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MAC: Uma Proposta para Metas Atuariais Consistentes em Fundos de Pensão

RESUMO

Objetivo:

viabilizar a proposição de um novo método, a Meta Atuarial Consistente (MAC), que evita, ajustando-as, metas atuariais incompatíveis nos fundos de pensão, após investigar e comprovar, na pesquisa, que a meta dissocia-se da regra geral dos normativos vigentes, que adere essa meta à expectativa de rentabilidade dos investimentos do plano de previdência.

Metodologia:

foi elaborada uma amostra contendo dados de 22 planos BD, onde aplicou-se a MAC depois de os métodos de dados em painel identificarem os elementos que influenciam a definição da meta atuarial ocorrida no conselho deliberativo dos respectivos fundos de pensão.

Resultados:

a utilização da MAC, adequando as metas atuariais de 2018 a partir dos vieses sistemáticos ocorridos nas metas anteriores, possibilitou um efeito positivo que se desdobra em estimativas mais fidedignas para as provisões matemáticas dos planos, ao mesmo tempo que identificou elementos que influenciam na determinação do valor da meta anual, provocando sua não aderência à regra geral da legislação.

Conclusões:

a adoção da MAC pela Previc aperfeiçoaria o regramento e forneceria subsídios para melhor adequar os níveis de contribuição praticados nos planos, tornando mais fidedignos seus níveis de solvência, o que beneficiaria o desenvolvimento do mercado de seguros e de previdência.

Palavras-chave:
mercado de seguros e previdência; meta atuarial; fundos de pensão; dados em painel; legislação previdenciária

ABSTRACT

Objective:

this article proposes the meta atuarial consistente (MAC) (consistent actuarial rate), which is a method that adjusts incompatible actuarial rates in pension funds, after investigating and proving that the rate dissociates from the general rule in current regulations (which binds this rate to the expected return of the investments of pension funds).

Methodology:

a sample with data from 22 defined-benefit plans was collected, and MAC was applied to produce consistent actuarial rates, after panel data methods have identified the elements that influence the definition of the actuarial rate by the pension fund board of trustees.

Results:

the use of MAC, adjusting actuarial rates of 2018 based on systematic biases in previous rates, enabled a positive effect that unfolds in more reliable estimates for the plans’ mathematical provision, while identifying elements that influence the determination of the annual rate, causing its non-compliance to the general rule.

Conclusion:

the adoption of MAC by the Brazilian supervisory authority Previc would improve the rules and provide subsidies to better adjust the contribution levels practiced in the plans, making their solvency levels more reliable, which would benefit the development of the insurance and pension market.

Keywords:
actuarial interest rate; pension funds; panel data; insurance and pension market; social security legislation

INTRODUÇÃO

Este trabalho propõe a Meta Atuarial Consistente (MAC), um método que possibilita adequar a taxa de descontos, a meta atuarial, dos planos de previdência de benefício definido (BD) à regra geral da legislação vigente. Desde 2013, há indícios de que a meta atuarial, definida anualmente nos fundos de pensão, se dissociou das rentabilidades futuras dos investimentos do patrimônio dos planos de previdência. Em 2018, 73,4% das carteiras dos fundos de pensão estavam alocadas em renda fixa, enquanto 18,5% encontravam-se em renda variável (Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar [ABRAPP], 2018). Giambiagi e Afonso (2009Giambiagi, F., & Afonso, L. E. (2009). Cálculo da alíquota de contribuição previdenciária atuarialmente equilibrada: Uma aplicação ao caso brasileiro. Revista Brasileira de Economia, 63(2), 153-179. https://doi.org/10.1590/S0034-71402009000200006
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), Leal e Mendes (2010Leal, R. P. C., & Mendes, B. V. M. (2010). The risk-return relationship of pension funds with investments in hedge funds. Latin American Business Review, 11(2), 141-169. https://doi.org/10.1080/10978526.2010.496307
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) e Pereira (2013Pereira, M. M. (2013). Impactos da redução nas taxas de juros da economia para os fundos de pensão (Master’s thesis). Universidade de Brasília, Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Ciência da Informação e Documentação, Brasília, DF, Brazil. Retrieved from https://repositorio.unb.br/handle/10482/15542
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) já destacavam que a tendência mundial de redução das taxas de juros alcançaria o mercado brasileiro, afetando rentabilidades dos títulos públicos federais e, consequentemente, fundos de pensão, que utilizavam, até 2012, metas iguais ou bem próximas a 6% ao ano. Previamente à tendência supracitada, Mesa-Lago (2006Mesa-Lago, C. (2006). Private and public pension systems compared: An evaluation of the Latin American experience. Review of Political Economy, 18(3), 317-334. https://doi.org/10.1080/09538250600797768
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) alertava que as altas taxas de retorno dos títulos governamentais não perdurariam para sempre devido ao risco de default.

O objetivo principal deste trabalho é propor uma metodologia, a MAC, que ajusta metas atuariais não aderentes à expectativa de rentabilidade do patrimônio de um plano de previdência, após identificar, na pesquisa, elementos que determinaram a escolha da meta atuarial nos fundos de pensão em um intervalo temporal. O método surgiu, inesperadamente, ao fim da pesquisa desenvolvida neste artigo, onde utilizamos, como metodologia, métodos de regressão de dados em painel (Fávero, 2013Fávero, L. P. L. (2013). Dados em painel em contabilidade e finanças: Teoria e aplicação. Brazilian Business Review, 10(1), 131-156. Retrieved from https://www.redalyc.org/pdf/1230/123025719006.pdf
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; Marques, 2000Marques, L. D. (2000, October). Modelos dinâmicos com dados em painel: Revisão de literatura [Working Paper n. 100]. Universidade do Porto, Faculdade de Economia do Porto, Centro de Estudos Macroeconômicos e Previsão, Porto, Portugal. Retrieved from http://wps.fep.up.pt/wps/wp100.pdf
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), modelos de efeitos fixos, aplicados em dados históricos de 22 planos de previdência, uma amostra extraída da população de 266 planos BD administrados pelos fundos de pensão brasileiros. As regressões identificaram os elementos que contribuem para a escolha, ex-ante, de metas atuariais que se mostrarão distantes da média das rentabilidades observadas, ex-post, em seus patrimônios. A MAC possibilita alinhar o atual processo de definição da meta atuarial dos fundos de pensão que, conforme resultados da pesquisa, encontra-se distante dos parâmetros determinados pela legislação atual. Metas imprecisas resultam em contribuições futuras de participantes e patrocinadores descompassadas com os benefícios prometidos dos planos. Nesse sentido, a adoção da MAC, reduzindo possíveis não aderências das metas às rentabilidades dos ativos financeiros, e os resultados das regressões constituem a contribuição teórica da pesquisa.

Há duas literaturas que poderiam remeter à pesquisa aqui apresentada. Santana e Costa (2017Santana, V. F., & Costa, T. M. T. (2017). The discount rate in pension assets and liabilities management. Brazilian Review of Finance, 15(4), 631-655. https://doi.org/10.12660/rbfin.v15n4.2017.66262
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) propuseram um estudo de caso com duas abordagens para apurar a meta atuarial a partir dos dados produzidos na avaliação atuarial de um plano BD. A meta, inicialmente, é baseada na carteira de investimentos do plano e em premissas de rentabilidades futuras, e, em seguida, em uma carteira de títulos públicos com previsões da taxa Selic obtidas em estudo pretérito de 2006. A última abordagem assemelha-se às defendidas por Chapman, Gordon e Speed (2001Chapman, R. J., Gordon, T. J., & Speed, C. A. (2001). Pensions, funding and risk. British Actuarial Journal, 7(4), 605-662. https://doi.org/10.1017/S1357321700002488
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) e Novy-Marx (2015Novy-Marx, R. (2015). Economic and financial approaches to valuing pension liabilities. Journal of Pension Economics & Finance, 14(2), 144-150. https://doi.org/10.1017/S1474747214000468
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), baseadas em um portfólio de baixo risco. Por sua vez, Silva, Malaquias e Rech (2020Silva, W. A. M., Malaquias, R. F., & Rech, I. J. (2020). Análise das variáveis que afetam o desempenho de carteira das entidades fechadas de previdência complementar brasileiras. Revista Contemporânea de Contabilidade, 17(44), 54-70. https://doi.org/10.5007/2175-8069.2020v17n44p54
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) identificaram variáveis que afetaram as rentabilidades, representadas por índices de Sharpe, dos portfólios de 310 fundos de pensão nacionais entre 2011 e 2018. Taxas administrativas ou recursos dos fundos (se ausentes as taxas no modelo), idade do fundo, índices de risco e de diversificação em ações explicaram a rentabilidade apurada. Apesar de alguma afinidade, esses trabalhos se distanciam da nossa pesquisa por conta da limitação a um único plano e conjunto de premissas, com regras anteriores aos normativos atuais, no caso de Santana e Costa (2017), e no caso de Silva et al. (2020), por explanar rentabilidades pretéritas dos fundos de pensão, as quais, como defendemos, encontram-se distantes das metas atuariais definidas.

Portanto, até onde temos conhecimento, a pesquisa aqui apresentada possui caráter inovador, não havendo similares em periódicos nacionais e internacionais. Inicialmente, a originalidade deve-se ao fato de a análise longitudinal, aplicada em ampla gama de dados de planos BD patrocinados por relevantes empresas e estatais, ter identificado, via métodos de dados em painel, fatores que realmente influenciaram a definição da meta atuarial característica do recorte temporal da amostra. Reforçando esse ineditismo, e talvez a grande contribuição da pesquisa, há, efetivamente, a proposição metodológica representada pela MAC, que calibra, suavemente, a meta definida nos planos à complexa legislação brasileira, utilizando desvios apurados entre as metas e rentabilidades anteriores.

Entendemos ser importante destacar o caráter social dos fundos de pensão, que está correlacionado à determinação da meta atuarial. A busca do cumprimento da meta, preferencialmente sua superação, é fator preponderante para a garantia dos benefícios dos participantes de um plano BD, que confiaram, via termo de adesão, suas economias às entidades fechadas de previdência complementar (EFPC), nome oficial dos fundos de pensão, investidores institucionais capazes de proporcionar proteção financeira pós-laboral condizente com as contribuições efetuadas ao plano (Alda, 2018Alda, M. (2018). A strategic fund family business decision: The pension fund liquidation. Journal of Business Research, 91, 248-265.https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2018.06.024
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; Binswanger & Schunk, 2012Binswanger, J., & Schunk, D. (2012). What is an adequate standard of living during retirement? Journal of Pension Economics & Finance, 11(2), 203-222. https://doi.org/10.1017/S1474747211000618
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; Martins-Costa, 2005Martins-Costa, J. (2005). Reflexões sobre o princípio da função social dos contratos. Revista Direito GV, 1(1), 41-66. Retrieved from http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/revdireitogv/article/view/35261
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). Acreditamos que a MAC proporcionará solidez aos pagamentos dos benefícios previdenciários dos participantes dos planos, geridos por entidades em um setor que possui ativos financeiros equivalentes a 13,2% do PIB (ABRAPP, 2018).

CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA

A importância da meta atuarial

Sociedades seguradoras e entidades de previdência dependem de uma taxa de desconto para precificar prêmios, contribuições e benefícios destinados à cobertura dos produtos oferecidos. Essa taxa é conhecida por meta atuarial nos fundos de pensão, termo que adotamos, e busca reproduzir a rentabilidade esperada do patrimônio de cobertura do plano de benefícios. A meta pode ser interpretada como uma taxa que equilibra fluxos de caixa de pagamento de benefícios ao patrimônio do plano. Se a meta sobe, o valor presente dos fluxos com benefícios diminui, e será possível reduzir o nível do plano de custeio ou aumentar o nível dos benefícios. Ao reduzi-la, o valor presente dos fluxos cresce, o que poderá implicar contribuições maiores ou benefícios menores. É comum o estabelecimento da hipótese de uma taxa constante como meta atuarial, embora seja um caso particular de uma hipótese mais geral variando, em uma curva, a taxa ao longo do tempo.

