Resumo
A partir dos conceitos de hegemonia de Gramsci e de violência simbólica de Bourdieu, este artigo questiona a existência de uma americanização das Ciências Humanas e Sociais (CHS) francesas. Para responder a essa interrogação, propõe-se uma cartografia dos editores franceses e estrangeiros envolvidos na exportação/importação de obras de CHS, comparando os fluxos de tradução na França a partir das três línguas mais traduzidas nessa área – inglês, alemão e italiano. Tal comparação se apoia em uma análise quantitativa e qualitativa e permite examinar a evolução da relação de hegemonia intelectual entre tradições nacionais e também as relações de força entre campos editoriais nacionais e entre intermediários interculturais, por meio de vários índices: hegemonia do inglês, capital simbólico dos autores(as) e das tradições disciplinares nacionais e concentrações geográficas e editoriais, entre outros. Os dados levam a nuançar a ideia de uma “americanização” das CHS francesas, mas indicam igualmente que o aumento dos fluxos de tradução do inglês, em detrimento do alemão, revela mais uma hegemonia estadunidense do que uma dinâmica regional, provocada por diferentes lógicas: comercial, política, acadêmica e de acumulação de capital simbólico.1
Palavras-chaves fluxos de tradução; Ciências Humanas e Sociais; cartografia editorial; violência simbólica; Pierre Bourdieu; Antonio Gramsci
Resumen
A partir de los conceptos de hegemonía de Gramsci y de la violencia simbólica de Bourdieu, este artículo cuestiona la existencia de una americanización de las Ciencias Humanas y Sociales francesas (CHS). Para responder a esta pregunta, se propone una cartografía de las editoriales francesas y extranjeras involucradas en la exportación/importación de obras de CHS, comparando los flujos de traducción en Francia de los tres idiomas más traducidos en esta área: inglés, alemán e italiano. Esta comparación se basa en un análisis cuantitativo y cualitativo y permite examinar la evolución de la relación de hegemonía intelectual entre tradiciones nacionales y también las relaciones de poder entre campos editoriales nacionales y entre intermediarios interculturales, a través de varios índices: hegemonía del inglés, capital simbólico de los autores y tradiciones disciplinarias nacionales, y concentraciones geográficas y editoriales, entre otras. Los datos conducen a una idea matizada de una “americanización” de las CHS francesas, pero también indican que el aumento de los flujos de traducción al inglés, en detrimento del alemán, revela una hegemonía estadounidense más que una dinámica regional, provocada por lógicas diferentes: acumulación de capital comercial, político, académico y simbólico.
Palabras clave flujos de traducción; Ciencias Humanas y Sociales; cartografía editorial; violencia simbólica; Pierre Bourdieu; Antonio Gramsci
É possível avaliar as relações de hegemonia intelectual? Para apreender essas relações, pode-se comparar os fluxos de tradução. A partir de uma cartografia dos editores franceses e estrangeiros envolvidos na tradução de obras de Ciências Humanas e Sociais (CHS) do inglês, do alemão e do italiano para o francês, entre 2003 e 2013, este artigo propõe-se a examinar o peso dos intermediários nessa circulação.
A noção gramsciana de hegemonia foi elaborada para pensar não apenas as relações de força entre grupos sociais (e o papel da escola), mas também entre nações, principalmente no campo intelectual. A reflexão de Gramsci parte de uma comparação entre a França e a Itália: “Este edifício intelectual sólido explica a função da cultura francesa nos séculos XVIII e XIX, função de irradiação internacional e cosmopolita, e de expansão de caráter imperialista e hegemônico (de modo orgânico)” (Gramsci, 1983, p. 152). Por outro lado, o filósofo se pergunta: “O que significa o fato de o povo italiano ler de preferência escritores estrangeiros? Isso significa que ele sofre a hegemonia intelectual e moral dos intelectuais estrangeiros, que se sente mais ligado aos intelectuais estrangeiros do que àqueles de seu país.” (p. 202). A noção de hegemonia remete a uma direção intelectual, moral e cultural que encontra um “consentimento ativo” em oposição à coerção. Nisso, ela converge com a concepção de “violência simbólica” elaborada por Pierre Bourdieu (apud Jeanpierre, 2011, p. 88-90). Entretanto, uma das diferenças entre os dois conceitos está na noção de consentimento: em sua análise da violência simbólica, Bourdieu (1997, p. 204-205) a recusa, insistindo sobre a interiorização, pelos dominados, das categorias e classificações dominantes que naturalizam sua inferioridade social.
No caso que examinamos aqui – as relações intelectuais de força entre nações sujeitas a mudanças –, trata-se de compreender as lógicas de importação ativa que fazem parte de estratégias de posicionamento no campo nacional, conforme explica Bourdieu (2002), quando reflete sobre as condições sociais da circulação internacional das ideias. Em seu artigo sobre as duas formas de imperialismo do universal, ele enfatiza as lutas internas aos campos confrontados a estratégias imperialistas (utilizando a noção de hegemonia como sinônimo de dominação simbólica): “Os interesses ligados à luta pela hegemonia cultural no espaço nacional podem levar certos indivíduos a serem cúmplices do imperialismo cultural do estrangeiro – assim como outros se fecham num nacionalismo regressivo” (Bourdieu, 1992).
A noção de imperialismo foi amplamente debatida acerca da política norte-americana dos anos 1990, mas geralmente os analistas concordam em excluir disso as relações de força culturais e intelectuais, que tangem, para eles, à noção gramsciana de hegemonia (ver Steinmetz, 2008; Mann, 2008). Ora, não somente os Estados desenvolvem políticas culturais que servem a visadas imperialistas, mas também as editoras são empresas capazes de articular imperialismo econômico e cultural ou intelectual, até político. Essas estratégias imperialistas no campo cultural cruzam as lógicas de hegemonia, pois, para ter êxito, requerem o reconhecimento das populações ou instituições “conquistadas”, seu consentimento (o que explica a noção de soft power) e podem originar estratégias de resistência. Então, para designar estratégias de instituições (estatais ou industriais) que subordinam a cultura a fins políticos e/ou econômicos (e não só culturais), propomos a noção de imperialismo cultural. Para as relações de força intelectual ou cultural, propomos hegemonia (ascendência que se exerceria sem mediação). A hegemonia intelectual é frequentemente mantida – quando não resulta disso – por políticas de soft power ou de “diplomacia de influência”: sabe-se hoje que a CIA fundou e financiou o Congresso pela Liberdade da Cultura, que era ativo em trinta países (Grémion, 1995; Saunders, 2001); e, em 1952, o State Department dos Estados Unidos encorajou a criação de uma organização sem fins lucrativos, The Franklin Publications, para auxiliar a tradução de livros americanos nos regimes comunistas e países árabes, com uma meta de soft power. Por outro lado, as próprias instâncias culturais participam, com objetivos próprios, de lutas por hegemonia intelectual (a exemplo das estratégias globais das grandes universidades estadunidenses).
Em todo caso, a importação de obras traduzidas pode ser considerada um indicador do valor relativo atribuído à produção intelectual em uma língua, visto que a tradução contribui para aumentar esse valor, ou seja, seu capital simbólico. Tal abordagem concebe essas trocas no âmbito da economia dos bens simbólicos, tal como elaborada por Bourdieu (1977). Nisso se distancia da análise funcionalista em termos de “necessidades” – noção pouco adaptada ao mercado dos bens culturais, onde a oferta tende a criar a procura – ou daquela que vê nos fluxos de tradução o reflexo do tamanho respectivo dos mercados nacionais (as duas se combinam às vezes; ver Pym e Chrupala, 2005), ou ainda das análises econômicas mais sofisticadas em termos de proximidade cultural (Ginsburgh; Weber; Weyers, 2011).2
Contrariamente à conotação de fluidez associada à noção de fluxo – útil para comparar as trocas interculturais no plano quantitativo e identificar os fenômenos de assimetria (Heilbron, 1999) –, a tradução de obras de Ciências Humanas requer, de fato, um investimento: em tempo de trabalho para os(as) tradutores(as), quer seja retribuído, voluntário ou incorporado a uma outra atividade remunerada como a pesquisa; investimento financeiro para as editoras, quando pagam pela tradução e adquirem os direitos de exploração da obra, ao qual se acrescenta o trabalho de edição e de promoção, cujo rendimento a curto ou a longo prazo nem sempre é garantido. O custo da tradução é regularmente invocado pelos(as) editores(as) como um obstáculo e supõe, portanto, que o investimento seja motivado e o risco justificado (Sapiro, 2012, 2014). No entanto, sem esses intermediários, as obras de CHS não circulariam entre as línguas.3 Isso justifica a criação de sistemas de auxílio financeiro à tradução, sejam estatais, filantrópicos ou acadêmicos (Sapiro, 2019a).
