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O Tratado de Marraqueche no contexto do regime global de políticas de informação

The Marrakesh Treaty in the context of the global regime of information policies

Resumo

Aborda a acessibilidade e a inclusão das pessoas com deficiência no contexto do Emergente Regime Global de Políticas de Informação. Aponta o Tratado de Marraqueche como uma inovação disruptiva que contribui para o atendimento dos objetivos estabelecidos pela Agenda 2030 no que diz respeito a construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis. Debate a preocupação da área da Ciência da Informação com os avanços nos estudos com relevância social sob a influência da transversalidade do quadro que compõe as infraestruturas de informação, a “modularidade” em plataformas digitais e a importância das redes colaborativas na produção e difusão de acervos acessíveis a pessoas com deficiência. Tem como objetivo trazer uma reflexão dessas ações e suas rupturas na prática dos profissionais da informação e as transformações que a própria biblioteca sofre enquanto protagonista desse processo. Utiliza a revisão de literatura do tipo narrativa como abordagem metodológica, sendo a pesquisa identificada como do tipo exploratória, de caráter descritivo-analítico. Conclui que o estabelecimento de políticas de informação são fundamentais no sentido que dão segurança normativa para a implementação de políticas institucionais com vista a promover melhores práticas de acessibilidade e inclusão em instituições sociais como as bibliotecas.

Palavras-chave:
pessoas com deficiência; regime global de informação; política de informação; Tratado de Marraqueche.

Abstract

Addresses the accessibility and inclusion of people with disabilities in the context of the Emerging Global Information Policy Regime. It highlights the Marrakesh Treaty as a disruptive innovation that contributes to meeting the objectives established by the Agenda 2030 regarding building effective, responsible, and inclusive institutions at all levels. It discusses the concern of the Information Science field with advances in studies with social relevance under the influence of the cross-cutting framework that comprises information infrastructures, the “modularity” in digital platforms, and the importance of collaborative networks in the production and dissemination of collections accessible to people with disabilities. Its aim is to reflect on these actions and their ruptures in the practice of information professionals and the transformations that the library itself undergoes as a protagonist in this process. It uses a narrative literature review as a methodological approach, with the research identified as exploratory, of a descriptive-analytical nature. It concludes that the establishment of information policies is fundamental in the sense that they provide normative security for the implementation of institutional policies aimed at promoting better practices of accessibility and inclusion in social institutions such as libraries.

Keywords:
people with disabilities; global information regime; information policy; Marrakesh Treaty

1 Introdução

A acessibilidade e inclusão de Pessoas com Deficiência (PcD) em espaços como as bibliotecas podem ser vistas como uma inovação social do atual regime de informação no sentido que impulsiona o desenvolvimento de tecnologias e soluções que permitam que este grupo social possa acessar e utilizar produtos e serviços de informação nestes ambientes.

Essas soluções exigem uma abordagem criativa e inovadora que pode levar a novas ideias e avanços no campo das Tecnologias Assistivas1 1 De acordo com Bersch (2017) é um conceito relativamente recente que se refere a um amplo conjunto de recursos e serviços destinados a melhorar ou ampliar as habilidades funcionais de indivíduos com deficiência, com o objetivo de promover a independência e a inclusão em suas vidas. e digitais (sites, catálogos, repositórios etc.). Além disso, a acessibilidade aos serviços informacionais pode trazer benefícios sociais e econômicos significativos, pois permite que PcD possam participar plenamente da sociedade, incluindo o mercado de trabalho. Isso implica na melhora de indicadores econômicos e sociais como produtividade, diversidade e inclusão social, avaliados por organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU).

De acordo com dados ONU (2018ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). ONU News - Perspectiva Global Reportagens Humanas. Brasil, 2018. ), existem hoje no mundo mais de um bilhão de Pessoas com Deficiência (PcD). No Brasil, já passam de 18,6 milhões, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2023INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD): pessoas com deficiência 2022. Brasília, 2023. ). Este grupo social está entre os estratos sociais identificados como em situação de vulnerabilidade social, ainda com baixa inserção nos espaços sociais em todos os campos da vida em sociedade: educação, cultura, lazer etc.

