será também o resultado da sua visão subjetiva do futuro. Se as expectativas sobre o comportamento da demanda por novos produtos introduzidos no mercado são otimistas, então um maior grau de endividamento será aceito.
7. O RITMO DOS INVESTIMENTOS
Não é apenas o grau geral de endividamento que conta. A firma deve também assegurar que o perfil dos fluxos de entrada e saída de caixa seja compatível, de forma a manter um nível desejável de liquidez. Nesse sentido, o perfil do investimento é importante como o perfil das obrigações contraídas.
É nesse contexto que a decisão de investimento deve ser considerada como uma escolha de portfólio. Como está se assumindo que decisões de investimento são tomadas baseadas nas expectativas de longo prazo dos empresários sobre o futuro incerto, isso significa que, no curto prazo, os empresários podem não estar interessados em comprometer seus recursos financeiros em atividades produtivas. Isso ocorre porque, no curto prazo, as interrupções, atrasos e adiamentos na implementação dos projetos de investimento podem ocorrer devido à recorrência cíclica de um aumento da incerteza. A existência de um sofisticado mercado financeiro em operação nessas economias oferece alternativas de investimentos financeiros que podem deslocar investimento de ativos fixos para ativos mais líquidos.
Por outro lado, o adiamento permitido pela aplicação financeira pode dar à firma o intervalo de tempo necessário para repensar seus planos e reorientar suas atividades. Dada a hipótese de que a firma está trabalhando num contexto em que o tempo é unidirecional (tempo histórico), quando ela decidir implementar um plano que já foi adiado o ambiente terá mudado. Mas, se a firma continua a existir de forma produtiva, o investimento em atividades produtivas não pode ser adiado indefinidamente.
Dado que se assume que o investimento em ativos fixos é uma das opções que os empresários têm para acumular riqueza, interrupções de curto prazo e atrasos nos planos de investimento (ou o contrário, uma aceleração e um aumento nos gastos com investimento, via desinvestimento em ativos líquidos) são relacionados com o grau de confiança que os empresários têm nas decisões que tomaram.
Num mundo incerto, o comportamento financeiro determina o ritmo do investimento. Nesse contexto, as condições financeiras que levam a uma decisão de investir constituem a mais importante variável a levar em consideração, na medida em que representam os meios pelos quais os planos de investimento se transformam em realidade. Assim, uma vez que se considere a necessidade de financiamento externo para complementar os fundos internos, as condições externas sob as quais dinheiro novo é captado podem atuar tanto como um estímulo quanto um desincentivo ao investimento em ativos fixos.
8. NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO
Uma vez que um plano de investimento tenha sido decidido, a firma tem de escolher um plano de financiamento adequado. Como vimos, ela pode ter poupado todos os recursos de que necessita para implementar seu projeto de investimento ou pode recorrer a fontes externas para complementar recursos.
No primeiro caso, a estratégia de acumulação envolverá mudança na composição do portfólio de ativos através da realocação de recursos de ativos financeiros para o novo projeto. O risco incorrido pela firma com esse tipo de financiamento deve-se ao fato de que o valor dos ativos financeiros está sujeito às vicissitudes do mercado. Se o valor de mercado dos ativos financeiros declina, a firma torna-se mais vulnerável, pois o fluxo esperado de recursos pode não ser o suficiente para cobrir pagamentos de dívidas contraídas no passado. Deve-se lembrar também que, se a firma decide adiar o investimento em ativo fixo porque as alternativas de curto prazo oferecem melhor retorno, isso pode implicar que o plano original nunca será implementado. A razão para isso, como já se viu, é que o ambiente externo está mudando o tempo todo e as firmas podem reavaliar suas decisões passadas.
A firma pode também esperar cobrir parte de suas dívidas com recursos de caixa gerados pelo novo projeto. Tão logo a unidade de capital fixo comece a operar, a firma poder contar com uma fonte adicional de receita.
Se escolhe colocar novas ações, então deve considerar o efeito que isso terá sobre o valor das ações já existentes. Se a razão entre o número de ações para o capital é alta, um lançamento adicional de ações pode reduzir seu valor. Se, por outro lado, essa razão é baixa e o retorno esperado do capital é alto, então o mercado pode absorver um volume adicional de ações, sem queda em valor. Quando a lucratividade esperada do novo capital não corresponde às expectativas, o preço da ação se moverá de acordo. A vantagem para a firma em financiar capital novo dessa forma consiste em que pode aumentar sua poupança externa sem aumentar, em contrapartida, o grau de endividamento. Contudo, torna a firma mais vulnerável à ação de takeovers e sofre o risco de a direção perder seu controle acionário.
