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Acesso de parturientes para a assistência ao parto em hospitais universitários: caracterização e fatores associados

Resumos

O estudo teve por objetivo analisar os fatores socioeconômicos, demográficos, obstétricos, neonatais e assistenciais associados ao acesso da parturiente à assistência ao parto. Foi um estudo transversal, realizado com 310 puérperas em dois hospitais universitários do estado do Paraná, Brasil, em 2011. O acesso ao parto foi analisado segundo as variáveis socioeconômicas, demográficas, obstétricas, neonatais e assistenciais. As puérperas foram entrevistadas durante a internação no hospital, nas primeiras 72 horas após o parto. Os dados foram analisados por frequências relativas e cálculo do x 2 , considerando-se associação significativa quando p≤ 0,05. A taxa total de mulheres encaminhadas aos hospitais universitários foi de 17,7%. Encontrou-se associação significativa do acesso ao parto com: residir em outros municípios; parto prematuro; recém-nascido de baixo peso; intercorrências na gestação atual e uso de ambulância. Conclui-se que os fatores associados encontrados neste estudo sugerem que a gestante com algum risco necessitou de encaminhamento para os hospitais universitários.

Assistência perinatal; Acesso aos serviços de saúde; Maternidades


This study aimed to analyze the socioeconomic, demographic, obstetric, neonatal and healthcare factors associated with access to care by women during childbirth. It was a transversal study conducted on puerperal women in two university hospitals in the state of Paraná, Brazil in 2011. Access to childbirth was analyzed according to socioeconomic, demographic, obstetric, neonatal and healthcare variables. The puerperal women were interviewed during hospitalization, in the first 72 hours after birth. The data was analyzed by relative frequencies and calculation of the x2, considering a significant association when p≤ 0.05. The overall rate of women referred to university hospitals was 17.7%. A significant associated was found between access to childbirth and: residing in other cities; premature birth; underweight newborns; complications in the current pregnancy and the use of ambulances. It was concluded that the associated factors found in this study suggest that pregnant women with some risk required referral to university hospitals.

Perinatal care; Access to health services; Maternities


El objetivo del estudio fue analizar los factores socioeconómicos, demográficos, obstétricos, neonatales y asistenciales relacionados con el acceso de las parturientas. Un estudio transversal que incluyó a 310 puérperas en dos hospitales universitarios en el estado de Paraná-Brasil en 2011. Acceso al parto se analizó de acuerdo a las variables socioeconómicas, demográficas, obstétricas, neonatales y asistenciales. Las mujeres fueron entrevistadas durante la estancia hospitalaria, las primeras 72 horas después del parto. Los datos analizados por frecuencias relativas y x2, considerando asociación significativa cuando p≤ 0,05. La tasa total de mujeres encaminadas a los hospitales universitarios fue 17,7%. Se encontró asociación significativa del acceso al parto, con: vivir en otros municipios, parto prematuro, recién nacido con bajo peso, complicaciones en el embarazo actual y el uso de ambulancia. Se concluye que los factores asociados encontrados sugieren que las mujeres embarazadas con algún riesgo requieren el encaminamiento a los hospitales universitarios.

Atención perinatal; Accesibilidad a los servicios de salud; Maternidades


INTRODUÇÃO

O acesso de gestantes para assistência ao parto hospitalar pode ser influenciado por aspectos sociodemográficos ou características obstétricas da parturiente. O conceito de acesso refere-se ao ingresso do indivíduo no sistema de saúde, mas também pode ser definido de acordo com o objetivo final da assistência e os resultados alcançados( 11 Sanchez RM, Ciconelli RM. Conceitos de acesso à saúde. Rev Panam Salud Pública. 2012;31(3):260-8. ).

As insuficiências na atenção obstétrica brasileira dizem respeito, além do acesso, também à má distribuição dos leitos que resultam em longas caminhadas das gestantes na procura por vagas para o parto, expondo-as a riscos e agravamento de sua situação( 22 Barbastefano PS. O acesso à assistência ao parto para gestantes adolescentes nas maternidades da rede SUS - RJ [dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro; 2009. ).

