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SOCIOLINGUÍSTICA EDUCACIONAL: UMA ENTREVISTA COM STELLA MARIS BORTONI-RICARDO

Educational Sociolinguistics: An Interview with Stella Maris Bortoni-Ricardo

Sociolingüística Educativa: una entrevista con Stella Maris Bortoni-Ricardo

Resumo

A descrição da Sociolinguística Educacional, voltada para o ensino de Língua Portuguesa, nesta entrevista com a Professora Stella Maris Bortoni-Ricardo, da Universidade de Brasília, é parte do dossiê da Revista Linguagem em (Dis)curso e suscita reflexões críticas a partir de experiências docentes em sala de aula, por apresentar a realidade do ensino de Língua Portuguesa e possibilidades metodológicas e teóricas profícuas para a ruptura de concepções cristalizadas no sistema de ensino público brasileiro. Esta entrevista, (re)construída em forma de diálogo, brinda-nos com uma ampla discussão sobre língua(gem), políticas linguísticas e educacionais, letramentos, gêneros textuais/discursivos, e nos convida a uma “crítica de dentro para fora”, por meio da provocação: “Como empoderar o professor de Língua Portuguesa para ensinar de forma produtiva e formar cidadãos brasileiros?”

Palavras-chave:
Língua Portuguesa; Sociolinguística Educacional; Formação de Professores

Abstract

This interview with Professor Stella Maris Bortoni-Ricardo is part of a dossier in Linguagem em (Dis)curso scientific journal, where she talks about the contribution of Educational Sociolinguistics to the treatement of Portuguese Language in Brazilian Schools, as well as raises critical thoughts related to teachers’ planning and action in the classroom. It introduces the reality of the Portuguese Language teaching in addition to methodological and theoretical possibilities of breaking with old-fashioned conceptions that still survive in the Brazilian public education system. The interview was (re)arranged as a dialogue and unveils a large discussion about speech and language, linguistic and educational policies, along with literacies and textual genres. Moreover, her thoughts invites us to an “inside out” criticism through a question: “How to empower Brazilian Portuguese teachers towards a productive teaching and the education of Brazilian citizens?”

Keywords:
Portuguese language; Educational Sociolinguistics; Teachers’ education

Resumen

La descripción de la Sociolingüística Educativa, direccionada para enseñanza de Lengua Portuguesa, en esa entrevista con la Profesora Stella Maris Bortoni-Ricardo, de la Universidade de Brasília, es parte del dossier de la Revista Linguagem em (Dis)curso, y suscita reflexiones críticas desde experiencias docentes en clase, por presentar la realidad de la enseñanza de Lengua Portuguesa y posibilidades metodológicas y teóricas proficuas para ruptura de concepciones cristalizadas en el sistema de enseñanza pública brasileña. Esta entrevista, (re)construida en forma de diálogo, nos brinda con una amplia discusión sobre lengua(je), políticas lingüísticas y educativas, letramentos, géneros textuales/discursivos, y nos invita para una “crítica de dentro hacia fuera”, por medio de la provocación: “¿Cómo empoderar el profesor de Lengua Portuguesa para enseñar de forma productiva y formar ciudadanos brasileños?”.

Palabras clave:
Lengua Portuguesa; Sociolingüística Educativa; Formación de Profesores

A realidade e a prática em sala de aula têm mostrado que a Sociolinguística voltada para a educação pode contribuir de forma significativa para melhorar a qualidade do ensino de língua materna em cursos de formação de professores, porque trabalha com os fenômenos da língua em uso, com base na relação língua e sociedade e voltada para a realidade dos alunos. (BORTONI-RICARDO, 2009, p. 223)

1 INTRODUÇÃO

Esta entrevista tem por objetivo central apresentar reflexões sobre Sociolinguística Educacional, focalizando, entre outros, temas como ensino de Língua Portuguesa, gêneros textuais/discursivos e letramentos (MEURER; BONINI; MOTTA-ROTH, 2005MEURER, J. L.; BONINI, A.; MOTTA-ROTH, D. (Org.) Gêneros: teorias, métodos e debates. São Paulo, SP: Parábola Editorial, 2005.; BORTONI-RICARDO, 2005BORTONI-RICARDO, S. M. Nós cheguemu na escola, e agora? São Paulo: Parábola Editorial, 2005., 2014, 2021; ROJO, 2012; ROJO; BARBOSA, 2015). O texto nos convida a uma “crítica de dentro para fora”, por meio da seguinte provocação e/ou indagação: “Como empoderar o professor de Língua Portuguesa para ensinar de forma produtiva e formar cidadãos brasileiros?”. Consideramos esta questão de suma importância no âmbito da educação linguística no Brasil.