Para aumentar a taxa de acumulação, a firma pode também tomar dinheiro emprestado de bancos e outras instituições financeiras (as firmas podem usar seu borrowing power, na terminologia de Minsky, 1975MINSKY, H. (1975) John Maynard Keynes. Nova York: Columbia University Press., p. 120). A capacidade da firma de financiar seu novo investimento depende das expectativas quanto à lucratividade do novo projeto e da avaliação de emprestador sobre os riscos envolvidos e sobre as margens de segurança oferecidas. Essa lucratividade pode ser medida em termos do fluxo de recursos futuros que são esperados e que deverão ser em volume suficiente para cobrir os pagamentos das dívidas contraídas.
O compromisso de assumir novas dívidas é uma decisão de comprometer receitas futuras e incertas contra um volume certo de pagamento a ser efetuado durante um dado período de tempo. Envolve um grau elevado de confiança tanto da parte dos tomadores como dos emprestadores sobre o futuro dos negócios. O risco do tomador nesse caso de financiamento é maior que nos casos descritos anteriormente, dado que, num futuro incerto, o fluxo de caixa esperado pode não ser o suficiente para cobrir os contratos de dívida. O cumprimento dos compromissos da firma pressupõe que os preços relativos relevantes para a firma se comportem conforme o esperado. O risco do emprestador é expresso nos termos nos quais os contratos financeiros são firmados. De acordo com Minsky,
“ ... taxas de juros mais altas, prazos mais curtos de maturação, requisitos de exigir ativos específicos como colaterais e restrições no pagamento de dividendos e outros empréstimos são alguns deles [risco do emprestador]” (Minsky, 1975MINSKY, H. (1975) John Maynard Keynes. Nova York: Columbia University Press., p. 110).
Quando a firma decide lançar mão do endividamento, seu passivo é sujeito à avaliação dos emprestadores. Dada a incerteza que cerca os planos para o futuro, essa avaliação é fortemente influenciada pela visão subjetiva dos bancos e instituições financeiras. Estes estarão mais inclinados a aceitar um grau maior de endividamento quando as expectativas sobre o futuro são otimistas e um menor grau de endividamento e condições contratuais mais severas quando as expectativas são pessimistas. Assim, num mundo incerto, o limite para financiar o investimento utilizando o endividamento é subjetivamente determinado e depende da visão geral das firmas e instituições financeiras sobre o futuro desempenho da economia e, em particular, da expectativa quanto às chances dos negócios de ser bem-sucedidos no período relevante de tempo. No mundo real, uma hipótese realista é a firma escolher uma estratégia para financiar seu novo investimento em ativos fixos que combine fundos internos e externos: a firma ter poupado parte dos recursos necessários e tomar emprestado o restante.
9. POSTURAS FINANCEIRAS
Durante a implementação dos planos de investimento, a necessidade por recursos irá variar, o que estará expresso nas contas do balanço da firma. O ritmo do investimento será o resultado da disponibilidade e do custo de fundos externos à firma, que varia de acordo com as relações entre a demanda por fundos e a oferta, e a confirmação e o desapontamento das expectativas em relação à geração de fundos internos.
A expansão da firma também depende de sua habilidade de administrar os recursos financeiros para cumprir suas obrigações. A evolução da firma cria, assim, não apenas uma dada estrutura administrativa, como já assinalado anteriormente, mas também uma estrutura financeira, e ambas representam os recursos com os quais a firma deve evoluir no presente e no futuro.
De acordo com Minsky (1982MINSKY, H. (1982) Inflation, Recession and Economic Policy. Londres: Weatseaf Books.), uma variável chave para a análise do balanço da firma é o perfil de suas receitas em face dos pagamentos ao longo do tempo. A renda bruta de capital - definida como a renda residual da receita total, depois dos pagamentos com a remuneração da mão-de-obra e a compra de insumos - indica os recursos disponíveis à firma para pagar juros, impostos e remunerar os sócios. A distribuição da renda bruta de capital entre essas parcelas define três posturas que a firma pode adotar em relação a sua estratégia de portfólio: hegde, especulativo e Ponzi.
Um comportamento hedge significa que o fluxo de caixa esperado excede os pagamentos de dívida a cada período. É uma postura caracterizada por hipóteses conservadoras relacionadas a margens de segurança e, portanto, uma unidade hedge manterá
“... o excesso de receita sobre o pagamento de compromissos contratuais em cada período, um excesso de valor de ativos de capital sobre a dívida e a retenção de moeda e ativos líquidos” (Minsky, 1982MINSKY, H. (1982) Inflation, Recession and Economic Policy. Londres: Weatseaf Books., p. 26).