A Sociologia da Arte há muito se interessa pelos intermediários culturais que contribuem para divulgar as obras no espaço público. Sua função como instâncias de legitimação e de produção do valor dessas obras foi teorizada por Bourdieu (1977), que também ressaltou as relações de concorrência entre eles. Howard Becker (2010), por sua vez, denomina “pessoal de reforço” (support personnel) aqueles e aquelas que participam da cadeia de cooperação para a difusão das obras, a fim de distingui-los dos “produtores cardinais” (core producers), que são os criadores. Essa noção de “pessoal de reforço” tende, entretanto, a nivelar todas as atividades de intermediação. No entanto, certos intermediários atuam mais diretamente nos conteúdos do próprio produto e na produção de seu valor, como os editores, em comparação com impressores, representantes comerciais ou assessores de imprensa. Por essa razão, propomos denominá-los intermediários cardinais, noção que permite examinar o peso relativo das diferentes categorias de agentes que atuam no processo. Desse modo, constatamos que, no setor do livro, os agentes literários agem cada vez mais junto aos editores como intermediários cardinais (Sapiro; Leperlier, 2021), o que corrobora a constatação feita por Laurent Jeanpierre e Olivier Roueff (2014). Em sua investigação sobre as diferentes categorias de intermediários culturais, eles concluíram que a divisão do trabalho no “sistema de intermediação” é instável e se caracteriza pela fluidez e pelas lutas de fronteiras (mesmo que algumas profissões, como corretor ou tipógrafo, sejam mais especializadas).
Bruno Latour (2006) distingue os mediadores dos intermediários: os primeiros modificam, redefinem o que transportam, ao passo que os segundos o mantêm tal qual. A pertinência dessa distinção parece discutível ao menos no que diz respeito à edição, se considerarmos que os intermediários modificam ou orientam o sentido dos textos por meio do que Roger Chartier denomina diagramação [em francês, “mise en livre”] (Chartier, 1997, p. 284; ver também McKenzie, 1991), ou seja, o trabalho editorial e as diretrizes de recepção por intermédio da capa, da quarta capa, da categorização (gênero, disciplina), do material publicitário, ou da inserção em uma coleção. No caso das traduções, o próprio texto é inteiramente transformado pela passagem de uma língua à outra. Por essa razão, parece mais adequado definir os intermediários culturais como aquelas e aqueles que se especializam na disponibilização dos produtos culturais para o público, independentemente do grau de intervenção e de modificação do texto. A noção de mediador pode ser reservada àqueles que o interpretam: prefaciadores(as), críticos(as), comentaristas, exegetas. A atividade de tradução tange mais à mediação do que à intermediação, mesmo que certos(as) tradutores(as) também sejam editores(as) ou agentes. Por outro lado, a mediação e a intermediação entre culturas têm propriedades específicas e requerem competências linguísticas e/ou um certo conhecimento das culturas de origem e de chegada; por isso, sugere-se neste caso adotar a noção mais específica de intermediação/mediação intercultural.
Os trabalhos sobre os intermediários não se limitam às obras de arte, mas se estendem cada vez mais à circulação das ideias (Matonti, 2012) e à circulação internacional das ideias, seguindo o programa traçado por Bourdieu (2002), que ressaltava a importância de estudar o grupo dos importadores. As três operações identificadas por ele, seleção, marcação e interpretação, receberam análises aprofundadas em estudos de caso (Matonti, 2009; Joly, 2012; Hauchecorne, 2019; Sapiro; Santoro; Baert, 2020). A metodologia que desenvolvemos para estudar a circulação das obras de literatura e de CHS em tradução na era da globalização (Sapiro, 2008) permitiu, além disso, propor parâmetros para refinar a explicação das assimetrias de fluxos de tradução entre as línguas, bem como o esquema centro-periferia para dar conta mais especificamente das condições de tradução dos livros de CHS. Identificamos seis grupos de fatores que favorecem ou obstaculizam a circulação dos livros de CHS: 1) as relações de força e/ou de hegemonia intelectual entre línguas, culturas e tradições nacionais disciplinares; 2) o capital simbólico e outras propriedades do autor; 3) certas propriedades do livro (conteúdo, volume, estilo); 4) o capital simbólico da editora original; 5) as redes editoriais e acadêmicas (capital social); 6) os auxílios à tradução (capital econômico) (Sapiro, 2019a).
Tal análise leva em consideração as especificidades da edição de obras de CHS (Auerbach, 2006; Fabiani, 1988; Godechot, 1999; Thompson, 2005; Seiler-Juilleret, 2020; Noël, 2021; Tesnière, 2001; Sapiro, 2019b). Mais do que um “setor” ou um “segmento” de mercado, propomos considerar a edição de CHS como um “subcampo” do campo editorial, situado na intersecção com o campo acadêmico (Bourdieu, 1977, 1984, 1999). Em suas aulas no Collège de France, Bourdieu explica que “um campo pode ser autônomo mesmo compartilhando parcialmente um de seus setores com outros campos” (Bourdieu, 2016, p. 173). Além disso, segundo ele, um subcampo “não é uma parte de um campo”: “Quando se passa de um campo a um subcampo, há um salto, uma mudança qualitativa, e isso acontece em cada nível de divisão” (p. 24). Desse modo, a lógica do subcampo da crítica difere daquela do campo literário por ter sua própria problemática, formas de capital e leis de funcionamento. É também o caso da edição das CHS, que obedece a lógicas específicas, encarnadas pelos agentes específicos – editoras científicas, editoras universitárias e coleções especializadas –, enquanto uma parte de suas propriedades constituiu um subcampo dominado dentro do campo editorial. De fato, como Bourdieu explica mais uma vez, as relações entre o subcampo e o campo circundante são relações de dominação e de luta, onde se forja a questão da autonomia (p. 167-168). Assim, as CHS ocupam uma posição relativamente dominada no campo editorial em relação aos setores mais lucrativos da literatura ou da não-ficção para o grande público, o que a noção econômica de segmento não explica muito bem. Por fim, mesmo encontrando lógicas econômicas mais gerais, tais como a estruturação em oligopólio de franja (Reynaud-Cressent, 1982), característica dos mercados muito competitivos, é forçoso constatar que os atores dominantes não são os mesmos de outros setores, sinal da relativa autonomia desse subcampo. No entanto, nele as traduções se encontram elas próprias em posição dominada, pelo menos na França, país que ocupa (ainda) uma posição central ou semicentral no subcampo transnacional da edição de CHS, já que as traduções são mais valorizadas em países situados na periferia (Even-Zohar, 1990).
Este artigo busca comparar os fluxos de tradução de obras de CHS na França a partir das três línguas mais traduzidas nessa área – inglês, alemão e italiano –, propondo uma cartografia dos editores envolvidos nesta exportação/importação em cada país. Para isso, ele se apoia em uma investigação quantitativa e qualitativa sobre as traduções de livros de CHS do inglês, alemão e italiano para o francês, entre 2003 e 2013.4 A fim de mostrar as tendências e evoluções no longo prazo, esses dados foram comparados àqueles do período de 1985 e 2002 (Sapiro; Popa, 2008). As bases de dados são apresentadas no quadro abaixo.
A comparação entre as três línguas permite examinar a evolução da relação de hegemonia intelectual entre tradições nacionais, assim como as relações de força entre campos editoriais nacionais e entre intermediários interculturais. Em função da posição relativa de cada um, a troca pode assumir significações diferentes: expressão da hegemonia da cultura de origem sobre a cultura de acolhida ou reconhecimento desta pela primeira, já que as relações entre culturas periféricas ou semicentrais passam às vezes pelo centro (a exemplo do sucesso mundial da French Theory após sua recepção/construção estadunidense). Porém, a importação de autores(as) estrangeiros(as) também se insere, como já dissemos, em lutas internas ao campo de recepção e faz parte, portanto, das estratégias de concorrência entre os intermediários, induzindo tanto lógicas de isomorfismo quanto de diferenciação (Sapiro, 2016).
No decorrer do período da globalização, os Estados Unidos se tornaram dominantes em muitas áreas, a começar pelo mercado do livro: entre 1957 e 1978, a produção editorial estadunidense sextuplicou, ao passo que na França, na República Federal da Alemanha e no Japão crescia apenas três vezes mais, segundo dados da UNESCO (Milo, 1984). A relação de forças histórica com a Inglaterra se inverteu em proveito dos Estados Unidos. Além disso, o período é marcado por um fenômeno de concentração da indústria do livro, por meio de fusões-aquisições, que reforçou as restrições econômicas no mercado editorial, aumentando os lucros esperados (Schiffrin, 1999). No mundo anglo-estadunidense, o aumento dessas restrições, associado à introdução das práticas de gestão neoliberais nas universidades e às restrições orçamentárias que se seguiram, teve um impacto imediato nas editoras universitárias (Thompson, 2005), apesar do status de associação sem fins lucrativos que as diferencia das editoras comerciais (trade).8 As traduções do inglês diminuíram muito. Muitos pesquisadores na Europa e fora dela escrevem agora em inglês ou mandam traduzir seus artigos por conta própria para terem acesso a uma edição anglófona muito cobiçada, sinal da hegemonia exercida pela esfera anglófona e pela pressão feita por suas instituições de origem para publicarem em inglês. Ainda que obras de CHS continuem a ser traduzidas, aumentam as assimetrias dos fluxos do inglês e para o inglês (Sapiro, 2019a). Em compensação, como vamos ver, há um aumento de obras traduzidas do inglês em detrimento das outras línguas, e em todas as disciplinas.
