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A UNIÃO EUROPEIA COMO NORM SHAPER NA PROTEÇÃO DA BIODIVERSIDADE 1 1 Este artigo foi realizado com apoio do Módulo Jean Monnet, financiado pela Comissão Europeia.

Resumo

A pesquisa parte de quais foram as contribuições da União Europeia (UE) como norm shaper no contexto do Pacto Ecológico Europeu (PEE) e da COP-15 da Convenção da Diversidade Biológica (CDB). São analisadas as normas emanadas pela UE que influenciam as decisões dos Estados-membros e dos países estrangeiros, a fim de examinar o papel da UE como norm shaper em matéria ambiental. Exploram-se iniciativas soft referentes à influência da UE quanto à preservação da biodiversidade globalmente. A metodologia utilizada é qualitativa, dedutiva e descritiva. As conclusões foram de que a Comissão Europeia (CE) tem atuado no monitoramento dos avanços e retrocessos do PEE, preenchendo lacuna de outrora. Uma falha percebida foi a falta de compromisso dos Estados-membros no cumprimento das metas do Pacto. A invasão da Ucrânia pela Rússia é apontada como fator de desaceleração nos planos do Green Deal quanto à neutralidade climática e quanto à contenção da perda de biodiversidade. Há pioneirismo da UE em sua Proposta de Regulamento sobre Restauração da Natureza (PRRN), e percebeu-se que as ambições para a COP-15 da biodiversidade foram ratificadas no âmbito da Conferência. A UE estabelece padrões de sustentabilidade internacionais, sendo uma norm shaper quanto ao meio ambiente.

Palavras-chave:
biodiversidade; norm shaper; Pacto Ecológico Europeu; União Europeia

Resumo

This research starts with the contributions of the European Union (EU) as a norm shaper in the context of the European Green Deal (EGD) and COP-15 of the Convention on Biological Diversity (CBD). The rules issued by the EU that influence the decisions of Member States and foreign countries are analyzed in order to examine the role of the EU as a norm shaper in environmental matters. Soft initiatives concerning the influence of the EU on the preservation of biodiversity globally are explored. The methodology used is qualitative, deductive and descriptive. The conclusions were that the European Commission (EC) acted in monitoring the advances and setbacks of the EGD, filling a gap. A perceived fault was the lack of commitment by Member States to meeting the goals of the EGD. Russia’s invasion in Ukraine is seen as a factor slowing down the Green Deal’s plans for climate neutrality and the containment of biodiversity loss. The EU is pioneering in its Proposal for a Regulation on Nature Restoration (PRNR) and it was noticed that the ambitions for the COP-15 on biodiversity were ratified in the Conference. The EU sets international sustainability standards and is an environmental norm shaper.

Keywords:
biodiversity; European Green Deal; European Union; norm shaper

Resumo

La investigación se basa en las aportaciones de la Unión Europea (UE) como norm shaper en el contexto del Pacto Ecológico Europeo (PEE) y la COP-15 del Convenio sobre la Diversidad Biológica (CDB). Se analizan las normas dictadas por la UE que influyen en las decisiones de los Estados miembros y los países extranjeros para examinar el papel de la UE como configuradora de normas en materia ambiental. Se exploran iniciativas soft relativas a la influencia de la UE en la preservación de la biodiversidad globalmente. La metodología utilizada es cualitativa, deductiva y descriptiva. Las conclusiones fueron que la Comisión Europea (CE) se ha mostrado activa en el seguimiento de los avances y retrocesos de la PEE, colmando una laguna anterior. Una de las deficiencias percibidas fue la falta de compromiso de los Estados miembros para cumplir las metas del Pacto. La invasión rusa de Ucrania se considera un factor que frena los planes del Green Deal para lograr la neutralidad climática y contener la pérdida de biodiversidad. Además, la UE es pionera en su Propuesta de Reglamento sobre Restauración de la Naturaleza (PRRN), y se dio cuenta de que las ambiciones de la COP-15 en materia de biodiversidad se ratificaron en la Conferencia. La UE establece normas internacionales de sostenibilidad, siendo una norm shaper en lo relativo al medio ambiente.

Palavras-chave:
biodiversidad; norm shaper; Pacto Ecológico Europeo; Unión Europea

Introdução

Diante da atual emergência climática e de tantos outros problemas oriundos da nova Era do Antropoceno, a União Europeia (UE) tem despontado como uma influenciadora mundial de decisões, uma norm shaper, tanto no seio da União quanto no cenário internacional. Trata-se de um fenômeno que se repete nas mais diversas áreas, como o comércio internacional, porém ganha especial destaque na seara ambiental com seus desafios transfronteiriços.

Desde 2019, com o lançamento de seu Pacto Ecológico Europeu (PEE), a UE, que já era protagonista no palco das negociações quanto ao meio ambiente, passou a estar um passo à frente das demais nações, tendo em vista as ambiciosas metas a que se propôs com esse plano de crescimento sustentável que é o Pacto.

Com os holofotes voltados para seus próximos movimentos, a UE passa a ser uma regulamentadora assídua de conflitos que envolvem o meio ambiente, emanando comunicações, regulamentos e diretivas, a fim de amarrar seus objetivos de maneira mais contundente, influenciando, em face de sua proatividade, outras nações a fazerem o mesmo, ou, então, exigindo certos padrões de sustentabilidade a serem aplicados por esses países, em uma sutil exigência de mudanças de comportamentos.

A problemática da perda da biodiversidade tem um papel fundamental nesta pesquisa, pois trata-se de uma grave consequência das atitudes humanas no Antropoceno. As mudanças climáticas, fruto dessas causas antropogênicas, são catalizadoras de uma extinção em massa, e, sem a vida, sem o papel essencial de cada espécie para o bom funcionamento ecossistêmico, não sobreviverão os ecossistemas. Sem estes, perde-se a vida. A parte influencia o todo, e o todo, a parte, em uma cadeia cíclica.

Com isso em mente, esta pesquisa parte do questionamento de quais são as contribuições e as possíveis influências da UE na preservação ambiental, sobretudo na proteção da biodiversidade, levando em consideração o contexto do PEE. Em um primeiro momento, focar-se-á o que tem sido emanado no âmbito do PEE, avaliando alguns programas, documentos e financiamentos criados para atender aos objetivos do Green Deal. Na sequência, apreciam-se prováveis influências da UE nas tratativas do novo acordo global para a biodiversidade, elaborado em Montreal durante a Conferência das Partes (COP) 15 da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB). A influência da UE na tomada de decisões em nível internacional e seu papel como norm shaper das negociações sobre a biodiversidade serão objeto de análise na segunda parte deste artigo.