As necessidades financeiras de um hedger são supridas no início do período, tornando-o independente de mudanças futuras nos mercados financeiros, desde que suas expectativas em relação ao mercado para seus produtos não sejam desapontadas.
Uma unidade torna-se especulativa quando, por alguns períodos, seus compromissos financeiros excedem suas receitas esperadas, significando que a unidade terá de recorrer ao refinanciamento para superar os momentos de déficit. A razão pela qual déficits no fluxo de caixa ocorrem é que a unidade especulativa financia sua posição de longo prazo com recursos de curto prazo, levando a que os compromissos com dívidas de curto prazo sejam maiores que as receitas esperadas como contrapartida dessa dívida.
Desde que as receitas sejam suficientes para pagar os juros devidos, a unidade será capaz de refinanciar sua posição sem aumentar a dívida, se não ocorrerem situações adversas no mercado financeiro. A longo prazo, à unidade deverá se tornar solvente dado que, nos períodos mais à frente, se espera que o excesso de receitas compense situações iniciais de déficits.
Finalmente, uma unidade é caracterizada como Ponzi quando no futuro imediato suas receitas líquidas não são suficientes nem mesmo para pagar os juros devidos. Para cumprir os compromissos financeiros, a unidade necessita tomar recursos emprestados, aumentando sua dívida sem a contrapartida de aumento de patrimônio. Os recursos para uma unidade Ponzi serão ofertados apenas se se esperar que, no final do período, a receita líquida (receita corrente menos pagamentos correntes) venha a compensar o aumento na dívida. A postura Ponzi é um caso extremo de especulação. Ambas as estratégias implicam vulnerabilidade a mudanças na disponibilidade e termos dos empréstimos.
Cada uma dessas posturas define uma trajetória particular de crescimento para a firma, dado que constrói uma situação financeira mais ou menos sólida, que capacitará a firma a planos de expansão mais ou menos ambiciosos. Durante o período de implementação dos planos de investimento, as mudanças no ambiente externo (tais como um declínio nos determinantes do lucro ou uma mudança nas condições de financiamento) afetarão a firma de diferentes formas, de acordo com a estrutura de obrigações contratuais e seu fluxo de receita. Como descreve Minsky,
“um declínio na renda bruta de capital esperada, ou um aumento na proteção da renda requerida para o financiamento hedge pode tornar uma unidade hedge especulativa; um declínio na renda bruta de capital esperada, um aumento na proteção da renda requerida para o financiamento especulativo ou um aumento nos custos financeiros pode tornar a unidade especulativa em unidade Ponzi” (Minsky, 1982MINSKY, H. (1982) Inflation, Recession and Economic Policy. Londres: Weatseaf Books., p. 29). Através deste canal, as ocorrências de curto prazo podem afetar a implementação de planos de longo prazo, dado que o ritmo dos investimentos pode ser afetado.
10. RESUMO E CONCLUSÃO
Este texto chamou atenção para o fato de que, num mundo de incerteza, as expectativas desempenham um importante papel quando as decisões sobre produção e investimento são tomadas.
As decisões de produção e investimento estão inter-relacionadas porque, uma vez que o tempo esteja sendo explicitamente considerado, as decisões de longo prazo têm de ser traduzidas em procedimentos de curto prazo.
Essa inter-relação pode ser vista de duas formas. Uma consiste em que o desempenho de curto prazo da firma influencia sua trajetória de crescimento a longo prazo. Como o futuro é incerto, as expectativas são voláteis e sujeitas a mudanças. Se, no presente, as decisões feitas no passado se mostram erradas, os empresários podem ter de rever seus planos de crescimento.
Outro aspecto dessa inter-relação é identificado no financiamento do crescimento. Como se considera a firma operando numa economia com contratos monetários futuros, os empresários estão sempre comprometendo recursos hoje contra ganhos num futuro incerto. A existência de contratos monetários dá alguma estabilidade ao funcionamento da economia, dado que custos - de produção e financeiros - são conhecidos com antecedência. No entanto, é a evolução da firma no tempo que permitirá que esses contratos sejam honrados através da geração de receita corrente, suficiente para saldar os compromissos financeiros e iniciar novos projetos. Nesse sentido, discutiram-se as decisões de preço como parte da estratégia de crescimento.
Se a estratégia de financiar planos de investimento envolve compromissos de dívida, a estrutura das obrigações da firma será objeto de avaliação dos emprestadores. Desde que bancos e instituições financeiras tomam suas decisões baseadas em avaliações subjetivas, o grau aceitável de endividamento da firma, bem como os termos dos contratos, variará ao longo do tempo. É por essa razão que o financiamento dos planos de investimento, em grande medida, determina seu ritmo.