No final do século passado as inovações tecnológicas provocadas pelas tecnologias de comunicação digital, como a web e a internet, geraram novos produtos e serviços para um público que não dispunha de acesso por meio das tecnologias tradicionais. Esse processo foi denominado por Christensen (2013CHRISTENSEN, Clayton M. O dilema da inovação: quando as novas tecnologias levam empresas ao fracasso. São Paulo: M. Books do Brasil, 2013.) como inovação disruptiva.

Abordagens socioculturais no campo da Ciência da Informação definem como disruptivas as inovações sociais, culturais e tecnológicas que transformam ideias e conhecimentos em processos, produtos e serviços que aplicados aos sistemas de informação enriquecem e ampliam as funcionalidades dos recursos disponíveis - catálogos, sites, repositórios etc. (Miranda; Campos, 2022MIRANDA, Marcos Luiz Cavalcanti; CAMPOS, Maria Luiza de Almeida. A organização do conhecimento no domínio das ciências sociais e humanidades na perspectiva de Douglas John Foskett e Derek Wilton Langridge: uma abordagem aos Estudos Culturais e inovações disruptivas. P2P & Inovação, Rio de Janeiro, v.8, n.2, p. 160-177, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.21721/p2p.2022v8n2.p160-177 . Acesso em: 4 mar. 2024.
https://doi.org/10.21721/p2p.2022v8n2.p1...
).

Nessa direção, pode-se dizer que a noção de inovação disruptiva parece-nos adequada, na medida que, para tornarem-se inclusivas, as bibliotecas terão que rever os serviços já existentes (tradicionais), revestindo-os de novos atributos (tecnologias web) para atender a todos. Isso inclui o desenvolvimento de catálogos online com a inserção de funções de acessibilidade, como o recurso da Libras; a inserção de podcast na descrição por áudio dos materiais para atender pessoas com deficiência visual; e o uso do QR Code para facilitar a leitura via celular, o que possibilita ao usuário com baixa visão ter mais independência no acesso à informação por meio dos catálogos eletrônicos. Esses são exemplos de inovações disruptivas aplicadas nas bibliotecas nos serviços e ações ofertadas às pessoas com deficiência.

Neste contexto destaca-se o Tratado de Maraqueche, ato normativo federal voltado a “[...] facilitar o acesso a obras publicadas às pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso” (Brasil, 2018BRASIL. Decreto n. 9.522, de 8 de outubro de 2018. Promulga o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso, firmado em Marraqueche, em 27 de junho de 2013. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 155, n. 195, p. 1-4, 9 out. 2018. ). Dado isto, pergunta-se: como o Tratado de Marraqueche tem sido efetivo como dispositivo de inclusão social e acessibilidade à informação para pessoas com deficiência? De que forma estas orientações legais vêm sendo incorporadas na prática do profissional da informação e nos serviços oferecidos pelas bibliotecas? Infere-se ser este documento uma inovação disruptiva na contribuição do atendimento dos objetivos estabelecidos pela Agenda 2030, no sentido que lança luz à relevância social das bibliotecas no atendimento à diversidade de público como as pessoas com deficiência (PcD).

São objetivos deste artigo analisar o impacto desta Lei na prática profissional dos bibliotecários e as transformações que a própria biblioteca sofre enquanto protagonista desse processo.

Tendo em vista os objetivos desta pesquisa e as características de uma discussão teórica, utilizamos como metodologia a revisão de literatura do tipo narrativa, sendo a pesquisa identificada como do tipo exploratória, de caráter descritivo-analítico.

Segundo Gil (2017GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2017., p. 26), a pesquisa de cunho descritivo é aquela que busca fazer “[...] a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou [...] o estabelecimento de relações entre variáveis”, a analítica vai ampliar as conclusões da pesquisa descritiva, servindo como um complemento uma vez que analisa e explica o “por quê” e “como” os fatos ocorrem.