A busca do hospital pela gestante para o parto e a assistência no primeiro hospital procurado tem melhorado no país e a região sul possui melhores índices de acesso, visto ter sido identificado que 96% das mulheres tiveram o parto realizado no primeiro hospital procurado( 33 Presidência da República (BR). Objetivos de desenvolvimento do milênio: 4º relatório nacional de acompanhamento. Brasília (DF); 2010. ). Este índice pode dar uma falsa ideia de suficiência de leitos na região. Contudo, o que é observado, muitas vezes, é um fluxo desordenado de gestantes procurando por assistência nas unidades de referência, sendo frequentemente as unidades de maior complexidade( 44 Cunha SF, D'Eça Júnior A, Rios CTF, Pestana AL, Mochel EG, Paiva SS. Peregrinação no anteparto em São Luis - Maranhão. Cogitare Enferm. 2010;15(3):441-7. ).

Alguns estudos sobre o acesso à rede hospitalar de saúde por ocasião do parto utiliza o termo "peregrinação" para representar o caminho percorrido pelas mulheres em busca de assistência. O peregrino, portanto, é aquele que teve insucessos nas tentativas de busca por assistência( 44 Cunha SF, D'Eça Júnior A, Rios CTF, Pestana AL, Mochel EG, Paiva SS. Peregrinação no anteparto em São Luis - Maranhão. Cogitare Enferm. 2010;15(3):441-7. - 55 Albuquerque VN, Oliveira QM, Rafael RMR, Teixeira RFC. Um olhar sobre a peregrinação anteparto: reflexões sobre o acesso ao pré-natal. Rev Pesqui Cuid Fundam (Online). 2011;3(2):1935-46. ).

Na capital do Estado do Maranhão-Brasil, foi verificado que muitas mulheres percorrem mais de um serviço de saúde e passam por, pelo menos, duas maternidades na tentativa de assistência ao parto, sendo a falta de leitos o principal motivo para o não atendimento( 44 Cunha SF, D'Eça Júnior A, Rios CTF, Pestana AL, Mochel EG, Paiva SS. Peregrinação no anteparto em São Luis - Maranhão. Cogitare Enferm. 2010;15(3):441-7. ). Em estudo realizado no município do Rio de Janeiro-Brasil, 36,6% das gestantes adolescentes tiveram acesso insatisfatório para o parto, o que se caracterizou pela incoerência entre o local de residência e o do parto. Também foi verificado que 20,7% delas não tiveram o parto realizado na primeira instituição procurada. A idade, a escolaridade, a situação conjugal, a renda e a raça/cor foram alguns fatores que não interferiram no acesso( 66 Barbastefano PS, Girianelli VR, Vargens OMC. O acesso à assistência ao parto para parturientes adolescentes nas maternidades da rede SUS. Rev Gaúcha Enferm. 2010;31(4):708-14. ).

O município de residência também é fator que pode influenciar no acesso, considerando mulheres que moram em municípios diferentes daqueles onde estão localizados os hospitais de referência para a assistência ao parto. Em estudo realizado com todos os municípios brasileiros, a distância entre o local de residência e de ocorrência do parto compromete o acesso geográfico, constituiu fator de risco para a mortalidade infantil( 77 Almeida WS, Szwarcwald CL. Mortalidade infantil e acesso geográfico ao parto nos municípios brasileiros. Rev Saúde Pública. 2012;46(1):68-76. ). Neste mesmo estudo, também foi observado que características do município, como o porte populacional e a renda per capita, tiveram relação inversa com o deslocamento geográfico, ou seja, quanto menor a população e a renda, maior o caminho percorrido para a assistência ao parto( 77 Almeida WS, Szwarcwald CL. Mortalidade infantil e acesso geográfico ao parto nos municípios brasileiros. Rev Saúde Pública. 2012;46(1):68-76. ).