A metodologia utilizada é qualitativa, dedutiva e descritiva, por meio da técnica de análise bibliográfica e documental.

1 As possíveis contribuições do Pacto Ecológico Europeu numa mudança sistêmica para a sustentabilidade da biodiversidade global

Ressalte-se que, nos últimos anos, a Comissão Europeia (CE), órgão executivo da UE, tem alterado um pouco seu papel de gestora administrativa para atuar cada vez mais na política. A arquitetura institucional gerada pelo processo de formação da UE propiciou amplas negociações intergovernamentais, as quais criaram um grau de autoridade política além dos Estados Nacionais sem precedentes, sendo este um indício de sua influência como norm shaper ( ZÜRN, 2018ZÜRN, M. The politicization of authority beyond the Nation State. In: ZÜRN, M. A theory of global governance: authority, legitimacy and contestation. Oxford: Oxford University Press, 2018. p. 137-169.). Há relatos de que a Comissão tem sido uma policy shaper por vigilância, pois, ao ter de pedir, por meio de uma forma soft, aos Estados-membros que estes elaborem normas com certa periodicidade, percebe-se que a CE acaba usando elementos os quais se tem chamado de harder soft governance ( KNODT; RINGEL, 2018KNODT, M.; RINGEL, M. The European Commission as a policy shaper-harder soft governance in the Energy Union. In: EGE, J.; BAUER, M. W.; BECKER, S. (ed.). The European Commission in turbulent times. Baden-Baden: Nomos Verlagsgesellschaft mbH, 2018. p. 181-206.).

A atuação competitiva da UE aliada a sua capacidade de inovação e ao poderio militar de seus Estados-membros possibilita um protagonismo em diversas dimensões, tais como a econômica e a ambiental, destacando-se o contexto regulatório. Com as regulamentações emanadas pela UE, criam-se padrões de referência internacional, utilizados nas relações entre entes públicos e privados, interna e externamente. Logo, a CE tem demonstrado um papel ativo na condução da regulamentação de normas, assumindo, assim, competências que ficavam normalmente sob responsabilidade dos Estados-membros. Isso pode ser percebido na política comercial, no combate às mudanças climáticas e na proteção do meio ambiente. Além disso, saliente-se o peso político do Conselho e do Parlamento Europeu, bem como da sociedade civil, em decisões sobre matérias que sejam comuns a todos os países envolvidos ( VARGAS, 2019VARGAS, E. V. Uma reflexão brasileira sobre a União Europeia. In: TOMAZINI, R. C.; ALBERGARIA, F.; BARROS-PLATIAU, A. F. (coord.). Relações internacionais da União Europeia: agendas e parcerias. Curitiba: Juruá, 2019. p. 11-26.).

O regime da Organização das Nações Unidas (ONU) tem sido crucial para a proeminência da UE como uma norm shaper global, sendo de conhecimento geral que a UE tem defendido o sistema da ONU e, por meio de alguns programas “onusianos”, como o dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), demonstra sua aptidão em inspirar novos comportamentos na ordem global, com destaque para temas como a mudança do clima e o desenvolvimento sustentável ( VARGAS, 2019VARGAS, E. V. Uma reflexão brasileira sobre a União Europeia. In: TOMAZINI, R. C.; ALBERGARIA, F.; BARROS-PLATIAU, A. F. (coord.). Relações internacionais da União Europeia: agendas e parcerias. Curitiba: Juruá, 2019. p. 11-26.).

É justamente na conjuntura da sustentabilidade que a UE tem ganhado cada vez mais espaço de influência política no cenário internacional. Com o lançamento, em 2019, de seu Pacto Ecológico Europeu – PEE ( COMISSÃO EUROPEIA, 2019COMISSÃO EUROPEIA. Comunicação da Comissão Europeia ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu, ao Comitê Econômico e Social Europeu e ao Comitê das Regiões. Pacto Ecológico Europeu. Bruxelas, 2019. Disponível em: https://eurlex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:b828d165-1c22-11ea-8c1f-01aa75ed71a1.0008.02/DOC_1&format=PDF. Acesso em: 13 set. 2023.
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), e sendo este uma das prioridades da presidência da CE, a UE tem mantido uma ambiciosa agenda ambiental voltada para uma mudança sistêmica, disseminando inúmeras iniciativas rumo à mitigação da crise climática e da perda da biodiversidade por meio de diversos órgãos e instituições. Desde então, os formuladores de políticas públicas mantêm-se ocupados tentando concretizar os compromissos emanados no Green Deal. Atualmente, estão colocadas várias estratégias e normas, como o marco da Lei Europeia do Clima, a Estratégia de Biodiversidade para 2030 ( COMISSÃO EUROPEIA, 2020COMISSÃO EUROPEIA. Comunicação da Comissão Europeia ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu, ao Comitê Econômico e Social Europeu e ao Comitê das Regiões. Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030: trazer a natureza de volta às nossas vidas. Bruxelas, 2020. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:a3c806a6-9ab3-11ea-9d2d-01aa75ed71a1.0011.02/DOC_1&format=PDF. Acesso em: 13 set. 2023.
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), o Programa Think 2030 ( IEEP, 2023IEEP – INSTITUTE FOR EUROPEAN ENVIRONMENTAL POLICY. Think 2030: science-policy solutions for a more sustainable Europe. Disponível em: https://ieep.eu/overview-think2030/. Acesso em: 14 set. 2023.
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), o pacote Fit for 55 ( EUROPEAN UNION, 2023EUROPEAN UNION. European Council. Fit for 55. Brussels, 25 jul. 2023. Disponível em: https://www.consilium.europa.eu/en/policies/green-deal/fit-for-55-the-eu-plan-for-a-green-transition/. Acesso em: 14 set. 2023.
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) – uma coleção de propostas de políticas destinadas a alinhar a agenda climática da UE com o objetivo de reduzir as emissões de GEE em pelo menos 55% até 2030. Além disso, medidas para proteger a biodiversidade e restaurar ecossistemas foram elaboradas pela CE na Proposta de Regulamento de Restauração da Natureza – PRRN ( EUROPEAN COMMISSION, 2022bEUROPEAN COMMISSION. Proposal for a regulation of the European Parliament and of the Council on nature restoration. Brussels, 2022b. Disponível em https://environment.ec.europa.eu/publications/nature-restoration-law_en. Acesso em: 14 set. 2023.
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) em junho, primeira de seu tipo nessa escala ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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).

