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EFEITO DE APLICAÇÕES DE PESTICIDAS SOBRE A BIOMASSA E A RESPIRAÇÃO DE MICRORGANISMOS DE SOLOS* * Parcialmente financiado pela Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA - RC BRA 8078) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP 95/04360-1)

EFFECT OF PESTICIDE APPLICATIONS ON SOIL BIOMASS AND MICROBIAL RESPIRATION

RESUMO

Os efeitos de pesticidas sobre a microflora do solo foram estudados em solos que receberam tratamentos com pesticidas recomendados para o plantio de algodão. Estudou-se a biomassa e a respiração dos microrganismos dos solos através dos métodos de respiração induzida por glicose (SIR) e a técnica de inibidores seletivos (SI). Verificou-se que os pesticidas estimularam, mas também inibiram, o aumento da biomassa microbiana, dependendo do tipo de solo. A população bacteriana foi diminuída pelos pesticidas mas mesmo assim, a respiração de bactérias prevaleceu sobre a de fungos. Detectou-se também variações das taxas de respiração nas diferentes épocas do ano, independentemente da aplicação de pesticidas. Os resultados indicaram, no entanto, que os efeitos dos pesticidas foram apenas temporários.

PALAVRAS-CHAVE:
Bioatividade; respiração induzida; inibidores seletivos; pesticidas.

ABSTRACT

The effects of pesticides on soil microflora were studied in soils that received the pesticide treatments recommended for cotton crops. Assessment of soil biomass and microbial respiration were done by the substrate-induced respiration (SIR) and the selective inhibition (SI) techniques. Pesticides both inhibitted or stimulated the increase of microbial biomass, depending on the soil type. Bacterial population was lowered by the pesticides, but its respiration prevailed on the fungi respiration. Variation on the respiration rates also occurred in the different seasons, independently of the pesticide applications. However, results indicated that the pesticide effects were only temporary.

KEY WORDS:
Bioactivity; substrate-induced respiration; selective inhibitors; pesticides.

INTRODUÇÃO

A respiração reflete diretamente a atividade de microrganismos heterótrofos do solo e estes são importantes nos processos de ciclagem de nutrientes que têm como conseqüência a fertilidade e a qualidade do ambiente (PAUL & CLARK, 1996PAUL, E.A. & CLARK, F.E. (Eds.) Soil microbiology and biochemistry. London: Academic Press, 1996.; SCHINNER et al., 1996SCHINNER, F.; ÖHLINGER, R.; KANDELER, E.; MARGESIN, R. (Eds.) Methods in soil biology. Germany: Springer-Verlag, 1996.). Medidas de respiração são determinadas tanto através de produção de CO2, como de consumo de O2; embora as medidas de CO2 sejam consideradas mais sensíveis (PAUL & CLARK, 1996PAUL, E.A. & CLARK, F.E. (Eds.) Soil microbiology and biochemistry. London: Academic Press, 1996.).

Como os solos variam na sua composição e características físico-químicas, também a população microbiana varia em conseqüência da adaptação ao ambiente (PAUL & CLARK, 1996PAUL, E.A. & CLARK, F.E. (Eds.) Soil microbiology and biochemistry. London: Academic Press, 1996.; SCHINNER et al., 1996SCHINNER, F.; ÖHLINGER, R.; KANDELER, E.; MARGESIN, R. (Eds.) Methods in soil biology. Germany: Springer-Verlag, 1996.). A ação do homem, transformando zonas florestais em agriculturais, e a aplicação de pesticidas, também determinam mudanças na microbiota e na fauna do solo (PAUL & CLARK, 1996PAUL, E.A. & CLARK, F.E. (Eds.) Soil microbiology and biochemistry. London: Academic Press, 1996.).