Diante disso, a análise do acesso de parturientes ao hospital para assistência ao parto pode contribuir para o conhecimento da organização e fragilidades dos serviços públicos de assistência à saúde da mulher no ciclo gravídico-puerperal, bem como compreender como as práticas profissionais respondem aos princípios da integralidade e da resolutividade em saúde( 88 Bellato R, Araújo LFS, Castro P. O itinerário terapêutico como uma tecnologia avaliativa da integralidade. In: Pinheiro R, Silva Junior AG, Mattos RA. Atenção básica e integralidade: contribuições para estudos de práticas avaliativas em saúde. Rio de Janeiro: CEPESC-IMS/UERJ-ABRASCO; 2008. 360 p. ). Portanto, o presente estudo visou analisar os fatores socioeconômicos, demográficos, obstétricos, neonatais e assistenciais associados ao acesso da parturiente à assistência ao parto, em dois hospitais universitários do estado do Paraná-Brasil, em 2011.

MÉTODOS

Realizou-se estudo transversal com puérperas de dois hospitais universitários do Estado do Paraná, localizados nos municípios de Maringá e Cascavel. Foram incluídas no estudo as mulheres atendidas por ocasião do parto, durante o período de um mês, ou seja, totalizando 310 puérperas. Ocorreram 11 perdas devido às altas precoces, antes do período pré-estabelecido nas instituições e por recusa da puérpera em participar do estudo.

Os dados foram coletados no período de 30 dias, durante o mês de dezembro de 2011, utilizando um instrumento do tipo questionário misto, com perguntas fechadas e abertas, constituídas de 37 questões. As entrevistas foram realizadas prioritariamente nas unidades de Alojamento Conjunto dos dois hospitais universitários, porém foram realizadas nas demais unidades em que as mulheres ficaram internadas nas primeiras 72 horas do pós-parto, como por exemplo, pronto-atendimento e centro obstétrico, por ausência de vaga para internamento no Alojamento Conjunto.

As variáveis independentes foram as informações socioeconômicas; demográficas; história obstétrica pregressa/atual; dados neonatais e dados assistenciais. Sobre as variáveis socioeconômicas e demográficas foram selecionadas a idade, situação conjugal, raça/cor, escolaridade, município de residência e ocupação. Para as variáveis sobre a história obstétrica pregressa/atual da parturiente e dados neonatais foram selecionados o tipo de parto, idade gestacional, peso ao nascer do recém-nascido, número de gestações e intercorrências na gestação atual. Sobre os dados assistenciais foram analisados o motivo da não assistência ao parto ou justificativa de encaminhamento da mulher, meio de transporte utilizado para deslocamento ao hospital universitário (carro, taxi, ônibus, ambulância e outros) e necessidade de vaga em UTI neonatal.

As variáveis dependentes do estudo foram o acesso ao parto e o município de residência. O acesso ao parto foi considerado quando houve a assistência ao parto no primeiro hospital procurado. Para isto, foram realizadas duas perguntas: "a senhora foi atendida no primeiro hospital procurado?" e "quantos hospitais necessitou procurar?". O município de residência foi analisado separadamente como variável dependente sendo dividido em município sede ou município não sede do hospital universitário que realizou o atendimento ao parto.

Foi utilizado o programa Excel(r) para tabulação dos dados e para a análise estatística descritiva foi utilizado o software Statistica 7. O teste de associação das variáreis foi o Qui-quadrado e considerado α = 5%. Foi utilizado o Odds Ratio (OR) para mensurar a magnitude da associação entre as variáveis.

O desenvolvimento do estudo ocorreu em conformidade com o preconizado pela resolução 196/96 da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa - CONEP e o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da Universidade Estadual de Maringá, sob o parecer nº 657/2011. As mulheres assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), concordando com a participação no estudo.