Num mundo onde os contratos são feitos em termos monetários, as decisões de investimento podem ser vistas como um elemento da estratégia de composição do portfólio das firmas. Estas desejarão manter ativos na expectativa de que gerarão receita no futuro. A receita gerada por ativos financeiros está definida nos contratos, enquanto a receita gerada por ativos fixos depende de seu uso na produção. O comprometimento de recursos em planos de expansão de capacidade produtiva expressa o grau de confiança da firma no futuro.
Num ambiente competitivo, a questão do crescimento, corno envolve o comprometimento de grande quantidade de recursos físicos e financeiros por longo período de tempo, é crucial para a firma.
É nesse contexto que se pode dizer que as estruturas financeira e administrativa da firma são resultantes de sua estratégia de crescimento. A execução de planos de investimento envolve não somente recursos consideráveis, como também coloca novas questões administrativas que demandam soluções criativas. Por outro lado, a capacidade da firma de cumprir com seus compromissos financeiros em mercados onde opera e onde pretende operar também determinará seu ritmo de expansão.
Diversas variáveis podem ser identificadas como guias para decisões de investir: expectativas sobre os ganhos, poupança interna e facilidades internas à firma que permitem diversificar a linha de produção e, finalmente, as condições para a obtenção de empréstimos para financiar novos planos de investimento. Em todos os casos, enfatizou-se a importância da avaliação subjetiva da equipe de direção como responsável pelas principais decisões relativas ao crescimento da firma. A firma assim descrita deve ser vista como uma “instituição viva”, com uma única trajetória de crescimento, a qual é traduzida nas suas estruturas administrativas e financeiras. Os limites a seu crescimento, como coloca Penrose (1980PENROSE, E. (1980) The Theory of Growth of the Firm. White Plains: M.E.Sharpe.), são dados por sua capacidade de tirar vantagem das oportunidades oferecidas pelo ambiente externo.
Finalmente, as firmas recorrem ao endividamento quando implementam seus planos de investimento. De acordo com Minsky, a firma adota uma das três estratégias de como compor seu portfólio - hedge, especulativo e Ponzi - para cumprir suas obrigações. As diferenças entre essas posturas referem-se ao grau de vulnerabilidade a que a firma se expõe quando as condições financeiras mudam. Num mundo de incerteza, onde se tomam decisões com base em avaliações subjetivas e convenções, é a inter-relação entre os agentes econômicos -principalmente entre unidades produtivas e instituições financeiras - que explicarão os movimentos do produto agregado.13 13 Uma firma bem-sucedida tanto influencia como é influenciada e se adapta ao seu ambiente. Um elemento importante da firma são as condições determinando a estabilidade da moeda. Inflação, particularmente a inflação alta, certamente influenciará nas escolhas e estratégias da firma. Uma abordagem sobre o comportamento da firma, dentro de uma visão pós-keynesiana, está desenvolvida em Feijó (1991).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1
Keynes desenvolveu seu conceito de economia monetária de produção entre a publicação do Tratado sobre a Moeda e a Teoria Geral. Recebeu muitos nomes, tais como economia empresarial, economia monetária de produção e, na Teoria Geral, economia monetária. V. Collected Writings on John Maynard Keynes, vols. 13, 14 e 29.
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2
Keynes define incerteza na conhecida passagem do artigo de 1937 (reimpresso em Keynes, 1973KEYNES, J.M. (1973) The General Theory and After, Part 2, Defence and Development. Londres, Macmillan, The Collected Writings of John Maynard Keynes, vol. 14., vol. 14, págs. 113-4) onde afirma que incerteza se refere a assuntos que simplesmente não se conhecem.
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3
Pode-se mencionar que estratégia se refere não apenas às atividades produtivas, mas também aos métodos administrativos. Chendler (1962CHANDLER, A. (1962) Strategy and Structure: Chapters in the History of the Industrial Enterprise. Cambridge, Massachusets: M.I.T. Press, 1973.), por exemplo, descreveu que, numa firma diversificada, algumas decisões são descentralizadas, enquanto outras são tomadas pela administração central. Afirma que “a estrutura segue a estratégia”, significando que a trajetória de crescimento da firma cria uma estrutura organizacional única, estabelecida pelos empresários para tratar com os problemas administrativos colocados pela expansão. No longo prazo, a estrutura administrativa da firma é o resultado de diferentes estratégias adotadas. Penrose (1980) também compartilha essa opinião. Por simplificação, adota-se neste trabalho a hipótese de que as decisões são tomadas por uma única unidade administrativa, dado que a hip6tese não interfere na discussão.