Dada a importância dos microrganismos nos processos biogeoquímicos do solo, atualmente requer-se testes de biodegradabilidade dos pesticidas para que eles obtenham licença para comercialização (PAUL & CLARK, 1996; BRASIL,1988BRASIL. Ministério da Habitação, Urbanismo e Meio Ambiente. Secretaria Especial do Meio Ambiente. Manual de testes para avaliação da ecotoxicidade de agentes químicos. Brasília: MHU, SEMA, 1988. E.1.2.), pois apesar dos microrganismos ocuparem menos que 1 % do volume do solo, seu número e influência são muito grandes (SCHINNER et al., 1996SCHINNER, F.; ÖHLINGER, R.; KANDELER, E.; MARGESIN, R. (Eds.) Methods in soil biology. Germany: Springer-Verlag, 1996.). Eles são tanto estimulados como inibidos pela adição de xenobióticos (KEARNEY & KELLOGG, 1985KEARNEY, P.C. & KELLOGG, T. Microbial adaptation to pesticides. Pure Appl. Chem., v.57, n.2, p.389-403, 1985.; SCHINNER et al., 1996SCHINNER, F.; ÖHLINGER, R.; KANDELER, E.; MARGESIN, R. (Eds.) Methods in soil biology. Germany: Springer-Verlag, 1996.).

Desta forma, mudanças na biomassa microbiana podem indicar os efeitos dos xenobióticos no solo. Uma das medidas indiretas da biomassa microbiana é feita através do método de respiração induzida por adição de substrato facilmente degradável, como por exemplo a glicose, e medidas da resposta respiratória das populações microbianas (ANDERSON & DOMSCH, 1978ANDERSON, J.P.E. & DOMSCH, K.H. A physiological method for the quantitative measurements of microbial biomass in soils. Soil Biol. Biochem., v.10, p.215-221, 1978.; SCHINNER et al., 1996SCHINNER, F.; ÖHLINGER, R.; KANDELER, E.; MARGESIN, R. (Eds.) Methods in soil biology. Germany: Springer-Verlag, 1996.). Esta resposta respiratória é proporcional à quantidade de carbono microbiano presente no solo, cujo valor é obtido após aplicação de um fator de conversão (ANDERSON & DOMSCH, 1978ANDERSON, J.P.E. & DOMSCH, K.H. A physiological method for the quantitative measurements of microbial biomass in soils. Soil Biol. Biochem., v.10, p.215-221, 1978.; SCHINNER et al., 1996SCHINNER, F.; ÖHLINGER, R.; KANDELER, E.; MARGESIN, R. (Eds.) Methods in soil biology. Germany: Springer-Verlag, 1996.). Ao mesmo tempo, pode-se adicionar inibidores de crescimento de bactérias e de fungos e avaliar a contribuição isolada de bactérias e fungos para o processo de respiração (ANDERSON & DOMSCH, 1973ANDERSON, J.P.E. & D OMSCH, K.H. Quantification of bacterial and fungal contributions to respiration of selected agricultural and forest soils. Arch. Mikrobiol., v.93, p.113-127, 1973.; ANDERSON & DOMSCH, 1974ANDERSON, J.P.E. & DOMSCH, K.H. Use of selective inhibitors in the study of respiratory activities and shifts in bacterial and fungal populations in soil. Ann. Microbiol., Paris, v.24, p.189-194, 1974.; SONG et al., 1986SONG, H.G.; PEDERSEN, T.A.; BARTHA, R. Hydrocarbon mineralization in soil: relative bacterial and fungal contribution. Soil Biol. Biochem., v.18, n.1, p.109-111, 1986.). Embora este método ainda não tenha sido estabelecido como padrão (SCHINNER et al., 1996SCHINNER, F.; ÖHLINGER, R.; KANDELER, E.; MARGESIN, R. (Eds.) Methods in soil biology. Germany: Springer-Verlag, 1996.), seus resultados podem fornecer dados relativos ou indicativos sobre a contribuição de cada grupo de microrganismos na respiração total do solo, e sobre os efeitos induzidos por pesticidas na microbiota ativa do solo (WARDLE et al., 1993WARDLE, D.A.; YEATES, G.W.; WARSON, R.N.; NICHOLSON, K.S. Response of soil microbial biomass and plant litter decomposition to weed management strategies in maize and asparagus cropping systems. Soil Biol. Biochem., v.25, n.7, p.857-868, 1993.).