RESULTADOS

Caracterização das puérperas, acesso ao parto e fatores associados

A média de idade das mulheres foi de 24,6 ± 6,6 anos e a maioria era casada (86,1%) ou tinha união estável e apenas 11,9% eram solteiras. Constatou-se que 48,4% consideravam-se brancas; 9,8% pretas e 41,8% pardas. Verificou-se que 65,2% não completaram o ensino médio; 57,4% eram do lar, seguidas de 26,8% trabalhadoras assalariadas com carteira assinada e 34,5% residiam em municípios vizinhos às duas cidades onde se localizavam os hospitais universitários em estudo. Mais da metade (58,7%) tiveram parto vaginal e menos da metade (43,2%) eram primigestas.

Sobre as condições de nascimento, a maioria dos partos (82,3%) ocorreu com 36 ou mais semanas de gestação e 12,6% dos recém-nascidos nasceram com baixo peso, e destes, a maioria (87,2%) foi transferido para UTI neonatal após o nascimento.

Das puérperas entrevistadas, 55 (17,7%) não tiveram acesso adequado, pois necessitaram procurar mais de um hospital para assistência ao parto (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição das puérperas segundo assistência ao parto e variáveis socioeconômicas, demográficas, obstétricas, neonatais e assistenciais. Maringá e Cascavel-PR, 2011.

O município de residência foi a única variável socioeconômica e demográfica que apresentou associação com a assistência ao parto (Tabela 1). Já com as varáveis obstétricas, assistenciais e do recém-nascido foi observada associação da idade gestacional, peso ao nascer, intercorrências na gestação atual com a não assistência ao parto no primeiro hospital procurado. As mulheres que não tiveram o parto realizado no hospital do município de origem tiveram seis vezes mais chance de serem transportadas ao hospital universitário de ambulância do que com outro tipo de locomoção (Tabela 1).

Foram observadas diferenças nas características das mulheres segundo o município de residência. Daquelas que residiam em município não sede do hospital universitário o percentual de adolescentes era maior (p = 0,016) assim como o percentual de não conclusão do ensino médio (p <0,001). Aproximadamente 45% das mulheres que não residiam no município sede de hospital universitário não foram atendidas no primeiro serviço procurado contrastando com apenas 3,5% das mulheres que residiam no município sede (p <0,001). Não residir no município sede do hospital universitário está associado com idade gestacional pré-termo (p= 0,004) e necessidade de vaga em UTI neonatal, pois 25,2% das parturientes que residiam fora da cidade sede tiveram seus recém-nascidos prematuros e precisaram de vaga em UTI neonatal (15,9%). Morar em outro município esteve associado com o transporte por ambulância (p <0,001). O que permite inferir que houve encaminhamento destas mulheres e que as mesmas foram transportadas com segurança até os hospitais de referência (Tabela 2).

Tabela 2
Distribuição das puérperas por município de residência segundo variáveis socioeconômicas, demográficas, obstétricas, neonatais e assistenciais, Maringá e Cascavel-PR, 2011.

Motivos para encaminhamento para outro serviço

Dos motivos para a não assistência ao parto no primeiro serviço procurado, poucas mulheres (5,4%) relataram desconhecer os motivos, algumas justificativas apresentadas foram ser primípara (5,4%) e não estar em efetivo trabalho de parto (14,5%). Cabe salientar que alguns casos, independente da gestação ser de alto risco, as mulheres eram encaminhadas devido o hospital universitário ser referência para o parto no âmbito da regional de saúde, por inexistência de hospital ou deste tipo de assistência no município de origem, conforme fluxo de atendimento dos serviços (Tabela 3).

Tabela 3
Motivos relatados para o encaminhamento para o Hospital Universitário. Maringá e Cascavel-PR, 2011.

Tipo de intercorrência na gestação

Das puérperas entrevistadas 49% relataram ter tido pelo menos uma intercorrência durante a gestação e as mais frequentes foram os distúrbios hipertensivos (23,3%) e urinários (22,6%) (Tabela 4).

