Open-access VIOLÊNCIA CONTRA PESSOA IDOSA: ANÁLISE DA CONSISTÊNCIA INTERNA DE INSTRUMENTOS*

RESUMO:

Objetivo:  avaliar a consistência interna de instrumentos utilizados no Brasil para mensuração de situações de violência contra pessoa idosa em dois estados.

Método:  estudo de corte transversal, desenvolvido com 481 idosos, em duas amostras, estados e recorte temporal diferentes. Foram aplicados dois instrumentos de mensuração de violência contra pessoa idosa. Os dados foram analisados, e a consistência interna entre os itens foi medida pelo coeficiente de Alfa de Cronbach.

Resultados:  o Hwalek-Sengstock Elder Abuse Screening Test apresentou o coeficiente de α = 0,08 para amostra coletada na Paraíba, enquanto, em Pernambuco, foi α = 0,57. A Conflict Tactics Scale apresentou alta precisão para definição da violência com coeficiente de α = 0,81 e α = 0,80 para as duas amostras.

Conclusões:  apenas a Conflict Tactics Scale apresentou-se confiável e estável para determinação da violência de natureza física e psicológica entre idosos, contribuindo assim, como uma possibilidade de desvelar o fenômeno.

DESCRITORES:
Reprodutibilidade dos Testes; Confiabilidade dos Dados; Pesquisa Metodológica em Enfermagem; Enfermagem Forense; Maus-tratos ao idoso.

HIGHLIGHTS

  1. H-S/EAST foi considerado instável do ponto de vista de confiabilidade.

  2. Conflict Tactics Scale apresentou alta precisão para definição da violência.

  3. Necessidade da construção de instrumentos para determinação violência contra VCPI.

ABSTRACT

Objective:  to evaluate the internal consistency of instruments used in Brazil to measure situations of violence against the elderly in two states.

Method:  a cross-sectional study with 481 elderly people in two different samples, states, and time periods. Two instruments were used to measure violence against the elderly person. The data was analyzed and the internal consistency between the items was measured by the Cronbach’s alpha coefficient.

Results:  the Hwalek-Sengstock Elder Abuse Screening Test showed a coefficient of α = 0.08 for the sample collected in Paraíba, while in Pernambuco it was α = 0.57. The Conflict Tactics Scale was highly accurate in defining violence, with a coefficient of α = 0.81 and α = 0.80 for the two samples.

Conclusions:  only the Conflict Tactics Scale turned out to be reliable and stable for determining physical and psychological violence among the elderly, thus contributing as a way of uncovering the phenomenon.

DESCRIPTORS:
Reproducibility of Results; Data Accuracy; Nursing Methodological Research; Forensic Nursing; Elder abuse.

HIGHLIGHTS

  1. H-S/EAST was considered unstable from a reliability point of view.

  2. The Conflict Tactics Scale was highly accurate in defining violence.

  3. There is a need to develop instruments to determine violence against VCPI.

RESUMEN

Objetivo:  Evaluar la consistencia interna de instrumentos utilizados en Brasil para medir situaciones de violencia contra ancianos en dos estados.

Método:  Estudio transversal realizado con 481 ancianos en dos muestras, estados y periodos de tiempo diferentes. Se utilizaron dos instrumentos para medir la violencia contra ancianos. Se analizaron los datos y se midió la consistencia interna entre los ítems mediante el coeficiente alfa de Cronbach.

Resultados:  el Hwalek-Sengstock Elder Abuse Screening Test presentó un coeficiente de α = 0,08 para la muestra recogida en Paraíba, mientras que en Pernambuco fue de α = 0,57. La Escala de Tácticas de Conflicto fue altamente precisa en la definición de violencia, con coeficientes de α = 0,81 y α = 0,80 para ambas muestras.

Conclusiones:  sólo la Escala de Tácticas de Conflicto demostró ser fiable y estable para determinar la violencia física y psicológica entre ancianos, contribuyendo así a desvelar el fenómeno.