Esse fenômeno hegemônico parece sobrepujar as lógicas de regionalização que acompanham a formação de um campo global das Ciências Sociais (Heilbron, 2013), mesmo quando encorajadas por políticas como a construção europeia, que implementou um dispositivo para favorecer as cooperações regionais (sobre a tensão entre essas duas lógicas, ver Heilbron, Sorá e Boncourt, 2018). Porém, essa relativa autonomia das relações de hegemonia intelectual não é mero reflexo das relações de força entre os campos editoriais nacionais: em uma análise quantitativa das colaborações internacionais que se baseou nas coassinaturas de artigos em revista, Yves Gingras e Johan Heilbron (2009) constatavam que, embora elas tivessem aumentado bastante entre pesquisadores(as) europeus(eias) na década de 1990, esse aumento era inferior ao das coassinaturas entre esses pesquisadores(as) e os estadunidenses. Por outro lado, a criação de uma política de auxílio à intradução em literatura e em CHS, em 1989, que visava a conter a dominação do inglês, apoiando as outras línguas, não foi suficiente para estancar esse fenômeno de hegemonia – voltaremos a isso na conclusão –, nem tampouco os auxílios à exportação dos outros países, que, no entanto, recaem em literatura, setor privilegiado por esses auxílios (Sapiro, 2008, p. 179-180).
Hegemonia crescente do inglês
Na base de dados de 2.950 títulos de CHS traduzidos para o francês a partir de 11 línguas, entre 1985 e 2002, o inglês totalizava 53% das traduções, seguido pelo alemão (25%), italiano (11%), espanhol (4%) e russo (3%); a participação de todas as outras línguas (holandês, polonês, romeno, tcheco, sueco) era inferior a 1,5% (Sapiro; Popa, 2008). Essa distribuição indicava uma relativa autonomia do mercado da tradução de livros de CHS: o alemão e o italiano estavam super-representados em relação ao conjunto das traduções dessas línguas, sinal do capital simbólico a elas associado na área das CHS, enquanto o inglês era menos preponderante (concentrava cerca de dois terços das traduções para o francês no mesmo período; alemão, 10%; italiano, 5%; espanhol e russo, 3%; Sapiro, 2008). No entanto, na década seguinte, a distância entre o inglês e o alemão parece ter aumentado: em nossa base de 2.560 traduções de obras de CHS do inglês, alemão e italiano para o francês, publicadas entre 2003 e 2013, o inglês totaliza dois terços, ou seja, três vezes mais do que o alemão (22%), cujo peso relativo diminuiu (era duas vezes superior); a relação de 1 para 5 com o italiano (12%) se manteve.9
Entre 2003 e 2013, a média anual de títulos traduzidos dessas três línguas é de 232,7. Observa-se um aumento regular ao longo de toda a década, exceto no ano de 2007, quando ocorre uma diminuição provavelmente devido à crise financeira. De fato, já no ano seguinte, uma retomada marca o início de um crescimento maior, pois o número de títulos ultrapassa, em 2009, a média da década (244) e aumenta bastante até 2011, momento em que o número dos títulos se mantém (ver gráfico 1). São as traduções do inglês que mais contribuem para esse aumento, ainda que também se registre um acréscimo nos títulos traduzidos do alemão e do italiano.
Os títulos traduzidos incluem obras que entraram em domínio público, títulos cujos direitos foram adquiridos de editores estrangeiros e coletâneas inéditas compostas por um editor francês a partir de artigos ou de capítulos de livros (tipo de obra característica dos livros de CHS em tradução), os quais classificamos em três categorias:
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autores(as) falecidos(as) antes de 1920, geralmente “clássicos” em domínio público;
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autores(as) do século XX falecidos(as) antes do período estudado, “em vias de canonização”, cujo indicador é sua tradução ou retradução após sua morte; seus livros caem progressivamente em domínio público, o que favorece os projetos de tradução;
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autores(as) vivos(as) no início do período estudado, qualificados(as) de “contemporâneos(as)”, e cujas obras ainda estão sujeitas a direitos autorais.
Como mostra o quadro 1, a distribuição dos títulos entre essas três categorias varia muito conforme a língua e permite examinar o capital simbólico relacionado às tradições intelectuais nacionais e a evolução das relações de hegemonia intelectual.10 Esse capital poderia ter se desvalorizado com o tempo (evolução do cânone); poderia ser transferido aos(às) autores(as) contemporâneos(as) se as relações de hegemonia se mantivessem; ou poderia, hipótese que se confirmou, como vamos ver, manter-se nos(as) autores(as) do passado sem se transferir aos(às) contemporâneos(as), o que indica uma transformação das relações contemporâneas de hegemonia sem questionamento do cânone, que é submetido, todavia, a reavaliações parciais: é sobretudo o caso da filosofia americana desde os anos 1990 (Sapiro; Popa, 2008; Sapiro, 2019b) e de alguns(as) autores(as) do passado.
Traduções do inglês, alemão e italiano para o francês: clássicos, modernos, contemporâneos (2003-2013)
Um sinal de que o prestígio associado à tradição alemã se mantém na França são as traduções dessa língua, que totalizam 55% dos títulos de autores clássicos (contra 6,6% do italiano e 38% do inglês); e 43% daqueles falecidos do século XX (contra 48,6% do inglês e 8,5% do italiano). Entretanto, esse capital simbólico não se transfere automaticamente aos(às) autores(as) alemães(ãs) contemporâneos(as), cujos livros representam apenas 10% desse conjunto, menos do que os 14% de títulos de autores(as)italianos(as) vivos(as), três quartos vindos de autores(as) anglófonos. Esses dados revelam que, apesar da “recuperação” de títulos de autores(as) estadunidenses do passado, desde a década de 1990 (eles constituem a maioria dos 22 títulos de autores(as) falecidos(as) antes de 1920 [re]traduzidos(as) do inglês para o francês entre 2003 e 2013), que corresponde a uma reavaliação dessa tradição, principalmente quanto ao pragmatismo, por muito tempo denegrido na França no plano filosófico (Pudal, 2012), essa tradição permanece menos valorizada do que sua homóloga alemã, que continua a prevalecer em Filosofia. Como veremos, a “recuperação” das traduções de autores(as) estadunidenses é muito mais marcante nos autores(as) do século XX.
O capital simbólico dos autores(as) e das tradições disciplinares nacionais
Os autores(as) falecidos antes de 1920, na maioria “clássicos”, representam menos de 9% do total (228 títulos, dos quais 63 coletâneas inéditas, ou seja, mais de um quarto). Atestando o capital simbólico associado a seus nomes próprios, esses clássicos são regularmente traduzidos ou retraduzidos, em particular os filósofos alemães (Kant, Hegel, Fichte, Schopenhauer, Nietzsche), ou italianos (Machiavel, Giordano Bruno), ou então os “pais” da Sociologia, Georg Simmel ou Max Weber, que foi inclusive objeto de lutas de apropriação na França (Pollak, 1988) no período estudado. Entre os clássicos (re)traduzidos do inglês para o francês entre 2003 e 2013, há muitos pensadores americanos (Ralph Waldo Emerson, Frederick Douglass, White Dickson, William James, Thomas Paine, Lysander Spooner, Henry Thoreau), mas também britânicos(as) (John Locke, David Hume, William Bradford, Edwin Chadwick, Francis Hutchinson, Mary Wollenstonecraft) e um título de Karl Marx. Certos autores(as) que já faleceram são por vezes (re)descobertos(as) e transformados(as) em clássicos. É o caso, por exemplo, de David Thoreau (seis traduções para o francês desde 1993), no contexto da escalada da questão ambiental e do interesse crescente pelos pensadores americanos.
Quanto aos(às) autores(as) do século XX falecidos antes do período aqui estudado, a maioria ainda estava sujeita a direitos autorais,11 embora alguns, como Aby Warburg, recém tivessem entrado em domínio público, o que oferecia aos editores uma oportunidade de traduzi-los ou retraduzi-los a menor custo. Eles representam 23% do total (597 títulos, com 71 coletâneas inéditas, ou seja, 12%). Alguns deles(as) estão se tornando clássicos, a exemplo de John Dewey ou de John Rawls, incorporado ao cânone filosófico francês nos anos 1990 (oito títulos traduzidos entre 1987 e 2013; Hauchecorne, 2019). Edward Said também se tornou uma referência nesse período (quatro títulos traduzidos desde sua morte em 2003; Brahimi; Fordant, 2017). No que tange ao alemão, lembremos o processo de canonização da obra de Heidegger, consagrada pela publicação das obras completas por uma editora prestigiada de obras de caráter geral, Gallimard, a partir da década de 1980, apesar das polêmicas recorrentes provocadas por seu engajamento pró-nazista (Bourdieu, 1988; Sapiro, 2022, p. 153-166). Também Hannah Arendt passa por um processo de canonização, ainda que em menor medida, pois sua recepção na França foi freada por sua apropriação pela direita antitotalitária desde os anos 1970. O sociólogo alemão Niklas Luhmann, em compensação, não adquiriu o status de referência clássica na França, onde era pouco traduzido e lido até recentemente. No entanto, cinco títulos foram publicados em língua francesa desde 1985, sendo três entre 2003 e 2013, mas fora da França (Quebec e Suíça alemã). Em contrapartida, certos sociólogos estadunidenses alcançaram maior visibilidade no período estudado: Erwin Goffman já era traduzido desde os anos 1960 na coleção “Le sens commun”, dirigida por Bourdieu na Éditions de Minuit, mas duas obras de Robert Park foram publicadas pela primeira vez em francês em 2007 e 2008, e uma do sociólogo das ciências Joseph Bem David. Entretanto, esses autores já eram bem conhecidos dos sociólogos franceses, que os liam em inglês, diferentemente do afro-americano W.E.B Du Bois, cujo nome foi introduzido no período que estudamos, após sua redescoberta nos Estados Unidos.