A maioria dos dados sobre mudanças na bioatividade do solo devido à aplicação de pesticidas, refere-se a medidas de atividade de algumas populações selecionadas e de tratamento com apenas um pesticida (ZELLES et al., 1986ZELLES, L.; SCHEUNERT, I.; KORTE, F. Comparison of methods to test chemicals for side effects on soil microorganisms. Ecotox. Environ. Saf., v.12, p.53-69, 1986.; VALLAEYS et al., 1997VALLAEYS, T.; C OURDE, L.; C HAUSSOD, R. Assessing side effects of micropollutants on the soil microflora. Anal.Magazine, v.25, n.9/10, p.M60-M66, 1997.). Estudos sobre a população microbiana total e sua dinâmica sob a situação real da agricultura podem fornecer dados para uma avaliação do impacto causado pela aplicação de pesticidas (ZELLES et al., 1986ZELLES, L.; SCHEUNERT, I.; KORTE, F. Comparison of methods to test chemicals for side effects on soil microorganisms. Ecotox. Environ. Saf., v.12, p.53-69, 1986.). Este trabalho estudou o efeito de aplicações de diferentes pesticidas - conforme a recomendação para a cultura do algodão - sobre a respiração e a biomassa microbiana de solos.

MATERIAL E MÉTODOS

Amostras de solo (0 - 15 cm de profundidade) foram coletadas de uma estação experimental que tem sido usada há mais de dez anos para o plantio do algodão (Tatuí, SP), após diferentes aplicações de pesticidas e no intervalo entre plantios. O mesmo esquema de aplicação de pesticidas e de coleta usado em Tatuí foi seguido em uma área de campo experimental do Instituto Biológico (São Paulo, SP). Uma área controle do mesmo solo em São Paulo não recebeu pesticidas.

O solo de Tatuí (Latossolo Vermelho Amarelo LVA) é argiloso com 80 g kg-1 de silte; 510 g kg-1 de argila; 410 g kg-1 de areia; 20 g dm-3 de matéria orgânica e pH entre 4,9 e 5,7 durante o período dos experimentos. O solo de São Paulo (Glei Húmico - GH) é muito argiloso com 80 g kg-1 de silte; 660 g kg-1 de argila; 280 g kg-1 de areia; os valores de matéria orgânica variaram de 31 a 36 g dm-3, e os de pH entre 4,7 e 5,3.

Os pesticidas foram aplicados de acordo com o recomendado e usados na Estação Experimental de Tatuí (Instituto Agronômico de Campinas) na seguinte ordem: monocrotofós, dimetoato (duas vezes seguidas), endosulfan, deltametrina, novamente endosulfan, novamente deltametrina, paration metílico, novamente endosulfan e carbaril durante o plantio de 1995-1996. O herbicida trifluralina foi aplicado antes do próximo plantio e, durante o plantio de 1996-1997 foram usados: duas vezes monocrotofós, endosulfan, paration metílico, três vezes paration metílico em mistura com endosulfan, duas vezes deltametrina, endosulfan e paration metílico com deltametrina. As doses dos pesticidas aplicados foram descritas em ANDRÉA et al. (1998)ANDRÉA, M.M.; PERES, T.B.; LUCHINI, L.C.; MARCONDES, M.A.; PETTINELLI JR., A.; NAKAGAWA, L.E. Impact of long term applications of cotton pesticides on soil biological properties, dissipation of [14C]-methyl parathion and persistence of multi-pesticide residues. Vienna: FAO/ IAEA, 1998. Third FAO/IAEA Research Coordination Meeting [BRA-8078]..

As coletas de amostras dos solos foram feitas antes de qualquer aplicação de pesticidas (S.0), após os primeiros tratamentos com monocrotofós (S.1), paration metílico (S.2) e carbaril (S.3). Também foram coletadas amostras entre os plantios (S.4) e, no segundo ano de estudo, após as duas aplicações de monocrotofós (S.5); após a primeira aplicação de endosulfan (S.6); após a primeira aplicação de deltametrina (S.7) e após a mistura paration metílico + deltametrina (S.8).