A meta é uma premissa econômica relevante dos planos previdenciários definida em reuniões do conselho deliberativo dos fundos de pensão, Conselho daqui em diante. Sua definição é um dos eventos mais importantes no Conselho, porque as alíquotas contributivas e os níveis de benefícios dependerão de a meta escolhida gravitar a média dos rendimentos futuros do patrimônio do plano. Uma meta adequada provê transparência à saúde financeira do plano, permitindo que o patrimônio de cobertura seja fidedignamente comparado às provisões matemáticas (ou atuariais), a soma total do valor atual dos benefícios futuros. Assim, estima-se um passivo atuarial contrapondo-o ao patrimônio de cobertura, o que resultará em déficit (patrimônio insuficiente para pagar os benefícios futuros), equilíbrio técnico ou superávit (o patrimônio excede o necessário). Déficits ou superávits são solucionados em até, respectivamente, dois e três períodos após a ocorrência, se vencidas regras e limites definidos na resolução CNPC n.º 30 de 10/10/2018 (resolução 30).

Assim, desequilíbrios em planos BD e suas soluções refletem-se, necessariamente, nas demonstrações contábeis dos fundos de pensão e nas patrocinadoras. A Tabela 1 contém o total anual de planos de contribuição variável (CV), BD e contribuição definida, de 2010 a 2018, dividido entre déficit ou superávit (ABRAPP, 2018).

Tabela 1
Planos de previdência das EFPCs em déficit ou superávit por ano.

Em 2018, havia um total de 199 planos em déficit, possivelmente com metas atuariais descalibradas. Isso pode indicar uma dificuldade dos fundos de pensão em estimar uma meta condizente com o desempenho financeiro do patrimônio de cobertura dos planos. Entre 2012 e 2013, a quantidade de planos em déficit mais que duplicou, enquanto os planos superavitários reduziram em quase ¼. A principal causa dos déficits e superávits concentra-se na diferença entre a meta atuarial e a rentabilidade efetiva do patrimônio de cobertura ao longo do tempo. De forma secundária, outras hipóteses biométricas e econômicas também produzem desequilíbrios, mas em um grau bem menor. Silva, Chan e Martins (2007Silva, F. L., Chan, B. L., & Martins, G. A. (2007). Uma reflexão sobre o equilíbrio dos planos de benefícios de caráter previdenciário a partir das demonstrações contábeis dos fundos de pensão. Revista de Informação Contábil, 1(1), 69-87. https://doi.org/10.34629/ufpe-iscal/1982-3967.2007.v1.69-87
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) e Sousa e Costa (2015Sousa, L. F. D., & Costa, F. M. (2015, May). Equilíbrio atuarial dos planos previdenciários de benefício definido: Relação entre características dos fundos de pensão e a escolha de premissas atuariais. Anais do Congresso da Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, Curitiba, PR, Brazil, 9. Retrieved from http://legado.fucape.br/_public/producao_cientifica/2/mfc294%20(2).pdf
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) coadunam com nossas percepções. Azambuja e Campani (2019Azambuja, S., & Campani, C. H. (2019). Impactos da reforma da previdência nos déficits dos planos de contribuição variável. Revista de Gestão, Finanças e Contabilidade, 9(3). https://doi.org/10.18028/rgfc.v9i3.7255
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) efetuaram sensibilidades na meta atuarial, alterando-a de 4,5% para 5,5%, e apuraram reduções entre 6% e 9% nas provisões de planos CV em um mesmo ano. Levy (2011Levy, S. (2011). Pensions in the national accounts: Compiling a complete picture of UK pensions including unfunded pensions for public sector employees. Economic & Labour Market Review, 5, 87-112. https://doi.org/10.1057/elmr.2011.71
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) reforça, indiretamente, nossas conclusões ao reportar que reduções de 1% e 1,4% em taxas de juros britânicas de 2006 (2,8%) e 2009 (3,2%) resultaram, no ano seguinte, em respectivos acréscimos de 30% e 37% nas provisões dos quatro maiores planos BD do setor público do Reino Unido. Essas últimas variações nos parecem excessivas, dado que as experiências que temos indicam que reduções de um ponto em metas de 5,5% elevam provisões em até 20%, mas podem ser relativizadas porque em Levy (2011) as excessivas variações referem-se a provisões de bases cadastrais de anos distintos. Portanto, dependendo do patamar da meta atuarial, reduções que parecem acanhadas têm potencial para impactar expressivamente provisões matemáticas. Por fim, destacamos que o movimento de oscilações significantes na taxa Selic, citado em Sartori (2015Sartori, R. L. (2015). Relevância da taxa de desconto atuarial na avaliação dos benefícios pós-emprego com características de benefício definido de previdência privada fechada e seus reflexos na patrocinadora (Master’s thesis). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Porto Alegre, RS, Brazil. Retrieved from http://hdl.handle.net/10183/132907
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), persistia em 2020. Curiosamente, no que tange às empresas patrocinadoras de planos BD, segue-se outro normativo para determinar a meta atuarial, agora taxa de juros, no provisionamento contábil da obrigação atuarial líquida (provisões matemáticas reduzidas do patrimônio) de seus planos patrocinados. Considera-se o pronunciamento n.º 33 do Comitê de Pronunciamentos Contábeis que estipula uma taxa de juros de desconto correspondente à rentabilidade dos títulos de baixo risco com vencimento harmônico com a duration do plano. Oscilações dessa taxa provocam relevantes alterações nas demonstrações financeiras (Sartori, 2015). Recentemente, a Petrobras contabilizou R$ 38,9 bilhões como obrigação atuarial líquida em 31/12/2018, enquanto a Petros contabilizou déficit equivalente a R$ 8,4 bilhões. Nas demonstrações da patrocinadora estatal a diferença foi detalhada, destacando-se a parcela de R$ 5,2 bilhões decorrente da adoção de uma taxa de desconto de 4,9% a.a., 0,8% inferior à meta de 5,70% a.a. da Petros (Petrobras, 2019). A MAC, proposta neste trabalho, possibilitará a redução dessa diferença, tornando obrigações mais transparentes para conselhos de administração, fiscal e de auditoria das patrocinadoras.

Normativos recentes e rentabilidade dos fundos de pensão

A meta atuarial, limitada em 6% a.a. em 2012, foi alterada pela resolução MPS/CNPC n.º9 de 29/11/2012, que estipulou novos limites com decréscimos de 0,25%, entre 2013 (5,75% a.a.) e 2018, quando atingiria 4,5% a.a. Fixou-se, à época, metas de longo prazo baseadas em históricos de curto prazo do mercado, provocando, possivelmente, falsos déficits nos planos, a julgar pelo total de planos deficitários já em 2013, na Tabela 1.

Entretanto, a acentuada queda do desempenho dos investimentos das EFPCs no período 2013-2014, em decorrência de crise econômica mundial, resultou na resolução MPS/CNPC n.º 15, de 19/11/2014 (resolução 15), suspendendo a redução linear em curso. Foi introduzida uma exceção na definição da meta atuarial, opcional à regra que dispunha que a meta corresponderia ao valor esperado da rentabilidade futura do patrimônio do plano, considerada a regra geral neste artigo. E foi adiante: caso a meta não estivesse aderente à exceção, uma taxa de juros paramétrica (taxa-parâmetro) originada por médias de três anos da ETTJ e localizada em um intervalo predeterminado (função da duration do passivo atuarial do plano), a EFPC deveria apresentar estudo técnico comprovando sua viabilidade.

Consequentemente, entendemos que passou a existir um incentivo para que as EFPCs não determinassem suas metas associadas ao desempenho esperado para seus ativos, mas sim a partir de limites calculados pelo órgão supervisor. A Tabela 2 possui algumas das taxas-parâmetro publicadas em 2019 pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). A opção pela taxa-parâmetro permite escolher valores compreendidos entre 70% desta, seu limite inferior, e ela própria acrescida de 40 pontos-base, o limite superior. A amostra possui uma média de 9,7 anos para a duration dos planos BD em 2019, o que permitiria ao gestor de um plano com essa duration escolher uma taxa-parâmetro entre 4,09% e 6,24% como meta atuarial.

Tabela 2
Taxa-parâmetro e limites publicados em 2019.

A Figura 1 reproduz dados relativos às rentabilidades médias dos patrimônios das EFPCs, excerto obtido nos consolidados estatísticos de 2018 e 2019 da ABRAPP, além de outras informações. O limite de 6% a.a., vigente em 2012, correspondeu a uma meta nominal de 12,6% (6% acrescido do INPC a 6,2%), localizada no valor TMA/TJP*+INPC de 2012. TMA significa taxa de juros máxima permitida até 2014 e TJP representa o limite superior da taxa-parâmetro, 2015 em diante, com duration de 10 anos.

Figura 1
Desempenho comparativo das rentabilidades das EFPCs no período 2004-2019.

Os valores para rentabilidades de EFPCs de 2013 a 2015, período em que as resoluções 9 e 15 vigeram, demonstram que houve um desempenho bastante insatisfatório dos ativos financeiros dos fundos de pensão. As rentabilidades nominais foram, respectivamente, 3,3%, 7,1% e 5,2%, decorrentes dos efeitos da crise mundial. Porém, metas atuariais definidas nesse intervalo, e em anos anteriores, escolhidas a partir dos limites de TMA/TJP*+INPC, não capturaram esses desempenhos. Com isso, o efeito da crise financeira foi sentido somente no desempenho dos ativos financeiros, possivelmente ocasionando déficits a serem solucionados, mas não nas estimativas das provisões matemáticas.

O waiver da resolução 15 e o limite de 5,75% a.a. em 2013 permitiram que fundos de pensão escolhessem metas atuariais descasadas com o que estava ocorrendo nos mercados financeiros em 2013-2015. Isso resultou em provisões matemáticas menores do que, por exemplo, as que seriam calculadas com taxas de desconto de títulos federais, disponíveis para negociação. Portanto, os déficits e possíveis equacionamentos que surgiram seriam maiores se as metas definidas nos fundos de pensão incorporassem as rentabilidades das crises financeiras. Esse mesmo raciocínio tem validade para metas definidas anteriormente a 2013: se elas contivessem a expressiva redução das rentabilidades entre 2013 e 2015, equacionamentos pretéritos teriam ocorrido resultando em patrimônios mais sólidos para o enfrentamento da crise iniciada em 2013.

Um dos efeitos de as provisões matemáticas não terem refletido as reduzidas rentabilidades de 2013 a 2015 resultou, na Figura 1, na aproximação da curva acumulada do IMA-Geral, da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), para a curva de rentabilidades acumuladas após 2014. A Figura 2 foi elaborada com dados da Figura 1, de 2012 a 2019, líquidos da inflação, permitindo um olhar mais apurado sobre o desempenho dos patrimônios.

Figura 2
Desempenho comparativo das rentabilidades das EFPCs no período 2012-2019.

É perceptível que a rentabilidade acumulada das EFPCs ficou, praticamente, abaixo do IMA-Geral, superando-o somente em 2013. No acumulado, o IMA-Geral extrapolou em 33% (55% versus 41%) a rentabilidade acumulada das EFPCs. Quando se comparam as rentabilidades ao CDI, a rentabilidade acumulada superou-o em 2012, 2013 e 2019, excedendo no acumulado em 25% (41% versus 33%) esse balizador. O valor médio dos rendimentos reais das EFPCs, líquidos do INPC, correspondeu a 4,5% a.a. no intervalo retratado na Figura 2, superior ao CDI médio (3,6%) e inferior ao IMA-Geral médio, benchmarks usuais da renda fixa (Lima, 2006Lima, A. C. (2006). Desempenho dos fundos de investimento do tipo previdência privada e sua sensibilidade à variação da taxa de juros. RAM. Revista de Administração Mackenzie, 7(2), 61-77. https://doi.org/10.1590/1678-69712006/administracao.v7n2p61-77
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). Entretanto, quando se observa a curva correspondente aos valores de TMP/TJP acumulados, percebe-se que os valores da taxa-parâmetro não são factíveis, pois parecem assumir que o desempenho financeiro dos investimentos das EFPCs não está sujeito às oscilações do mercado. A resolução 30 unificou normativos e apresentou regras já praticadas para a definição da meta atuarial nas EFPCs. Suas alterações pontuais mantiveram as responsabilidades e obrigações dos órgãos de governança, e a regra geral que determinava a taxa de desconto como o valor esperado das rentabilidades futuras do patrimônio do plano. Porém, alterou-se o intervalo de apuração da ETTJ de três para cinco anos, agravando uma possível utilização da taxa-parâmetro, originada em médias de taxa de juros diárias de títulos públicos federais indexados ao IPCA com data-base em primeiro de abril, que estará defasada em nove meses em 31/12.