Tabela 4
Distribuição das intercorrências na gestação relatadas pelas puérperas, Maringá e Cascavel-PR, 2011

DISCUSSÃO

O percentual de mulheres que não realizou o parto no primeiro hospital procurado foi 17,7%. Os motivos da não assistência ao parto nestes hospitais foram, conforme o relato das mulheres, principalmente, o hospital universitário ser referência, prematuridade, falta de estrutura e falta de médico. Percebeu-se nesses relatos que existe um fluxo de gestantes no sentido das metrópoles, que muitas vezes sobrecarrega a rede de assistência ao parto dos municípios maiores onde se encontram melhores estruturas dos serviços de saúde( 99 Menezes DC, Leite IC, Schramm JMA, Leal MC. Avaliação da peregrinação anteparto numa amostra de puérperas no município do Rio de Janeiro, Brasil, 1999/2001. Cad. Saúde Pública. 2006;22(3):553-9. ).

Em um estudo sobre peregrinação anteparto a ocorrência da não assistência ao parto devido ao profissional afirmar que a gestante ainda não estava em trabalho de parto, pode demonstrar que muitas mulheres desconhecem o início do trabalho de parto e o momento oportuno de buscar assistência hospitalar, principalmente as primíparas( 44 Cunha SF, D'Eça Júnior A, Rios CTF, Pestana AL, Mochel EG, Paiva SS. Peregrinação no anteparto em São Luis - Maranhão. Cogitare Enferm. 2010;15(3):441-7. ), que no presente estudo representaram 43,2%. Porém, mesmo sendo assim avaliadas, o parto ocorreu no outro serviço, o que é incoerente com o motivo do encaminhamento.

Alguns dos motivos citados pelas mulheres merecem destaque, como o fato da primeira instituição não atender pelo SUS fato que demonstra a dificuldade de funcionamento de uma rede de referência à maternidade a ser procurada no momento do parto.

Com relação aos fatores associados à assistência ao parto no primeiro hospital procurado, não foi verificada relação entre as variáveis sociais e econômicas, diferentemente de estudos anteriores em outras regiões brasileiras para os quais a raça/cor, a idade, a renda e a situação conjugal tiveram associação com a peregrinação anteparto( 44 Cunha SF, D'Eça Júnior A, Rios CTF, Pestana AL, Mochel EG, Paiva SS. Peregrinação no anteparto em São Luis - Maranhão. Cogitare Enferm. 2010;15(3):441-7. , 99 Menezes DC, Leite IC, Schramm JMA, Leal MC. Avaliação da peregrinação anteparto numa amostra de puérperas no município do Rio de Janeiro, Brasil, 1999/2001. Cad. Saúde Pública. 2006;22(3):553-9. ).

O município de residência esteve associado com a assistência ao parto no primeiro hospital procurado, pois as mulheres que moravam em municípios vizinhos tiveram que buscar assistência no seu município, para então serem encaminhadas aos hospitais universitários. Sabe-se que em Cascavel e Maringá a referência para a realização do parto é determinada e/ou orientada durante o pré-natal. As cidades vizinhas são pertencentes às Regionais de Saúde das cidades sede dos hospitais universitários, possuem serviços de saúde integrantes da rede de atenção à gestante e os municípios são responsáveis por encaminhamentos quando necessários, e devem garantir também o transporte ao hospital de destino.

O transporte por ambulância teve relação significativa com a não assistência no primeiro hospital procurado, o que pode indicar um encaminhamento ao serviço de maior complexidade, como os hospitais universitários. A presença de intercorrência na gestação atual pode constituir indicativo de risco gestacional e, por conseguinte necessidade de uma assistência de maior complexidade. Nestes casos, os pequenos hospitais devem encaminhar as gestantes para os hospitais de referência.