As últimas duas décadas apresentaram a UE como líder indiscutível na política ambiental internacional. Percebe-se que houve uma mudança dos EUA como líder global ambiental nas décadas de 1970 e 1980 para um Estado obstrucionista na década de 1990, mas a emergente liderança europeia não se deu apenas por inércia dos EUA ou de outros países. Assim, nos anos 2000, a UE passou a figurar como nova liderança mundial da agenda ambiental ( KELEMEN, 2009KELEMEN, R. D. Globalizing European Union Environmental Policy. Journal of European Public Policy, v. 17, n. 3, p. 335-349, 2009. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/228974626_Globalizing_European_Union_Environmental_Policy. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

A partir disso, a UE começou a destacar a importância cada vez maior da relação entre suas políticas internas e externas, sendo que a atuação na política local gerou naturalmente uma maior atividade externa ( EUROPEAN COMMISSION, 2006EUROPEAN COMMISSION. Europe in the world — some practical proposals for greater coherence, effectiveness and visibility. Brussels, 8 jun. 2006. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/ALL/?uri=COM:2006:0278:FIN. Acesso em: 14 set. 2023.
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). Atualmente, essa é uma abordagem estratégica da UE e sua base legal pode ser vista na Parte 3 do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia – TFUE ( UNIÃO EUROPEIA, 2016UNIÃO EUROPEIA. Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. Jornal Oficial da União Europeia, v. 7, 2016. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/resource.html?uri=cellar:9e8d52e1-2c70-11e6-b497-01aa75ed71a1.0019.01/DOC_3&format=PDF. Acesso em: 14 set. 2023.
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). Com base nessas disposições e na jurisdição do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), a UE acrescentou competências externas em alçadas que antes eram internas ( COSTA, 2020COSTA, O. A União Europeia e sua política externa: história, instituições e tomada de decisão. Brasília, DF: Cidade Gráfica, 2020.), e isso tem refletido em políticas como o PEE.

Os esforços da UE para “globalizar” a regulamentação ambiental surgiram como resultado da combinação de efeitos da política doméstica e da concorrência reguladora internacional. Foi no interesse competitivo da UE em dar suporte a acordos internacionais que se gerou a pressão para que outras jurisdições adotassem os mesmos regulamentos ambientais que a UE. Ao promover tratados que difundiram internacionalmente as normas ambientais da UE, esta acabou também por legitimar suas regras, além de protegê-las contra questionamentos legais perante órgãos mundiais ( KELEMEN, 2009KELEMEN, R. D. Globalizing European Union Environmental Policy. Journal of European Public Policy, v. 17, n. 3, p. 335-349, 2009. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/228974626_Globalizing_European_Union_Environmental_Policy. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

O PEE é uma estratégia de crescimento mais sustentável de longo prazo da UE, e conta com uma gama de temáticas e iniciativas entre os mais variados escopos e cujo alcance é mundial, já que, em muitos casos, as normas emanadas refletem no comportamento de outras nações. Dentro das limitações de um artigo científico, trata-se de analisar apenas algumas das atividades mais recentes referentes à proteção da biodiversidade no contexto do Green Deal.

Em face do PEE e de sua meta de neutralidade climática até 2050, a UE aumentou sua credibilidade ao poder falar de maneira uníssona no cenário internacional e, assim, exercer uma liderança climática, tornando-se protagonista do Acordo de Paris. A UE estabeleceu sua liderança na diplomacia ambiental e climática, pressionando, por meio de uma harder soft governance, por padrões ambiciosos de proteção interna e externa, e impactando empresas com suas políticas ambientais. De fato, os objetivos ambientais, dada a natureza transnacional de suas problemáticas, foram integrados a outras políticas externas da UE e a outras estruturas de cooperação. Diante do desafio das mudanças climáticas (desmatamento, perda de biodiversidade, destruição da camada de ozônio, aumento do nível do mar etc.), a UE desenvolveu, nas últimas duas décadas, “o regime regional de proteção ambiental mais abrangente do mundo” ( COSTA, 2020, p. 214–215COSTA, O. A União Europeia e sua política externa: história, instituições e tomada de decisão. Brasília, DF: Cidade Gráfica, 2020.). Ao negociar acordos com países terceiros, as cláusulas ambientais são incorporadas a esses outros países na tentativa de se aproximarem da UE e de aumentarem o grau de cooperação.

Quanto aos escopos do PEE, notou-se que apenas recentemente a CE passou a monitorar o progresso dos objetivos de 2030 e das metas ambientais e climáticas para 2050, abrangendo um conjunto de 26 indicadores principais, incluindo índices sobre mitigação e adaptação das mudanças climáticas, da biodiversidade e da economia circular. Enquanto o primeiro relatório desse tipo só deve ser entregue em 2024, essa estrutura de monitoramento preenche a lacuna existente, obrigando a CE a um esclarecimento sobre os avanços quanto aos objetivos do Pacto Verde ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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). A fidúcia da UE depende de um controle eficaz do que tem sido feito no âmbito do Pacto, pois, caso contrário, esvaziam-se suas propostas e sua boa governança em nível global.

Um exemplo de iniciativa que torna a Europa uma proeminente norm shaper é o Programa Think 2030, uma plataforma multistakeholder que prepara ideias e soluções científicas e em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para uma execução consistente do PEE. Lançado em 2018, trata-se de um programa vinculado ao Institute for European Environmental Policy (IEEP), envolvendo especialistas europeus em políticas de think vtanks, sociedade civil, setores privado e público, concentrando-se na produção de recomendações políticas pertinentes, a fim de encontrar respostas para uma Europa mais sustentável. A plataforma se reúne a cada dois anos para uma conferência de alto nível, a qual geralmente ocorre no país da presidência rotativa do Conselho da UE, com o apoio do membro Think Sustainable Europe baseado naquele país ( IEEP, 2023IEEP – INSTITUTE FOR EUROPEAN ENVIRONMENTAL POLICY. Think 2030: science-policy solutions for a more sustainable Europe. Disponível em: https://ieep.eu/overview-think2030/. Acesso em: 14 set. 2023.
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). O fato de estabelecer recomendações políticas torna esse programa um típico exemplo de como a UE tem disseminado suas ideias mundo afora, seja oficialmente, por intermédio de representantes dos governos, seja extraoficialmente, por meio de atitudes como essa.