De acordo com Rother (2007ROTHER, Edna Terezinha. Revisão sistemática x revisão narrativa. Acta Paulista de Enfermagem, São Paulo, v. 20, n. 2, p. 1, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0103-21002007000200001 . Acesso em: 20 abr. 2024.
https://doi.org/10.1590/S0103-2100200700...
, p. 1) a revisão narrativa envolve o levantamento de publicações “[...] apropriadas para descrever e discutir o desenvolvimento ou o “estado da arte” de um determinado assunto, sob ponto de vista teórico ou contextual, abrangendo diversos artigos e documentos pertinentes ao tema.

Para essa etapa da pesquisa, foram utilizadas bases de dados disponíveis no Portal da CAPES, sendo consultadas as bases Scopus, Web of Science e Scielo. Os termos de busca foram: Tratado de Marraqueche, Pessoas com Deficiência e Biblioteca. Utilizou-se a booleana “and” para associar os termos e conseguir mais especificidade nos resultados.

As legislações citadas foram pesquisadas nos sites do Senado Federal, Câmara dos Deputados e Portal do Planalto. Além disso, dados estatísticos sobre o número de pessoas com deficiência foram obtidos no site do IBGE. Esta informação ajudou-nos a conhecer o perfil desse grupo social no Brasil.

As fontes selecionadas foram analisadas e avaliadas quanto à sua relevância e contribuição à investigação proposta. Os artigos levantados foram essenciais no desenvolvimento da discussão sobre regime global de informação e políticas informacionais, constituindo-se no aporte teórico usado para analisar a regulamentação do Tratado de Marraqueche no Brasil e verificar seu impacto sobre as bibliotecas e seus profissionais.

A presente pesquisa está estruturada da seguinte forma: uma introdução e três seções, por meio das quais fundamentamos a discussão sobre regime global de informação e contextualizamos nosso objeto de análise: o Tratado de Marraqueche. Por fim, concluímos destacando a importância deste documento na elaboração de políticas informacionais para a inclusão social de PcD em unidades de informação.

2 A Agenda 2030: a inclusão das pessoas com deficiência e as bibliotecas

Até meados do século passado as PcD eram colocadas à margem da sociedade, enclausuradas em manicômio e longe das pessoas ditas “normais”, mas a luta das PcD no mundo mudou essa realidade. Hoje a ONU e os Estados nacionais, em sua maioria, defendem de forma global a inclusão das PcD em todos os espaços sociais; as veem como cidadãs, participantes dos processos de produção, consumo e geração de renda, índices que a macroeconomia capitalista valoriza e que, caso não sejam contemplados, coloca sob risco a sustentabilidade do atual modelo de desenvolvimento2 2 Pina (2010), ao abordar a inclusão de PcD, faz uma crítica ao modelo de inclusão social como “processo de adequação ao sistema gerais da sociedade”, como o postulado pela ONU por meio da Agenda 2030. Para a autora, esse modelo de inclusão não discute o modelo econômico vigente. Para a autora, trata-se de uma estratégia ideológica da “velha ordem social” que propõe um mundo mais humanizado em relação ao diferente. Além disso, destaca que “[...] eliminar os fatores que excluem certas pessoas da sociedade implica atacar os fundamentos centrais da sociedade capitalista” (Pina, 2010, p. 133). Essas considerações são importantes para entendermos as contradições, os limites e as possiblidades que envolvem os estudos em torno da Agenda 2030, mas dado o recorte de nossa abordagem não foi possível explorar neste artigo. .

Entre os esforços para mitigar as contradições sociais engendradas pelo próprio sistema está a elaboração de uma agenda de compromisso - a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, que recebeu a adesão de 193 Estados integrantes, entre eles o Brasil.

O documento arrola 17 objetivos e 169 metas que devem ser alcançadas pelos países signatários até 2030. A Agenda começou a ser implementada em janeiro de 2016, visando o alcance do desenvolvimento sustentável tendo como eixos o acesso à educação, difusão das tecnologias da informação e comunicação, bem como a disseminação e o acesso à informação, tendo como preocupação grupos sociais vulneráveis, como as PcD.