Base de dados amostral

Os dados da pesquisa foram coletados na demonstração atuarial de encerramento do exercício (DA) no site Acesso à Informação (Superintendência Nacional de Previdência Complementar [Previc], 2020), informações de 2013 a 2018, complementados por alguns relatórios anuais de informação (RAI) das EFPCs, encontrados em seus sites, permitindo acesso a informações de 2019 para alguns planos. A pesquisa utilizou informações de 22 planos, administrados pelas entidades Petros, Fachesf, Fundação Real Grandeza, Funcef, Eletrocee, Forluz, Banesprev, Funcesp, Valia, Telos, Sistel, Previ, Funbep, Usiminas, Centrus, Fundação Copel, Braslight, Previrb e Fundação Itaú Unibanco. A escolha dos planos combinou o ranking dos 15 maiores patrimônios (14 estão na amostra) com outros sete planos de fundos de pensão, pertencentes ao grupo dos 25 maiores patrimônios (ABRAPP, 2018).

As provisões atuariais dos planos totalizaram R$ 365 bilhões, enquanto seus patrimônios de cobertura atingiram R$ 364,6 bilhões (64% de todos os planos BD em 2018). Outros elementos compuseram a base: índices inflacionários dos benefícios, taxas-parâmetro e seus limites, valores do Ibovespa, taxas dos títulos NTN-B e a composição do Conselho. A constituição deste último pode influenciar a definição da meta atuarial, como indicou Andonov, Bauer e Cremers (2017Andonov, A., Bauer, R. M., & Cremers, K. J. M. (2017). Pension fund asset allocation and liability discount rates. The Review of Financial Studies, 30(8), 2555-2595. https://doi.org/10.1093/rfs/hhx020
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), pois espera-se que um integrante que se aposente durante seu mandato passe a representar interesses dos assistidos.

A Tabela 3 exibe uma parcela dos dados do Plano Básico de Benefícios (PBB) e do Plano de Benefícios (REG/Replan) da Funcef, geridos respectivamente pela Centrus e pelo Funcef, fundos de pensão administradores dos planos de previdência do Banco Central e da Caixa Econômica.

Tabela 3
Dados dos planos PBB e REG/Replan.

Observa-se, na Tabela 3, certa estabilidade nas metas atuarias, limitadas a 4,5% a.a., do PBB da Centrus, um plano em extinção (não há participantes ativos) e superavitário, conforme se deduz dos índices de solvência (IS), enquanto o REG/Replan, um plano em déficit composto por participantes ativos e assistidos, apresenta valores para meta atuarial que variam entre 4,5% e 5,6% ao ano.

A julgar pelos dados apresentados, o PBB apresenta uma meta atuarial média superior em 1% à média da rentabilidade do seu patrimônio (4,3% versus 3,3%), e bem abaixo da taxa-parâmetro média do período, 5,74%. O coeficiente de variação da meta atuarial, 6%, comparado ao coeficiente relativo às rentabilidades, 165%, indicando dados heterogêneos, induz a concluir que eles se referem a amostras distintas. O mesmo ocorre quando se comparam coeficientes das provisões, 1,8%, e de rentabilidades. Esses fatos podem indicar que a Centrus optou por não reduzir suas metas, evitando assim possíveis equacionamentos que afetariam participantes e patrocinadoras, ou que a meta atuarial evitará valores permitidos pelas taxas-parâmetro, que poderiam ensejar a distribuição dos excedentes financeiros (superávit) para participantes e patrocinadores.

As informações sobre o REG/Regplan, na Tabela 3, sugerem que a meta atuarial média está próxima da média das taxas-parâmetro (5,8%), porém bem distante da média das rentabilidades do patrimônio (1,4%), a qual possui coeficiente de variação (6,1%) dissociado do coeficiente da meta atuarial (465%). Fato semelhante ocorre com o coeficiente de variação do patrimônio (6,1%) em relação ao coeficiente das rentabilidades, mas que se apresenta próximo dos coeficientes 4,6% e 7,2% relativos a provisões e taxas-parâmetro. Esses fenômenos corroboram que a meta atuarial escolhida pelo Conselho da Funcef utilizou a liberalidade da legislação para adoção da taxa-parâmetro, muito provavelmente devido à presença de um déficit persistente em virtude de baixas rentabilidades do patrimônio, resultando em metas atuariais e provisões não atingidas pelos rendimentos dos ativos do plano. A definição de metas maiores em intervalos de reduzidas rentabilidades sugere a repetição dos fenômenos encontrados em Pennacchi e Rastad (2011Pennacchi, G., & M. Rastad. (2011). Portfolio allocation for public pension funds. Journal of Pension Economics & Finance, 10(2), 221-245. https://doi.org/10.1017/S1474747211000102
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), que, entre 2000 e 2009, identificaram que 125 fundos de pensão estaduais norte-americanos optaram por comprar mais risco nos portfólios dos ativos financeiros, após períodos de desempenho de investimento relativamente fraco. A Tabela 4 contém as estatísticas da base, possibilitando uma visão sintetizada sobre esses valores.

Tabela 4
Estatísticas descritivas das principais variáveis.

Por sua vez, a Figura 3 contém informações que possibilitam uma análise mais detalhada em relação aos valores médios, a cada ano, da meta atuarial, taxa-parâmetro correspondente à duration, rentabilidade do patrimônio e rentabilidade esperada naquele ano, definidas nos fundos de pensão, a partir dos dados encontrados no DA ou no RAI.

Figura 3
Médias das metas atuarias, rentabilidades reais ocorridas, taxas-parâmetro e rentabilidades esperadas em cada período para os 22 planos BD da base amostral.

O desempenho, observado na Figura 3, das médias das metas atuariais é quase idêntico à curva das médias das rentabilidades esperadas para o mesmo intervalo, o que indica baixíssima oscilação da meta entre anos subsequentes. A curva relativa às taxas-parâmetro é mais aderente, graficamente, à curva das metas nos anos 2013 a 2015, intervalo onde a taxa-parâmetro começou a ser adotada gradativamente pelas EFPCs. Essas curvas mantiveram-se semelhantes entre 2016 e 2019, possivelmente indicando uma maior adesão à nova metodologia por parte das EFPCs. Quando se observam os valores médios das rentabilidades reais em cada ano, a curva mais sinuosa, praticamente não se encontram semelhanças para as curvas representando as outras médias. Por conseguinte, é improvável inferir que as metas atuariais guardam relação com as rentabilidades dos patrimônios dos planos no período apresentado.

A utilização, nos fundos de pensão, de metas atuariais superiores às rentabilidades do patrimônio posterga possíveis equacionamentos de desequilíbrios financeiros, que porventura apareceriam caso as metas escolhidas tivessem semelhança com os valores médios das rentabilidades futuras da carteira de investimentos do plano. Na Figura 3, as médias para as metas atuariais, taxas-parâmetro e rentabilidades são, respectivamente, 5,26%, 5,78% e 4,6% no período exposto. Logo, a média das rentabilidades encontra-se 13% inferior à média das metas utilizadas. Segundo a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) (2019), em 304 planos BD a média das metas atuariais alcançou 5,30% a.a. em 2018, semelhante à média 5,36% calculada na amostra da pesquisa para o mesmo ano, reforçando a relevância e a representatividade da base de dados.

REFERENCIAL TEÓRICO E LITERATURA EMPÍRICA

A produção acadêmica que descreve métodos para a estimação da meta atuarial dos planos de previdência, incluindo propostas alternativas, apresentou-se, em geral, bastante descritiva e pouco assertiva. Destaca-se a abrangente literatura em Government Accountability Office (GAO) (2014), organismo do Congresso norte-americano, que efetuou extensa pesquisa sobre a meta atuarial em planos dos EUA, Canadá, Holanda e Reino Unido. Nesse referencial, as duas metodologias principais foram nomeadas como assumed-return approach (assumed-return) e bond-based approach (bond-based), e guardam semelhança às técnicas empregadas para os planos BD brasileiros: meta atuarial baseada na rentabilidade futura da carteira do patrimônio ou em taxas de desconto originadas em médias de retornos de títulos do governo. Similarmente, estruturamos a análise da literatura tendo em vista essas duas vertentes e mais uma terceira, com literaturas que não se enquadraram nas anteriores.

Meta atuarial como rentabilidade da carteira de ativos financeiros do plano

Em GAO (2014), a metodologia assumed-return foi descrita como a especificação de uma meta associada ao desempenho esperado de longo prazo dos ativos do portfólio dos planos pesquisados, composto por parcelas significativas de ações e títulos corporativos. Segundo o organismo, planos patrocinados por estatais, entes públicos ou multipatrocinados utilizam a assumed-return.

De fato, a construção da meta atuarial nas EFPCs inicia-se, idealmente, com o processo de decisão dinâmica viabilizado por um asset liability management (ALM) para estimar rentabilidades anuais do patrimônio, conforme a alocação estratégica definida da carteira, que descontarão os fluxos de longo prazo (30 anos ao menos) futuros dos benefícios, líquidos de contribuições, visando a refletir a média dessas rentabilidades em uma meta suficiente para suportar o pagamento dos benefícios futuros (Bertucci, Souza, & Félix, 2006Bertucci, L. A., Souza, F. H. R., & Félix, L. F. F. (2006). Gerenciamento de risco de fundos de pensão no Brasil: Alocação estratégica ou simples foco na meta atuarial? Revista Economia & Gestão, 6(13). Retrieved from http://periodicos.pucminas.br/index.php/economiaegestao/article/view/25
http://periodicos.pucminas.br/index.php/...
; Haneveld, Streutker, & Van Der Vlerk, 2010Haneveld, W. K. K., Streutker, M. H., & Van Der Vlerk, M. H. (2010). An ALM model for pension funds using integrated chance constraints. Annals of Operations Research, 177, 47-62. https://doi.org/10.1007%2Fs10479-009-0594-4
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; Santos & Lima, 2019Santos, S. I. F., & Lima, D. V. (2019). Perspectivas de adoção de modelos de asset and liability management (ALM) em regimes próprios de previdência social. REDECA - Revista Eletrônica do Departamento de Ciências Contábeis & Departamento de Atuária e Métodos Quantitativos da FEA-PUC/SP, 6(1), 21-43. https://doi.org/10.23925/2446-9513.2019v6i1p21-43
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; Silva, Chan, & Martins, 2007Silva, F. L., Chan, B. L., & Martins, G. A. (2007). Uma reflexão sobre o equilíbrio dos planos de benefícios de caráter previdenciário a partir das demonstrações contábeis dos fundos de pensão. Revista de Informação Contábil, 1(1), 69-87. https://doi.org/10.34629/ufpe-iscal/1982-3967.2007.v1.69-87
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). Bertucci, Souza e Félix (2006) e Corrêa (2018Corrêa, R. B. (2018). Modelo de simulação de governança de passivo atuarial de um fundo de pensão brasileiro (Master’s thesis). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Escola de Administração, Porto Alegre, RS, Brazil. Retrieved from http://hdl.handle.net/10183/180828
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) defendem que, demarcada a meta, esta irá direcionar as rentabilidades do portfólio do plano, readaptando o ALM para buscar reduzir riscos atuariais e financeiros. Entretanto, De La Peña, Garayeta e Iturriscastillo (2017De La Peña, J. I., Garayeta, A., & Iturricastillo, I. (2017). Dynamic immunisation does not imply cash flow matching: A hard application to Spain. Economic Research-Ekonomska istraživanja, 30(1), 238-255. https://doi.org/10.1080/1331677X.2017.1305780
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) alertam que a readaptação do portfólio inicial que tenha buscado imunização com o método cash flow matching, utilizado em algumas EFPCs, poderá resultar em períodos em que os recursos disponíveis do patrimônio, transferíveis ao caixa, sejam insuficientes para o pagamento dos benefícios.