DESCRIPTORES:
Reproducibilidad de los Resultados; Exactitud de los Datos; Investigación Metodológica en Enfermería; Enfermería Forense; Abuso de Ancianos.

ASPECTOS DESTACADOS

  1. H-S/EAST se consideró inestable desde el punto de vista de la fiabilidad.

  2. La Conflict Tactics Scale fue muy precisa a la hora de definir la violencia.

  3. Hay necesidad de construir instrumentos para determinar la violencia contra VCPI.

INTRODUÇÃO

A psicometria surge como a ciência que estuda teorias e métodos consistentes para compreender as respostas dos sujeitos1 a determinados estímulos e/ou situações, ou corresponder a um traço latente. Este, por sua vez, pode ser exprimido por variados conceitos como: traço cognitivo, processo mental, aptidão, tendência, variável, estrutura mental, entre outros. De forma geral, a psicometria se propõe a estudar os traços por meio de análise e parâmetros estatísticos confiáveis que determinarão o comportamento latente relacionado aos seus atributos2.

A legitimidade de um teste, escala ou instrumento é medida por testes de validade e de fidelidade. A validação consiste, especificamente, no comportamento do traço latente, que deve ser estruturada mediante análise empírica do conteúdo literário relacionado ao traço, e, em seguida, a mensuração estatística deles. Já a precisão (fidedignidade ou confiabilidade) se relaciona à capacidade de o instrumento medir, sem erros, o traço1.

Para criação de um instrumento de mensuração, é necessário serem incluídas variáveis em seu construto, a fim de determinar as expressões singulares que o traço latente indica3. Estudos na enfermagem valorizam o desenvolvimento de instrumentos confiáveis para determinação de fenômenos subjetivos4 com traços latentes específicos. A Violência Contra a Pessoa Idosa (VCPI) se insere como um desses fenômenos de difícil determinação e conceituação, haja vista suas múltiplas faces.

O abuso na pessoa idosa é considerado um problema mundial5, a Organização Mundial de Saúde (OMS) o define como um “ato de acometimento ou omissão que pode se manifestar de forma individual ou coletiva, independentemente da frequência, em um vínculo que cause danos ou aflição a esse indivíduo”6, e se caracteriza por apresentar alta prevalência em diversos países7, necessitando da utilização de tecnologias que norteiam o rastreio e a assistência a esses indivíduos8.

Por se tratar de um fenômeno que reflete um contexto social, sua prevalência é heterogênea em diversos países; estudo na Croácia apresentou prevalência de 21,4%9, 21,5%, na Romênia10, e no Irã, 90,4%11.

No Brasil, essa heterogeneidade, também é observada em pessoas idosas conforme a região do país. O estado de São Paulo12 apresentou 10% de prevalência da VCPI, enquanto na Amazônia, 52,6%13. Em estudo de base populacional desenvolvido em 23 capitais do país, mediado pelo sistema Vigilância de Violência Interpessoal e Autoprovocada (VIVA/ SINAN), foi possível mostrar que a violência física foi a mais prevalente (85%) em pessoas idosas, seguida da negligência (9,1%)14.

Embora não seja um fenômeno novo, apenas nos últimos anos, a VCPI foi objeto de estudo científico, que está avançando na construção do arcabouço teórico que sustenta a prática profissional15. É um desafio a identificação da VCPI, principalmente, quando ocorre no ambiente doméstico. Tendo em vista sua gravidade, é imprescindível o uso e desenvolvimento de ferramentas que auxiliem os profissionais na sua detecção precocemente16.