Para atingir os objetivos da Agenda, a ONU vem mobilizando organismos internacionais, como a Federação Internacional de Associações e Instituições Bibliotecárias (IFLA), e criando parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) no desenvolvimento de diretrizes com o objetivo de tornarem as bibliotecas em todo o mundo inclusivas e acessíveis. Essa preocupação vai além do acesso físico, perpassando pelo acesso à informação por meio de acervos e catálogos acessíveis, bibliotecas digitais e redes cooperativas.

O Manifesto IFLA/UNESCO (2022)3 3 Atualiza a versão de 1994 e alinha o documento com os preceitos da Agenda 2030, destacando a contribuição das bibliotecas para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. A biblioteca é definida como “[...] um componente essencial das sociedades do conhecimento, adaptando-se continuamente a novos meios de comunicação para cumprir sua missão de fornecer acesso universal e permitir o uso significativo da informação para todas as pessoas [...]” (IFLA; UNESCO, 2002). para as bibliotecas públicas, atualizado em 2022, elenca as missões da instituição, dentre as quais destacamos: apoiar a educação individual e a autoformação em todos os níveis; fomentar o diálogo intercultural e as diversidades (étnica e cultural, de gênero, religiosa); facilitar o desenvolvimento da capacidade de utilizar a informação para desenvolvimento individual e coletivo. O Manifesto ainda destaca que os serviços das bibliotecas devem ser prestados:

[...] com base na igualdade de acesso para todos, independentemente de idade, etnia, sexo, religião, nacionalidade, idioma, condição social e qualquer outra característica. Serviços e materiais específicos devem ser fornecidos para aqueles usuários que não podem, por qualquer motivo, usar os serviços e materiais regulares, por exemplo, minorias linguísticas, pessoas com deficiência, com baixa proficiência em habilidades digitais ou de informática, com baixa escolaridade, pessoas hospitalizadas ou privadas de liberdade (IFLA; UNESCO, 2022INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA); ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA (UNESCO). Manifesto da Biblioteca Pública IFLA-UNESCO. Paris: IFLA, 2022. Disponível em: https://repository.ifla.org/handle/123456789/2187 . Acesso em: 6 mar. 2024.
https://repository.ifla.org/handle/12345...
).

Para a IFLA, o acesso à informação e as habilidades e competências para o seu uso são essenciais ao desenvolvimento humano. Dessa forma, a organização procurou assegurar junto à ONU o reconhecimento do assunto como recurso estratégico. Inclusive elaborou o documento The Lyon Declaration (IFLA, 2014INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA). Declaração de Lyon. Sobre acesso à informação e desenvolvimento. Paris: IFLA, 2014. ), com o propósito de influenciar o conteúdo da Agenda 2030. O documento tem como princípio o acesso à informação como fundamental no “[...] apoio, desenvolvimento, capacitação das pessoas, especialmente dos marginalizados e os que vivem em situação de pobreza, para exercer os seus direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais” (IFLA, 2014INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA). Declaração de Lyon. Sobre acesso à informação e desenvolvimento. Paris: IFLA, 2014. ).

Nesse contexto, a biblioteca protagoniza um cenário de destaque na contribuição e na execução dos 17 Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelecidos, e dentre eles destacamos os seguintes: “[...] promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos; [...] construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis” (ONU, 2015ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Sobre o nosso trabalho para alcançar os objetivos de desenvolvimento sustentável no Brasil: como as Nações Unidas apoiam os objetivos de desenvolvimento sustentável no Brasil, 2015. ).

No Brasil, a Federação Brasileira de Associações de Bibliotecas, Cientistas de Informação e Instituições (FEBAB) tem protagonizado uma forte atuação política, liderando a campanha “bibliotecas por um mundo melhor” (FEBAB, 2018FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE ASSOCIAÇÕES DE BIBLIOTECÁRIOS, CIENTISTAS DE INFORMAÇÃO E INSTITUIÇÕES (FEBAB). Bibliotecas por um mundo melhor - Agenda 2030. São Paulo: FEBAB, 2018. Disponível em: http://repositorio.febab.org.br/items/show/4563 . Acesso em: 20 fev. 2024.
http://repositorio.febab.org.br/items/sh...
), em que relata alguns exemplos de ações de informação alinhadas aos propósitos da Agenda 2030.