Em seguida ao processo de ALM, a taxa interna de retorno (TIR) é a metodologia comumente utilizada para encontrar a meta atuarial nos fundos de pensão, envolvendo o cálculo de uma TIR que compõe um fator de desconto e traz, para valor presente, fluxos de despesas com benefícios previdenciários ou o pagamento de importâncias seguradas (Hansen & Miltersen, 2002Hansen, M., & Miltersen, K. R. (2002). Minimum rate of return guarantees: The Danish case. Scandinavian Actuarial Journal, 2002(4), 280-318. https://doi.org/10.1080/03461230110106282
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). A soma desses fluxos atuais corresponde ao patrimônio de um plano de previdência. Nesse contexto, a Fórmula 1 representa uma equação genérica cuja solução representa a meta atuarial θ. A equação é solucionada computacionalmente pelo método Newton-Raphson. O valor de θ pode ser interpretado como um valor mínimo de rentabilidade anual do patrimônio (p), tornando-o suficiente para cumprir despesas com benefícios (FluxoDespBenef i ) líquidos de contribuições de participantes e patrocinadoras.

P = i = 1 n [ ( F l u x o D e s p B e n e f i / ( 1 + θ ) i ) ] ; i = 1, , n a n o s (1)

Historicamente, a contabilização dos benefícios pós-emprego iniciou em 1956, nos EUA, e em 1983, na Europa. Entretanto, até o fim do ano de 2000 as empresas brasileiras efetuavam o registro dos benefícios pelo regime de caixa (Silva, Tinoco, & Vieira, 2015Silva, M. A. F., Tinoco, P. P., & Vieira, S. S. C. (2015). Benefícios pós-emprego e seus impactos nas demonstrações contábeis das empresas brasileiras. Registro Contábil, 6(3), 118-135. Retrieved from https://www.seer.ufal.br/index.php/registrocontabil/article/view/1654
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). No mesmo contexto, Vittas (2010Vittas, D. (2010). Discount rates and the valuation of pension liabilities. World Bank.) destacou que ativos financeiros eram precificados pelos valores contábeis (book value) até 1960, influenciando atuários a utilizar esse modelo tanto para o patrimônio como para o passivo do plano. Com a mudança dessa prática, ativos passaram a ser avaliados a valor de mercado e comparados com passivos de despesas futuras, descontados a valor presente por uma taxa equivalente à rentabilidade média histórica do patrimônio. Essa mudança gerou, à época, um conflito entre a volatilidade dos preços a mercado dos ativos, uma característica de curto prazo, e a natureza dos passivos previdenciários, que recai no médio e longo prazo.

Andonov et al. (2017Andonov, A., Bauer, R. M., & Cremers, K. J. M. (2017). Pension fund asset allocation and liability discount rates. The Review of Financial Studies, 30(8), 2555-2595. https://doi.org/10.1093/rfs/hhx020
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) identificaram uma legislação norte-americana mais discricionária para fundos de pensão governamentais daquela que regula fundos privados. Essa condição incentiva gestores a investirem mais em ativos de risco, produzindo uma meta atuarial mais elevada como resultado de a legislação vincular a meta ao retorno esperado do patrimônio do plano. Esse comportamento é favorável a patrocinadoras e participantes, porquanto evita comunicações ao mercado sobre condições financeiras inadequadas do plano, que poderiam acarretar a revisão do custeio, maximizando contribuições, além de exposição negativa à opinião pública ou à revisão dos benefícios. A pesquisa analisou 863 entidades e seus planos BD nos EUA, Canadá, Reino Unido e Holanda, entre 1990 e 2012, com patrimônios estimados em 29% dos ativos globais dos planos BD. Os autores destacaram que fundos de pensão públicos norte-americanos, expostos a ativos de risco (public equity, alternative assets e títulos com rating inferior a BBB-), possuem um nível mais alto de subfinanciamento por participante.

Nos últimos anos, o declínio das taxas de juros que regem as economias dos países impactou a política de investimentos dos fundos de pensão, que tiveram que diversificar suas carteiras para buscar cumprir a meta atuarial. Leal e Mendes (2010Leal, R. P. C., & Mendes, B. V. M. (2010). The risk-return relationship of pension funds with investments in hedge funds. Latin American Business Review, 11(2), 141-169. https://doi.org/10.1080/10978526.2010.496307
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) já tinham previsto que a redução das taxas em curso em outros países chegaria ao Brasil, e pesquisaram a viabilidade de estratégias de alocação de investimento em fundos multimercado, comparadas às alocações usuais dos fundos brasileiros, comprovando que há vantagens na adoção de investimentos em hedge funds, estratégia comum em fundos de pensão no exterior. Os autores concluíram que essa diversificação proporcionaria uma melhora na relação risco-retorno, permitindo um menor reequilíbrio do portfólio e viabilizando atingir o limite da meta atuarial da época com menos risco.

Talvez a grande questão nos fundos de pensão seja a escolha entre uma taxa pré-fixada como meta, a partir de um intervalo de taxas definido nas normas, ou uma meta que represente a taxa real de rentabilidade esperada para o patrimônio do plano, produzida tecnicamente. Parece lógico utilizar como meta a rentabilidade esperada para o patrimônio, conforme parâmetros de mercado, mas entendemos que há riscos de que, ao atingir a meta, o gestor permaneça em gestão passiva, situação defendida por Nese (2017Nese, A. A. S. (2017). Governança, características das organizações e desempenho dos investimentos: Evidências em fundos de pensão no Brasil (Doctoral dissertation). Universidade de São Paulo, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, São Paulo, SP, Brazil. https://doi.org/10.11606/T.12.2017.tde-13062017-162106
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), evitando riscos desnecessários ao patrimônio. No entanto, se a meta atuarial for restrita por limites, poderão surgir déficits artificiais por conta da subestimação das rentabilidades de longo prazo, o que poderá representar, em um primeiro momento, o recolhimento de níveis de contribuição acima do necessário, retirando recursos dos participantes e dos patrocinadores. Não consideramos ideal a meta direcionar os investimentos, porque passará a existir uma pressão para uma maior assunção ao risco. Mas ponderamos que o portfólio poderá ser direcionado pela meta atuarial desde que contribuições e níveis dos planos sejam adequados à situação previdenciária e fiscal do país. Explicamos: não são defensáveis aposentadorias normais em planos BD antes dos 55 anos ou com menos de 35 anos de contribuição, enquanto a maioria do restante da população, contribuintes do INSS, somente se aposentará após os 60 anos.

Meta atuarial estimada pela rentabilidade de títulos corporativos de baixo risco

Quando a patrocinadora, não estatal ou ente público, é única, estima-se a meta atuarial pela metodologia bond-based e suas variações (Government Accountability Office [GAO], 2014). Dessa forma, a meta representa taxas de desconto de títulos corporativos, cujos prazos correspondem aos mesmos esperados para os benefícios, com possibilidade de suavização da meta pelas médias históricas. Outra variante calcula a meta baseada nas taxas prospectivas dos títulos do Tesouro. Uma bond-based mais complexa estima uma meta atuarial após casar a qualidade de crédito dos títulos corporativos com o risco do pagamento dos benefícios prometidos, o que inclui também utilizar rentabilidades históricas de municipal bonds e calcular uma meta atuarial específica para equacionamentos de déficits em fundos de pensão norte-americanos. A última variante origina-se na Pension Benefit Guaranty Corporation (PBGC), agência seguradora norte-americana acionada para prestar algum auxílio financeiro ou efetuar o encerramento de planos. No PBGC, a bond-based produz uma meta conforme anuidades atuariais transacionadas em um mercado específico com taxas de desconto, associadas a títulos marcados a mercado, que imunizam riscos financeiros e de longevidade.

Além da combinação ALM e TIR, modelos paramétricos e não paramétricos compõem as outras metodologias utilizadas para estimar a meta atuarial associada à rentabilidade de títulos corporativos. Os resultados produzidos nos modelos podem, com frequência, representar diretamente a meta, mas também servir de insumo da rentabilidade futura de parte do portfólio para o ALM. Varga (2009Varga, G. (2009). Teste de modelos estatísticos para a estrutura a termo no Brasil. Revista Brasileira de Economia, 63(4), 361-394. Retrieved from https://www.scielo.br/j/rbe/a/jkcD6FP6pWhGvcMp8t6JhrP/abstract/?lang=pt#
https://www.scielo.br/j/rbe/a/jkcD6FP6pW...
) e Duarte, Silva, Oliveira, Weffort e Chan (2015Silva, M. A. F., Tinoco, P. P., & Vieira, S. S. C. (2015). Benefícios pós-emprego e seus impactos nas demonstrações contábeis das empresas brasileiras. Registro Contábil, 6(3), 118-135. Retrieved from https://www.seer.ufal.br/index.php/registrocontabil/article/view/1654
https://www.seer.ufal.br/index.php/regis...
) pesquisaram métodos utilizados pelas EFPCs na determinação da meta, semelhantes aos adotados na aplicação do teste de adequação do passivo (TAP) às provisões técnicas no mercado segurador. Tais métodos consistem em modelar uma curva de juros futura, a ETTJ, representada graficamente pelo conjunto de pontos que relaciona taxa de juros spot zero-cupom versus o prazo, resultando na maturidade ou duration. A relação entre taxas spot e durations produz condições não observáveis da ETTJ na medida em que é improvável construí-la pela simples observação dos títulos negociados. Essas situações são solucionadas por modelos estatísticos, paramétricos e não paramétricos (spline), que estimam essas taxas a partir das durations existentes. Os modelos paramétricos produzem uma curva que fornece a melhor descrição para a curva de juros ETTJ observada, resultado das teorias econômicas das expectativas, da segmentação de mercado e da preferência, mesmo que a curva produzida não atenda a todos os pontos da real. Os métodos spline buscam a interpolação exata para gerar a melhor forma de descrição das taxas observadas, utilizando polinômios para interpolação seccionada aplicada a um conjunto de pontos formado pela taxa de juros e seu prazo (duration), ou pela taxa e respectivo preço do título, produzindo uma curva que toca todos os pontos. O mercado previdenciário utiliza, com frequência, o modelo paramétrico de Svensson, uma ampliação do modelo de Nelson e Siegel com o custo de ser menos parcimonioso (Caldeira, 2011Caldeira, J. F. (2011). Estimação da estrutura a termo da curva de juros no Brasil através de modelos paramétricos e não paramétricos. Revista Análise Econômica, 29(55), 95-122. https://doi.org/10.22456/2176-5456.13198
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). Esse modelo produz, para um prazo estipulado, uma taxa de juros intradiária originada de uma curva ETTJ. Essa curva é construída por parâmetros do modelo baseados em valores de mercado dos títulos públicos e publicados diariamente (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais [Anbima], 2017). Esse modelo é representado pela Fórmula 2.

r t ( τ ) = β 1 t + β 2 t ( 1 e λ 1 t τ λ 1 t τ ) + β 3 t ( 1 e λ 1 t τ λ 1 t τ e λ 1 t τ ) + β 4 t ( 1 e λ 2 t τ λ 2 t τ e λ 2 t τ ) (2)

Os dois primeiros coeficientes são o nível (β1) e a inclinação (β2), seguidos pelas curvaturas β3 e β4, enquanto λ1 e λ2 são as taxas de desconto ponderadas pelas curvaturas anteriores para atingir os pontos máximos. Esses parâmetros são calibrados por um processo de minimização dos erros entre os preços observados no mercado e os preços calculados pelo modelo. Uma alternativa a Svensson é o modelo HJM, citado em Kimura (2019Kimura, R. Y. (2019). Definição dos limites da premissa de taxa de retorno real para planos de previdência complementar utilizando o modelo HJM (Master’s thesis). Fundação Getulio Vargas, EESP, São Paulo, SP, Brazil. Retrieved from http://hdl.handle.net/10438/28040
http://hdl.handle.net/10438/28040...
), que projeta uma curva de taxas forward baseada na estrutura a termo gerada por processos estocásticos.

Santana e Costa (2017Santana, V. F., & Costa, T. M. T. (2017). The discount rate in pension assets and liabilities management. Brazilian Review of Finance, 15(4), 631-655. https://doi.org/10.12660/rbfin.v15n4.2017.66262
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) descontaram fluxos previdenciários de 15 anos pelo rendimento esperado de uma carteira hipotética, constituída por títulos públicos em negociação, com taxas Selic futuras obtidas em dados publicados em 2006. Porém, os autores não verificaram se a alternativa produziu taxas adequadas à legislação, existindo uma clara restrição de a sua formulação repousar em dados de um único ano, gerados por um conjunto invariante de premissas biométricas e econômicas, e utilizar projeções pontuais da Selic.