A partir desta entrevista realizada com uma pioneira, estudiosa da área da Sociolinguística no Brasil, Stella Maris Bortoni-Ricardo, da Universidade de Brasília, visa-se suscitar reflexões críticas sobre planejamentos e experiências docentes em sala de aula, (re)apresentar realidades do ensino de Língua Portuguesa e desvendar possibilidades metodológicas e teóricas profícuas para a ruptura de concepções cristalizadas no sistema de ensino público.

O texto está dividido em três partes. Na seção 2 apresentamos as experiências, memórias e identidades da sociolinguista entrevistada. A seguir, apresentamos e discutimos onze perguntas que estão interligadas com questões de Sociolinguística Educacional, ensino de Língua Portuguesa, gêneros textuais/discursivos e multiletramentos. Por último, apresentaremos uma síntese com reflexões sobre língua(gem), políticas linguísticas, letramentos, gêneros textuais/discursivos, visando a propor parâmetros e/ou orientações advindas de uma “crítica de dentro para fora” e contribuir com o empoderamento do professor de Língua Portuguesa e de seus alunos nas escolas públicas.

2 DO CAMPO PARA A CIDADE: EXPERIÊNCIAS, MEMÓRIAS E IDENTIDADES EM (RE)CONSTRUÇÃO

Stella Maris Bortoni-Ricardo nasceu em 12 de fevereiro de 1945, no ano do final da II Guerra Mundial, na cidade mineira de São Lourenço. Sua mãe era professora de Português e fazia questão de que suas três filhas também estivessem atentas à Língua Portuguesa, especialmente a suas peculiaridades na região. Essa influência materna muito benéfica a predispôs aos estudos linguísticos, assim como sua irmã mais nova, Márcia Elizabeth Bortoni, que seguiu a mesma direção. Já a irmã mais velha, Maria Luiza Bortoni Ninis, atua como advogada. Depois de formada, Stella trabalhou na cidade de Rio Verde - GO, consolidando ali uma extensão da Universidade Católica de Goiás, que se transformou em uma fundação municipal e passou a denominar-se FESURV. Mudou-se para Brasília em 1975 e trabalhou na Universidade de Brasília até sua aposentadoria em 2015.

À época, uma nova corrente de estudos linguísticos e sociais - a Sociolinguística - estava ganhando corpo nos Estados Unidos e chegando ao Brasil. Stella Maris Bortoni-Ricardo aplicou-se a leituras sobre essa temática, o que lhe deu recursos para trabalhar e divulgar modos revolucionários de ensinar línguas, em particular a língua materna. A Sociolinguística mostrava pela primeira vez que modos de falar próprios de grupos minoritários não eram um amontoado de erros, mas um sistema consistente e sistemático. O que foi proposto para o Inglês Vernacular Negro nos Estados Unidos por William Labov e associados cabia também ao Português rural e regional no Brasil.

Outra proposta analítica que data desses primeiros anos foi a postulação do contínuo de urbanização, posteriormente complementado pelos contínuos de oralidade e letramento e de monitoração estilística. E, no raiar do novo século, pelo contínuo de acesso à Internet. Com esses contínuos, pôde analisar o Português brasileiro sem fazer juízo de valor com relação às variedades de pouco prestígio social.

Nas primeiras décadas do século XX, poucas mulheres, ainda mais fora do eixo Rio-São Paulo, conseguiam completar seus estudos de graduação. Stella Maris Bortoni-Ricardo iniciou a profissão ministrando aulas de Inglês, mas logo se sentiu entediada com as metodologias estruturalistas de ensino: ouvir e repetir, ouvir e repetir... Como era formada em Letras - Português e Inglês -, podia estender seu trabalho para as aulas de Português, e assim o fez, dedicando-se ao ensino da língua materna.

Sua graduação iniciou-se no Lake Erie College, em Ohio, e concluiu-se na PUC de Goiás. Seu mestrado foi na Universidade de Brasília (UnB) em 1977 e seu doutorado na Universidade de Lancaster (1983).

Na Inglaterra teve contato com a metodologia socioantropológica de Redes Sociais (Social Networks), que adotou para sistematizar o estudo da migração doméstica, especialmente do norte e nordeste brasileiros, para as regiões centro-oeste e sudeste. Tal metodologia é especialmente útil no estudo de novas comunidades urbanas e processos migratórios, condições presentes na consolidação de regiões metropolitanas em países colonizados na Idade Moderna, como o Brasil.

Foi Professora de Língua Portuguesa e Linguística na Universidade de Brasília (1975-2015) e Diretora do Instituto de Letras da UnB (1993-1997), contando com o apoio da Vice-Diretora Professora Alice Joko.

Sem esquecer suas raízes mineiras, nem mesmo seu /r/ retroflexo, caipira, Stella adotou Brasília como uma segunda cidade natal. Da primeira, São Lourenço - MG, recebeu uma Comenda de Filha Ilustre da Cidade em julho de 2000. De Rio Verde - GO recebeu o título de cidadã honorária em 2001.