Os instrumentos validados mais comumente utilizados para determinação da VCPI no Brasil são: o Hwalek-Sengstock Elder Abuse Screening Test (H-S/EAST), para rastreio do risco para violência17; e a Conflict Tactics Scales Form R (CTS-1)18, para detecção de violência física e psicológica. O risco para violência dimensionado pela H-S/EAST foi utilizado em diversos contextos no Brasil, como em estudo desenvolvido em São Paulo19, com idosos hospitalizados, o qual observou prevalência de 56,0% de risco entre o grupo etário, achado semelhante em pesquisa realizada na Paraíba, com prevalência de 69,8% de risco20. Já, concernente à violência por meio do CTS-1 na população idosa, foi observada prevalência de 20,9% para o abuso psicológico, e 5,9% para violência física em pesquisa desenvolvida em Minas Gerais21.

A avaliação da consistência interna entre os itens e o uso do coeficiente estatístico Alfa de Cronbach é a medida mais comumente utilizada na área da saúde4,23. Para tanto, a avaliação de medidas de confiabilidade é essencial para verificar a sua qualidade psicométrica22, que pode determinar a estabilidade de um instrumento e/ou a sua fidedignidade utilizando diversas modalidades de testes estatísticos.

A fim de compreender se os instrumentos que mensuram a VCPI podem ser reproduzidos por diferentes observadores em diversos contextos, este estudo tem por objetivo avaliar a consistência interna de instrumentos utilizados, no Brasil, para mensuração de situações de violência contra pessoa idosa em dois estados.

MÉTODO

Trata-se de estudos transversais desenvolvidos em dois estados brasileiros, em tempo e em amostras de idosos distintas, guiado pelo Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE)24. O primeiro recorte transversal foi desenvolvido no território do Distrito de saúde IV do município de Recife, Pernambuco, no período de 2016 a 2017, com idosos comunitários. Já a segunda coleta aconteceu no período de 2019 a 2020, em dois hospitais da Paraíba: Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW); e Hospital Universitário Alcides Carneiro (HUAC).

Para coleta na unidade de saúde, a população foi composta por 1209 idosos cadastrados no serviço, a amostra foi definida como base na fórmula de população finita para estudos epidemiológicos, e adotado um poder de erro de 8%, sendo então composta por 159 idosos. Já no estudo desenvolvido no ambiente hospitalar, a população foi determinada conforme o quantitativo de atendimentos e admissões no ano anterior, no mesmo período da coleta de dados, totalizando 1259 idosos. Foi realizado o cálculo amostral com base na fórmula de população finita para estudos epidemiológicos, utilizando uma prevalência esperada de 60%8, nível de confiança de 95% e poder de erro de 5%, sendo acrescido 10% de perdas, deste modo, a amostra foi constituída por 322 idosos.

A coleta de dados foi realizada com pessoas acima de 60 anos, que estavam recebendo assistência nos hospitais, para os idosos coletados na Paraíba, e aqueles cadastrados na unidade básica de saúde no estudo coletado em Pernambuco. Foram excluídos 46 idosos da amostra hospitalar, ao apresentarem elevado déficit de comunicação ou condições clínicas que impediram a participação. Já na unidade de saúde, 17 idosos foram removidos considerando os mesmos critérios. A identificação e estabelecimento dos critérios foram realizados pelo pesquisador por meio de observação e/ou informações provindas dos responsáveis.

Para a coleta de dados, utilizaram-se os seguintes instrumentos: Hwalek-Sengstock Elder Abuse Screening Test (H-S/EAST)17 para avaliar o risco para violência e o Conflict Tactics Scale (CTS-1)18 para a violência física e/ou psicológica19.

O H-S/EAST é um instrumento de origem americana, adaptado transculturalmente para o Brasil. Esse instrumento realiza triagem de sinais específicos de violência quanto às circunstâncias correlatas, possibilitando classificar a presença do risco para violência17. O CTS-1 se propõe a compreender as estratégias utilizadas para enfrentamento dos conflitos. Divide-se em três grupos: argumentação; agressão; e agressão física. Apresenta três opções de respostas conforme a frequência de acontecimentos daquela situação18. Ambos os instrumentos receberam adaptação transcultural para uso no Brasil.