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4
Com exceção de produção por encomenda, que se aplica a um conjunto pequeno de bens finais, mais especificamente bens de capital.
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5
Para uma discussão acerca de decisão sob incerteza, ver Carvalho (1988CARVALHO, F. J .C. (1988) “Keynes on probability; uncertainty and decision making”, Journal of Post Keynesian Economics 11 (1), págs. 66-80.).
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6
A definição de Keynes de eficiência marginal de capital também enfatiza o papel das expectativas. V. Keynes, 1936KEYNES, J.M. (1936) The General Theory of Employment, Interest and Money. Nova York, Harcourt Brace and World, 1964., capítulo II.
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7
Eichner cita três fontes de problemas que conterão o anseio de fixar preços muito altos da grande empresa (megacorp): o efeito substituição, o fator entrada e a intervenção governamental (Eichner, 1976EICHNER, A. (1976) The Megacorp and Oligopoly. Nova York: M.E.Sharpe., capítulo 3).
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8
As firmas que não são líderes são supostas como produzindo com custos mais altos que a firma líder, e urna vez que o preço é lixado, suas margens de lucro dependerão do comportamento da líder. Sylos-Labini (1969SYLOS-LABINI, P. (1969) Oligopoly and Technical Progress. Cambridge, Massachusetts: Harvard University Press.) distingue dois tipos de comportamento de preço que a firma líder pode assumir: a) para evitar a entrada de novas firmas no mercado pode dar um “preço de exclusão”, que nega a novos concorrentes uma taxa de lucro mínima; ou b) pode fixar um preço para eliminar as firmas existentes no mercado. Nesse caso, o “preço de eliminação” seria fixado abaixo do custo médio da firma.
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9
A firma manterá sua participação cm mercados maduros se crescer à mesma taxa que o mercado. Se a firma cresce à taxa maior que a expansão do mercado, então sua participação aumentará, aumentando o grau de concentração. Steindl (1976STEINDL, J. (1976) Maturity and Stagnation in American Capitalism. Nova York: Monthly Review Press, 2a. edição.) assinala que, nesse caso, a capacidade potencial da firma para crescer pode aumentar porque domina novas técnicas de produção, que permitem reduzir seus custos de produção cm relação a seus concorrentes. Se essa tendência for muito marcante, o grau de “concentração absoluto” irá aumentar, dado que as firmas menos eficientes serão eliminadas. Mas, se tais inovações não ocorrerem e se a firma não adotar uma postura agressiva cm relação ao mercado, então deverá investir cm outros mercados para continuar a crescer.
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10
Isso não quer dizer que a firma, uma vez estabelecida com mercados maduros, deixará de investir. Para manter sua posição no mercado, é necessário que continue a investir cm seu desenvolvimento. Um incentivo à entrada de novos competidores é a existência de oportunidades que não são plenamente exploradas.
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11
Dependendo do grau de maturidade de cada mercado, mudanças no custo de produção terão impactos diferentes sobre as receitas das firmas. Em mercados novos emergentes, onde a posição da firma ainda não está bem estabelecida, um aumento nos custos pode não ser repassado aos preços, enquanto em mercados maduros provavelmente será. No caso de um decréscimo nos custos, firmas buscando desenvolver seus mercados provavelmente usarão a oportunidade para reduzir os preços e ampliar seus mercados. Em mercados maduros, o resultado poderia ser a manutenção do preço e, consequentemente, um aumento nos lucros da firma.
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V., por exemplo, Robinson (1959ROBINSON, J. (1959). “La tasa de interés”. In J. Robinson (1974) Ensayos de Economia Poskeynesiana. Mexico: Pondo de Cultura Economica.) discutindo o impacto de mudanças na taxa de juros sobre planos de investimentos.
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Uma firma bem-sucedida tanto influencia como é influenciada e se adapta ao seu ambiente. Um elemento importante da firma são as condições determinando a estabilidade da moeda. Inflação, particularmente a inflação alta, certamente influenciará nas escolhas e estratégias da firma. Uma abordagem sobre o comportamento da firma, dentro de uma visão pós-keynesiana, está desenvolvida em Feijó (1991FEIJÓ, C.A. (1991) “Entrepreneurial Decision in a Monetary Production Economy with Price Instability”, 19º Encontro Nacional de Economia da ANPEC - Associação Nacional dos Centros de Pós-graduação, vol. 4, Paraná.).
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JEL Classification: E12; E22.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
29 Maio 2023 -
Data do Fascículo
Jan-Mar 1993