A Universidade de Cambridge publicou sua tese de doutorado, defendida em 1983. Está publicada em Português com o título: Do campo para a cidade: estudo sociolinguístico de migração e redes sociais (Parábola Editorial, 2011).

Durante sua formação universitária, passou três anos nos Estados Unidos: em 1964-1965, no Lake Erie College - Ohio, como aluna de graduação. Em 1978-1979 na Universidade do Texas em Austin, como bolsista Fulbright. E, em 1990, na Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia, onde fez estágio de pós-doutorado e trabalhou com o renomado Professor William Labov.

No Brasil, mais precisamente na Universidade de Brasília, orientou mais de cento e quarenta mestrandos, doutorandos e pós-doutorandos, além de muitos trabalhos de conclusão de curso de graduação. Sempre defendeu que a formação em Letras deveria habilitar os profissionais ao trabalho também com as séries iniciais. Acreditava que os professores oriundos das licenciaturas de Pedagogia e de Letras deveriam ter um melhor preparo, pois o curso de Letras no Brasil sequer contempla a questão importantíssima do alfabetizar, enquanto o curso de Pedagogia pouca informação transmite sobre princípios básicos da fonologia do Português. Isso é inaceitável em um país que ainda tem cerca de 11 milhões de analfabetos (Pnad, 2019).

Na Universidade de Brasília, além de cursar o mestrado em Linguística, atuou por quarenta anos como Professora nas áreas de Linguística e Educação. Foi presidente pro tempore da Associação Brasileira de Linguística (ABRALIN) durante períodos entre 2003-2005 e presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Letras e Linguística (ANPOLL) entre 1992-1994.

Tem cerca de sessenta capítulos publicados e vinte e sete livros de autoria e/ou organizados.

Stella Maris teve três filhos: duas mulheres e um homem. Larissa, formada em Jornalismo; outra filha, Ana Karina, atua como presidente do Banco BMG; já o filho, Clécio José, cursou Economia e fez doutorado nos Estados Unidos.

Aposentada, Stella Maris Bortoni-Ricardo continua seu trabalho na Sociolinguística e vem escrevendo livros voltados para a formação inicial e continuada dos professores brasileiros.

A partir do título “Sociolinguística Educacional: uma entrevista com Stella Maris Bortoni-Ricardo” temos perguntas postuladas pelo Professor Doutor Kleber Aparecido da Silva, da Universidade de Brasília, respondidas pela Professora Stella Maris Bortoni-Ricardo para suscitar reflexões críticas apoiadas nas experiências docentes em sala de aula e evidenciar que a Sociolinguística Educacional pode contribuir em contextos de desafios educacionais, sociais, comportamentais e culturais.

3 ENTREVISTA COM UMA SOCIOLINGUISTA EM PROCESSO DE (TRANS)FORMAÇÃO SOCIAL E CRÍTICA

Kleber Silva:

O que é língua(gem) para você?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

Linguagem é a capacidade de comunicação entre os humanos, por meio de sistemas sócio-simbólicos, que são as línguas. O domínio da linguagem é chamado de competência linguística desde Chomsky (1965CHOMSKY, N. Aspects of the Theory of Syntax. Cambridge Mass: MIT Press, 1965.). Para os sociolinguistas, que levam em conta a forma e a função linguística conjuntamente (HYMES, 1974), há que se valorizar também o domínio da capacidade de conversação, que é chamado de competência comunicativa.

Ferdinand de Saussure (1949SAUSSURE, F. de. Cours de Linguistique Générale. Paris: s.e., 1949.) [1857-1913] foi o primeiro a postular uma distinção entre dois conceitos relevantes para a definição de linguagem: língua e fala. A língua é um fato social abstrato, conforme proposto por Émile Durkheim [1858-1917], partilhado por uma comunidade de falantes, que ganha realidade concreta na fala.

Noam Chomsky, já referido, associa, respectivamente, língua à competência linguística e fala ao desempenho ou performance. Para ele, a competência é o domínio que o falante tem de um conjunto de regras que lhe permite reconhecer as que são bem formadas de acordo com o sistema da língua. Bem formadas, nesse contexto, não é equivalente às sentenças próprias da chamada Norma Culta. E já que falamos em norma, convém trazer a proposta teórica de Eugenio Coseriu (1979COSERIU, E. Sistema, Norma e fala. In: COSERIU, E. Teoria da Linguagem e Linguística em Geral. (cinco estudos). Rio de Janeiro: Presença, 1979. p. 13-85.) [1921-2002], nascido na Moldávia (entre a Romênia e a Ucrânia), que substituiu a dicotomia saussuriana por um sistema tripartite: sistema, norma e fala. A noção de sistema não sofreu grande mudança, mas a introdução do conceito de norma torna mais operacionalizáveis as ideias de Saussure. Esse conceito pode situar-se entre o sistema (abstrato) e a fala (concreta). Há normas geográficas, estruturais, etc.