O referido programa divulgou recentemente um de seus produtos, o European Green Deal Barometer ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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), o qual identifica barreiras e oportunidades para a implementação do PEE, analisando as negociações em andamento no processo legislativo, bem como o impacto da guerra na Ucrânia e o aumento do preço da energia, projetando um retrato de como está o PEE. Durante a pesquisa, ficou evidente a riqueza de detalhes trazida pelo Barômetro do PEE, o qual passa a ser analisado a seguir.

1.1 O Barômetro do Pacto Ecológico Europeu: a UE tem segurado as pressões dos compromissos que assumiu?

O Barômetro do PEE costuma ser elaborado por mais de 300 especialistas em sustentabilidade, os quais se manifestam sobre as barreiras e oportunidades para implementação do PEE, o que é complementado com o monitoramento existente em torno de diversas áreas. Nele, a CE acompanha os principais indicadores de progresso das metas ambientais e climáticas do Green Deal. Alinhados com o monitoramento, os resultados identificados podem ajudar na formulação das políticas adequadas para ações mais efetivas, tornando o Barômetro um documento base para a tomada de decisões de gestão pública interna e de política externa ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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). Por isso, a relevância em investigar o que há no Barômetro, uma vez que o objetivo é analisar de que maneiras o PEE contribui para a UE ser uma norm shaper global.

Constatou-se que a difusão do conhecimento acerca do PEE é imprescindível para que haja a participação da sociedade civil no controle dos compromissos assumidos em torno do PEE. Ter uma forte rede de partes interessadas e defender a agenda do Green Deal é fundamental para sua implementação. Nas duas edições do Barômetro, foi identificada uma consistente falta de compromisso por parte dos Estados-membros, sendo isto o maior obstáculo à implementação do Pacto. Relata-se que, durante a realização de pesquisas para a elaboração do Barômetro, houve uma dificuldade de acesso aos peritos nacionais, o que, por si só, já demonstra certa falta de interesse na colaboração quanto ao Green Deal ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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). Um obstáculo à efetivação do Pacto é também uma dificuldade para a estratégia de a UE ser uma liderança em termos de sustentabilidade.

O Barômetro mostra que especialistas em sustentabilidade estão perdendo a confiança na capacidade das instituições da UE para a implementação do Green Deal até 2024 e para a redução das emissões de GEE em pelo menos 55% até 2030. O Parlamento Europeu e o Conselho da UE estão tentando chegar a um acordo sobre uma infinidade de propostas e traduzir o Green Deal em um conjunto concreto de leis. Entretanto, constatou-se que há regressão em cada uma das áreas temáticas do PEE entre os pontos ótimos divulgados pela ciência ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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).

A partir do momento em que o programa se propõe a sugestionar políticas relacionadas ao PEE, gera-se uma expectativa de ação para os Estados receptores de normas e documentos, os norm takers, criando, assim, um ciclo de influência no qual a UE, como parte emanadora das normativas, mantém-se em posição de vantagem, podendo estabelecer critérios, valores e princípios a serem seguidos pelos demais envolvidos nesse processo de troca.

Ademais, o referido Barômetro traz uma seção específica quanto à restauração dos ecossistemas da UE por meio da implementação da Proposta de Regulamento sobre Restauração da Natureza (PRRN), trazendo como resultado nenhum progresso ou um progresso limitado com relação às metas e aos compromissos da Estratégia de Biodiversidade para 2030 (Ebio). Espera-se que os dispositivos da Proposta sejam efetivamente aplicados, impedindo uma degradação ainda maior dos ecossistemas. Para tanto, é necessário governança adequada da biodiversidade, uma vez que a restauração da natureza proporciona outros benefícios e a realização de muitos objetivos políticos da UE. Então, os Estados-membros devem assegurar o envolvimento de todas as partes interessadas relevantes para os planos de restauração nacionais, além da participação cidadã. A nova Lei de Restauração da Natureza deve ser redigida de modo a permitir que a Comissão e o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) possam desencadear ações judiciais contra os Estados-membros que não cumpram suas obrigações. Portanto, a nova Lei deve estabelecer metas mensuráveis, a fim de que os Estados-membros especifiquem como a conformidade será verificada ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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).

Além disso, os Estados-membros devem procurar desenvolver um trabalho técnico em conjunto com a CE para uma implementação de sucesso do novo Regulamento, estabelecendo métodos comuns de avaliação das condições dos habitats, especialmente os que não estão abrangidos pela Directiva Habitats ( UNIÃO EUROPEIA, 1992UNIÃO EUROPEIA. Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de maio de 1992. Relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens. UE, 1992. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:01992L0043-20130701&from=EN. Acesso em: 14 set. 2023.
https://eur-lex.europa.eu/legal-content/...
), de modo a atingir alvos quantitativos de restauração até 2030 e alcançar o objetivo de restabelecer todos os ecossistemas da UE em necessidade de reparação até 2050 ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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).

O que se entende é uma constante tentativa de a UE desenvolver um poder civil e normativo no cenário mundial, promovendo medidas multilaterais destinadas a salvaguardar uma extensa gama de normas, o que inclui normas ambientais. Em vez de permitir que a política ambiental fosse conduzida pelas pressões do processo natural de globalização, a UE, estrategicamente, implementou critérios destinados a propagar seus padrões de sustentabilidade em outras jurisdições. A liderança da UE na governança ambiental global foi proveniente de múltiplos fatores, entre os quais as reformas legais e políticas e o compromisso da UE em uma política econômica externa comum, o que capacitou a UE para uma coerência na agenda ambiental, que, por sua própria natureza, exige soluções multilaterais. Além disso, o comportamento insustentável dos EUA também facilitou o destaque europeu ( KELEMEN, 2009KELEMEN, R. D. Globalizing European Union Environmental Policy. Journal of European Public Policy, v. 17, n. 3, p. 335-349, 2009. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/228974626_Globalizing_European_Union_Environmental_Policy. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