Foram realizados treinamentos de calibração da equipe para coleta dos dados, que, posteriormente, dirigiram-se para os locais de coleta segundo sua disponibilidade, buscando-se um local reservado para sua realização, a fim de preservar a privacidade do entrevistado.

No tocante à análise dos dados, aqueles indivíduos com escore igual ou maior que três foram classificados com risco para violência conforme o H-S/EAST17, enquanto para o CTS-118 e o questionário de Avaliação de Violência e Maus tratos, uma resposta positiva nos itens obteve a classificação de “com violência”22.

Os dados foram tabulados e analisados no SPSS, versão 26.0, mediante a frequência absoluta, relativa, e, para a confiabilidade interna, foi realizado o Alfa de Cronbach (α), que analisa a consistência interna dos itens que contemplam o instrumento. Sua precisão é medida entre a covariância entre os itens do instrumento1. A confiabilidade foi classificada em: muito baixa (α ≤ 0,30); baixa (0,30 < α ≤ 0,60); moderada (0,60 < α ≤ 0,75); alta (0,75 < α ≤ 0,90); e muito alta (α < 0,90)24.

A etapa coletada de PE foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pernambuco sob n.º de protocolo: 1.413.599/16, e a etapa vinculada a PB faz parte de um projeto guarda-chuva intitulado “Instrumentalização da Enfermagem Forense diante do cuidado ao idoso hospitalizado”, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HULW/UFPB com o número de parecer 3.709.600 e do HUAL/UFCG parecer de n.º 3.594.339.

RESULTADOS

A amostra do estudo foi composta por 322 (100%) idosos hospitalizados e 159 (100%) idosos comunitários. Na Tabela 1, conforme o HS-EAST, a maioria dos idosos se apresentou em risco para violência (202; 62,7%) na PB e PE (96; 60,4). Conforme a CTS-1, a maioria dos idosos vivencia a argumentação entre os conflitos intrafamiliares (167; 51,7%) na PB, e não há argumentação entre aqueles de PE (120; 77,4%); a maioria vivenciou agressão verbal (178; 55,1%) na PB e no estado de PE não foi vivenciado (99; 64,3%). Em ambos os estados, os idosos não experienciaram a violência física, na PB 88,5% (n=286) e em PE 95,5% (n=148).

Tabela 1
Distribuição da frequência relativa e frequência absoluta das situações de violência entre os idosos (2019 - 2020). João Pessoa, Paraíba, Brasil, 2023

Para amostra da PB, a média total dos 15 itens da H-S/EAST foi de 4,22 (DP= 8,3) e variância de 68,9. Entre todos os itens do instrumento, α = 0,08, sendo então considerado com consistência muito baixa, assim como entre todos os domínios da escala (α ≤ 30). Na amostra de idosos de PE, a média dos itens foi de 3,35 (DP=2,24) e variância de 5,03; entre todos os itens do instrumento, o α = 0,57 foi considerado baixo, assim como entre todos os domínios da escala (α ≤ 0,42). A variação do coeficiente entre as duas amostras coletadas indica instabilidade do instrumento em análise (Tabela 2).

Tabela 2
Escores médios do H-S/EAST* * HS-EAST - Hwalek-Sengstock Elder Abuse Screening Test; †DP - Desvio Padrão; ‡α - α de Cronbach; §Q - Questão; ||V/S - Você/ Senhor. e desvio-padrão (DP) para os itens individuais, correlação total entre os itens corrigidos, consistência interna (α de Cronbach) por domínio e total. João Pessoa, Paraíba, Brasil, 2023

Os 18 itens da CTS-1 estão apresentados na Tabela 3, assim como a média, desviopadrão, a correlação corrigida entre os itens e o α de Cronbach (deletado). A escala apresentou confiabilidade alta (α = 0,81), com média de 3,45 (DP = 3,9) e variância de 15,3; a confiabilidade entre os domínios variou entre moderada e alta para amostra da PB. Dados semelhantes podem ser observados entre a amostra coletada em PE, na qual a média foi de 1,92 (DP=3,24), variância de 10,53 e alta confiabilidade (α = 0,81).