No caso das bibliotecas as diretrizes que orientam e/ou direcionam a escolha dos meios e dos recursos informacionais preferenciais, bem como os critérios de padronização da informação, se expressam como micropolíticas em um regime global de informação, que tem como estratégia a organização e a distribuição da informação por meio de redes, formais e informais, relativamente estáveis (González de Gómez, 2002GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. Novos cenários políticos para a informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 31, n. 1, p. 27-40, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0100-19652002000100004 . Acesso em: 29 fev. 2024.
https://doi.org/10.1590/S0100-1965200200...
), operacionalizadas mediante ações de informação que podem ser compartilhadas por mais de um agente (humanos e não humanos) e em diferentes dispositivos. González de Gómez (2003GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As relações entre ciência, Estado e sociedade: um domínio de visibilidade para as questões da informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 32, n. 1, p. 60-76, 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0100-19652003000100007 . Acesso em: 29 fev. 2024.
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) sintetiza o processo e explica que se trata de políticas de informação que são “[...] organizadas e transferidas de diferentes produtores, por muitos e diversos meios, canais e organizações, a diferentes destinatários ou receptores de informação, sejam estes usuários específicos ou públicos amplos” (González de Gómez, 2003GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As relações entre ciência, Estado e sociedade: um domínio de visibilidade para as questões da informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 32, n. 1, p. 60-76, 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0100-19652003000100007 . Acesso em: 29 fev. 2024.
https://doi.org/10.1590/S0100-1965200300...
, p. 61).

Para funcionar adequadamente, as infraestruturas tecnológicas precisam de outras ações de informação, dentre as quais destacamos as estruturais, manifestas por meio de normas que regularizam os fluxos de informação, desde sua produção à disseminação e que se expressam, na maioria das vezes, como políticas de informação.

Como veremos mais à frente, o Tratado de Marraqueche é uma inovação nas políticas de informação no sentido de promover uma estrutura jurídica a nível internacional que permite que seja criada e distribuída cópias em formato acessível para as pessoas com baixa visão ou com alguma limitação ou dificuldade em acessar ao texto no formato impresso, promovendo, dessa forma, o compartilhamento de recursos bibliográficos acessíveis e a promoção do intercâmbio transfronteiriço o que favorece e fortalece a formação de redes para compartilhamentos de acervos.

Sendo assim, entendemos o Tratado como um dispositivo jurídico disruptivo do atual regime global de informação, no quadro do desenvolvimento de atos normativos sobre o uso de tecnologias digitais para garantir a acessibilidade a produtos e serviços que atendam às necessidades culturais e educacionais das PcD, O documento indica ações que otimizam modelos tradicionais de difusão de informação, amplia a Lei dos Direitos Autorais, provando mudanças nos processos de tratamento, organização e disseminação do regime de informação das bibliotecas, uma vez que novos recursos, como a digitação de livros impressos, podem ser produzidos para atender as PcD, além de favorecer a criação de redes colaborativas para a produção e difusão de objetos digitais acessíveis.

Na subseção a seguir, busca-se contextualizar este documento a partir das análises sobre o atual regime global de informação, tendo como referencial teórico os estudos de Braman (2004BRAMAN, Sandra. The emergent global information policy regime. New York: Palgrave Macmillan, 2004. , 2006BRAMAN, Sandra. Information, policy, and power in the informational state. In: Change of state: information, policy, and power. Cambridge: MIT Press, 2006. p. 1-8. Disponível em: https://doi.org/10.7551/mitpress/1783.001.0001 . Acesso em: 20 fev. 2024.
https://doi.org/10.7551/mitpress/1783.00...
, 2011BRAMAN, Sandra. A economia representacional e o regime global da política de informação. In: MACIEL, Maria Lucia; ALBAGLI, Sarita Albagli (org.) Informação, conhecimento e poder: mudança tecnológica e inovação social. Rio de Janeiro: Garamond, 2011. p. 41-66. ) e González de Gómez (2003GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As relações entre ciência, Estado e sociedade: um domínio de visibilidade para as questões da informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 32, n. 1, p. 60-76, 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0100-19652003000100007 . Acesso em: 29 fev. 2024.
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, 2019GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maris Nélida. Reflexões sobre a genealogia dos regimes de informação. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.29, n.1, p. 137-158, 2019. , 2020GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As ações de informação e seus contextos: aportes da pragmática ao campo investigativo da Ciência da Informação. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.30, n.4, p. 1-20, 2020. ) aproximando-os das macropolíticas propostas pela Agenda 2030 (ONU, 2015ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Sobre o nosso trabalho para alcançar os objetivos de desenvolvimento sustentável no Brasil: como as Nações Unidas apoiam os objetivos de desenvolvimento sustentável no Brasil, 2015. ).