Kleber Silva:

Em que consiste aprender e ensinar Língua Portuguesa na contemporaneidade?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

De acordo com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), a Língua Portuguesa é usada como língua primeira e oficial em Portugal e no Brasil. Em Portugal é considerado oficial também o Mirandês. No Brasil há cerca de 180 línguas indígenas minoritárias, além da LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) e da Língua de Sinais Kaapor Brasileira, falada no Sul do Maranhão. Nas ex-colônias portuguesas na África e no Timor Leste, na Ásia, também se fala Português, mas em contextos bilíngues ou plurilíngues, como por exemplo o Arquipélago de Cabo Verde onde o Português convive com o crioulo cabo-verdiano e outras línguas aborígines. O quadro 1 (BORTONI-RICARDO, 2021BORTONI-RICARDO, S. M. Português Brasileiro, a língua que falamos. São Paulo: Contexto, 2021., p. 40) traz informações sobre o Português na ecologia linguística dos nove países em que a língua é usada em comunidades de fala.

Quadro 1
Principais línguas usadas na CPLP

Recomendo, sobre o tema, pesquisar também o trabalho da Comissão de Língua Portuguesa (COLIP) criada pelo MEC para assessorar o Governo Federal na questão do Acordo Ortográfico de 2009 no âmbito da CPLP, entre outros assuntos, Comissão esta da qual participei como membro.

Pensando na proeminência internacional de nossa língua, há que se levar em conta nas diferentes economias linguísticas onde a língua tem vitalidade que são sociedades multiculturais e plurilíngues. Com exceção de Portugal, todos os países falantes de Língua Portuguesa estão do Sul Global.

O Português é a quinta língua mais falada no mundo, a terceira do Ocidente e é considerada por muitas fontes como a primeira língua do Hemisfério Sul. Ao todo, há 260 milhões de falantes de Língua Portuguesa (Agência Brasil, 2020), sendo 211 milhões só no Brasil, o que totaliza 81,15% do total de falantes de Língua Portuguesa no mundo. A posição do Brasil nesse ranking acarreta responsabilidades do governo e sociedade brasileiros em relação à preservação da língua e seu desenvolvimento como código escrito, particularmente na difusão das ciências e literatura.

A metodologia de ensino e aprendizagem do Português depende da economia sociolinguística da comunidade onde essa língua é falada. Em particular, recomendo que se traga à baila o conceito de recursos comunicativos (BORTONI-RICARDO, 2005BORTONI-RICARDO, S. M. Nós cheguemu na escola, e agora? São Paulo: Parábola Editorial, 2005.). Aprender Língua Portuguesa na contemporaneidade significa, para mim, dominar recursos comunicativos. Para isso levo em conta três parâmetros que facilitam ou dificultam essa aprendizagem: a) grau de dependência contextual no evento de fala; b) grau de complexidade do tema abordado; c) familiaridade com a tarefa comunicativa (BORTONI-RICARDO, 2021).

Quando a dependência contextual é mais limitada, os falantes sentem necessidade de recorrer a um vocabulário específico e a operadores lógicos, buscando clareza. Esse é o caso de textos mais complexos, desenvolvidos sem apoio contextual no ambiente em que se encontram falantes e ouvintes. Gêneros discursivos mais conhecidos são expressos com um vocabulário também mais conhecido. O mesmo se aplica ao grau de complexidade do tema. Quando o falante tem familiaridade com determinada tarefa comunicativa, ela vai exigir dele menos pressão comunicativa. O contrário também é verdadeiro. Comparem-se, por exemplo, a defesa de uma tese de doutorado ou uma aula de física quântica com uma conversa casual.

Para a maioria da população brasileira, a Língua Portuguesa é língua primeira, aprendida no lar, mas é na escola que a competência comunicativa dos brasileiros se amplia, no sentido de que há um esforço de metalinguagem que vai contemplar a reflexão sobre os recursos e os usos adequados da língua. Não nos referimos a uma metalinguagem terminológica, cujo uso excessivo na escola pode ser até mesmo prejudicial, mas ao esforço de trazer à consciência dos alunos a relação entre forma e função no uso de sua língua materna. Em síntese, é preciso trabalhar na escola a competência de falar, de ouvir, de ler e escrever a Língua Portuguesa, levando em conta os gêneros textuais presentes na comunidade de fala. É preciso levar em conta também a competência comunicativa que os alunos já trazem de sua sociabilização em família. Muitas crianças chegam à escola com conhecimentos da variedade formal do Português, pelo menos na oralidade. Nesse caso, juntamente com o ensino da leitura e escrita, será ampliado esse conhecimento, familiarizando-as com os estilos mais formais da língua. Mas há estudantes que provêm de comunidades onde as variedades usadas são apenas as informais, o que vai requerer metodologias mais específicas para que tenham acesso aos estilos formais. É quase como a metodologia própria do ensino de línguas estrangeiras. Os cursos de formação de professores têm de estar atentos a essas demandas variadas.