1.2 A Invasão da Ucrânia como atraso aos objetivos europeus

Há que se destacar um elemento de desaceleração de todos os objetivos europeus: a invasão da Ucrânia pela Rússia. Todo período de guerra é um momento de instabilidade política, e isso atrasa as tomadas de decisão. O evento “ Russia’s war in Ukraine: Why doubling down on the Green Deal is the best strategy”, organizado durante a Semana Verde da UE, analisou o impacto da guerra na Ucrânia na implementação do Pacto Ecológico Europeu (PEE). Levando em consideração o último relatório de avaliação do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), se o mundo não tomar medidas para reduzir as emissões de GEE, será inevitável ultrapassar 1,5 °C de aquecimento global. Com a UE começando a sentir as consequências da guerra na Ucrânia, espera-se que o bloco redobre os esforços quanto aos objetivos do PEE. Apesar desse imprevisto, acredita-se que o PEE é a resposta à crise ambiental e o caminho a ser seguido pela UE a fim de acelerar uma transição verde sistêmica e ajudar a limitar o aquecimento global em 1,5 °C. Entretanto, torna-se imperativo que os governos não se limitem a soluções de curto prazo que dificultem a mudança no longo prazo, além de uma vigilância das nações estrangeiras quanto aos compromissos ambientais assumidos pela UE ( IEEP 2022IEEP – INSTITUTE FOR EUROPEAN ENVIRONMENTAL POLICY. Russia’s war in Ukraine: why doubling down on the Green Deal is the best strategy. IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/news/event-russias-war-in-ukraine-why-doubling-down-on-the-green-deal-is-the-best-strategy/. Acesso em: 14 set. 2023.
https://ieep.eu/news/event-russias-war-i...
).

Foi visto que a Comissão apresentou um número impressionante de propostas desde o início do Green Deal, o que mostra que sua agenda verde sobreviveu à pandemia do Covid-19, sendo a guerra na Ucrânia seu segundo teste de resiliência. A guerra deve mudar os caminhos a serem seguidos em algumas áreas do Pacto, tendo em vista que os tomadores de decisão devem pensar em novas respostas de longo prazo. Permanece a tarefa desafiadora de manter metas ambiciosas para 2030 e 2050, em contraste à disparada dos preços pela inflação geral. Resta cerca de dois anos até chegarem os próximos mandatos na Comissão Europeia e no Parlamento, cabendo, principalmente, ao Parlamento e ao Conselho manterem o alto nível das metas do Pacto ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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). Percebe-se que toda a temática envolve política e diplomacia, logo, fica a ressalva de que muitos pontos tratados podem ser relativizados a partir de novas conjunturas políticas.

1.3 A Europa como norm shaper por meio de financiamentos

A proteção ambiental na Europa, além de depender da boa vontade política, depende, sem dúvida, de uma boa gestão das finanças e de ajuda financeira externa. Um financiamento adequado e seguro é pré-requisito para uma implementação bem-sucedida do Regulamento vindouro sobre restauração da natureza. Os Estados-membros devem valer-se de todas as oportunidades disponíveis para financiar ações de restauração por meio dos fundos da UE e no período de programação financeira ( CASERT; BAS-DESFOSSEZ, 2022CASERT, C.; BAS-DESFOSSEZ, F. European Green Deal barometer. 2. ed. Brussels: IEEP, 2022. Disponível em: https://ieep.eu/wp-content/uploads/2022/11/IEEP-Barometer-2022.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
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).

Além disso, a International Fund for Animal Welfare (IFAW) e outras organizações conservacionistas, como Wildlife Conservation Society, Conservation International, Birdlife International, Wetlands International, The Nature Conservancy, entre outras, escreveram uma carta aberta ao vice-presidente executivo da UE pedindo que a UE liderasse as negociações do acordo sobre uma forte meta financeira global no apoio à biodiversidade. Essas organizações expressaram o apoio à abordagem que a UE adotou durante as últimas décadas para lutar contra a degradação ambiental e contra a perda da biodiversidade em âmbito global. Verificou-se que os investimentos realizados resultaram em importantes benefícios para as comunidades locais, criando empregos e oportunidades econômicas, especialmente para as mulheres e para os jovens. A iniciativa dessas entidades internacionais demonstra como a abordagem da UE tem sido influente sob a égide do Pacto Ecológico. A Ebio, ponto fundamental do PEE, foi um divisor de águas no enfrentamento da crise da biodiversidade. No entanto, a estratégia permanece muito genérica e vaga com relação à implementação de ações efetivas para a conservação das espécies, o que é alarmante em face à urgência que a crise demanda, particularmente no Sul global, onde o bem-estar econômico e social e a resiliência das comunidades estão diretamente ligados à saúde do ecossistema. É preciso tratar da problemática ambiental de maneira holística, para que os esforços da UE não sejam em vão ( IFAW, 2020IFAW – INTERNATIONAL FUND FOR ANIMAL WELFARE. EU Global Leadership on Biodiversity Finance. Brussels: IFAW, 2020. Disponível em: https://www.ifaw.org/international/resources/eu-global-leadership-on-biodiversity-finance. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

O papel da UE no financiamento da biodiversidade é particularmente importante neste momento e, recentemente, ganhou fôlego na COP-15 da CDB, que trouxe metas globais para a biodiversidade e tratou das finanças relacionadas, em especial, sobre o alinhamento dos fluxos financeiros às demandas da natureza, além da promoção de investimentos sustentáveis ( UN, 2023aUN – UNITED NATIONS. UN Environment Programme. UN Biodiversity Conference (COP-15). 2023a. Disponível em: https://www.unep.org/un-biodiversity-conference-cop-15. Acesso em: 14 set. 2023.
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). As finanças estiveram no centro das discussões da COP-15, tendo o setor financeiro desempenhado importante papel nas negociações, com destaque para a quantidade de dinheiro que os países desenvolvidos devem enviar aos países em desenvolvimento para lidar com a perda de biodiversidade. Foi solicitado que o Global Environment Facility criasse um fundo fiduciário especial – o Global Biodiversity Framework Fund (GBFF) – a fim de garantir um fluxo de fundos adequado ( UN, 2023bUN – UNITED NATIONS. UN Environment Programme. COP15 ends with landmark biodiversity agreement. 20 dez. 2023b. Disponível em: https://www.unep.org/news-and-stories/story/cop15-ends-landmark-biodiversity-agreement. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