Os contemporâneos, vivos no início do período considerado, e cujas obras ainda estão sujeitas a direitos autorais, totalizam mais de dois terços das traduções (1.735 títulos, sendo 137 coletâneas inéditas, ou seja, 8%, cujos capítulos não provêm necessariamente de obras protegidas). Alguns autores(as) contemporâneos(as) também contam com um capital simbólico importante. De fato, seis autores têm entre dez e vinte obras traduzidas entre 2003 e 2013: em primeiro lugar, Slavoj Zizek (19 títulos), ensaísta prolífico e provocador, seguido por Noam Chomsky (18) e Judith Butler (13) – ambos conhecidos por seus engajamentos políticos enquanto intelectuais, para além de sua obra acadêmica; muitas de suas obras traduzidas são ensaios engajados –, pelos filósofos Giorgio Agamben (12) e Peter Sloterdijk (11) e pelo sociólogo de origem polonesa Zygmunt Bauman (11). Cento e quarenta e sete autores(as) (dentre os quais, nove alemães e dez italianos) têm entre dois e nove títulos publicados; alguns já haviam sido traduzidos na década anterior, como o classicista italiano Luciano Canfora (9), o economista indiano Amartya Sen (6), o filósofo italiano Antonio Negri (6), o sociólogo americano Richard Senett (5), o filósofo alemão Jürgen Habermas (3), que encabeçava a lista dos autores(as) traduzidos do alemão entre 1985 e 2002, com mais de 10 títulos, os sociólogos alemães Ulrich Beck (5) e Axel Honneth (4), o sociólogo americano Immanuel Wallerstein (5), o antropólogo britânico Jack Goody (4), o antropólogo indiano Arjun Appadurai (3), a historiadora do gênero americana Joan Scott (3), ou ainda o historiador britânico Quentin Skinner (3). Outros foram introduzidos no mercado editorial francês a partir de 2003, como o filósofo pragmático americano Stanley Cavell (8), o estatístico libanês-americano Nassim Taleb (3), o cientista político James Scott (3), os teóricos da literatura Fredric Jameson (3) e Gayatry Spivak (2), a socióloga americana Saskia Sassen (2) e a antropóloga americana Ann Stoler (2) (sobre a recepção de Spivak na França, ver Brisson, 2020). Porém, excetuando as obras coletivas (46), 1.075 autores(as) têm apenas um livro dos 1.689 títulos de autores(as) contemporâneos(as) traduzidos(as), o que indica uma grande dispersão (a razão de concentração é de 1,3). A polarização entre uma forte concentração e uma grande dispersão é sinal de um mercado muito competitivo. Com efeito, os autores(as) vivos(as) sem capital simbólico transnacional encontram muitos obstáculos à tradução de suas obras, pois a reputação nacional não é transferida automaticamente ao exterior.
Uma das consequências dessa hegemonia estadunidense é um início de feminização da paisagem intelectual (ver gráfico 2): em 13,4% dos títulos traduzidos do inglês e 14,6% do italiano, a primeira autora era uma mulher,12 contra 5,7% do alemão (a média era de 12%). O índice para o inglês e o italiano se aproxima daquele de 15% constatado nas traduções do francês para o inglês, mas com uma variação de 11% a 17% entre o Reino Unido e os Estados Unidos. Ele permanece nitidamente inferior à parcela das obras escritas por mulheres entre as traduções literárias, que é de 25% dos títulos; essa porcentagem sobe para um terço nos autores(as) contemporâneos(as) (Sapiro, 2015). Simultaneamente à redescoberta de uma autora como Rosa de Luxemburgo, observa-se um fenômeno de “recuperação” das traduções, principalmente nos estudos de gênero, como, por exemplo, a tradução de Feminism Unmodified da jurista feminista Catharine MacKinnon, duas décadas após sua publicação, em 1987.
Gênero do primeiro autor das obras traduzidas do inglês, alemão e italiano para o francês (2003-2013)
Uma outra consequência é a “recuperação”, desde os anos 1990, das traduções de filósofos estadunidenses, analíticos e pragmáticos, até agora pouco considerados na França e mantidos à margem do campo intelectual e acadêmico (Pudal, 2004, 2012). É o caso principalmente de Dewey, pois a maior parte de suas obras só foi traduzida após 2000. Essa “recuperação” leva o inglês a ultrapassar o alemão em número de títulos de filósofos traduzidos, embora essa língua, apoiada no capital simbólico da filosofia alemã, liderasse nessa área no período 1985-2002 (Sapiro; Popa, 2008). Entretanto, contam-se ainda 214 obras de filosofia traduzidas do alemão para o francês, o que representa 38% das traduções dessa língua, contra 306 do inglês (18%) e 102 do italiano (33%) (gráfico 3). Disciplina mais traduzida do alemão e do italiano para o francês, a Filosofia vem depois da História (25%) nas traduções do inglês (são também as disciplinas mais traduzidas do francês para o inglês, com cerca de um quarto cada uma) (Sapiro, 2014).
No alemão, a Psicologia e a Psicanálise chegam em terceiro lugar (14,4%, devido às traduções de Freud e de Jung), enquanto, no italiano, é a Ciência Política (com 9%; no inglês, essas duas disciplinas se situam em torno de 8%). Segue, no italiano, a História da Arte, (5,1%); no alemão, é a Sociologia (8,7%) que vem na quarta posição, com traduções de clássicos (Max Weber, Simmel, Tönnies, Kracauer), testemunho do capital simbólico acumulado pela Sociologia alemã, e 15 títulos contemporâneos (cinco de Ulrich Beck e dois de Axel Honneth). De fato, 70% dos títulos de sociólogos traduzidos do alemão são de autores(as) já falecidos, enquanto os contemporâneos(as) representam cerca de 80% das traduções do inglês (e do italiano) nessa disciplina. Com efeito, embora a primeira institucionalização acadêmica da Sociologia tenha ocorrido nos Estados Unidos já no final do século XIX, a Sociologia americana só começou a suscitar interesse na França e em outros países da Europa e do mundo após a Segunda Guerra Mundial. O ritmo das traduções se acelerou na década de 1970 e, mais ainda, a partir dos anos 1990 (Chenu, 2001). Comparando com as traduções do francês para o inglês de 2002 a 2012, a Sociologia vem em terceiro lugar, com 13% dos títulos. Como no caso do alemão para o francês, essa porcentagem relativamente elevada da Sociologia entre as traduções do francês para o inglês expressa o capital simbólico acumulado pela Sociologia francesa desde o papel que teve Durkheim na fundação da disciplina no fim do século XIX (Heilbron, 2016) e, sobretudo, desde a consagração internacional de Bourdieu (Sapiro, 2015).
A rede dos autores(as) mais traduzidos(as) do inglês, alemão e italiano para o francês e suas editoras (2003-2013)
Embora o capital simbólico dos autores(as) clássicos(as) ou em vias de canonização e das tradições disciplinares ajude a explicar uma parte das importações, existem outras lógicas que tangem às relações de força editoriais, como mostra a análise de redes que relacionam os autores(as) e suas editoras em francês (gráfico 4).
Concentrações geográficas e editoriais: de onde vêm os livros traduzidos?
A origem geográfica dos livros traduzidos confirma os fenômenos de concentração editorial em áreas linguísticas. Mais de 85% dos títulos traduzidos do inglês para o francês de 2003 a 2013 foram publicados de início nos Estados Unidos (55%) e no Reino Unido (30%), e 6% são coletâneas de artigos de autores(as) majoritariamente baseados nesses países, compilados por editores franceses, o que significa que menos de um título em dez vem de outro país anglófono. No caso da língua alemã, as traduções provêm de 9 países, mas 86% dos títulos (398 de 464, exceto 79 coletâneas inéditas e 20 obras em domínio público) foram publicados na Alemanha, 6,7% na Áustria (31, com 19 títulos de Freud) e 4,5% na Suíça (21); o restante é disperso. De modo previsível, tratando-se de uma língua falada sobretudo na Itália, quase todos (294 de 312) os títulos traduzidos do italiano foram publicados nesse país, e 15 são novas coletâneas.
A centralização é manifesta também em torno dos grandes centros históricos do mercado editorial – Nova York 30%, Londres 16% (exceto coletâneas inéditas) –, ainda que atenuada, na zona anglófona, pelo papel das editoras universitárias (já que as cidades das grandes editoras alcançam até 6%). A zona germanófona se concentra em torno de quatro cidades alemãs, que totalizam perto de dois terços das “exportações” dessa língua: Frankfurt (26%) mantém a centralidade adquirida durante a Guerra Fria, apesar da migração de algumas editoras para Berlim (14,5%), cujo índice equivale ao de Munique (14,3%); Leipzig (8,4%) vem antes de Viena (6,3%). Na Itália, Milão (33%), Roma (27%) e Turim (14,5%) concentram três quartos dos livros de Ciências Humanas “exportados” em tradução.
Essas concentrações se encontram no âmbito das editoras. É das universitárias que vem o maior número de obras de CHS traduzidas do inglês para o francês, particularmente as mais antigas e renomadas. Elas figuram no centro da análise de rede das trocas com os editores franceses e se relacionam tanto com os que publicam obras de caráter geral quanto com os especializados (gráfico 5). Assim, no período 2003-2013, Cambridge University Press (72) e Oxford University Press (58) vêm à frente, seguidas de Princeton (48) e Harvard (47, às quais se deve acrescentar 14 da filial Belknap, aqui registrada em separado), da grande editora escolar britânica Routledge (46) e da editora “radical” Verso (43) (Frisani, 2014). The University of Chicago Press, Yale University Press e The University of California Press figuram também entre as 14 editoras universitárias com mais de 20 títulos traduzidos para o francês, juntamente com os grandes editores comerciais HarperCollins, Basic Books, Penguin e Knopf.