Sopesamos que a rentabilidade dos títulos federais acompanha, em grande parte, variações da taxa Selic, alterada pelo Banco Central para, dentre outras razões, combater surtos inflacionários ou atenuar perdas devido ao aumento do risco-país. Em tese, uma Selic alta beneficia as rentabilidades dos fundos de pensão, mas também afeta a demanda agregada e as taxas de crescimento internas, gerando problemas econômicos de maior magnitude (Attilio, 2020Attilio, L.A. (2020). A Influência da financeirização sobre a taxa de juros real brasileira. Revista de Economia Contemporânea, 24(3), e202431. https://doi.org/10.1590/198055272431
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; Libânio, 2010Libânio, G. (2010). A note on inflation targeting and economic growth in Brazil. Brazilian Journal of Political Economy, 30(1), 73-88. https://doi.org/10.1590/S0101-31572010000100005
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).

Motta e Santoro (2003Motta, L. F. J., & Santoro, R. M. (2003). Desempenho dos fundos de pensão fechados no Brasil: Uma análise comparativa com planos geradores de benefícios livres (PGBL’s). Revista de Economia e Administração, 2(2), 87-102. Retrieved from http://www.spell.org.br/documentos/ver/25636/desempenho-dos-fundos-de-pensao-fechados-no-brasil--uma-analise-comparativa-com-planos-geradores-de-beneficios-livres--pgbl---s-/i/pt-br
http://www.spell.org.br/documentos/ver/2...
), assim como Silva, Drumond, Silva, Pereira e Oliveira (2016Silva, C. M., Drumond, F. M. P., Silva, D. M. I., Pereira, V. H., & Oliveira, C. V. (2016). Identificação dos disclosures do CPC 33 (R1) nas demonstrações de empresas brasileiras do segmento de telefonia listadas na BM&FBOVESPA. Revista de Auditoria Governança e Contabilidade - RAGC, 4(17), 133-153. Retrieved from https://www.fucamp.edu.br/editora/index.php/ragc/article/view/895
https://www.fucamp.edu.br/editora/index....
), avaliaram que planos BD incorrem no risco atuarial devido ao descasamento de premissas, gerando desencontro entre passivo atuarial e patrimônio, e tornando o custo dos benefícios excedente ao estimado, agravado se investimentos renderem aquém do esperado. Saad e Ribeiro (2004Saad, N., & Ribeiro, C.O. (2004). Modelos determinísticos de gestão de ativo/passivo: Uma aplicação no Brasil. Revista Contabilidade & Finanças, 15(34), 50-62. https://doi.org/10.1590/S1519-70772004000100004
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) solucionam esses problemas imunizando a carteira de um fundo de previdência multipatrocinado, adaptando modelos ALM do plano para atender aos fluxos de caixa futuros. A volatilidade da taxa de desconto é o principal motivador dos riscos citados. Para Silva, Tinoco e Vieira (2015), a legislação determina que parte desses riscos recaiam sobre a patrocinadora de planos BD.

Para Chapman et al. (2001Chapman, R. J., Gordon, T. J., & Speed, C. A. (2001). Pensions, funding and risk. British Actuarial Journal, 7(4), 605-662. https://doi.org/10.1017/S1357321700002488
https://doi.org/10.1017/S135732170000248...
), há equivalência entre qualquer fluxo de caixa e um ativo correspondente. Logo, passivos previdenciários podem ser precificados por uma carteira de títulos de baixo risco. Novy-Marx (2015Novy-Marx, R. (2015). Economic and financial approaches to valuing pension liabilities. Journal of Pension Economics & Finance, 14(2), 144-150. https://doi.org/10.1017/S1474747214000468
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) adere a esse raciocínio ao defender que os princípios da economia financeira embasam a necessidade de a taxa de desconto apresentar-se como taxa esperada de retorno do portfólio de hedge, cujos fluxos corresponderão aos fluxos dos passivos. Reforçando essa linha, Bader e Gold (2003Bader, L. N. & Gold, J. (2003). Reinventing pension actuarial science. The Pension Forum, 15(1), 1-13. Retrieved from http://users.erols.com/jeremygold/reinventingpensionactuarialscience.pdf
http://users.erols.com/jeremygold/reinve...
) discordam de estudos que defendem uma taxa de desconto idêntica àquela que rentabilizará o patrimônio no longo prazo. Eles destacam que essa abordagem tradicional contraria a teoria financeira porque ativos e passivos dos planos de previdência expõem riscos distintos, não devendo ser avaliados do mesmo modo. A formação do portfólio que defendem poderia evitar as constatações de Bicalho (2018Bicalho, F. C. (2018). Avaliação dos investimentos dos fundos de previdência complementar do Brasil (Master’s thesis). Universidade Católica de Brasília, Escola de Gestão e Negócios, Brasília, DF, Brazil. Retrieved from https://bdtd.ucb.br:8443/jspui/bitstream/tede/2410/2/FilipeCarneiroBicalhoDissertacao2018.pdf
https://bdtd.ucb.br:8443/jspui/bitstream...
), que observou rentabilidades acumuladas das EFPCs, entre 2010 e 2015, um pouco abaixo do CDI, com resultados deficitários na média.

Entre 2010 e 2012, o Banco Mundial e a Previc colaboraram na construção da supervisão baseada em risco para as EFPCs. Foi o início da evolução dos normativos destacada neste trabalho, determinando regras para metas atuariais associadas às taxas de títulos do Tesouro. Para o Banco Mundial (World Bank, 2012), planos BD brasileiros apresentavam riscos associados à ausência de uma governança que verificasse premissas escolhidas, à independência dos atuários e à utilização de taxas elevadas. Para o organismo, como dificilmente conselheiros ou administradores das EFPCs são responsabilizados por premissas, a evasão de responsabilidade proporciona conflitos de interesse na gestão e alta discricionariedade no Conselho, permitindo desconsiderar parâmetros tecnicamente definidos. Retornos reais históricos de dois dígitos permitiram margens suficientes para absorver, ou ocultar, desvios em outras premissas quando havia o limite de 6%. Esta complacência tornou os Conselhos resistentes a reduções nas metas atuariais, apesar do arrefecimento das taxas reais de juros dos títulos públicos. O Banco Mundial (World Bank, 2012) concluiu que uma supervisão baseada em risco reduziria problemas ao utilizar taxas de desconto mais harmônicas às expectativas da rentabilidade do patrimônio dos planos, vinculadas às taxas de títulos de curta, média e longa duração.

Entendemos que a definição de uma meta atuarial do tipo bond-based, portanto baseada nas rentabilidades de títulos de baixo risco, sejam elas retrospectivas, como possibilita a resolução 30, sejam elas prospectivas, como as referências anteriores defendem, deve ser utilizada como última opção na gestão financeira dos patrimônios nos fundos de pensão. A definição dessas metas constitui, em nossa análise, um esforço contraditório na gestão de investimentos, desfavorecendo publicações acadêmicas especializadas e técnicas de investimento consagradas em troca da segurança de uma rentabilidade mínima. Além disso, compromete excessivamente o capital de participantes e patrocinadores, possivelmente retirando-o da economia formal, ao exigir maiores contribuições decorrentes das esperadas elevações das provisões matemáticas.

Em reforço às nossas considerações, Leal e Mendes (2010Leal, R. P. C., & Mendes, B. V. M. (2010). The risk-return relationship of pension funds with investments in hedge funds. Latin American Business Review, 11(2), 141-169. https://doi.org/10.1080/10978526.2010.496307
https://doi.org/10.1080/10978526.2010.49...
) demonstraram a razoabilidade de estratégias de investimento com rentabilidades acima dos benchmarks do mercado financeiro. A resolução CMN n.º 4.661 de 25/5/2018 apresenta um rol de possibilidades de alocação, incluindo limites máximos, dos ativos financeiros geridos por fundos de pensão, permitindo compor portfólios com investimentos nos segmentos estruturado, imobiliário, operações com participantes e exterior, além dos tradicionais renda fixa e renda variável. As condições para buscar rentabilidades acima dos retornos dos títulos de baixo risco existem, documentadas na academia e legalmente aceitas, e são facilitadas pelo fato de os fundos de pensão terem, em sua maioria, condição favorável para formar e manter equipes de investimentos com profissionais especialistas nos segmentos supracitados.

Outras formas de determinação da meta atuarial

A taxa de juros de desconto (meta atuarial) é um dos componentes centrais na definição das anuidades atuariais e de seguros utilizados nos cálculos atuariais. Raros foram os autores que descreveram metodologias para a definição dessa taxa de juros em publicações destinadas aos cursos, graduação e pós, voltados para a área de seguros e previdência. Na única referência encontrada, Norberg (2000Norberg, R. (2000). Basic life insurance mathematics [Lecture notes]. University of Copenhagen, Laboratory of Actuarial Mathematics. Retrieved from https://www.simiode.org/resources/4080/download/2002-Norberg-Basic_Life_Insurance_Mathematics.pdf
https://www.simiode.org/resources/4080/d...
) descreve um modelo simples de cadeia de Markov que estima taxas de desconto baseado em suas ocorrências e nas probabilidades de alterações dos valores ao longo do tempo.

GAO (2014) destacou situações, nos EUA e na Europa, em que a taxa de desconto tem seu valor ou sua metodologia determinada pela legislação, e que planos BD que utilizam assumed return são caracterizados por serem patrocinados por empresas longevas, resilientes nas flutuações dos mercados financeiros, ou entes federativos, que podem arrecadar mais impostos, elevando os níveis de contribuição aos planos. Especialistas consultados pelo organismo aconselham reportar múltiplas estimativas do passivo atuarial, com distintas taxas de desconto, minimizando trade-offs entre os objetivos anteriores e suas implicações, e consideram que estimar provisões matemáticas pelos custos médios dos benefícios dos planos, alicerçados na alocação do patrimônio, é a medida mais relevante para evidenciar as obrigações.

Ribeiro (2015Ribeiro, G. X. K. (2015). Asset liability management em um plano aberto de previdência tradicional (Master’s thesis). Instituto de Matemática Pura e Aplicada - IMPA, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Retrieved from https://www.ens.edu.br/arquivos/31_3_2015_gabriela_xavier_krull_ribeiro_seminario_aplicacoes_em_asset_liability_management.pdf
https://www.ens.edu.br/arquivos/31_3_201...
) aplicou um ALM otimizado por programação estocástica para um horizonte de longo prazo nos dados primários dos ativos financeiros de planos previdenciários fechados. Foi utilizada gestão dinâmica para uma carteira composta de títulos públicos do Tesouro Nacional para três estágios futuros da economia - esperado, médio pessimista e pessimista - com premissas distintas para tábua de mortalidade, ETTJ, aportes, percentuais de resgate e de conversão em renda vitalícia. A pesquisa evidenciou que o modelo estocástico obteve retornos que foram, no mínimo, 33% acima daqueles auferidos pelo ALM determinístico para a carteira inicial de ativos.

Pennacchi e Rastad (2011Pennacchi, G., & M. Rastad. (2011). Portfolio allocation for public pension funds. Journal of Pension Economics & Finance, 10(2), 221-245. https://doi.org/10.1017/S1474747211000102
https://doi.org/10.1017/S147474721100010...
) mostraram que gestores de fundos de pensão estaduais norte-americanos manifestam conflitos de agência na definição de suas metas atuariais, influenciados por suas carreiras, e que a presença no Conselho de participantes do plano contribui para que os portfólios reflitam os definidos em fundos de pensão semelhantes, em oposição à busca pela imunização das provisões. Andonov et al. (2017Andonov, A., Bauer, R. M., & Cremers, K. J. M. (2017). Pension fund asset allocation and liability discount rates. The Review of Financial Studies, 30(8), 2555-2595. https://doi.org/10.1093/rfs/hhx020
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) ratificam essa última descoberta, ao relatarem que fundos com integrantes políticos, ou eleitos dentre os participantes, nos conselhos de governança, apresentam assunção de mais risco e utilizam valores elevados para a meta atuarial.