A respiração e a biomassa microbiana foram estudadas pelo método de respiração induzida por substrato (SIR), conforme ANDERSON (1982)ANDERSON, J.P.E. Soil respiration. In: PAGE, A.L.; M ILLER, R.H.; KEENEY, D.R. (Eds.) Methods of soil analysis. Wisconsin; Soil Society of America, 1982. p.831-871.. Subamostras de solo (6 × 50 g) foram colocadas em frascos biométricos (BARTHA & PRAMER, 1965BARTHA, R. & PRAMER, D. Features of a flask and method for measuring the persistence and biological effects of pesticides in soil. Soil Sci., v.100, n.1, p.68-70, 1965.), reumidecidas a 55 % da capacidade máxima de retenção de água (CMRA), e pré-incubadas a 28º C por dois dias. Três subamostras receberam 4,0 mg de glicose g-1 de solo. A formação de CO2 foi medida no KOH (0,01 mol L-1) do braço latetal dos frascos. A solução de KOH foi trocada por outra recém preparada após 2, 4, 6, 24, 48 e 72 horas. O CO2 produzido por respiração basal (subamostras de solos que não receberam glicose) e respiração induzida (por adição de glicose) foi determinado por titulação com HCl (0,05 mol L-1), após adição de fenolftaleína e retro-titulação com metilorange. O quociente metabólico (respiração basal/ induzida h -1 g-1 solo) foi multiplicado por 20,6 para conversão em biomassa (SCHINNER et al., 1996SCHINNER, F.; ÖHLINGER, R.; KANDELER, E.; MARGESIN, R. (Eds.) Methods in soil biology. Germany: Springer-Verlag, 1996.).

A contribuição de bactérias e fungos na respiração total do solo foi estudada usando-se o método de ANDERSON & DOMSCH (1973ANDERSON, J.P.E. & D OMSCH, K.H. Quantification of bacterial and fungal contributions to respiration of selected agricultural and forest soils. Arch. Mikrobiol., v.93, p.113-127, 1973. e 1974) adaptado por SONG et al. (1986)SONG, H.G.; PEDERSEN, T.A.; BARTHA, R. Hydrocarbon mineralization in soil: relative bacterial and fungal contribution. Soil Biol. Biochem., v.18, n.1, p.109-111, 1986. e WARDLE et al. (1993)WARDLE, D.A.; YEATES, G.W.; WARSON, R.N.; NICHOLSON, K.S. Response of soil microbial biomass and plant litter decomposition to weed management strategies in maize and asparagus cropping systems. Soil Biol. Biochem., v.25, n.7, p.857-868, 1993., através de tratamento das amostras com inibidores seletivos (SI). Retirouse 9 subamostras de 10 g das amostras de cada solo que foram colocadas em frascos biométricos, mantendo-se a umidade ajustada a 55 % da CMRA por dois dias antes do tratamento com inibidores de microrganismos. A seguir, um grupo de triplicatas das subamostras foi tratado com 75 mg de estreptomicina, como depressor de respiração e biomassa bacteriana, em mistura com 50 mg de talco; outras triplicatas foram tratadas com 150 mg de cicloheximida (depressor de respiração fúngica) em 50 mg de talco, e o último grupo de triplicatas foi tratado apenas com talco. Os três grupos receberam 4 mg de glucose g-1 de solo e foram mantidos a 28º C durante a semana do teste. A troca do KOH do braço lateral e a determinação do CO2 produzido foram feitas conforme no teste de respiração induzida.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A quantidade de CO2 produzido por respiração induzida por glicose variou nas diferentes coletas e nas diferentes amostras de cada solo. No solo de Tatuí a variação foi de mínimo de 0,48 ± 0 (S.3) a máximo de 3,83 ± 0,21 (S.2) µg CO2 h-1 g-1. No solo de São Paulo com tratamentos de pesticidas, a variação foi de 0,58 ± 0,21 (S.1) a 2,46 ± 0,79 (S.7) ) µg CO2 h-1 g-1 , e na área sem tratamentos, foi de 0,42 ± 0 (S.1) a 2,18 ± 0,63 (S.2) µg CO2 h-1 g-1. A variação na taxa de respiração no solo que não recebeu os pesticidas pode ser atribuída a mudanças provocadas pelos próprios fatores edafo-climáticos, conforme também observado por ZELLES et al. (1985)ZELLES, L.; SCHEUNERT, I.; KORTE, F. Side effects of some pesticides on non-target soil microorganisms. J. Environ. Sci. Health, New York, v.B20, n.5, p.457-488, 1985..