Rede assimétrica dos editores franceses e anglófonos segundo os autores compartilhados (2003-2013)
Os 25 editores com ao menos 10 títulos traduzidos concentram aproximadamente a metade das 1.458 traduções do inglês (exceto as 227 coletâneas inéditas). A razão de concentração é de 3,4 (1.458 títulos em 428 editoras), mas essa diversidade editorial deve ser relativizada se considerarmos que os livros provêm de cerca de 20 países e que a maioria dos editores exportadores tem sede nos Estados Unidos e no Reino Unido, conforme já vimos. No entanto, essa diversidade também reflete a configuração mais descentralizada da edição acadêmica estadunidense e britânica graças às editoras universitárias, em contraste com a edição francesa, muito concentrada em Paris (ver infra e Sapiro, 2019a).
No que diz respeito à língua alemã, a razão de concentração é mais baixa, 2,5 (465 títulos em 189 editoras – exceto coletâneas inéditas ou clássicas), o que revela maior diversidade editorial, inclusive em comparação com a edição especializada anglófona, muito mais limitada a um segmento de mercado. O motivo disso, sem dúvida, é a configuração intermediária dos editores alemães, entre o estado anterior do subcampo editorial e as transformações posteriores às fusões e aquisições (Schalke; Gerlach, 1999). De um lado, as editoras de obras gerais como Suhrkamp, Hanser, Fischer e Rowholt (as duas últimas fazem parte, entre outras, do grande conglomerado Holztbrinck ou de outros grupos) continuam a publicar e a exportar obras de CHS; do outro, vê-se a importância de grupos de edição científica como Springer e de Gruyter e o editor de obras gerais Beck se situando entre esses dois polos devido a seu papel na edição jurídica (a editora publica também setenta revistas). Algumas editoras especializadas independentes, como Mohr Siebeck, Meiner ou Klostermann, participam da internacionalização das Ciências Humanas alemãs.
A análise da rede das trocas entre editoras alemãs e francesas (ligadas por autores(as) compartilhados(as) mostra a centralidade das editoras de obras gerais, cercadas pelas editoras especializadas ou científicas (ver gráfico 6). Diferentemente das trocas com os editores anglófonos, aquelas efetuadas com os alemães estão muito mais centradas em torno de Suhrkamp. Essa posição central de Suhrkamp, que vem bem à frente nas exportações, com 65 títulos traduzidos para o francês, principalmente de autores(as) contemporâneos(as), e que comercializa com o maior número de editores franceses (32), deve-se à sua política de autor: essa editora tem, em seu catálogo, a maioria dos autores mais traduzidos do alemão, ou seja, Peter Sloterdijk, Jürgen Habermas, Ulrich Beck. Porém, pode-se igualmente pensar que essa editora contribuiu para torná-los pensadores mundialmente conhecidos. Seu capital simbólico se construiu a partir do pós-guerra com escritores inovadores, alemães e traduzidos, como Brecht, Enzenberger, Thomas Bernhard, Beckett, Joyce, Proust, que entraram no cânone da literatura mundial, e com pensadores da Escola de Frankfurt, que ela continua a exportar durante o período, tais como Adorno (7) e Walter Benjamin (3), ou ainda o filósofo (sem corrente) Hans Blumenberg (4).
Rede assimétrica dos editores franceses e alemães, de acordo com os autores compartilhados (2003-2013)
Essa política de autor também é observada naqueles que exportam autores do século XX já falecidos, a exemplo de Fischer com Freud (projeto de retradução com a Presses Universitaires de France/PUF), ou de Klostermann com Heidegger (que detém 9 dos 11 títulos traduzidos desse editor, todos pela Gallimard). Para esses autores do século XX em vias de canonização, constata-se também a prática de coletâneas inéditas de artigos. Beck, por sua vez, comercializa mais com editores especializados.
Algumas editoras (como de Gruyter) formam pequenas redes periféricas. À esquerda do gráfico, figuram editores franceses que apostam em valores garantidos sem assumir riscos. Rowohlt, que pertence desde 1982 ao grupo Holzbrinck, publica sobretudo edições de bolso (Flammarion “Pluriel”, “Pocket” etc.) para reedições de autores(as) em vias de canonização, como Walter Benjamin; embaixo, à esquerda, Walter Verlag cede títulos de Carl Jung a Albin Michel.
A dispersão é ainda maior no caso da edição italiana, com uma razão de concentração de 2,5 (288 títulos – exceto 24 coletâneas inéditas – publicados por 16 editores). Doze editoras concentram perto da metade dos títulos traduzidos para o francês no período estudado. Duas editoras de obras gerais (com mais de vinte títulos traduzidos para o francês no período), com grande tradição de publicação de obras de CHS, detêm a liderança: Laterza (36, sendo seis de Canfora) e Einaudi (22), que se mostram centrais na análise de redes (gráfico 7). São seguidas de três editoras especializadas em ensaios de CHS: a prestigiosa Il Mulino, fundada em 1955 (13); Boringheri (12), fundada em 1957 (e comprada em 2009 pelo grupo Mauri Spagnol); Jaca Book (11), fundada em 1966 (que publicou Derrida, Lévinas e Ricoeur em italiano), e que formam sua própria rede na periferia esquerda. Esses cinco editores concentram um terço das exportações do italiano (exceto coletâneas inéditas). Estão à frente dos grupos Bompiani (9), Feltrinelli (9) e Mondadori (do qual Einaudi faz parte; 7), relativamente afastados do centro na análise de rede. Seguem de perto quatro editoras igualmente especializadas em CHS, mas criadas mais recentemente (a partir de 1980), à exceção da última: Cortina (7), Donzelli (6), Mimesis (6) e Adelphi (6). Todos esses editores (ou marcas), até os mais centrais, formam redes mais distintas do que ocorre com as outras línguas.
Rede assimétrica dos editores franceses e italianos, de acordo com os autores compartilhados (2003-2013)
Essas paisagens contrastantes confirmam as especificidades dos modos de acumulação do capital simbólico dos editores conforme as tradições nacionais, que pesam sobre a assimetria das trocas, mas embaralham também as lógicas editoriais, quando, por exemplo, grandes editores de obras gerais como Gallimard e Le Seuil comercializam com editoras universitárias americanas ou pequenos editores “radicais” (Sapiro, 2019a).
Morfologia do grupo das editoras importadoras
À imagem do mercado da tradução (Sapiro, 2008), mas com seus intermediários específicos, o setor dos ensaios em CHS se organiza como um oligopólio de franja, com uma forte concentração em torno de 25 editoras que publicaram ao menos 20 títulos, totalizando 45% do conjunto, e uma forte dispersão entre 456 editoras. Essa concentração é visível na análise da rede de todos os editores franceses que traduziram do inglês, do alemão e do italiano na década estudada (gráfico 8).
Dos 25 primeiros, 13 publicaram ao menos 30 títulos, concentrando um terço das traduções. Trata-se principalmente de grandes editoras de obras gerais (Gallimard, Flammarion, Seuil, Fayard) e de editoras especializadas (principalmente PUF, Payot, La Découverte, Belles-lettres, Vrin, Cerf, Éditions de l’Éclat e Harmattan), assim como de um pequeno editor, Amsterdam. As editoras universitárias têm um papel muito marginal, com menos de dez títulos cada uma, exceto a de Rennes (16 títulos).
O gráfico 8 revela uma polarização entre, à direita, a rede dos grandes editores que disputam entre si os clássicos (Hegel, Locke) e os autores(as) de referência do século XX (Arendt, Heidegger), ou contemporâneos (em cima, a História; embaixo, a Filosofia), à esquerda, a rede dos pequenos editores “radicais”, tais como Amsterdam, Agone, Allia, Prairies ordinaires, e os editores comunistas Éditions sociales e Temps des cerises, que compartilham autores marxistas ou críticos (no sentido da “critical theory”): Chomsky, Harvey, Jameson, Spivak etc.
O gráfico 9 os diferencia conforme as línguas que publicam. As grandes editoras de obras gerais (Gallimard, Flammarion, Seuil, Fayard, Albin Michel) traduzem majoritariamente do inglês e mais os contemporâneos (o mesmo se dá com dois importantes editores de Ciências Humanas, La Découverte e Payot); são as editoras especializadas (PUF, Vrin, MSH, Hermann) que privilegiam o alemão, mas também a pequena editora independente Allia, que propõe títulos de filósofos clássicos como Herder, Nietzche, Winckelman ou Simmel, assim como pensadores da Escola de Frankfurt (Adorno, Benjamin) e teóricos da literatura da Escola de Constance (Wolfgang Iser e Hans-Robert Jauss); alguns raros pequenos editores independentes têm sobretudo títulos italianos.
Rede dos editores franceses que traduziram ao menos dois títulos do inglês, alemão e italiano, diferenciados de acordo com a língua mais traduzida (2003-2013)
Observemos agora as políticas de tradução de nove editoras nos três polos do subcampo: obras gerais, especializado, engajado. Os catálogos das grandes editoras dão continuidade à sua linha anterior, mas se ajustam às evoluções do campo intelectual marcado pela hegemonia estadunidense. O exame dos catálogos das três primeiras em número de títulos traduzidos revela as estratégias editoriais, entre acumulação de capital simbólico, participação no debate de ideias (ou seu impulso) e meta comercial. As importações contam mais seguidamente com a mediação de agentes literários(as) do que no polo especializado (retomaremos essa questão).