Sousa e Costa (2015Sousa, L. F. D., & Costa, F. M. (2015, May). Equilíbrio atuarial dos planos previdenciários de benefício definido: Relação entre características dos fundos de pensão e a escolha de premissas atuariais. Anais do Congresso da Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, Curitiba, PR, Brazil, 9. Retrieved from http://legado.fucape.br/_public/producao_cientifica/2/mfc294%20(2).pdf
http://legado.fucape.br/_public/producao...
) identificaram que gestores dos planos BD patrocinados por estatais, ou por empresas do ramo financeiro, são incentivados a alterarem tábuas de mortalidade e meta para reduzirem o passivo, principalmente quando o índice de cobertura do plano, IS, aproxima-se da situação de déficit. Para eles, as EFPCs são impelidas, pela legislação, a não se fundamentarem de forma exclusiva em estudos técnico-atuariais.

Os artigos consultados descreveram direções para definição da meta atuarial. A primeira utiliza modelos ALM para combinar características do passivo atuarial com um portfólio de investimentos, visando a produzir uma taxa interna de retorno (TIR) representativa da expectativa de rentabilidade do patrimônio do plano. Outra vertente defende que a meta atuarial deva ser determinada a partir das rentabilidades estimadas de uma carteira conservadora, hipotética e hedgeada, ou dos títulos de baixo risco oferecidos no mercado financeiro, com durations semelhantes às dos passivos atuariais. O último formato se mostrou pouco técnico e influenciado por elementos como a composição do Conselho, a saúde financeira dos planos, opinião de especialistas, conflito de agência, a existência de patrocinadoras estatais ou entes federativos e uma legislação local definindo limites e metodologias.

Defendemos que a proposta da MAC da presente pesquisa, construída a partir de uma rentabilidade originada em um ALM, mas igualmente aplicável às rentabilidades originadas em metodologias bond-based, é superior às propostas e aos métodos descritos neste referencial porque proporciona, periodicamente, ajuste não discricionário das metas definidas no Conselho, levando em conta as diferenças entre metas dos anos anteriores e suas correspondentes rentabilidades do patrimônio.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Modelo de dados em painel

Com o intuito de verificar se as metas atuariais dos fundos de pensão são definidas pelo valor esperado da rentabilidade futura do patrimônio do plano, utilizamos a metodologia de dados em painel, modelos de efeitos fixos, que visam a combinar dados cross-section com séries temporais. Com isso, utilizamos esses modelos estatísticos para identificar relações entre a meta atuarial, coletada no DA, e as outras observações dos planos, todas variando entre 2013 e 2018 e distintamente em cada plano BD. Por conseguinte, consideram-se as características diferenciadas dos indivíduos da amostra, os planos de previdência, constituindo o efeito não observável, imutável ou aproximadamente constante, de cada fundo de pensão nos modelos estatísticos produzidos, o que minimiza o possível problema de omissão de variáveis porventura relevantes na determinação da meta atuarial (Fávero, 2013Fávero, L. P. L. (2013). Dados em painel em contabilidade e finanças: Teoria e aplicação. Brazilian Business Review, 10(1), 131-156. Retrieved from https://www.redalyc.org/pdf/1230/123025719006.pdf
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; Hair, Black, Babin, Anderson, & Tatham, 2009Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., Anderson, R. E., & Tatham, R. L. (2009). Análise multivariada de dados. Porto Alegre: Editora Bookman.; Marques, 2000Marques, L. D. (2000, October). Modelos dinâmicos com dados em painel: Revisão de literatura [Working Paper n. 100]. Universidade do Porto, Faculdade de Economia do Porto, Centro de Estudos Macroeconômicos e Previsão, Porto, Portugal. Retrieved from http://wps.fep.up.pt/wps/wp100.pdf
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; Montgomery, 2017Montgomery, D. C. (2017). Design and analysis of experiments. New York: John Wiley & Sons.). Os dados utilizados na pesquisa adequaram-se aos modelos de efeitos fixos e variações, uma delas indicada na Fórmula 3, dispensando, após testes estatísticos, modelos aleatórios e empilhados (pooled) de dados em painel.

M e t a A t u a r i a l i , t = α i + ( β 1 x 1, i , t + β 2 x 2, i , t + + β 3 x 3, i , t + + β k x k , i , t ) + ε i , t (3)

Nessa fórmula, o índice (i) varia de 1 a 22 e corresponde ao número de planos BD da pesquisa, com (t), que varia entre 2013 e 2018, correspondendo ao respectivo ano em que as observações de cada plano (i) ocorreram. MetaAtuarial i,t é a variável-resposta do modelo e corresponde à meta atuarial definida no plano (i) em cada ano (t). O termo αi~(0,σα2) é o efeito idiossincrático, não observável, de cada plano i, correspondendo ao intercepto, caracterizando os efeitos específicos do plano constantes ao longo do tempo, não capturados pelas variáveis x k,i,t , k = 1, ..., 14, e seus coeficientes regressores β k , coeficiente angular de cada variável explicativa do modelo. Um modelo de efeito fixo pressupõe que cada um dos coeficientes β seja o mesmo na variação temporal de cada plano. Assume-se que os erros εi,t~N(0,σε2), não correlacionados entre si, e que αi e x k,i,t são correlacionados.

O termo x k,i,t corresponde às variáveis investigadas como possíveis explicações da variável-resposta. Incluem-se nessas variáveis possíveis lags (defasagens), leads (valores de períodos futuros) e diferenças (entre o atual valor e um anterior), inclusive da própria variável-resposta, recursos disponíveis em dados em painel. A Tabela 5 contém a descrição das variáveis x k,i,t utilizadas.

Tabela 5
Descrição das variáveis explicativas testadas no modelo de dados em painel.

A operacionalização e o tratamento dos dados foram baseados na experiência dos autores e na literatura mencionada na presente seção. Destacamos que as variáveis indicadas como NTN-B e Ibovespa foram utilizadas com parcimônia, dado que elas proporcionam os mesmos valores em cada plano, mas distintos em cada ano. Se fossem iguais nos anos, seus efeitos seriam capturados em αi.

Não obstante considerarmos que o método MAC é necessário e complementar aos preceitos que incidem nos fundos de pensão, a pesquisa testará a hipótese, exibida a seguir, descrita e defendida pelos autores anteriormente citados, e enraizada há anos na legislação previdenciária, com o intuito de afiançar e justificar a proposição do presente trabalho.

H1: Fundos de pensão escolhem a meta atuarial, de um plano BD, relacionada à rentabilidade futura do patrimônio de cobertura dos benefícios oferecidos.

Meta Atuarial Consistente (MAC)

Para atenuar os efeitos da distância entre metas atuariais determinadas pelo Conselho e rentabilidades médias observadas no patrimônio, introduziremos, na presente pesquisa, a proposta de uma metodologia quinquenal de ajuste. Essa metodologia apresenta-se mais eficiente do que as atuais, utilizadas pelos fundos de pensão, porque, efetivamente e de forma cíclica, ajusta as metas atuarias escolhidas pelo Conselho para valores que compreendam desvios de uma meta pretérita para um desempenho médio do patrimônio dos planos de benefícios. Desse modo, montantes correspondentes às provisões matemáticas passam a capturar o real desempenho médio dos ativos financeiros, evitando uma gestão administrativa e financeira com provisões subvalorizadas ou sobrestimadas por longos períodos, o que cria falsas impressões de solvência, cooperando, por exemplo, para adiar ou antecipar alterações nas carteiras de investimentos.

A metodologia pressupõe que fluxos de entradas e saídas de valores nos ativos financeiros, originados por um ALM, produzam uma taxa interna de retorno θ de forma semelhante à calculada na Fórmula 1. O valor dessa TIR será a base para gerar a MAC. A Fórmula 4 contém os fluxos do ALM, no numerador das frações, descontados por fatores de θ, resultando no patrimônio do plano ρ t . O valor de t corresponde ao ano da data-base onde TIR e a MAC serão determinadas.

φ t + 1 τ t + 1 δ t + 1 ( 1 + θ ) 1 + φ t + 2 τ t + 2 δ t + 2 ( 1 + θ ) 2 + + φ t + y τ t + y δ t + y ( 1 + θ ) β = ρ t (4)

As variáveis β e y são números inteiros, com y=1,…,β, e correspondem ao diferimento em anos da ocorrência de cada um dos fluxos. As outras variáveis são:

φt+y: valor dos benefícios pagos pelo plano de previdência em cada fluxo futuro.

τt+y: valor das contribuições líquidas de taxas administrativas ou carregamentos adicionadas ao patrimônio em cada fluxo futuro.

δt+y: valor dos juros adicionados ao patrimônio em cada fluxo futuro.

Os valores dos juros financeiros (δt+y ) são produzidos no estudo de ALM efetuado na EFPC e originam-se da rentabilidade do patrimônio. Os valores das contribuições e benefícios, τt+y φt+y , são apurados em cada fluxo pela avaliação atuarial periódica e não dependem de alguma taxa de desconto para serem estimados.

O valor θ é a base para o Conselho definir a meta atuarial, nomeada na metodologia por θ'. Para que essa taxa de juros se torne consistente, refinada pelos desvios ocorridos nas metas pretéritas, é necessário que ao fim do ano t sejam apuradas a média da rentabilidade (μ) do patrimônio do plano dos últimos cinco anos, incluindo o atual, e a meta atuarial (Φ) estipulada na data-base anterior ao período de μ. Seja ϵ um valor que apura o desvio entre a rentabilidade quinquenal e a meta atuarial, que ajustará o valor θ', expresso por:

ϵ = μ Φ (5)

Se ϵ > 1, a rentabilidade média (μ) superou a meta atuarial (Φ) definida para o período, que se mostrou subavaliada. Para ϵ > 1 a situação é oposta, a rentabilidade ficou abaixo da meta (Φ) que foi sobrevalorizada na sua definição há cinco anos. Feito isso, será possível adequar θ' a partir das discrepâncias observadas nos últimos cinco anos. Logo, a meta atuarial consistente será calculada pela aplicação da razão ϵ em θ'.

θ ^ = θ ' * ϵ , p a r a ϵ > 0 (6)

A razão ϵ é um número real, logo torna-se necessário balizar os resultados das possíveis reduções ou elevações na taxa, evitando valores incoerentes que poderiam até inviabilizar a continuidade do plano. Uma forma eficiente e direta para isso recai em regras que utilizem limites inferiores e superiores baseados em um percentual razoável de variabilidade para θ'. Na pesquisa foi utilizado o seguinte regramento:

  1. Caso θ^ pertença a [0,777∙θ';1,280∙θ'], a taxa real de juros do plano será a MAC calculada em (6).

  2. Se θ^<0,777∙θ' então =0,777∙θ'.

  3. Se θ^>1,280∙θ' então θ^=1,280∙θ'.

  4. A MAC não poderá assumir valores abaixo da média das rentabilidades dos títulos públicos, com vencimento +5 anos em diante, disponíveis durante o ano t.

A última regra justifica-se por considerarmos que um esforço mínimo da gestão de investimentos da EFPC permitiria a realocação, durante o ano t, de grande parte do portfólio para máxima exposição em títulos do Tesouro.

Os valores 0,777 e 1,280 foram apurados nas informações dos 22 planos que compuseram a base de dados da pesquisa, correspondendo às medianas dos valores de ϵ referentes a dois grupos de planos. O valor 0,777 refere-se ao grupo formado pelos planos com rentabilidades médias do período 2014-2018 inferiores às metas (Φ) determinadas em 2013, enquanto 1,280 refere-se ao grupo de planos onde cada média (μ) ultrapassou a meta estipulada em 2013 individualmente para o período. Essas medianas deverão ser avaliadas tempestivamente, refletindo a realidade das gestões e um melhor gerenciamento das carteiras dos ativos.

Dessa forma, utiliza-se uma média móvel de cinco anos que, a cada ano, será integrada ao valor de ϵ na produção de uma meta consistente, suficiente para sanar parte ou o total dos desvios entre rentabilidades reais e esperadas do patrimônio. Ressaltamos a importância da utilização de testes de adequação para verificar a aderência da meta produzida pela MAC à rentabilidade média apurada a partir do ano seguinte, monitorando a eficiência do método.

ANÁLISE DOS RESULTADOS

Modelos encontrados

A modelagem de dados em painel aplicada às informações originais dos 22 planos BD, alicerçada à Equação 3, produziu um modelo, modelo-base, exibido na Tabela 6.

Tabela 6
Variáveis explicativas do modelo-base de efeitos fixos.