Quando os inibidores seletivos foram usados, os coeficientes estreptomicina / cicloheximida foram sempre menores do que 1,0 (Fig. 1), nos tempos de maior produção de CO2 das curvas de respiração, indicando a prevalência da respiração de bactérias. Esses resultados são concordantes com a predominância da população de bactérias no solo (PAUL & CLARK, 1996PAUL, E.A. & CLARK, F.E. (Eds.) Soil microbiology and biochemistry. London: Academic Press, 1996.). A taxa de respiração da população microbiana foi maior no solo GH proveniente da área não tratada (de 0,6 a 0,9), seguida pelo LVA (de 0,4 a 0,9). As aplicações de monocrotofós (S.1) e paration metílico (S.2) provocaram inibição nos solos tratados, principalmente em comparação com os valores detectados no solo sem tratamento com pesticidas. No entanto a faixa de variação desta taxa foi muito pequena no solo da área tratada de São Paulo (de 0,5 a 0,7), embora ela tenha sido nitidamente inibida por deltametrina (S.7), seguida por estímulo provocado pela mistura paration metílico + deltametrina (S.8). No solo de Tatuí (LVA), houve inibição após aplicação da mistura. Portanto, notou-se efeitos diferenciados conforme o tipo de solo.

Os valores de respiração dos grupos microbianos, medidos nos períodos entre plantios, e portanto, sem adição de pesticidas (S.0 e S. 4), serviram como controle para comparação com os valores obtidos após os tratamentos no solo LVA de Tatuí. Os resultados demonstram que neste solo a maioria dos pesticidas provocou inibição da respiração tanto de bactérias como de fungos (Fig. 2). Entretanto, a aplicação de monocrotofós provocou estímulo da respiração de fungos, e a mistura paration metílico + deltametrina estimulou a respiração tanto de bactérias como de fungos.

No solo GH de São Paulo a comparação foi feita com os valores obtidos na área sem tratamentos, verificando-se também inibição na maioria das vezes, apesar de um pequeno estímulo da respiração de fungos após as aplicações de paration metílico (S. 2) e de carbaril (S. 3. Fig. 3). Os maiores valores de inibição ocorreram no solo de São Paulo e após aplicação de endosulfan (S. 6) e de deltametrina (S. 7).

Fig. 1
Contribuição de grupos de microrganismos na respiração dos solos.

Comparando-se os resultados obtidos nos dois solos pôde-se verificar que, embora a respiração da população de bactérias tenha prevalecido sobre a de fungos em ambos os solos (Fig. 1), ela foi pouco estimulada pela mistura paration metílico + deltametrina (S. 8) no solo de Tatuí e sempre inibida no solo de São Paulo (Figs. 2 e 3). A população de fungos foi pouco estimulada pela primeira aplicação de monocrotofós (S. 1), mas inibida na segunda (S. 5) e estimulada pela mistura paration metílico + deltametrina (S. 8), no solo de Tatuí (Fig. 2). No entanto, no solo de São Paulo (Fig. 3) houve pouco estímulo pelas aplicações de paration metílico (S. 2) e carbaril (S. 3). Portanto, as populações de bactérias e fungos reagiram diferentemente nos dois tipos de solos, o que parece indicar a influência do tipo de solo na população presente.