Dentre as 106 traduções publicadas pela Gallimard (60 do inglês, 39 do alemão, sete do italiano), encontram-se poucos clássicos (seis de 106), todos do alemão: três de Schopenhauer, um de Bolzano, um de Rudolf Haym, na coleção “Bibliothèque de Philosophie” – fundada em 1950 por Sartre e Merleau-Ponty e que, desde o início, importou maciçamente a filosofia alemã –, um volume de cartas escolhidas de Nietzsche em volume de bolso e a retradução de A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, de Max Weber na coleção “Bibliothèque de Sciences Humaines”. Gallimard prossegue, em contrapartida, com a publicação das obras completas de dois autores estelares de seu catálogo: Heidegger (nova títulos na “Bibliothèque de Philosophie”) e Freud (sete na “Bibliothèque des Idées” ou em formato de bolso), que totalizam portanto metade dos 32 títulos de autores(as) do século XX (em concorrência com o projeto de retradução das obras completas de Freud na PUF). A isso se acrescentam, na Psicanálise, dois títulos de Winnicott. A Epistemologia e a Filosofia das Ciências estão representadas com Schlick, Gould, Wittgenstein e Bernard Williams; a Filosofia política, com Arendt e Macpherson, a Filosofia pragmática, com três títulos de Dewey. A maioria dos 67 títulos de autores(as) contemporâneos(as) vem do inglês: 48, contra 12 do alemão (três de Harald Welzer, dois de Jürgen Habermas, dois d’Axel Honneth) e sete do italiano (dois da historiadora Benedetta Craveri e dois do linguista Raffaelle Simone). Do inglês, são traduzidos especialmente historiadores (Jared Diamond, Raoul Hilberg, Timothy Snyder, Darnton), filósofos analíticos e pragmáticos (Hilary Putnam, Stanley Cavell), antropólogos (Marshall Sahlins), teóricos políticos (Philip Pettit), sociólogos (Saskia Sassen) e historiadores da Arte (Svetlana Alpers, Michael Fried).
Nas 99 traduções publicadas pela editora Flammarion, 40% delas (re)editadas em formato de livro de bolso, sinal do sucesso encontrado, encontram-se dez clássicos (três de Max Weber e obras de filósofos: Beccaria, Locke, Hume Kant, Hegel, Schopenhauer e William James), 23 autores(as) do século XX (entre os quais, Konrad Lorenz, Popper, Karl Polanyi, Carl Schmitt, Walter Benjamin, Adorno, Hans Jonas e Elias) e dois terços de contemporâneos, com sete títulos de Zižek, três de Canfora, dois de Beck (e apenas duas biografias escritas por mulheres). Junto com os clássicos, publicados em formato de bolso (às vezes diretamente) na coleção “Champs”, essa editora promove obras mais ensaísticas – como o livro de Fukuyama sobre o fim da história (reeditado em formato de bolso) – ou de não-ficção, visando um público mais amplo e minimizando assim os riscos ligados à tradução.
A editora Seuil traduziu apenas três títulos clássicos, todos do alemão (Hegel, Riegl e Helen Deutsch). Entre os autores(as) do século XX (nove títulos), citemos Hans Blumenberg, Robert Park e Karl Polanyi. Entre as obras publicadas 64 são de autores(as) contemporâneos(as), tais como Giorgio Agamben, Ian Kershaw, Saul Friedländer, Suzan Berger, Oliver Sacks, Daniel Heller-Roazen e Sudhir Kakar. Nesse catálogo, a interação com o campo acadêmico é mais marcada do que no anterior.
No polo da edição especializada, no qual as traduções são feitas mais por iniciativa dos pesquisadores(as), a PUF ocupa um lugar central. As traduções do alemão (53 de 104) predominam no seu catálogo, devido ao projeto de obras completas de Freud (26), às quais se acrescentam seis títulos de outros(as) psicanalistas (como Mélanie Klein e Alice Miller), assim como dez de filósofos clássicos (Hegel) ou do século XX (Heidegger, Husserl), cinco de sociólogos clássicos (Simmel, Tönnies, Weber), três de Direito (Schmitt, Savigny) e três de outras disciplinas. O número de traduções do inglês é, contudo, muito próximo (49), mas perto de dois terços (30) provêm de autores(as) contemporâneos(as). É a Filosofia (19) que predomina com, no caso dos contemporâneos(as), Judith Butler, Cora Diamond (2), Jon Elster, Margaret Gilbert, Alasdair MacIntyre, Philip Pettit: ilustrando o fenômeno de “recuperação”, o prazo de tradução era de 24-25 anos para Après la Vertue [After Virtue] (1981) de MacIntyre e Sujets de désir - Réflexions hégéliennes en France au XXe siècle [Subjects of desire: Hegelian reflections in twenty-century France (1987) de Butler; três outros títulos – de Diamond, Gilbert, Pettit – são coletâneas inéditas, sinal do capital simbólico associado agora a esses nomes. Segue a Psicanálise (13), depois vêm a Economia (quatro, com dois títulos de Friedrich Hayek, um de Peter Bernstein e um de Amartya Sen) e a Sociologia (quatro de Gosta Esping-Andersen, Anthony Giddens, Harold Garfinkel e Robert Nisbet); as demais disciplinas (História, Letras, Ciência Política) só têm uma ou duas obras.
A importante editora de Ciências Sociais, La Découverte, publica principalmente do inglês (55 de 68). Nove títulos são traduzidos do alemão, a maioria contemporâneos (dois de Honneth, dois de Walraff, um de Hartmut Rosa e, única mulher, Mechtild Fend), além de três autores do século XX (Theodor Herzl, Siegfried Kracauer e Norbert Elias); quatro do italiano, todos contemporâneos(as) (Francesco Fristetti, Annamaria Rivera, Domenico Losurdo e Dino Costantini), sobre questões de multiculturalismo, de universalismo e sobre o liberalismo. Dentre as traduções do inglês, nove títulos de autores do século XX, sendo três de Rawls, autor que se encontra em vias de canonização, como já vimos. Entre os contemporâneos, excetuando Bruno Latour (três obras), alguns raros autores têm duas obras traduzidas, Immanuel Wallerstein, Chris Harman, e duas mulheres, Nancy Fraser e Mary Douglas. Três outras figuram no catálogo com um título: Judith Butler, a antropóloga Ann Stoler e a historiadora israelense Idith Zertal, ao lado de Eric Hobsbawm, Perry Anderson, Howard Becker e Timothy Mitchell entre os mais conhecidos. Os temas são frequentemente políticos e socioeconômicos, com uma dimensão crítica, e uma abordagem pós-colonial ou de gênero no caso de alguns.
Especializada em Filosofia, a editora Vrin traduz mais da metade de seus títulos (31 de 58) do alemão: clássicos (Kant, Schelling, Fichte, Hegel, Schopenhauer, Husserl), autores do século XX (como Gadamer, Blumenberg, Rickert, Schmitt) e apenas quatro contemporâneos. Do italiano, à parte Léon l’Hébreu, a editora só tem autores contemporâneos (como Agamben). Do inglês, traduziu ou mandou revisar quatro títulos clássicos (três de Locke e um de Hume), dez de autores do século XX. Nenhuma dessas obras foi escrita por uma mulher.
No polo das pequenas editoras independentes voltadas para o pensamento crítico, a Éditions de l’Éclat, fundada em 1985, tem um catálogo original, cujas traduções provêm majoritariamente do inglês (19), sobretudo no caso dos(as) autores(as) contemporâneos(as). Ao lado de trabalhos sobre o pensamento judaico e as filosofias analíticas (Putnam, Recanati), por ela introduzidos na França, o catálogo dessa editora inclui a teórica crítica Donna Haraway e a antropóloga Susan McKinnon. Entretanto, é também uma das principais importadoras do italiano (11), com autores que vão de Giordano Bruno ao teórico do operaísmo Mario Tronti e ao economista heterodoxo Christian Marazzi (a maioria de contemporâneos, sete). Ela também traduziu seis obras do alemão (de Hermann Broch, Schlegel, Ludwig Siep e Wittgenstein).
Fundada em 2002, Amsterdam foi uma das pequenas editoras engajadas que mais contribuíram para a introdução na França da teoria crítica estadunidense – sobretudo Butler, com seis títulos, Eve Kosofsky Sedwig, Dipesh Chakabarty, Gayatry Spivak – e dos cultural studies – em particular a obra de Stuart Hall. Dos 31 títulos que traduziu, 29 vêm do inglês, dois do italiano (pensadores da “multidão” Antonio Negri e Vittorio Morfino).
Por fim, das 25 traduções publicadas pela editora Agone, fundada em 1998, em Marselha, cuja linha é de crítica social e política baseada nas Ciências Sociais, três provêm do alemão – sendo dois volumes de obras completas de Rosa de Luxemburgo, projeto em colaboração com o coletivo Smolny e em acordo com o editor britânico radical Verso, que está preparando a versão inglesa – e 22 do inglês, com 18 autores contemporâneos, dentre os quais Chomsky (3), Howard Zinn (3) e Franck Thomas (2). Essas pequenas editoras formam suas próprias redes com suas análogas estrangeiras, mas também trabalham de maneira mais ou menos regular com universitários que as orientam, fazem propostas, traduzem e às vezes prefaciam.