Tabela 3
Escores médios do CTS-1* * CTS-1 - Conflict Tactics Scale; †DP - Desvio-Padrão; ‡α - α de Cronbach; §Q - Questão Fonte: Os autores (2019-2020). e desvio-padrão (DP) para os itens individuais, correlação total entre os itens corrigida, consistência interna (α de Cronbach) por domínio e total. João Pessoa, Paraíba, Brasil, 2023

DISCUSSÃO

A elaboração de um instrumento de medida na área da saúde envolve a utilização de modelos teóricos para construção metodológica. A Teoria Clássica dos Testes (TCT) se propõe a mensurar o escore total de um traço latente (ou construto). Esses traços são medidos por medidas de tendência central e de dispersão. Já a Teoria de Resposta ao Item (TRI) tem seu suporte estatístico na curva característica do item de forma que não se propõe a determinar um escore total, e, sim, o relacionamento entre todos os itens para indicação do construto2.

As duas teorias não são antagônicas em sua utilização psicométrica, entretanto, a TCT é a pioneira, e a TRI surge com maior complexidade do ponto de vista matemático2. Independentemente da adoção do modelo teórico, no momento de elaboração de um instrumento ou a adaptação transcultural é necessário que o pesquisador consiga responder à questão: quão válido e quão preciso aquele instrumento é para mensurar o construto proposto? As medidas de validade são determinadas por estudos de validação e a sua confiança por estudos de confiabilidade; o escopo do presente estudo se concentrou em discutir a fidedignidade entre os itens dos instrumentos direcionados a mensurar a VCPI.

A confiabilidade de um teste é uma condição de verificação da sua qualidade, indicando o quanto ele consegue ser consistente em expressar o traço sem erros significativos ou com grandes diferenças de correlação24. Existem cinco classificações gerais para estimativa da confiabilidade de um instrumento, genericamente, ele se classifica em dois grandes grupos: os testes de estabilidade (teste reteste e formas paralelas) e os testes de fidedignidade (consistência interna, entre avaliadores e duas metades).

O coeficiente de consistência interna é estimado mais popularmente pelo α de Cronbach, no qual pressupõe que a estimativa interna é classificada pela variabilidade dos itens de um mesmo teste. A estimativa varia entre 0 e 1 no coeficiente de correlação, em que, quanto mais próximo de 1 mais precisa é a fidelidade do instrumento e uniforme são seus itens25.

Entre os dois instrumentos utilizados para determinação da VCPI, a estimativa do α de Cronbach23, o H-S/EAST, apresentou-se muito baixa sua consistência interna (α = 0,08) na amostra da PB e baixo entre a amostra de idosos da PE (α = 0,57), e alta consistência entre as duas amostras populacionais CTS-1 (α = 0,81).

Dentre estes, apenas o H-S/EAST e CTS-1 efetuaram a validação dos seus itens ao realizar a adaptação transcultural para o cenário brasileiro17-18. As equivalências relacionadas às adaptações transculturais envolvem a semântica conceitual, operacional e funcional; a equivalência de mensuração em alguns estudos não é aderida à fase de adaptação, classificada como medida de validade psicométrica, sendo executada, então, em etapa subsequente26.

O H-S/EAST foi desenvolvido originalmente nos Estados Unidos, para realizar triagem de sinais sugestivos de abuso na pessoa idosa por meio de 15 questões que receberam validação de conteúdo e distribuídas em três dimensões: abuso potencial; violação dos direitos pessoais ou abuso direto; e característica de vulnerabilidade. O escore de risco é determinado pela pontuação de 3 ou mais, nos itens 2, 3, 4, 5, 7, 8, 9, 10, 11, 13 e 15 pontua-se 1 para cada resposta afirmativa, já nos demais, itens, o escore de pontuação é atribuído às respostas negativas27.