Kleber Silva:

Afinal, o que faz a Sociolinguística Educacional?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

A Sociolinguística surgiu em meados da década de 1960 nos Estados Unidos e na Europa, como resultado da discussão entre os problemas do ensino de leitura. Havia uma concepção equivocada de que crianças negras e latinas nos Estados Unidos tinham menos condições de aprendizagem do que crianças brancas de classes altas. Alguns precursores da Sociolinguística, como Labov (1972LABOV, W. The Logic of Nonstandard English. In: Language in the Inner City. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1972.), Shuy (1967SHUY, R.; WOLFRAM, W.; RILEY, W. K. A study of social dialects in Detroit. Report on project 6-1347. Washington, D.C.: Office of Education, 1967.) e Fasold (1984FASOLD, R. The Sociolinguistics of Society. Oxford: Basil Blackwell, 1984.), entre outros, mostraram que essas crianças dos grupos minoritários não eram portadoras de um déficit cognitivo. O bem conhecido artigo “The Logic of Nonstandard English” (LABOV, 1972LABOV, W. The Logic of Nonstandard English. In: Language in the Inner City. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1972.) (A lógica do Inglês não-padrão) mostrou que o comportamento monossilábico das crianças em condições de vulnerabilidade social decorria da situação assimétrica em que se encontravam. Quando se sentiam mais confiantes, essas crianças mostravam muita competência linguística. Foi a partir desse embate de ideias que surgiu a Sociolinguística. Podemos dizer que essa área do conhecimento é “educacional” pela sua própria natureza.

No caso específico do Brasil, venho denominando Sociolinguística Educacional todos os esforços de promover a competência linguística e comunicativa de crianças que não são expostas às variedades de prestígio da língua materna em sua família e que as vão aprender na escola, seguindo a orientação da Sociolinguística Educacional. Sobre o adjetivo “Educacional” que emprego para identificar essa trilha da Sociolinguística, recomendo alguns textos meus recentes: BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Português Brasileiro, a língua que falamos. São Paulo: Editora Contexto, 2021. E BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Manual de Sociolinguística. São Paulo: Editora Contexto, 2014. Na Universidade de Brasília já são muitos os trabalhos orientados pela Sociolinguística Educacional, que podem ser acessados em < http://lattes.cnpq.br/7444415903226607>. Há também trabalhos nessa linha na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na Universidade Federal da Bahia (UFBA), entre outras.

Kleber Silva:

O que distingue a Sociolinguística Educacional da Linguística Aplicada?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

Não há distinção conceitual entre elas. A Sociolinguística Educacional vale-se do conhecimento acumulado na Linguística e na Linguística Aplicada. Veja-se que, nessa última, a aplicação não se restringe aos recursos didáticos. A Linguística pode ser aplicada a muitos contextos e não se restringe à educação linguística. Para uma discussão mais circunstanciada, remeto a Cavalcanti (1986CAVALCANTI, M. do C. A propósito de Linguística Aplicada. Trabalhos em Linguística Aplicada v. 7, n. 2, p. 5-12, 1986) e outros trabalhos em que a autora demonstra a relevância e a aplicabilidade da Linguística Aplicada, bem como a Roxane Rojo, para quem a Linguística Aplicada pode ser qualificada como transdisciplinar, interdisciplinar e intercultural:

A questão é: não se trata de qualquer problema - definido teoricamente - mas de problemas com relevância social suficiente para exigirem respostas teóricas que tragam ganhos a práticas sociais e a seus participantes, no sentido de uma melhor qualidade de vida, num sentido ecológico. (ROJO, 2006ROJO, R. Fazer Linguística Aplicada em perspectiva sócio-histórica: privação sofrida e leveza de pensamento. In: MOITA-LOPES, L. P. da. (Org.) Por uma linguística aplicada indisciplinar. São Paulo: Parábola Editorial, 2006. p. 253-276., p. 258).

Kleber Silva:

Quais os efeitos da relação entre linguagem e sociedade nas pesquisas em Sociolinguística Educacional e na Linguística Aplicada?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

É através da linguagem que se estabelecem as hierarquias sociais e se definem os papéis sociais que os indivíduos assumem em função das exigências que se lhes apresentam.

Ward Goodenough (1964GOODENOUGH, W. Cultural Anthropology and Linguistics. In: HYMES, D. (Org.) Language in Culture and Society. New York: Harper & Row, p. 36-39, 1964.) observou sabiamente que, nos processos comunicativos, os membros de uma comunidade têm de aprender o que dizer e como dizê-lo adequadamente em quaisquer circunstâncias.

Segue daí que a estrutura de uma sociedade é constituída pelos usos que os falantes fazem da(s) língua(s) que implementam suas relações sociais. Portanto, a Sociolinguística Educacional concebe a linguagem (e as línguas empregadas pelos indivíduos) como base das sociedades. Essa é uma síntese muito feliz da antropologia cognitiva proposta pelo linguista americano Ward Goodenough (1964GOODENOUGH, W. Cultural Anthropology and Linguistics. In: HYMES, D. (Org.) Language in Culture and Society. New York: Harper & Row, p. 36-39, 1964.).