O modelo-base de painel, aplicado nos valores originais da base, apresentou as variáveis IS e Rentabilidade como significativas na definição da variável-resposta MetaAtuarial, e um razoável R 2 , o coeficiente de determinação, explicando quase 29% da variância da meta. O teste de Breusch-Pagan (Breusch & Pagan, 1979Breusch, T. S., & Pagan, A. R. (1979). A simple test for heteroscedasticity and random coefficient variation. Econometrica, 47(5), 1287-1294. https://doi.org/10.2307/1911963
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) indicou homocedasticidade dos resíduos, que possuem média nula e variância constante. Entretanto, os testes Shapiro-Wilk (Razali & Wah, 2011Razali, N. M., & Wah, Y. B. (2011). Power comparisons of Shapiro-Wilk, Kolmogorov-Smirnov, Lilliefors and Anderson-Darling tests. Journal of Statistical Modeling and Analytics, 2(1), 21-33. Retrieved from https://www.researchgate.net/profile/Bee_Yap/publication/267205556_Power_Comparisons_of_Shapiro-Wilk_Kolmogorov-Smirnov_Lilliefors_and_Anderson-Darling_Tests/links/5477245b0cf29afed61446e1/Power-Comparisons-of-Shapiro-Wilk-Kolmogorov-Smirnov-Lilliefors-and-Anderson-Darling-Tests.pdf
https://www.researchgate.net/profile/Bee...
) e Breusch-Godfrey/Wooldridge (Croissant & Millo, 2008Croissant, Y., & Millo, G. (2008). Panel data econometrics in R: The plm package. Journal of Statistical Software, 27(2), 1-43. https://doi.org/10.18637/jss.v027.i02
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; Torres-Reyna, 2010Torres-Reyna, O. (2010). Getting started in fixed/random effects models using R. Princeton University, Data & Statistical Services. Retrieved from https://www.princeton.edu/~otorres/Panel101R.pdf
https://www.princeton.edu/~otorres/Panel...
) rejeitaram normalidade e constataram correlação serial nos resíduos, afetando a confiabilidade dos p-valores e do teste F do modelo, provocando variâncias subestimadas devido a possíveis autocorrelações entre os valores das variáveis para o período anterior ou mais distante. Portanto, o modelo-base não possui robustez.

Os resultados anteriores e as análises das possíveis soluções para transformações dos dados, que permitissem um modelo vigoroso, resultaram na escolha de uma variante do modelo de efeitos fixos da Fórmula 3, após suspeitarmos que o intercepto αi estaria enviesado, exibindo valores semelhantes entre os fundos de pensão, com o mesmo sinal. Foi encontrada na literatura uma solução para substituir αi de forma que concebesse um efeito geral no modelo, um valor médio, representando os efeitos conjuntos de todos os fundos. Assim, alteramos a Fórmula 3, adicionando o intercepto α na variável-resposta MetaAtuarial i,t e no intercepto α i , reescrevendo-a na Fórmula 7.

M e t a A t u a r i a l i , t = α + ( β 1 x 1, i , t + β 2 x 2, i , t + + β 3 x 3, i , t + + β k x k , i , t ) + ( α i α + ε i , t ) (7)

Essa variação é conhecida por estimador between de efeitos fixos, consistindo em um modelo que explica as médias das variáveis-resposta através das médias das variáveis consideradas explicativas (Croissant & Millo, 2008Croissant, Y., & Millo, G. (2008). Panel data econometrics in R: The plm package. Journal of Statistical Software, 27(2), 1-43. https://doi.org/10.18637/jss.v027.i02
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; Duarte, Lamounier, & Takamatsu, 2007Duarte, P. C., Lamounier, W. M., & Takamatsu, R. T. (2007). Modelos econométricos para dados em painel: Aspectos teóricos e exemplos de aplicação à pesquisa em contabilidade e finanças. Anais do Congresso USP de Iniciação Científica em Contabilidade (Vol. 4, pp. 1-15). Retrieved from https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/176819/mod_resource/content/1/Artigo%20-%20Modelos%20em%20Painel.pdf
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; Fávero, 2013Fávero, L. P. L. (2013). Dados em painel em contabilidade e finanças: Teoria e aplicação. Brazilian Business Review, 10(1), 131-156. Retrieved from https://www.redalyc.org/pdf/1230/123025719006.pdf
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). O novo erro não deverá ser correlacionado às variáveis explicativas significativas que pertencerão ao modelo. A Tabela 7 contém as informações do modelo produzido pelo estimador between de efeitos fixos, após colocarmos e retirarmos variáveis do modelo, previamente avaliadas pelas correlações, semelhante ao método stepwise (Hair et al., 2009Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., Anderson, R. E., & Tatham, R. L. (2009). Análise multivariada de dados. Porto Alegre: Editora Bookman.; Montgomery, 2017Montgomery, D. C. (2017). Design and analysis of experiments. New York: John Wiley & Sons.). O modelo e suas variáveis são os insumos para confirmar ou refutar a hipótese H1, onde se afirmou que a meta atuarial definida nos fundos de pensão representa a rentabilidade futura do patrimônio de seu plano BD associado.

Tabela 7
Variáveis explicativas e testes do modelo between de efeitos fixos.

Esse modelo possui um bom coeficiente de determinação (77,6%), suficiente para o objetivo explanatório, e não preditivo, do modelo, destinado a aclarar os elementos que determinaram valores pretéritos da meta atuarial, explicando quase 80% da variância da meta atuarial. Além do R 2 adequado, a estatística F avaliza os coeficientes regressores, confirmados também pelos testes estatísticos que mostraram que os resíduos são homocedásticos, possuem normalidade e não apresentam correlação serial. Torna-se, portanto, viável a seguinte representação do modelo com coeficientes estatisticamente significantes:

M e t a A t u a r i a l i , t = 0,87592 + 0,17667 Re n t a b i l i d a d e i , t + 0,00426 log ( Pr o v i s õ e s i , t N u m A s s i s t i d o s i , t ) 0,04962 [ log ( P a t r i m ô n i o i , t ) log ( Pr o v i s õ e s i , t ) ] o n d e u i , t = ( α i 0,87592 + ε i , t ) (8)

O modelo descrito na Fórmula 8 é suficiente para confrontar a afirmação da hipótese H1. Ele possui um intercepto que constitui o efeito geral representativo de cada fundo de pensão, seu coeficiente é significante para um nível de 1% e explica, positivamente, parte da meta atuarial definida nas EFPCs. Rentabilidade, outra variável que influencia positivamente a meta correspondendo ao desempenho individual do patrimônio em cada período da série, possui a mesma significância que o intercepto. TaxaParTMA, que reduz o valor da meta e corresponde à taxa-parâmetro associada à duration específica do plano BD, ou ao limite da meta atuarial em 2013, possui nível de significância de 5%. A representação da variável logPatrimônioLíquido no modelo apresenta-se como a mais significante, seu nível está em 0,1%, porém seu coeficiente negativo poderá influenciar a meta tanto positivo como negativamente, pois dependerá do valor que a diferença entre o logaritmo do patrimônio e o logaritmo das provisões assumirá. Caso seja um déficit, patrimônio menor que as provisões, a influência será positiva; se superávit, mudará para negativa. A última variável, logProvisõesporAssistidos, foi representada no modelo como o logaritmo da divisão de provisões pelo total de assistidos em cada plano. Seu nível de significância é 10%, no limite do aceitável, e afeta positivamente a meta atuarial.

Portanto, o melhor modelo encontrado, exibido na Fórmula 8, permite inferir que a variável-resposta MetaAtuarial é influenciada pelo conjunto formado pela rentabilidade passada de curtíssimo prazo (dos últimos 12 meses), pela taxa-parâmetro (ou limite da meta) disponível no ano, pelo nível anual de provisão por assistido do plano, pelo resultado atual do plano (o patrimônio líquido, que ocasiona déficit ou superávit) e pelo efeito idiossincrático que atribuímos ao efeito característico do setor das entidades fechadas de previdência complementar, os fundos de pensão. Essas inferências permitem considerar como falsa a hipótese H1 da pesquisa, dado que a meta atuarial não representa alguma variável integral ou parcialmente associada à rentabilidade de cada plano BD.

Entendemos que a rejeição da hipótese justifica a proposição da MAC. Adicionalmente, a evidência de que a rentabilidade futura não é capturada pela meta atuarial contraria Bertucci et al. (2006Bertucci, L. A., Souza, F. H. R., & Félix, L. F. F. (2006). Gerenciamento de risco de fundos de pensão no Brasil: Alocação estratégica ou simples foco na meta atuarial? Revista Economia & Gestão, 6(13). Retrieved from http://periodicos.pucminas.br/index.php/economiaegestao/article/view/25
http://periodicos.pucminas.br/index.php/...
), Silva et al. (2007Silva, F. L., Chan, B. L., & Martins, G. A. (2007). Uma reflexão sobre o equilíbrio dos planos de benefícios de caráter previdenciário a partir das demonstrações contábeis dos fundos de pensão. Revista de Informação Contábil, 1(1), 69-87. https://doi.org/10.34629/ufpe-iscal/1982-3967.2007.v1.69-87
https://doi.org/10.34629/ufpe-iscal/1982...
), Corrêa (2018Corrêa, R. B. (2018). Modelo de simulação de governança de passivo atuarial de um fundo de pensão brasileiro (Master’s thesis). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Escola de Administração, Porto Alegre, RS, Brazil. Retrieved from http://hdl.handle.net/10183/180828
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), Vittas (2010Vittas, D. (2010). Discount rates and the valuation of pension liabilities. World Bank.) e Andonov et al. (2017Andonov, A., Bauer, R. M., & Cremers, K. J. M. (2017). Pension fund asset allocation and liability discount rates. The Review of Financial Studies, 30(8), 2555-2595. https://doi.org/10.1093/rfs/hhx020
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). Além disso, desvirtua a resolução 30, que estipula como regra geral a associação entre essa rentabilidade e a meta. Em menor grau, essa dissociação às rentabilidades prejudica a composição do ALM defendida por Haneveld, Streutker e Van Der Vlerk (2010Haneveld, W. K. K., Streutker, M. H., & Van Der Vlerk, M. H. (2010). An ALM model for pension funds using integrated chance constraints. Annals of Operations Research, 177, 47-62. https://doi.org/10.1007%2Fs10479-009-0594-4
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) e o esforço empregado por Leal e Mendes (2010Leal, R. P. C., & Mendes, B. V. M. (2010). The risk-return relationship of pension funds with investments in hedge funds. Latin American Business Review, 11(2), 141-169. https://doi.org/10.1080/10978526.2010.496307
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)em demonstrar estratégias de multimercado que cumpram a meta atuarial.