Em relação à biomassa microbiana verificou-se um grande estímulo provocado pelas aplicações de monocrotofós (S. 1), paration metílico (S. 2) e deltametrina (S. 7), e pequenos efeitos inibidores foram observados pelas outras aplicações no solo de Tatuí (Fig. 4). No solo de São Paulo (Fig. 5), pequenos aumentos da biomassa foram observados após a segunda aplicação de monocrotofós (S. 5) e pela mistura paration metílico + deltametrina (S. 8). Assim, observou-se novamente respostas diferenciadas de acordo com o tipo de solo.

Fig. 2
Influência das aplicações de pesticidas na respiração de microrganismos do solo de Tatuí.

Fig. 3
Influência das aplicações de pesticidas na respiração de microrganismos do solo de São Paulo.

Desta forma, conforme também foi detectado por outros autores (ANDERSON et al., 1981ANDERSON, J.P.E.; ARMSTRONG, R.A.; SMITH, S.N. Methods to evaluate pesticide damage to the biomass of the soil microflora. Soil Biol. Biochem., v.13, p.149-153, 1981.; HARDEN et al., 1993HARDEN, T.; JOERGENSON, R.G.; MEYER, B.; WOLTERS, V. Soil microbial biomass estimated by fumigation-extraction and substrate-induced respiration in two pesticidetreated soils. Soil Biol. Biochem., v.25, n.6, p.679-683, 1993.; WARDLE et al., 1993WARDLE, D.A.; YEATES, G.W.; WARSON, R.N.; NICHOLSON, K.S. Response of soil microbial biomass and plant litter decomposition to weed management strategies in maize and asparagus cropping systems. Soil Biol. Biochem., v.25, n.7, p.857-868, 1993.), observou-se que alguns pesticidas estimularam o aumento da biomassa nos solos estudados. Como conseqüência, espera-se maior degradação dos resíduos de pesticidas no solo devido ao metabolismo dessas populações; ou, conforme indicado por WARDLE et al. (1993)WARDLE, D.A.; YEATES, G.W.; WARSON, R.N.; NICHOLSON, K.S. Response of soil microbial biomass and plant litter decomposition to weed management strategies in maize and asparagus cropping systems. Soil Biol. Biochem., v.25, n.7, p.857-868, 1993., o pesticida pode exercer uma indução ao ataque da matéria orgânica nativa e assim, a população pode reproduzir-se. Observou-se que os efeitos de cada aplicação foram temporários, pois não perduraram, ou foram revertidos pelas aplicações seguintes, o que também foi observado por outros autores (ZELLES et al., 1985ZELLES, L.; SCHEUNERT, I.; KORTE, F. Side effects of some pesticides on non-target soil microorganisms. J. Environ. Sci. Health, New York, v.B20, n.5, p.457-488, 1985.; HARDEN et al., 1993HARDEN, T.; JOERGENSON, R.G.; MEYER, B.; WOLTERS, V. Soil microbial biomass estimated by fumigation-extraction and substrate-induced respiration in two pesticidetreated soils. Soil Biol. Biochem., v.25, n.6, p.679-683, 1993.).

CONCLUSÕES

  1. A respiração de bactérias prevalece, independentemente do tipo de solo e das aplicações de pesticidas.

  2. Aplicações de pesticidas provocaram, tanto estímulo como inibição da respiração do solo e da biomassa microbiana. Estes efeitos variaram conforme o tipo de solo.

  3. Os efeitos das aplicações de pesticidas sobre a respiração e biomassa microbianas foram temporários.

Fig. 4
Estímulo ou inibição da aplicação de pesticidas na biomassa microbiana do solo de Tatuí.

Fig. 5
Estímulo ou inibição da aplicação de pesticidas na biomassa microbiana do solo de São Paulo.

  • *
    Parcialmente financiado pela Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA - RC BRA 8078) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP 95/04360-1)

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Set 2024
  • Data do Fascículo
    Jul-Dec 2000

Histórico

  • Recebido
    19 Nov 1999
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