Kleber Silva:

O que é letramento para você? E como este conceito foi ressignificado com o decorrer dos anos no Brasil e no exterior?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

O termo letramento, como tradução do inglês literacy, foi introduzido no Brasil pela Professora Magda Soares e divulgado especialmente pela Professora Angela Kleiman (inter alia). Geralmente vem usado no plural, referindo-se a culturas de letramento, que convivem, nas comunidades, associadas a diferentes atividades sociais, científicas, religiosas, profissionais, etc. Existem também manifestações culturais letradas associadas à cultura popular, como a literatura de cordel (BORTONI-RICARDO, 2004BORTONI-RICARDO, S. M. Educação em língua materna: a Sociolinguística na sala de aula. São Paulo: Parábola Editorial, 2004., p. 24).

A partir do trabalho do antropólogo britânico Brian Street (1984STREET, B. Literacy in theory and practice. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.) [1943-2017], que viveu alguns anos no Brasil, as práticas de letramento foram associadas ao desenvolvimento cognitivo da criança e se tornaram um lócus de grande interesse para a Pedagogia.

Em meu trabalho de 2004, pude dar ênfase à transição entre a cultura predominantemente oral no âmbito familiar e vicinal, e a cultura escolar, permeada pela escrita, ou seja, pela cultura de letramento.

Todavia, a cultura de sala de aula não se configura sempre como de letramento. Há momentos próprios de uma cultura de oralidade.

Em todos os domínios sociais há regras que determinam as ações que ali são realizadas. Elas podem estar documentadas e registradas, como nos casos de um tribunal de júri ou culto religioso, ou podem ser apenas parte da tradição cultural. (BORTONI-RICARDO, 2004BORTONI-RICARDO, S. M. Educação em língua materna: a Sociolinguística na sala de aula. São Paulo: Parábola Editorial, 2004., p. 25).

Vou exemplificar o caso da tradição consuetudinária, com uma transcrição de interação em sala de aula. Nos eventos de letramento, nesse domínio, a fala é geralmente simultânea à escrita no quadro de giz ou no caderno dos alunos. Os turnos costumam ser mais longos com a fala mais pausada. Já os eventos de oralidade são intervenções mais curtas do professor, para manter a disciplina ou passar informações que têm alto grau de dependência contextual. De fato, o grau de dependência contextual é uma variável relevante, que distingue eventos de letramento de eventos de oralidade.

Vejamos um exemplo de uma sala de aula multisseriada em que o professor está conduzindo um evento de letramento e interpõe, na sequência, atos de oralidade (BORTONI-RICARDO, 2004BORTONI-RICARDO, S. M. Educação em língua materna: a Sociolinguística na sala de aula. São Paulo: Parábola Editorial, 2004., p. 28 ss):

  1. Professor lendo: por que todos gostavam dele? /.../ Qual era a maior felicidade do palhacinho? Como costumavam chamá-lo?

  2. Professor falando: As crianças chamavam ele é... De um nome, sei lá. Um apelido lá, né? Qual era esse apelido dele, tá?

  3. Professor lendo: um dia o palhacinho chorou. Por que ele chorou?

  4. Professor falando: Isto tá escrito lá no livro.

  5. Professor lendo: Quantas crianças haviam mais ou menos no palco?...

  6. Professor falando: quantas crianças tinha mais o menos lá, tá bom? Então cê vai respondê lá, olhano no livro respondê, tá? (BORTONI-RICARDO, 2004BORTONI-RICARDO, S. M. Educação em língua materna: a Sociolinguística na sala de aula. São Paulo: Parábola Editorial, 2004., p. 28 ss.).

Em 1 o professor, que está lendo, usa o pronome oblíquo “o” precedido pela consoante eufônica “l”. Em 2 o professor emprega o pronome do caso reto “ele” como objeto direto, além de marcadores conversacionais: “sei lá”, “né” e “tá”. Em 3 o professor lê, mantendo a formalidade da frase. Em 4, no entanto, como está falando, usa a forma “tá” em vez de “está”. Em 5 o professor, ao ler, produz uma hipercorreção: “haviam”. Em 6, o professor, ao falar, usa informalmente o pronome pessoal “cê” (você). Reduz a sequência de gerúndio “-ndo” para “-no” e conclui o turno com um marcador conversacional.

Nesse curto episódio de sala de aula podemos ver que um evento de letramento, em um domínio onde esse é apropriado, pode ser permeado por eventos de oralidade. Podemos constatar também a dificuldade em estabelecer as fronteiras de eventos (ou atos) de letramento e eventos (ou atos) de oralidade.