Verificou-se que a hipertensão e infecção do trato urinário foram as intercorrências mais frequentes no período gestacional e estas são as principais causas de morbimortalidade materna e neonatal, culminando num desfecho negativo, como por exemplo, a prematuridade, ocorrências de near miss (morbidade materna grave) e o óbito. Tal fato corrobora com a literatura que acrescenta que infecção do trato urinário é a complicação clínica mais frequente na gestação e se não adequadamente tratada, cerca de 25% podem evoluir para pielonefrite aguda e ainda induzir o trabalho de parto prematuro, por meio da ruptura prematura das membranas( 1010 Ministério da Saúde (BR) , Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas, Área Técnica de Saúde da Mulher . Pré-natal e puerpério: atenção qualificada e humanizada - manual técnico. Brasília (DF); 2005. - 1111 Góis ALC, Cravo EO, Mendes RB. Infecção do trato urinário e trabalho de parto prematuro: a realidade em uma maternidade referência para alto risco em Aracajú (SE). Cad Grad, Ciênc Biol Saúde. 2010;11(11):65-80. ). Em relação a hipertensão arterial, o relatório nacional afirma que, embora esta doença tenha apresentado uma importante redução entre os anos de 1990 a 2007, ainda é apontada como a maior causa específica de morte materna, apresentando uma razão de mortalidade materna de 15,1%( 33 Presidência da República (BR). Objetivos de desenvolvimento do milênio: 4º relatório nacional de acompanhamento. Brasília (DF); 2010. ).

A assistência ao parto esteve associada tanto à idade gestacional como ao peso ao nascer do recém-nascido. A estimativa do peso fetal é feita para definir a complexidade assistencial exigida para os casos de baixo peso ao nascer ou muito baixo peso ao nascer. Com os exames complementares de apoio diagnóstico, no caso a ultrassonografia, a avaliação ponderal do feto pode ajudar na definição da assistência a ser prestada ao recém-nascido.

A idade gestacional menor que 37 semanas e o baixo peso ao nascer são fatores determinantes para a morbimortalidade neonatal e estimativa de sobrevida do recém-nascido( 1212 Santos HGS, Andrade SM, Silva AMR, Carvalho WO, Mesas AE. Risk factors for infant mortality in a municipality in southern Brazil: a comparison of two cohorts using hierarchical analysis. Cad Saúde Pública. 2012;28(10):1915-26. , 1313 Santana IP, Santos JM, Costa JR, Oliveira RR, Orlandi MHF, Mathias TAF. Aspectos da mortalidade infantil, conforme informações da investigação do óbito. Acta Paul Enferm. 2011;24(4):556-62. ). Assim fatores como a idade gestacional e peso ao nascer, provavelmente motivaram a não assistência ao parto no primeiro serviço procurado pela gestante com consequente encaminhamento para hospitais com maior capacidade para atendimento de média e alta complexidade.

Das mulheres entrevistadas 70,3% tinham idade gestacional superior a 37 semanas e o parto ocorreu no primeiro hospital procurado. Quando observada a influência do local de nascimento em relação à mortalidade infantil, verificou-se que os recém-nascidos prematuros que precisaram de transferência para UTI neonatal em outro hospital tiveram um maior percentual de óbitos. Ou seja, o transporte da gestante para hospitais que possuem UTI neonatal seria uma alternativa que reduziria a mortalidade infantil, pois a presteza no atendimento de qualidade ao recém-nascido prematuro é fundamental para um desfecho favorável( 1414 Araújo BF, et al. Influência do local de nascimento e do transporte sobre a morbimortalidade de recém-nascidos prematuros. J Pediatr. 2011;87(3):257-62. ). O número de habitantes do município é condição para a existência de leitos de UTI neonatal, ou seja, o fluxo de gestantes com risco perinatal para as cidades maiores observado no presente estudo é compreensível.