O resultado da confiabilidade interna do instrumento primário foi de α = 0,29, corroborando o achado do presente estudo, indicando baixa confiabilidade e instrumento frágil para conceituação determinação do conceito da VCPI. Por seus dados serem heterogêneos, os autores relacionam essa característica às múltiplas facetas do abuso, sendo, então, difícil a determinação de um traço homogêneo. Na adaptação transcultural do instrumento, a confiabilidade interna foi determinada pelo coeficiente de confiabilidade de Kuder-Richardson (kr20)17.

Considerando o kr20 medida de confiabilidade interna, o H-S/EAST apresenta boa confiabilidade (kr20=0,64) para uso de seus itens em conjunto, porém, entre as dimensões a consistência diminui, kr20=0,53 no abuso potencial, kr20=0,49 na dimensão de violação dos direitos pessoais ou abuso direto e kr20=0,49 nas características de vulnerabilidade17. Já a versão persa o instrumento apresentou moderada confiabilidade interna (α=0,741)28. Apesar da instabilidade nas características de precisão, o referido instrumento é utilizado no Brasil29 e em outros países30.

Em sua primeira versão proposta, a CTS-1 foi elaborada no final da década de 70, para identificar as estratégias utilizadas para resolver conflitos intrafamiliares e, por sua vez, identificar casos de violência física e psicológica autorrelatadas. O instrumento não foi validado em sua primeira versão com pessoas idosas, mas entre relações intrafamiliares (casais, pais e filhos e entre irmãos); em sua versão final constam 19 itens, que receberam validação de conteúdo e construto, com alta fidelidade (α= 0,88)30.

A adaptação transcultural para o Brasil foi realizada em 2003, sendo também aplicada em casais, identificando α de 0,70 entre as dimensões de violência física e verbal e de 0,34 a 0,38 entre a faceta de argumentação18. Apesar da utilização em outro grupo populacional da adaptação, os dados foram semelhantes, com alta consistência interna.

Embora cada instrumento apresente fragilidades consideradas no momento da sua escolha para classificação da VCPI é importante considerar a carência de instrumentos e escalas de medidas elaboradas para o contexto e situação social brasileira, assim como a adaptação destes que inclua todas as dimensões tipológicas que envolvem o fenômeno da VCPI

Assim, destaca-se, enquanto limitação do estudo, o déficit de instrumentos válidos e confiáveis para mensuração da VCPI, dificultando a compreensão precisa do fenômeno na pessoa idosa; por outro lado, o estudo direciona pesquisadores, enfermeiros, profissionais de saúde e a comunidade científica para a necessidade de instrumentalização adequada, considerando as particularidades da VCPI.

CONCLUSÕES

O H-S/EAST obteve baixa consistência interna para determinação do risco para violência entre idosos hospitalizados e comunitários, uma vez que apresentou divergentes valores para o coeficiente Alfa de Cronbach, sendo então considerado instável. Embora o CTS-1 não tenha sido planejado para dimensionar situações de VCPI, o instrumento apresentou estabilidade quando aplicado entre os dois grupos estudados com alta confiabilidade interna.

Os achados do presente estudo apontam a necessidade de desenvolvimento de estudos de construção, validação e/ou adaptação transcultural de instrumentos que ofereçam suporte para a enfermagem e demais profissionais da saúde, na determinação de situações de violência contra pessoa idosa.

  • *
    Artigo extraído de projeto de tese de doutorado “EVIDÊNCIAS DE VALIDADE DE ESCALA PARA RASTREIO DA VIOLÊNCIA CONTRA PESSOA IDOSA”, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, Paraíba, Brasil, 2023.

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Editado por

  • Editora associada: Dra. Juliana Balbinot Reis Girondi

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    17 Mar 2023
  • Aceito
    03 Ago 2023
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