Não se pode descuidar ainda do fato de que o conceito de “literacy” pode ser traduzido como “alfabetização” ou como “letramento”. No primeiro caso, a tradução corresponde ao uso tradicional da palavra. No segundo, ao conceito mais complexo de letramento conforme expusemos.

Kleber Silva:

Qual é o papel da pedagogia dos (multi)letramentos e da teoria dos gêneros textuais e/ou discursivos no ensino-aprendizado da língua portuguesa?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

O conceito de letramento proposto por Brian Street (1984STREET, B. Literacy in theory and practice. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.) vem sendo contemporaneamente usado no plural de modo a contemplar a variação existente na forma como os letramentos são efetivamente usados, ou seja, é um modo de combater preconceitos que consideram dimensões valorativas entre os diversos letramentos: letramentos de maior ou menor prestígio em função dos grupos sociais que os usam. A pesquisadora da Unicamp Roxane Rojo (2015ROJO, R.; BARBOSA, J. Hipermodernidade, multiletramentos e gêneros discursivos. São Paulo: Parábola Editorial, 2015.), mostra que, na perspectiva dos multiletramentos, articulam-se diversas modalidades de linguagem, a escrita, a imagética, a fala e a música, bem como tecnologias.

A teoria de gêneros textuais, proposta pela Escola de Genebra, é consentânea com a visão da pluralidade de letramentos, sempre levando em conta que os gêneros textuais são muito variados, especialmente nas comunidades de fala mais complexas, e se manifestam na oralidade e na cultura letrada.

Gêneros são peças de linguagem historicamente consolidadas, que podem ser orais ou escritos. Por exemplo, uma oração, uma tirinha, um editorial jornalístico, etc. (BORTONI-RICARDO, 2014BORTONI-RICARDO, S. M. Manual de Sociolinguística. São Paulo: Editora Contexto, 2014.). Cada falante tem domínio sobre um certo número de gêneros. Isso é parte da sua competência comunicativa, como já explicada aqui ao citarmos Goodenough (1964GOODENOUGH, W. Cultural Anthropology and Linguistics. In: HYMES, D. (Org.) Language in Culture and Society. New York: Harper & Row, p. 36-39, 1964.). O repertório de gêneros de um falante não coincide necessariamente com o repertório de outro falante. Por exemplo, algumas pessoas são muito hábeis na contação de histórias infantis, outros não assumem se engajam nesse evento por não terem habilidades com eles.

Kleber Silva: Que concepção de aluno e de professor seria mais adequada às pesquisas na Sociolinguística Educacional e por quê?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

A Sociolinguística Educacional procura seguir o que ensinou Paulo Freire (1996FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.) sobre os papéis do professor e do aprendente. Esse grande pensador brasileiro revolucionou a forma como os professores se veem e veem seus alunos. O professor sabe que seus alunos devem ter primazia no processo escolar e também que há sempre algo a aprender nesse processo.

Paulo Freire é um dos brasileiros mais referenciados em trabalhos educacionais. Sua teoria é ampla e não podemos resumi-la em um parágrafo aqui, mas podemos apontar que sua principal contribuição é começar o trabalho pedagógico onde os alunos estão. Isso vale para classes de alfabetização, mas também para outros níveis de ensino e aprendizagem. Ele mostrava, por exemplo, que a alfabetização de adultos deveria começar com palavras que pertencem ao universo vivencial desses aprendizes.

Kleber Silva:

As novas tecnologias digitais têm trazido contribuições no uso e na aprendizagem de Língua Portuguesa? De que forma?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

As tecnologias digitais podem ser muito úteis no ensino e aprendizagem de línguas, seja língua materna, sejam línguas estrangeiras. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) de 2018, há no Brasil contemporâneo cerca de 82,7% de domicílios nacionais com acesso à Internet (TOKARNIA, 2020TOKARNIA, M. Um em cada 4 brasileiros não tem acesso à internet, mostra pesquisa. Agência Brasil. Brasília, 29/04/2020. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-04/um-em-cada-quatro-brasileiros-nao-tem-acesso-internet. Acesso em: 7 maio 2021.
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). Esse recurso ajuda a difundir a cultura de letramento e supre a deficiência histórica que temos de livros e outros suportes da língua escrita.

A Internet não está aí, todavia, para substituir os livros e sim para possibilitar o acesso à cultura letrada, que se dá pelos meios tradicionais e pela tecnologia da informação. Considere-se também a possibilidade de acesso a línguas estrangeiras, mesmo quando livros e outros suportes não estão disponíveis. Os jovens gostam de trabalhar com as tecnologias digitais e aos poucos a população mais velha também se apropria desses recursos.

Há alguns anos, antes da década de 1980, temia-se que a língua escrita estivesse fadada ao desaparecimento em larga escala porque a escrita propriamente dita pouco era usada na sociedade em geral em virtude do desenvolvimento de equipamentos digitais. As Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), ao propiciar oportunidade de escrita em diversas plataformas, reverteram essa situação e vêm tornando mais democráticos os letramentos.