Portanto, percebe-se que a UE, em seu desempenho como norm shaper, é uma facilitadora de uma forte meta financeira de apoio global à biodiversidade. Acredita-se que uma meta razoável para a UE seria de 10% para a biodiversidade sob o novo Neighbourhood, Development and International Cooperation Instrument (NDICI), sendo que tal percentagem estaria de acordo com pedido do Parlamento Europeu para que 15% dos fundos do NDICI sejam dedicados ao meio ambiente, à biodiversidade e à luta contra desertificação ( IFAW, 2020IFAW – INTERNATIONAL FUND FOR ANIMAL WELFARE. EU Global Leadership on Biodiversity Finance. Brussels: IFAW, 2020. Disponível em: https://www.ifaw.org/international/resources/eu-global-leadership-on-biodiversity-finance. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

Antes mesmo da COP-15, novas iniciativas haviam sido anunciadas no evento “Countdown to CBD COP15: Landmark Leaders Event for a Nature Positive World”, organizado pela High Ambition Coalition for Nature and People (HAC N&P), e incluíam: € 0,87 bilhão de um novo financiamento vindo do governo alemão; um plano com 10 pontos para financiar a biodiversidade, endossado, inicialmente, por 16 países, incluindo a UE; e a próxima fase da HAC N&P, apoiando a proteção de pelo menos 30% da terra e do oceano globalmente. O evento também contou com o endosso do Leaders Pledge for Nature (compromisso dos líderes pela natureza, em tradução livre), que reflete um compromisso internacional de conter a perda da biodiversidade até 2030 e aborda a emergência planetária ( EUROPEAN COMMISSION, 2022cEUROPEAN COMMISSION. Countdown to COP15: world leaders declare ambitious global agreement to protect biodiversity a priority. Brussels, 2022c. Disponível em: https://environment.ec.europa.eu/news/countdown-cop15-world-leaders-declare-ambitious-global-agreement-protect-biodiversity-priority-2022-09-21_en. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

Além de quatro objetivos mais abrangentes, o GBF também apresenta 23 metas a serem alcançadas até 2030, incluindo os objetivos financeiros de: eliminar gradualmente ou reformar os subsídios que prejudicam a biodiversidade em, pelo menos, US$ 500 bilhões por ano, e, ao mesmo tempo, aumentar os incentivos positivos para a conservação e o uso sustentável da biodiversidade; mobilizar, no mínimo, US$ 200 bilhões por ano provindos de fontes públicas e privadas para financiamentos relacionados à biodiversidade; aumentar os fluxos financeiros internacionais de países desenvolvidos para países em desenvolvimento para, pelo menos, US$ 30 bilhões por ano; exigir que empresas transnacionais e instituições financeiras monitorem, avaliem e divulguem de maneira transparente os riscos e os impactos sobre a biodiversidade por meio de suas operações, portfólios, suprimentos e cadeias de valor ( UN, 2023bUN – UNITED NATIONS. UN Environment Programme. COP15 ends with landmark biodiversity agreement. 20 dez. 2023b. Disponível em: https://www.unep.org/news-and-stories/story/cop15-ends-landmark-biodiversity-agreement. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

O financiamento é um dos pontos mais relevantes no novo acordo global para a biodiversidade, e este trouxe propostas para aumentar o envio de verbas para países em desenvolvimento – o que, outrora, fora ponto de discórdia nas negociações ( UN, 2023bUN – UNITED NATIONS. UN Environment Programme. COP15 ends with landmark biodiversity agreement. 20 dez. 2023b. Disponível em: https://www.unep.org/news-and-stories/story/cop15-ends-landmark-biodiversity-agreement. Acesso em: 14 set. 2023.
https://www.unep.org/news-and-stories/st...
). O poder econômico é um vetor de influência dos países europeus nesta e em outras temáticas, pois os países para quem a Europa envia verbas de financiamento se tornam seus aliados políticos e ficam dentro do espectro de controle europeu. Nesse sentido, é importante analisar, além da questão do financiamento, em quais outros pontos relevantes a UE lidera nos avanços quanto à proteção da biodiversidade.

2 As possibilidades de influência da UE nas negociações sobre a biodiversidade na COP-15

A manutenção do multilateralismo sempre foi uma prioridade da UE, que tem tomado para si a responsabilidade de criar um sistema multilateral dentro de um ambiente complexo, com a idealização de uma governança global de maneira cooperativa. Pensa-se que isso pode ser um reflexo de decisões democráticas, transparentes e inclusivas tomadas pela UE, no intuito de conseguir resoluções sustentáveis. A partir desse raciocínio, percebe-se a importância de haver incentivo nas parcerias, a fim de obter conformidade, harmonia e estabilidade nas decisões coletivas ( COSTA, 2020COSTA, O. A União Europeia e sua política externa: história, instituições e tomada de decisão. Brasília, DF: Cidade Gráfica, 2020.). Essa estratégia europeia pode ser constatada em suas tratativas internacionais, porém, aqui se buscou analisar seus movimentos em torno da COP-15 da CDB, a maior conferência sobre biodiversidade em uma década.

No já citado evento organizado pela HAC N&P, ocorrido antes da conferência mundial, a UE reforçou sua intenção de aumentar os esforços para estabelecer um acordo global ambicioso na COP-15 da Biodiversidade, a fim de reverter a perda massiva das espécies. Nessa circunstância estavam presentes presidentes e primeiros-ministros, bem como líderes de comunidades indígenas, ONGs, líderes financeiros e representantes da sociedade civil, todos tentando pressionar as autoridades responsáveis a adotarem medidas que sejam efetivas na proteção das espécies e na consequente mitigação das mudanças climáticas. Desde que o novo acordo global para a biodiversidade começou a entrar na pauta das discussões internacionais, já se percebeu a necessidade de adotar um acordo global ousado, que, de fato, contribuísse para a manutenção dos ecossistemas, com metas e objetivos mensuráveis, um sistema de monitoramento justo e um amplo financiamento advindo de várias fontes. Na oportunidade, as declarações da presidente da CE, Ursula von der Leyen, mostraram que a Europa estava pronta para avançar nas negociações de maneira ambiciosa. Contudo, as ações advindas do novo pacto devem ser tomadas em conjunto pelos países, e todos devem fazer o que tem de ser feito imediata e urgentemente. A Comissão Europeia, seja por meio de suas ações e iniciativas, seja por meio de suas declarações e compromissos, dá exemplos de sua intenção em reverter a perda da biodiversidade, mostrando-se uma verdadeira influenciadora de decisões e normas, ou seja, uma norm shaper ( EUROPEAN COMMISSION, 2022cEUROPEAN COMMISSION. Countdown to COP15: world leaders declare ambitious global agreement to protect biodiversity a priority. Brussels, 2022c. Disponível em: https://environment.ec.europa.eu/news/countdown-cop15-world-leaders-declare-ambitious-global-agreement-protect-biodiversity-priority-2022-09-21_en. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