3 O regime global e o Tratado de Marraqueche no contexto das políticas de informação

González de Gómez (2003GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As relações entre ciência, Estado e sociedade: um domínio de visibilidade para as questões da informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 32, n. 1, p. 60-76, 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0100-19652003000100007 . Acesso em: 29 fev. 2024.
https://doi.org/10.1590/S0100-1965200300...
, p. 61) entende o regime de informação como “[...] modo de produção informacional dominante em uma formação social” vigente em determinado lugar, tempo e espaço, atravessada por relações socioculturais e condicionados a relações de poder, sendo as ações dos sujeitos, das organizações, das regras e de autoridades influenciadas por micro e macropolíticas, locais e globais.

Braman (2004BRAMAN, Sandra. The emergent global information policy regime. New York: Palgrave Macmillan, 2004. ), define os Estados-nação e os regimes globais de informação como sistemas complexos e adaptativos que exigem demandas distintas das entidades constituintes, que não podem ser mudadas porque as mudanças interferem no relacionamento ou mesmo na alteração do objetivo dessas entidades. A autora continua sua explicação, dizendo-nos que os sistemas políticos se desdobram em um amplo campo jurídico composto por uma vasta variedade de práticas, instituições e discursos que envolvem múltiplos atores e subsistemas em contínua mudança de relacionamentos formais e informais. O que nos leva a inferir que a noção de regimes globais de informação exige acordos entre os Estados-nação, como a Agenda 2030, pactos que garantam a sustentabilidade do sistema capitalista cujas intervenções nos campos econômico, político e social estão suscetíveis a inovações tecnológicas.

González de Gómez (2020GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As ações de informação e seus contextos: aportes da pragmática ao campo investigativo da Ciência da Informação. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.30, n.4, p. 1-20, 2020. ) ao falar do crescimento exponencial da internet e dos ambientes digitais em condições “históricas excepcionais, como a pandemia” ressalta o quanto são frequentes ações virtuais “[...] trans locais, distribuídas entre múltiplos agentes fisicamente localizados, e que passam a compor, nas esferas eletrônicas e online, multi-agências ou interagentes coletivos” (González de Gómez, 2020GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As ações de informação e seus contextos: aportes da pragmática ao campo investigativo da Ciência da Informação. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.30, n.4, p. 1-20, 2020. , p. 3).

Para Braman (2004BRAMAN, Sandra. The emergent global information policy regime. New York: Palgrave Macmillan, 2004. ), o emergente regime global de informação atravessa historicamente as questões políticas que giram em torno do fluxo global de informação, cultura e comunicação. Explica que seu caráter global se dá pelo envolvimento de atores estatais e não estatais, enquanto que o caráter emergente se configura pela “[...] teoria dos sistemas adaptativos [sendo] atribuído ao fato de seu conteúdo e de suas características estarem em processo de desenvolvimento” (Alves; Bezerra, 2019ALVES, Thiara dos Santos; BEZERRA, Arthur Coelho. Informação, política e poder: 20 anos do conceito de “regime de informação” em Maria Nélida González de Gómez. Tendências da Pesquisa Brasileira e Ciência da Informação, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, 2019. , p. 9).