Kleber Silva:

Há influências da pós-modernidade no campo da Sociolinguística Educacional? Quais?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

Como já explicado nesta entrevista, a Sociolinguística teve seu nascedouro na década de 1960 nos Estados Unidos e em muitos outros países, inclusive no Brasil. Como os conceitos sociolinguísticos fazem parte da estrutura sociocultural de cada comunidade, estão submetidos às influências da pós-modernidade e também exercem sua influência sobre os modos como os seres humanos desenvolvem as suas relações interindividuais. Em particular, devemos citar a globalização dos conhecimentos, área à qual a Sociolinguística trouxe relevante contribuição, ao trabalhar especialmente com o conceito de competência comunicativa.

Kleber Silva:

Quais as perspectivas da Sociolinguística Educacional e seus desafios neste contexto pandêmico?

Stella Maris Bortoni-Ricardo:

A Pandemia de Covid-19 nos impôs muitas restrições em nossas relações interindividuais, na medida em que recomendou o isolamento social como forma de evitar a propagação da doença. Apesar dessa consequência negativa da Covid-19, temos de admitir que o próprio isolamento social propiciou um incremento na Educação remota ou a distância (EAD).

Nesse contexto, a Sociolinguística surgiu como um recurso na implementação das relações a distância e, muito especialmente, auxilia o trabalho escolar remoto na medida em que colabora com a difusão dos letramentos entre os diversos segmentos que compõem a sociedade brasileira. Ressalte-se ainda que a Sociolinguística colabora para o diálogo tecnológico entre as diversas mídias (impressas e digitais), o que é muito importante em um país continental como o nosso e com perversa hierarquização social.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A perspectiva adotada neste artigo coaduna-se com as constatações de temas de pesquisas recentes, realizados no bojo da Linguística Aplicada (Crítica) e da Sociolinguística Educacional (MEURER; BONINI; MOTTA-ROTH, 2005MEURER, J. L.; BONINI, A.; MOTTA-ROTH, D. (Org.) Gêneros: teorias, métodos e debates. São Paulo, SP: Parábola Editorial, 2005.; BORTONI-RICARDO, 2005BORTONI-RICARDO, S. M. Nós cheguemu na escola, e agora? São Paulo: Parábola Editorial, 2005., 2014, 2021; ROJO, 2012; ROJO; BARBOSA, 2015).

São direcionados às experiências pedagógicas sobre o ensino de línguas, concebidas como praxiologias críticas, que dão ênfase não somente aos aspectos gerais do ensino, como à expressão oral, à leitura e produção textual, à análise linguística. Também realçam a importância de trabalharmos aspectos culturais, ideológicos e políticos (PESSOA; SILVA; FREITAS, 2021PESSOA, R.; SILVA, K.; FREITAS, C. C. Praxiologias do Brasil Central sobre Educação Linguística Crítica. São Paulo: Pá de Palavra, 2021.). Esta filosofia de ensino de Língua Portuguesa converge com os preceitos educacionais de Freire (1987FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987., p. 34) quando afirma que

Não há prática social mais política que a prática educativa. Com efeito, a educação pode ocultar a realidade da dominação e da alienação ou pode, pelo contrário, denunciá-las, anunciar outros caminhos, convertendo-se assim numa ferramenta emancipatória. O oposto da intervenção é a adaptação, é acomodar-se, ou simplesmente adaptar-se a uma realidade sem questioná-la. (FREIRE, 1987FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987., p. 34).

Em síntese, defendemos que os resultados de pesquisas realizadas no bojo da Linguística Aplicada e da Sociolinguística Educacional deveriam ser incorporados no (re)pensar em políticas linguísticas e em políticas educacionais, visando assim fomentar e promover iniciativas docentes para a educação linguística crítica, em contextos que têm desafios educacionais, sociais, comportamentais, culturais. E isto só será possível por meio de ações instigadoras que possam fazer com que os/as professores/as aventem posturas críticas e/ou decoloniais em suas salas de aula, por meio de busca de inovações metodológicas, didáticas, epistêmicas e teóricas mais condizentes com os paradigmas que vislumbramos nesta contemporaneidade.

REFERÊNCIAS

  • BENEGRA, T. Uma Professora revolucionária: Stella Maris Bortoni-Ricardo. Revista Parabólicos, São Paulo, ano 1, 4. ed., p. 2-3, jun. 2021.
  • BORTONI-RICARDO, S. M. Português Brasileiro, a língua que falamos. São Paulo: Contexto, 2021.
  • BORTONI-RICARDO, S. M. Manual de Sociolinguística. São Paulo: Editora Contexto, 2014.
  • BORTONI-RICARDO, S. M. Nós cheguemu na escola, e agora? São Paulo: Parábola Editorial, 2005.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    23 Jul 2021
  • Aceito
    14 Nov 2021
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