No contexto do PEE, constatou-se que como parte da Ebio, a CE, o Parlamento Europeu e os Estados-membros estão comprometidos em firmar um elevado nível de ambição da UE e em motivar empenhos mundiais em prol da sustentabilidade. A UE mostra-se líder no âmbito do novo quadro global pós-2020, devendo determinar, inclusive, ações externas para divulgar e proporcionar o que ambiciona. Para garantir essa liderança europeia no cenário internacional da biodiversidade, a CE planejou diversas ações, tais como: uma proposta para endurecer ainda mais as regras do comércio de marfim na UE; a negociação de acordo ambicioso sobre a diversidade biológica marinha de áreas além da jurisdição nacional e em três vastas Áreas Marinhas Protegidas no Oceano Antártico a partir de 2020; a avaliação do impacto dos acordos comerciais na biodiversidade, com acompanhamento quando necessário; medidas para evitar ou minimizar a colocação de produtos associados à desflorestação ou à degradação florestal no mercado da UE; a revisão do Plano de Ação da UE contra o Tráfico de Vida Selvagem; a iniciativa NaturAfrica, que visa proteger a vida selvagem e os principais ecossistemas; e uma ambiciosa e firme negociação no acordo de biodiversidade da 15ª COP da Convenção sobre Diversidade Biológica. Quanto a esta última programação, percebe-se que a participação firme e ambiciosa da UE na COP-15, de fato, ocorreu ( EUROPEAN COMMISSION, 2021UNIÃO EUROPEIA. Regulamento (UE) 2021/1119 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de junho de 2021. Cria o regime para alcançar a neutralidade climática e altera os Regulamentos (CE) n. 401/2009 e (UE) 2018/1999 (Lei europeia em matéria de clima). UE, 2021. Disponível em: https://eur-lex.europa.eu/PT/legal-content/summary/european-climate-law.html. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

Ainda sobre as cartas que a UE levou para a mesa de negociações da COP-15, sabe-se que o que está em jogo é a própria vida na Terra como a conhecemos. Trata-se de salvar os sistemas de suporte à vida, tendo em vista que somente com uma biodiversidade sadia é que se tem saúde para as pessoas e segurança alimentar e hídrica, além do fato de as espécies serem colaboradoras no combate às alterações climáticas. A CE estabeleceu como objetivo geral da UE na COP-15 que todas as partes concordassem com uma estrutura de biodiversidade ambiciosa para interromper a perda das espécies, estabelecendo que a UE defende metas e objetivos mensuráveis para proteger pelo menos 30% da terra e dos oceanos até 2030; a restauração de 3 bilhões de hectares de terra e oceanos; o enfrentamento das extinções de espécies causadas por humanos; a agricultura, a silvicultura e a pesca sustentáveis; o combate aos fatores de perda de biodiversidade, como pesticidas, espécies exóticas invasoras e plásticos; o fortalecimento dos vínculos entre biodiversidade e ação climática, com soluções baseadas na natureza. Tais metas necessitam de monitoramento e revisão, bem como ampliação do financiamento de todas as fontes – públicas e privadas, domésticas e internacionais ( EUROPEAN COMMISSION, 2022aEUROPEAN COMMISSION. Nature and Biodiversity. EU at COP-15 global biodiversity conference. Brussels, 2022a. Disponível em: https://environment.ec.europa.eu/topics/nature-and-biodiversity/eu-cop15-global-biodiversity-conference_en. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

Pode-se dizer que a UE foi bem-sucedida ao alcançar seus objetivos nas negociações da COP-15, tendo em vista que o novo acordo global estabelece quatro metas globais abrangentes para proteger a natureza, quais sejam: interromper a extinção de espécies induzida pelo ser humano e reduzir a taxa de extinção de todas as espécies em dez vezes até 2050; uso sustentável e gestão da biodiversidade para garantir que as contribuições da natureza para as pessoas sejam valorizadas, mantidas e aprimoradas; repartição justa dos benefícios da utilização dos recursos genéticos e informação sequencial digital destes; e que meios adequados de implementação do GBF sejam acessíveis a todas as partes, particularmente aos países menos desenvolvidos e aos pequenos Estados insulares em desenvolvimento ( UN, 2023bUN – UNITED NATIONS. UN Environment Programme. COP15 ends with landmark biodiversity agreement. 20 dez. 2023b. Disponível em: https://www.unep.org/news-and-stories/story/cop15-ends-landmark-biodiversity-agreement. Acesso em: 14 set. 2023.
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). Tais metas encontram-se alinhadas aos objetivos de proteção ambiental da Europa, principalmente ao PEE.

Observa-se, portanto, que a UE tem sido uma boa influência internacional por meio de exemplos de iniciativas voltadas à proteção da biodiversidade. No âmbito da Ebio, vê-se que a UE estabeleceu metas em harmonia com o que ficou estabelecido no novo acordo global, por exemplo: plantar 3 bilhões de árvores adicionais; reduzir o uso de pesticidas em 50%; desbloquear pelo menos € 20 bilhões por ano para a biodiversidade; tornar orgânicas 25% das terras agrícolas da UE. Além disso, há o compromisso de proteger: 1.700 espécies animais e vegetais ameaçadas; 200 tipos de habitats; 18% das terras da UE; 9% dos mares da UE, no âmbito da Natura 2000; 30% de todas as terras e mares até 2030. Ademais, a UE vai duplicar seu financiamento externo para a biodiversidade, além de apoiar mais de 145 parques naturais e áreas protegidas em África e auxiliar na realização de 8.000 km da Grande Muralha Verde em toda a África para combater a desertificação e a degradação dos ecossistemas. Tudo isso é visto positivamente pela comunidade internacional, e as citadas iniciativas acabam influenciando outras semelhantes no mundo, colocando a Europa como um centro de irradiação normativa de proteção ambiental ( EUROPEAN COMMISSION, 2022aEUROPEAN COMMISSION. Nature and Biodiversity. EU at COP-15 global biodiversity conference. Brussels, 2022a. Disponível em: https://environment.ec.europa.eu/topics/nature-and-biodiversity/eu-cop15-global-biodiversity-conference_en. Acesso em: 14 set. 2023.
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).