Por outro lado, a presença da taxa-parâmetro no modelo confirma que os fundos de pensão estão optando, acolhidos na resolução 30, por metas atuariais baseadas em médias pretéritas de ETTJ, mas que estão distantes quase dez meses da data-base dos cálculos atuariais. Entendemos que esse fato corrobora Bicalho (2018Bicalho, F. C. (2018). Avaliação dos investimentos dos fundos de previdência complementar do Brasil (Master’s thesis). Universidade Católica de Brasília, Escola de Gestão e Negócios, Brasília, DF, Brazil. Retrieved from https://bdtd.ucb.br:8443/jspui/bitstream/tede/2410/2/FilipeCarneiroBicalhoDissertacao2018.pdf
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), que identificou que o desempenho do patrimônio das EFPCs se assemelhou ao CDI, mas não podemos afirmar que a presença da taxa-parâmetro no modelo significa que a meta atuarial representa rentabilidades prospectivas das taxas de título de baixo risco, como informado em Chapman et al. (2001Chapman, R. J., Gordon, T. J., & Speed, C. A. (2001). Pensions, funding and risk. British Actuarial Journal, 7(4), 605-662. https://doi.org/10.1017/S1357321700002488
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), Bader e Gold (2003Bader, L. N. & Gold, J. (2003). Reinventing pension actuarial science. The Pension Forum, 15(1), 1-13. Retrieved from http://users.erols.com/jeremygold/reinventingpensionactuarialscience.pdf
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), Varga (2009Varga, G. (2009). Teste de modelos estatísticos para a estrutura a termo no Brasil. Revista Brasileira de Economia, 63(4), 361-394. Retrieved from https://www.scielo.br/j/rbe/a/jkcD6FP6pWhGvcMp8t6JhrP/abstract/?lang=pt#
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), Caldeira (2011Caldeira, J. F. (2011). Estimação da estrutura a termo da curva de juros no Brasil através de modelos paramétricos e não paramétricos. Revista Análise Econômica, 29(55), 95-122. https://doi.org/10.22456/2176-5456.13198
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), GAO (2014), Duarte et al. (2015Duarte, A. A., Silva, A. F., Oliveira, L. V., Weffort, E. F. J., & Chan, B. L. (2015). The term structure of interest rates and its impact on the liability adequacy test for insurance companies in Brazil. Revista Contabilidade & Finanças, 26(68), 223-236. https://doi.org/10.1590/1808-057x201500420
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), Silva et al. (2015Silva, M. A. F., Tinoco, P. P., & Vieira, S. S. C. (2015). Benefícios pós-emprego e seus impactos nas demonstrações contábeis das empresas brasileiras. Registro Contábil, 6(3), 118-135. Retrieved from https://www.seer.ufal.br/index.php/registrocontabil/article/view/1654
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) e Novy-Marx (2015Novy-Marx, R. (2015). Economic and financial approaches to valuing pension liabilities. Journal of Pension Economics & Finance, 14(2), 144-150. https://doi.org/10.1017/S1474747214000468
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). Já a presença do patrimônio líquido, no modelo, evidencia uma influência parcial do índice de solvência, defendida por Sousa e Costa (2015Sousa, L. F. D., & Costa, F. M. (2015, May). Equilíbrio atuarial dos planos previdenciários de benefício definido: Relação entre características dos fundos de pensão e a escolha de premissas atuariais. Anais do Congresso da Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, Curitiba, PR, Brazil, 9. Retrieved from http://legado.fucape.br/_public/producao_cientifica/2/mfc294%20(2).pdf
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) no caso de déficits.

Destacamos que não foram encontrados indícios que possibilitem identificar a influência da composição do Conselho na definição da meta atuarial, como relatado por Pennacchi e Rastad (2011Pennacchi, G., & M. Rastad. (2011). Portfolio allocation for public pension funds. Journal of Pension Economics & Finance, 10(2), 221-245. https://doi.org/10.1017/S1474747211000102
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) e Andonov et al. (2017Andonov, A., Bauer, R. M., & Cremers, K. J. M. (2017). Pension fund asset allocation and liability discount rates. The Review of Financial Studies, 30(8), 2555-2595. https://doi.org/10.1093/rfs/hhx020
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).

Aplicação da Meta Atuarial Consistente (MAC) nos dados da pesquisa

Os dados coletados dos 22 planos BD possibilitaram aplicar a MAC conforme sua definição na subseção 4.2. Foi possível refinar a meta atuarial escolhida, em 2018, utilizando a rentabilidade quinquenal de 2014 a 2018 para encontrar a razão entre essa média e a última meta atuarial válida, de 2013. Em seguida, essa razão foi aplicada na meta escolhida pelo Conselho em 2018, o que gerou um novo valor para a meta atuarial do período, observados os limites inferior e superior apurados na amostra da pesquisa e a média das rentabilidades das NTN-B, com vencimento para 2024, 2035, 2045 e 2050.

São exibidos, na Tabela 8, os passos da aplicação da MAC nos planos e valores produzidos para a meta de 2018. A média das metas atuariais passou de 5,36%, valores determinados pelo Conselho em 2018, para 6,09%, após a MAC, um acréscimo de 0,73%. A partir das informações apresentadas, conclui-se que o método funcionou de forma eficiente, compreendendo a regra que susta reduções da meta para valores menores que a rentabilidade média das NTN-B (4,94% a.a. em 2018). De forma semelhante, limitaram-se valores muito altos, evitando metas que representassem rentabilidades dificilmente mantidas no longo prazo.

Tabela 8
Método da Meta Atuarial Consistente aplicado para a definição da meta atuarial em 2018.

O Banco do Brasil (2018) estimou redução de 2,2% na obrigação atuarial caso a meta atuarial de 5,3% a.a. mudasse para 5,55%. Pela proximidade à média 5,36% das metas atuariais da amostra, empregamos essa sensibilidade para estimar que as provisões de R$ 365 bilhões, citadas em 2.3, associada à média 5,36%, seriam reavaliadas para R$ 341,6 bilhões. Essa retração de R$ 23,4 bilhões, ou quase R$ 1,1 bilhão por plano, resultaria em efeitos econômicos imediatos, como, p.e., redução das alíquotas de custeio normal e reavaliações de custeios extraordinários.

Consideramos que participantes e patrocinadoras seriam os principais beneficiados pela aplicação dos ajustes na meta atuarial dos planos da amostra, o que permitiria níveis de contribuição justos e equivalentes aos benefícios prometidos. Em seguida, beneficiaria os fundos de pensão, que passariam a apresentar situações financeiras mais consistentes com suas rentabilidades, favorecendo, também, a eventual contratação de seguros para a cobertura de riscos previdenciários, com respectivos prêmios refletindo a presença da MAC na avaliação de risco por parte das seguradoras.

CONCLUSÕES

Avaliamos que as condições oferecidas para o uso da taxa-parâmetro, comparadas à regra geral, podem inibir a busca por um maior desempenho da rentabilidade dos ativos financeiros que compõem o patrimônio dos planos nos fundos de pensão. Isso acontece porque a norma permite escolher uma taxa pertencente ao intervalo de uma taxa-parâmetro em detrimento da rentabilidade esperada do patrimônio do plano, e obriga a apresentação de relatório técnico para metas fora do intervalo que compreende a taxa-parâmetro.

O presente estudo identificou que a escolha do valor da meta atuarial na amostra foi influenciada pela rentabilidade anual do patrimônio, pelo patrimônio líquido observado na data-base e pela própria taxa-parâmetro que representa rentabilidades passadas baseadas em ETTJ. Não foram encontradas evidências, nos modelos estatísticos construídos, que permitissem vislumbrar alguma aderência entre a meta atuarial, definida pelo Conselho, e a rentabilidade futura do patrimônio do plano. Tampouco detectamos influência de títulos públicos, no que tange a alguma colaboração das taxas de retorno das NTN-B a vencer na meta atuarial. Assim, metas atuariais fixadas nos planos da amostra não guardam relação com as metodologias assumed return ou bond-based, descritas em GAO (2014). Esses indícios justificam uma abordagem distinta para a definição da meta atuarial, representada pela proposição da Meta Atuarial Consistente.

Consideramos que a utilização da metodologia da MAC contribuirá para a evolução das normas e técnicas que subsidiam a escolha da meta atuarial nos fundos de pensão. A MAC possibilita que possíveis desvios (vieses) entre uma meta pretérita e a rentabilidade quinquenal do patrimônio sejam considerados e incorporados ao modelo, refinando e concedendo maior expectativa de precisão ao valor escolhido da meta atuarial pelo Conselho, e, com o passar dos anos, convergindo essa meta para a rentabilidade média auferida pelos ativos do plano.

As limitações da pesquisa resumem-se a não termos tido recursos e tempo suficientes para coletar informações de mais planos de benefício definido, a partir dos conteúdos localizados nos documentos DA de 2018, submetidos à Previc, liberados para acesso somente em 2020, durante a elaboração deste estudo.

Por sua vez, a MAC apresenta limitações relativas à presença de limites inferiores e superiores calculados com dados da amostra da pesquisa. Além disso, um dos limites inferiores fundamenta-se na média das taxas NTN-B de 2018, mas poderia ser mais amplo, incorporando outros títulos de baixo risco disponíveis ou, até mesmo, uma rentabilidade mínima garantida por seguradoras. Esses pequenos entraves poderão ser minimizados, e até solucionados, caso órgãos normativos e supervisores, sobretudo a Previc, adotem a metodologia proposta. Assim, será possível utilizar os parâmetros populacionais de todos os planos das EFPCs, fixando novos limites para a MAC e tornando o método proposto representativo do mercado, permitindo que qualquer plano BD aplicasse a MAC e ajustasse sua meta atuarial.

Para efeito de boas práticas de governança, documentos oficiais das entidades poderão incluir a MAC além da meta atuarial escolhida e fixada pelo Conselho. Desse modo, garante-se maior publicidade e transparência ao tema, proporcionando comparações futuras entre a meta atuarial do plano (fixada pelo Conselho), a meta atuarial consistente (aqui proposta) e a rentabilidade de fato obtida no período.

Os resultados desta pesquisa sugerem, no mínimo, um trabalho futuro que investigaria a composição dos conselhos deliberativos em uma amostra maior de fundos de pensão, abrangendo um período mais longo. Seriam efetuadas entrevistas com participantes dos conselhos deliberativos para a elaboração de análises das decisões e deliberações das atas das plenárias, que contivessem decisões sobre alocação de investimentos ou premissas atuariais e econômicas. Seus resultados identificariam dinâmicas que ocorrem nos fundos de pensão, avaliando-as no contexto de governança e compliance do mercado previdenciário.

O aproveitamento do método MAC permitirá que fundos de pensão revisem e adequem seus planos de custeio, especificamente seus valores de alíquotas contributivas, seus déficits e superávits, de maneira mais efetiva. A aplicação dos resultados da pesquisa poderá promover uma maior eficiência no mercado brasileiro de previdência complementar fechada, contribuindo para a sustentabilidade e solidez do sistema, com desdobramentos positivos para o crescimento econômico do país.

REFERENCES

  • Classificação JEL:

    J32, E43, C23.
  • Pareceristas:

    Tatiana Albanez (Universidade de São Paulo, FEA, Brasil)
    Um dos indivíduos revisores não autorizou a divulgação de sua identidade.
  • Relatório de Revisão por Pares:

    A disponibilização do Relatório de Revisão por Pares não foi autorizada pelos revisores.
  • Financiamento

    O autor Carlos Heitor Campani agradece às seguintes instituições pelo suporte financeiro que sua pesquisa recebe: Cátedra Brasilprev em Previdência, ENS (Escola de Negócios e Seguros), CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), FAPERJ (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro) e Quantum Finance (Provedor de Dados).
  • Verificação de Plágio

    A RAC mantém a prática de submeter todos os documentos aprovados para publicação à verificação de plágio, mediante o emprego de ferramentas específicas, e.g.: iThenticate.
  • Direitos Autorais

    A RAC detém os direitos autorais deste conteúdo.
  • Método de Revisão por Pares

    Este conteúdo foi avaliado utilizando o processo de revisão por pares duplo-cego (double-blind peer-review). A divulgação das informações dos pareceristas constantes na primeira página e do Relatório de Revisão por Pares (Peer Review Report) é feita somente após a conclusão do processo avaliativo, e com o consentimento voluntário dos respectivos pareceristas e autores.
  • Disponibilidade dos Dados

    Os autores afirmam que todos os dados utilizados na pesquisa foram disponibilizados publicamente, e podem ser acessados por meio da plataforma Harvard Dataverse:
    Azambuja, Sandro; Campani, Carlos Heitor, 2021, "Replication Data for: MAC: A Proposal for Consistent Actuarial Interest Rates in Pension Funds published by RAC - Revista de Administração Contemporânea", Harvard Dataverse, V1. https://doi.org/10.7910/DVN/EZSUXE
    A RAC incentiva o compartilhamento de dados mas, por observância a ditames éticos, não demanda a divulgação de qualquer meio de identificação de sujeitos de pesquisa, preservando a privacidade dos sujeitos de pesquisa. A prática de open data é viabilizar a reproducibilidade de resultados, e assegurar a irrestrita transparência dos resultados da pesquisa publicada, sem que seja demandada a identidade de sujeitos de pesquisa.

Editado por

Editores-chefes:

Wesley Mendes-da-Silva (Fundação Getulio Vargas, EAESP, Brasil)
Marcelo de Souza Bispo (Universidade Federal da Paraíba, PPGA, Brasil)

Editores Convidados:

João Vinícius de França Carvalho (Universidade de São Paulo, FEA, Brasil)
Eduardo Flores (Universidade de São Paulo, FEA, Brasil)
Emiliano A. Valdez (University of Connecticut, EUA)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    21 Nov 2020
  • Revisado
    09 Jul 2021
  • Aceito
    15 Jul 2021
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