O gráfico 10 representa a rede dos editores franceses com os editores estrangeiros nas três línguas estudadas aqui, de acordo com os autores(as) compartilhados(as). Sem comentar esse gráfico, cujos componentes já foram analisados acima para cada uma das línguas, pode-se visualizar o conjunto das redes, antes de evocar as categorias de intermediários e de mediadores interculturais envolvidos.
Rede assimétrica dos editores franceses e estrangeiros, de acordo com os autores(as) compartilhados(as) (2003-2013)
Redes e trocas
Situada na intersecção entre o campo acadêmico e o editorial, a tradução de obras de CHS liga as redes dos dois campos: editores(as), encarregados(as) de cessão de direitos, agentes literários, universitários(as) (que são também, muitas vezes, tradutores, por vezes diretores(as) de coleções), instituições de pesquisa.
Os agentes do campo editorial são, primeiramente, os editores(as). Alguns deles têm contatos e relações diretas com seus colegas estrangeiros e trocam regularmente informações durante as feiras do livro, por telefone, correio eletrônico ou outro meio, constituindo uma rede editorial transnacional. Essas redes repousam, em boa parte, no capital simbólico e social dos editores. No polo dos editores de obras gerais, as trocas não se restringem à não-ficção. Assim, as trocas entre Gallimard e Suhrkamp de 2003 a 2013 não se limitaram aos cinco títulos de Ciências Humanas traduzidos do alemão (Gallimard é principalmente o editor de Peter Handke em francês). Em CHS, colaborações regulares podem também se dar em torno de um projeto de edição de obras completas de autores(as) em vias (avançadas) de canonização – a tradução das obras completas de um determinado autor é um dos indicadores mais seguros disso –, como entre Gallimard e Klostermann para Heidegger, ou entre Gallimard e Fischer para Freud, o que não impede que outros editores publiquem obras desses autores, como se viu, sinal do status de clássicos que eles alcançaram (ver também o exemplo da tradução dos seminários de Derrida pela Chicago University Press, McCoy, 2014).
Entretanto, devido à estruturação compartimentada dos campos editoriais acadêmicos estadunidense e inglês, dos quais procede a maioria das obras traduzidas em francês, as trocas entre editores são menos diversificadas do que entre editores europeus continentais. Para as obras publicadas no período estudado, Fayard, por exemplo, adquiriu direitos de tradução de 25 editores diferentes, mas somente três cederam mais de um título. Essa editora publicou somente uma obra da Columbia UP, um ensaio engajado de Judith Butler, Vers la cohabitation [Parting ways: Jewishness and the critique of Zionism], ao passo que traduziu todas as obras de Julia Kristeva; destas, 11 entre 1990 e 2007, período em que a Columbia UP também adquiriu os direitos de seis outros títulos dessa editora.
Em razão da estrutura do campo editorial acadêmico anglófono, a assimetria das trocas se revela aqui invertida em proveito dos editores franceses de obras gerais. Ela é manifesta nas relações entre a editora Seuil e a mais prestigiosa editora universitária estadunidense, Harvard UP, que publicou entre 2010 e 2013 sete títulos da Seuil – três de Milad Doueihi, autor que as reuniu, como aconteceu com Thomas Piketty em 2014, após o fulgurante sucesso de vendas de O Capital no Século XXI. Contudo, essas colaborações não são sistemáticas: Harvard não publicou os livros seguintes de Pascale Casanova, apesar da bela acolhida reservada à República Mundial das Letras, publicado em 2004.
Entre as grandes editoras assim como entre muitos editores especializados, as trocas editoriais são intermediadas pelos encarregados(as) de cessão de direitos. Não sendo quase nunca especialistas em Ciências Humanas (sobretudo nas grandes editoras, onde o setor é organizado por grupos de línguas), esses profissionais tendem a focar nos títulos que têm mais sucesso e que são, portanto, mais rentáveis e produzem na prática o efeito Mateus*, e a centrar sua atenção em alguns nomes e obras em detrimento de outros (sobre esses intermediários, ver Seiler-Juilleret, 2014).
Tradicionalmente, os agentes literários(as), que representam o autor, eram mais presentes no setor literário do que no acadêmico, mas a situação está mudando, sobretudo nos Estados Unidos13, onde muitos professores(as)-pesquisadores(as) que desejam publicar em um editor comercial contratam um(a) agente, a exemplo dos autores traduzidos pela editora Denoël. As agências literárias se interessam mais, de fato, por livros que atingem um público mais amplo não-universitário, como o best-seller de David Bellos, Is that a fish in your ear?, representado pela agencia britânica Janklow & Nesbit. No entanto, nem sempre essas agências conseguem colocar seus autores nos editores de obras gerais e os propõem agora também a editoras universitárias com coleções comerciais, como Harvard UP, Princeton UP ou Yale UP, e o mesmo no exterior. Por exemplo, as obras do sociólogo Richard Sennet, representadas pelo mesmo agente Janklow & Nesbit, foram publicadas por Faber & Faber, Norton, mas também na Yale UP. Em francês, ele foi primeiro traduzido por um pequeno editor, Éditions de la Passion, e depois três títulos foram publicados por um editor de obras gerais, Albin Michel, pouco tempo depois da primeira publicação (zero e dois anos). Fato bastante raro com livros de autores(as) contemporâneos(as) traduzidos(as), eles são reeditados em formato de bolso a partir de 2008 pela “Pluriel”, enquanto a matriz Fayard publica os romances do mesmo autor.
Em muitos casos, a circulação das obras de CHS implica igualmente redes acadêmicas. Os acadêmicos(as) podem recomendar a um editor uma obra a ser traduzida, seja porque conhecem o autor (capital social), seja porque o consideram importante para o campo de recepção. Observa-se mais essa lógica no polo mais acadêmico da edição.
Na edição das CHS, redes acadêmicas e redes editoriais se imbricam mais ou menos. Os acadêmicos frequentemente ocupam funções de diretores(as) de coleção: as grandes editoras já recrutavam, nos anos 1960, figuras-chave como Pierre Bourdieu (Minuit), Pierre Nora (Gallimard), Paul Ricœur (Seuil), Tzvetan Todorov e Gérard Genette (Seuil) para assumir essas funções. Assim como com os editores, mas agora mais de acordo com a lógica acadêmica de cooptação, essas figuras transferem seu capital simbólico aos autores que elas publicam. No caso de algumas dessas coleções, a tradução foi um meio de acumular capital simbólico. Por exemplo, a metade dos 63 títulos publicados na coleção “Le sens commun”, dirigida por Bourdieu na editora Minuit, entre seu lançamento em 1966 e o ano de 1978, eram traduções (32): 15 do inglês, 12 do alemão, quatro do grego antigo e uma do russo.
As lógicas editoriais e acadêmicas estão, portanto, estreitamente ligadas no que toca à circulação das obras de CHS, mas nem sempre seus interesses convergem. Às vezes, as lógicas acadêmicas até mesmo inibem a introdução de autores(as) estrangeiros(as), conforme ilustrado pela fraca recepção da filosofia analítica e pragmática na França até os anos 1990: primeiro introduzida por uma pequena editora especializada, Éclat, e por um pequeno grupo em torno de Jacques Bouveresse, foi depois “recuperada” pelos editores centrais, de obras gerais ou especializadas. A tradução de Luhmann, no Quebec, também exemplifica um circuito na periferia do subcampo.
Estratégias editoriais de transferência de capital simbólico: os prefácios
Para além do seu envolvimento (parcial) no processo de seleção, os acadêmicos também têm um papel na promoção dos livros traduzidos, prefaciando-os, escrevendo sinopses ou resenhas. No entanto, atualmente a prática dos prefácios é menos valorizada pelos editores: somente 7% dos 2.950 livros traduzidos para o francês a partir de 11 línguas entre 1990 e 2002 tinham um prefácio; 14% daqueles traduzidos do inglês, alemão e italiano entre 2003 e 2013 (sem variação dessa porcentagem entre as línguas), às vezes do próprio autor, e 2% contavam com um posfácio. Dos 364 prefácios em obras publicadas entre 2003 e 2013, apenas 31 foram redigidos por mulheres, muitos deles pelas próprias tradutoras, o que ocorre com menos frequência quando se trata dos homens.
Esse tipo de paratexto corresponde às operações de marcação e de interpretação que Bourdieu (2002) descreve como cruciais no processo de recepção, após a operação de seleção. Nessas operações, efetua-se uma transferência de capital simbólico, ora do autor (re)traduzido para o prefaciador quando se trata de clássicos, ora do prefaciador para o autor, quando este é desconhecido no campo de recepção. Essa alternativa não esgota as estratégias possíveis, para as quais Luc Boltanski (1975) propôs uma primeira tipologia – “oblativa”, “emblemática” e “distante” –, mas nos deteremos aqui nas estratégias dos editores em pedido de prefácios para introduzir autores pouco conhecidos na França. Desse ponto de vista, distinguem-se dois tipos, representativos dos circuitos acadêmico e comercial.
A primeira estratégia, praticada pelas editoras especializadas, como Les Éditions de la Maison des Sciences de l’Homme ou Herman (MSH), baseia-se na legitimidade científica, como ilustra o prefácio do historiador Christophe Charle na obra Essais sur l’histoire de la société allemande: 1870-1914, de Hans-Ulrich Wehler, inicialmente publicada em alemão pela Beck Verlag, em 1987, e traduzida pela MSH em 2003. Por vezes, esses prefácios evidenciam o papel dos prefaciadores acadêmicos que promoveram o projeto de tradução e revelam em todo caso redes acadêmicas preexistentes, como as de Alain Touraine em Communication et Pouvoir, de Manuel Castells, na MSH.