Conclusão

A UE tem ganhado cada vez mais espaço como norm shaper global na temática da biodiversidade, tendo em vista diversas iniciativas e ações que foram divulgadas, sobretudo no âmbito do PEE.

As normas emanadas pela UE costumam revestir-se de uma forma soft, mas é possível perceber elementos de uma harder soft governance, que abrangeria normas sem poder coercitivo, porém com um grau mais profundo de influência na governança. Verifica-se que essas normas estabelecem um padrão internacional mais rigoroso e ambicioso de proteção ambiental.

O PEE tem sido, então, o pano de fundo estratégico para uma influência europeia no cenário internacional, pois, por meio de suas mais variadas áreas de atuação, a UE consegue pulverizar suas ideias, costumes e vontades na comunidade global.

A UE tem despontado como líder na governança ambiental global e, consequentemente, na governança da biodiversidade. Isso se deveu, entre outros fatores, à atuação na política interna para a sustentabilidade, o que refletiu na política externa. Desse modo, a globalização da regulamentação ambiental pela UE se tornou uma abordagem estratégica para compartilhar seus objetivos no mundo todo.

Constatou-se que, por meio do PEE e de outras ações, a UE tem atuado como uma harder soft governance, estabelecendo altos níveis de proteção ambiental, ainda que por meio de normas não coercitivas. Na negociação com outros países, a UE consegue que estes incorporem as normas ambientais por ela estabelecidas em face da necessidade de cooperação.

Pela análise documental, observou-se que há pouco tempo a Comissão Europeia (CE) tem acompanhado a desenvoltura dos objetivos para 2030 e para 2050. Apesar do atraso, tal fato será benéfico para o monitoramento dos avanços e retrocessos do Pacto, preenchendo uma lacuna existente. A supervisão das ações é fundamental para manter a credibilidade da UE perante a comunidade internacional.

Entre as iniciativas de destaque, mencionou-se o programa Think 2030, do IEEP, que difundiu a edição 2022 do Barômetro do PEE. Esse Barômetro faz um balanço do que já foi realizado em cada área de atuação do Pacto.

Verificou-se a importância do Barômetro para a análise e o acompanhamento dos diversos indicadores do Green Deal, sendo de grande valia na formulação de políticas mais efetivas e, consequentemente, contribuindo na posição da UE como influenciadora nas normativas globais.

Um problema encontrado foi a insistente falta de compromisso dos Estados-membros, além da dificuldade de acesso aos peritos nacionais para averiguação de informações. Tal obstáculo deve ser trabalhado pela CE, a fim de formar uma maior integração e estabilidade da União, o que fortaleceria seu papel como norm shaper.

Frisou-se o pioneirismo da UE com sua PRRN por meio de sua Ebio, justificando-se com esses documentos e tantos outros o motivo por que a UE pode ser considerada um regrador no qual os demais países devem se pautar.

Percebeu-se que UE foi bem-sucedida ao espalhar seus padrões sustentáveis em outras nações, sendo líder, uma norm shaper, quanto ao meio ambiente e quanto à biodiversidade.

Pondera-se que a invasão da Ucrânia pela Rússia é um evento que impacta o alcance das metas do PEE e, sem dúvida, a proteção da biodiversidade. Nesse aspecto, a UE precisa se manter firme quanto a seu propósito de neutralidade climática e a comunidade internacional necessita estar atenta ao cumprimento, pela UE, dos objetivos estabelecidos no Pacto.

Outro ponto sensível da temática, e que foi destaque nas negociações da COP-15, é a questão do financiamento, que deve ser abordado enfaticamente pela PRRN. Contudo, na Ebio do PEE, esse ponto permaneceu vago e impreciso. Tal lacuna deve ser melhorada no Regulamento que está prestes a entrar em vigor e já foi superada no novo acordo global para a biodiversidade.

Aferiu-se que vários eventos já estavam tratando sobre a COP-15 em meados de sua realização, entre eles o “Countdown to CBD COP15: Landmark Leaders Event for a Nature Positive World”, o qual teve como objetivo justamente mobilizar esforços para que as negociações do novo acordo fossem as melhores possíveis. Na oportunidade, a UE ratificou sua intenção de negociar ambiciosamente, com metas verificáveis, despontando como influencer na proteção da biodiversidade no cenário mundial, inclusive por meio de documentos já publicados, como a Ebio do PEE, e por meio de inúmeras ações divulgadas pela CE.

As ambições europeias para a COP-15 foram confirmadas diante do que se estabeleceu no novo acordo global. Na COP-15, definiu-se um quadro equitativo e abrangente de metas, acompanhado do estabelecimento de recursos necessários para a implementação. A Conferência considerou que as metas foram suficientemente claras para lidar com a superexploração do recursos naturais, com a poluição e com práticas agrícolas insustentáveis. Houve uma vitória quanto à menção de um plano para resguardar os direitos dos povos indígenas e para reconhecer suas contribuições como guardiões da natureza ( UN, 2023aUN – UNITED NATIONS. UN Environment Programme. UN Biodiversity Conference (COP-15). 2023a. Disponível em: https://www.unep.org/un-biodiversity-conference-cop-15. Acesso em: 14 set. 2023.
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). A COP-15 terminou com um histórico acordo mundial sobre biodiversidade, o Kunming-Montreal Global Biodiversity Framework (GBF), o qual, de maneira geral, pretende reduzir a perda da biodiversidade, restaurar ecossistemas e proteger direitos dos indígenas. Fica a reflexão se o acordo não deveria ter sido ainda mais ambicioso, servindo esse questionamento como possível ponto de partida para futuras pesquisas relacionadas ao tema.

  • 1
    Este artigo foi realizado com apoio do Módulo Jean Monnet, financiado pela Comissão Europeia.
  • Como citar este artigo (ABNT):

    MONT’ALVERNE, T. F.; LIMA, M. C. G. V. A União Europeia como norm shaper na proteção da biodiversidade. Veredas do Direito, Belo Horizonte, v. 20, e202569, 2023. Disponível em: http://www.domhelder.edu.br/revista/index.php/veredas/article/view/2569. Acesso em: dia mês. ano.

Referências

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    15 Maio 2023
  • Aceito
    20 Set 2023
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