O período do parto é gerador de ansiedade para a parturiente e sua família( 1515 Van der Sand ICP, Girardon-Perlini NMO, Abreu SM. Ansiedade de familiares de parturientes durante o processo de parto. Ciênc Cuid Saúde. 2011;10(3):474-81. ). A necessidade de melhora na articulação dos serviços de assistência pré-natal com a referência ao parto, e o aumento da cobertura são condições fundamentais para diminuição da angústia das parturientes e suas famílias( 44 Cunha SF, D'Eça Júnior A, Rios CTF, Pestana AL, Mochel EG, Paiva SS. Peregrinação no anteparto em São Luis - Maranhão. Cogitare Enferm. 2010;15(3):441-7. ).

Embora o Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento (PHPN) tenha como objetivo articular a rede que atende a mulher durante a gravidez, parto e puerpério, assegurando a melhoria do acesso( 1616 Ministério da Saúde (BR) , Secretaria de Políticas de Saúde . Programa de humanização no pré-natal e nascimento. Brasília (DF); 2002. ), há ainda um grande desafio no que se refere à atenção à saúde da mulher na gestação e parto quanto à qualidade propriamente dita( 1717 Busanello J, Kerber NPC, Fernandes GFM, Zacarias CC, Capellaro J, Silva ME. Humanização do parto e formação dos profissionais da saúde. Ciênc Cuid Saúde. 2011;10(1):169-75. ). A educação em saúde para gestante também melhora a qualidade da assistência no período gestacional, melhora o vínculo com os profissionais e com os serviços de saúde, contribuindo para a integralidade do cuidado prestado( 1818 Souza VB, Roecker S, Marcon SS. Ações educativas durante a assistência pré-natal: percepção de gestantes atendidas na rede básica de Maringá-PR. Rev Eletrôn Enferm [Internet]. 2011;13(2):199-210. Available in: http://www.fen.ufg.br/revista/v13/n2/v13n2a06.htm
Available in: http://www.fen.ufg.br/revi...
).

No presente estudo, apesar dos resultados mostrarem que a peregrinação anteparto se configurou como o encaminhamento da gestante de risco, demonstrando uma articulação da rede nestes municípios, houve um pequeno número de mulheres que não tiveram o encaminhamento adequado e precisaram buscar assistência em mais serviços, como mostra os motivos relatados pelas puérperas pela não assistência ao parto no primeiro hospital procurado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados mostraram que residir fora da cidade sede do hospital universitário, ser transportada por ambulância e ter tido alguma intercorrência durante a gestação atual, tanto observada pela variável em si, como pela prematuridade e pelo baixo peso ao nascer foram determinantes para a não assistência ao parto no primeiro serviço procurado. Tal evidência indica que esta mulher que mora em outro município e tendo uma intercorrência durante a gestação foi encaminhada pelo primeiro serviço procurado a um hospital de referência. A falta de estrutura no primeiro serviço procurado pela gestante e a possível prematuridade foram os principais motivos citados pelas mulheres durante as entrevistas como justificativas da dificuldade na assistência ao parto nos hospitais dos municípios de origem. Uma gestação de risco para mãe e concepto demanda recursos e atendimento de maior complexidade, sendo necessário o encaminhamento correto e seguro da gestante.

É fundamental que haja hierarquização da rede de assistência ao pré-natal e parto, que estabeleça o fluxo de atendimento de acordo com o risco gestacional, o qual é dinâmico e deve ser reavaliado a qualquer momento durante o ciclo gravídico-puerperal, priorizando o atendimento de risco, permitindo um acesso eficiente e equânime.

Alguma das limitações do estudo foram as entrevistas ocorrerem em hospitais universitários, onde o fluxo de funcionários, alunos e docentes é grande, reduzindo o tempo disponível para entrevista. As especificidades do setor de Alojamento Conjunto, como por exemplo, a realização de exames, as palestras, as refeições, as visitas, os cuidados com o recém-nascido e a amamentação, dificultaram a coleta. Porém, o período de pós-parto é propicio para melhor elucidação da real assistência prestada à parturiente.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2014

Histórico

  • Recebido
    09 Maio 2013
  • Aceito
    16 Dez 2013
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