Diferentemente do polo acadêmico, no da edição de obras gerais, onde os prefácios são mais raros, prevalece o princípio de notoriedade no espaço público, que busca ampliar a repercussão midiática da publicação. Geralmente, são obras traduzidas do inglês e representadas por agências. Por exemplo, Denoël, editora que se tornou filial do grupo Gallimard, solicita a escritores(as) que apresentem a um público amplo traduções de ensaios publicadas em editores comerciais anglo-americanos: Virginie Despentes, em 2009, para Vamps & tramps: une théorie païenne de la sexualité (publicado em 1994 por Vintage Books) da feminista Camille Paglia, representada pela agente Lynn Nesbit.
Um terceiro tipo de estratégia é de ordem política. Encontram-se exemplos em pequenos editores engajados como Agone: Serge Halimi prefaciou o livro de Franck Thomas Pourquoi les pauvres votent à droite, publicado em 2013.
Conclusão
Este estudo, que abarca uma década, permite nuançar a ideia de uma “americanização” das CHS francesas. Não resta dúvida de que, apesar da existência de uma política de estímulo à cooperação da União Europeia, o aumento dos fluxos de tradução do inglês, em detrimento sobretudo do alemão (não obstante o papel preponderante da Alemanha na UE), indica mais uma hegemonia estadunidense do que uma dinâmica regional. Esse fenômeno, registrado por Gingras e Heilbron (2009) em publicações conjuntas, não é específico à França e parece ainda mais forte na Alemanha, Itália, Espanha, Países Baixos e países escandinavos. Devido à sua posição dominante até a década de 1970 no campo intelectual transnacional, a França chegou “atrasada” nesse movimento de sincronização de um campo global das Ciências Humanas e Sociais sob hegemonia estadunidense – com variações, conforme as disciplinas, que se devem a seu grau de internacionalidade, tal como definido por Gingras (2002), e às especificidades das tradições nacionais e das relações de força internacionais nas diversas disciplinas.
Vale observar, entretanto, que o campo estadunidense das Ciências Sociais, longe de ser unificado, é ele próprio dividido: assim, longe de se reduzir às teorias críticas, como sugerem seus defensores na mídia, ele inclui um polo dominante e um polo conservador, para além da tradição filosófica analítica e pragmática e das tradições sociológicas do interacionismo simbólico e da etnometodologia, introduzidas na França já na década de 1970, ou especialidades como a Sociologia Econômica e a Sociologia do Direito, e métodos como a análise de redes (introduzida na França nos anos 1990). O polo dominante, quantitativista e presentista, volta-se para a teoria do ator racional e para a modelização, conforme o exemplo da economia ortodoxa (cujos trabalhos circulam mais em artigos de revisão de Economia em inglês); o polo conservador se mostra hostil aos saberes críticos. Em contrapartida, foi mais pelo canal das traduções de obras que esses saberes foram importados, sendo os mais novos no campo intelectual francês, que lhes era bem pouco receptivo até os anos 1990 (período em que a noção de “gênero” começou a ser introduzida). Além da “recuperação” em matéria de clássicos e de autores(as) estadunidenses do século XX, que ampliou o cânone filosófico continental com autores como Dewey e Rawls, a tradução de obras assimiladas à teoria crítica (Butler, Spivak) permitiu paralelamente ao polo dominado do campo francês das CHS que se afirmasse como polo dominante.
Na interseção entre os campos acadêmico e editorial, o subcampo da edição em Ciências Sociais refletiu as evoluções de cada um, sendo marcado pelas concentrações, pela racionalização da economia e pela importância crescente dos agentes. Deste modo, as políticas de tradução dos editores franceses em matéria de CHS indicam continuidade na importação de autores do cânone filosófico, sociológico ou psicanalítico, de predominância alemã, com uma abertura para pensadores estadunidenses ainda pouco traduzidos em francês. Eles contribuem ativamente para o processo de canonização de figuras do século XX, como Heidegger ou Elias (Joly, 2012), mas aderem mais do que antes a projetos de canonização liderados pelos Estados Unidos, como o de Dewey (até então pouco considerado na França), de Arendt (cuja recepção na França foi absorvida de início pela direita antitotalitária), ou de Saïd (que teve uma primeira recepção moderada), o que indica uma harmonização com a agenda intelectual do campo das Ciências Sociais sob hegemonia estadunidense, reforçada pelas importações contemporâneas, que abrigam três quartos de obras de autores(as) americanos(as).
Todavia, é preciso distinguir diferentes lógicas nessa importação: a lógica comercial para certas obras sobre temas atuais (presentes ou relativos ao passado), passíveis de atingir um público maior, representada por agentes (majoritariamente do inglês); a lógica de acumulação de capital simbólico para autores(as) que já são referência (Goody, Putnam, Skinner no inglês; Habermas, Beck e Honneth no alemão; Canfora no italiano); a lógica política voltada para obras críticas mais ou menos baseadas em pesquisas ou em uma reflexão teórica (Butler, James Scott no inglês; Negri e Losurdo no italiano), reflexão renovada pelas abordagens em termos de gênero e de racialização, e agora pelo método interseccional, mas também pelas abordagens marxistas espaciais (Wallerstein, Harvey); e, por fim, a lógica mais acadêmica, centrada nos interesses de conhecimento. Muitos autores(as) se situam entre essas categorias: Butler se tornou uma referência nos estudos de gênero e sua obra contribuiu para a institucionalização desses estudos na França, com a de Joan Scott; por outro lado, ela publica ensaios engajados sobre as leis de exceção, ou sobre Israel, a exemplo de Chomsky. Como vimos, os prefácios, embora raros, ilustram a diversidade das estratégias no subcampo, entre lógica generalista (e comercial), lógica acadêmica e lógica política. As editoras universitárias, que eram, até pouco tempo atrás, as grandes ausentes desse movimento de importação, começam a desenvolver seu papel de intermediárias entre os campos acadêmicos nacionais, e é de se esperar que, mais do que se associar ao modelo anglo-americano como já fazem algumas, elas auxiliem a favorecer um verdadeiro diálogo entre campos acadêmicos, que escape às lógicas comerciais e às modas intelectuais.
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1
Tradução realizada a partir do artigo L’américanisation des sciences humaines et sociales françaises ? Une cartographie des traductions de l’anglais, de l’allemand et de l’italien en français (2003-2013), mediante autorização. A autora agradece à Patricia C. R. Reuillard pela tradução.
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2
Ver nossa crítica dessas abordagens em Heilbron e Sapiro, 2015.
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3
Recorrer à tradução automática ainda é pontual e individual, não sendo admitido no campo editorial como instrumento legítimo de transposição de uma obra de uma língua à outra.
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4
A pesquisa foi realizada no âmbito do projeto europeu Interco-SSH (International Cooperation in the Social Sciences and the Humanities), financiado pelo programa FP 7 (n°319974) http://interco-ssh.eu/en/; https://halshs.archives-ouvertes.fr/INTERCOSSH.
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5
Além do gênero, três categorias Dewey foram selecionadas na base: 100 – Filosofia, Psicologia; 300 – Ciências Sociais; 900 – História.
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6
Hélène Seiler-Juilleret coletou os dados e me auxiliou em sua exploração. Eles foram verificados, recodificados e complementados por Madeline Bedecarré, Elsie Cohen, Quentin Fondu, Barbara Grüning, Alihan Mestci e Rafaël Schögler.
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7
Efetuadas por Mauricio Bustamante.
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8
De fato, as editoras universitárias desenvolvem cada vez mais uma atividade comercial em paralelo à atividade não lucrativa para compensar a redução de seus recursos.
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9
Caso se introduzissem as outras oito línguas analisadas no período anterior, as porcentagens seriam evidentemente inferiores. Por essa razão, limitamo-nos a comparar a relação. No entanto, pode-se controlar esse resultado a partir da extração feita da base Electre para a categoria “CHS, ensaios”, a partir de 17 línguas: alemão, inglês, árabe, chinês, coreano, húngaro, japonês, holandês, polonês, romeno, russo, tcheco, espanhol, italiano, português e sueco. Dos 3.550 títulos, o inglês totalizava 47,5 %, o alemão 16% e italiano 8,8%. Portanto, trata-se da mesma relação.
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10
Sobre as tradições nacionais em Ciências Sociais, ver Heilbron, 2008.
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11
O prazo de proteção é, como na França, de 70 anos após a morte do autor na Alemanha, na Itália e no Reino Unido; nos Estados Unidos, de 95 após a publicação da obra. Mesmo que as obras publicadas nos anos 1920-1930 já tenham todas entrado em domínio público em 2000, deve-se levar em conta o tempo de tradução, assim como um meio termo com a legislação estadunidense. O argumento jurídico não é o único para essa classificação. Muitos autores do século XX estão em processo de canonização, o que se observa nas traduções, como acontece com Heidegger.
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12
Em somente 31 títulos do total, havia uma mulher como segundo autor.
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13*
Cunhado pelo psicólogo Keith Stanovich a partir de uma passagem bíblica e posteriormente assumido também por outras áreas do conhecimento, o efeito Mateus se refere ao crédito desproporcional que podem receber indivíduos que já têm renome, ofuscando outros igualmente talentosos, mas menos conhecidos (Nota de trad.).
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14
Lá entrevistei universitários que tinham um agente e também uma agente que trabalhava com universitários.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
28 Abr 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
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Recebido
14 Out 2022 -
Aceito
10 Jan 2023