Nesse contexto, segundo Braman (2011BRAMAN, Sandra. A economia representacional e o regime global da política de informação. In: MACIEL, Maria Lucia; ALBAGLI, Sarita Albagli (org.) Informação, conhecimento e poder: mudança tecnológica e inovação social. Rio de Janeiro: Garamond, 2011. p. 41-66. ), a elaboração de política nacional de informação só se tornou possível porque líderes políticos de todo o mundo reconheceram que, de fato, leis e regulamentos que afetam as informações são realmente questões de “alta política” e de importância estratégica global. Complementa dizendo que a política de informação é “um conceito guarda-chuva” que envolve o conjunto de leis, regulações, posições doutrinárias que lidam com três aspectos: a informação, a comunicação e a cultura.

Conforme Braman (2004BRAMAN, Sandra. The emergent global information policy regime. New York: Palgrave Macmillan, 2004. ; 2006BRAMAN, Sandra. Information, policy, and power in the informational state. In: Change of state: information, policy, and power. Cambridge: MIT Press, 2006. p. 1-8. Disponível em: https://doi.org/10.7551/mitpress/1783.001.0001 . Acesso em: 20 fev. 2024.
https://doi.org/10.7551/mitpress/1783.00...
) os Estados-nação e os regimes globais expressam complexos sistemas adaptativos. Significa dizer que os comportamentos informacionais só podem ser inferidos analisando as entidades constituintes, a nível global e local, já que qualquer alteração em uma entidade ou relacionamento pode alterar outras entidades ou relacionamentos.

Para mediar os relacionamentos os sistemas políticos vão desenvolver, no campo jurídico, uma grande variedade de práticas, leis, hábitos culturais, instituições e discursos envolvendo múltiplos atores e “[...] subsistemas formais e informais de relacionamentos” (Alves; Bezerra, 2019ALVES, Thiara dos Santos; BEZERRA, Arthur Coelho. Informação, política e poder: 20 anos do conceito de “regime de informação” em Maria Nélida González de Gómez. Tendências da Pesquisa Brasileira e Ciência da Informação, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, 2019. , p. 9), nas instâncias públicas e nas não-governamentais, em âmbitos nacional e internacional.

Sobre a questão das práticas informacionais, González de Gómez (2003GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As relações entre ciência, Estado e sociedade: um domínio de visibilidade para as questões da informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 32, n. 1, p. 60-76, 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0100-19652003000100007 . Acesso em: 29 fev. 2024.
https://doi.org/10.1590/S0100-1965200300...
) em seu artigo direciona o olhar do leitor para a forma como a informação se manifesta o que chama de “ações de informação”, as quais “[...] remetem aos atores que as agenciam aos contextos e situações em que acontecem e aos regimes de informação em que se inscrevem” (González de Gómez, 2003GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As relações entre ciência, Estado e sociedade: um domínio de visibilidade para as questões da informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 32, n. 1, p. 60-76, 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0100-19652003000100007 . Acesso em: 29 fev. 2024.
https://doi.org/10.1590/S0100-1965200300...
, p. 61, nota). Avançando em seus estudos, destaca que a análise dos regimes de informação recebe a influência da “transversalidade” das infraestruturas de informação, com a internet e a web e mais recentemente da “modularidade” das plataformas digitais. Explicando, diz que a transversalidade se perfilava como tendência, mas “[...] nas últimas duas décadas passamos a vivenciar uma vigorosa expansão do que alguns denominam plataformização das infraestruturas” (González de Gómez, 2019GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maris Nélida. Reflexões sobre a genealogia dos regimes de informação. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.29, n.1, p. 137-158, 2019. , p.143). No entanto, ressalta que o processamento da informação não se limita às condições de funcionamento das infraestruturas tecnológicas, devendo caminhar em paralelo às ações regulatórias, as especificações jurídicas e normativas, conforme veremos a seguir.

As questões levantadas por González de Gómez (2019GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maris Nélida. Reflexões sobre a genealogia dos regimes de informação. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.29, n.1, p. 137-158, 2019. ) e Braman (2004BRAMAN, Sandra. The emergent global information policy regime. New York: Palgrave Macmillan, 2004. , 2006BRAMAN, Sandra. Information, policy, and power in the informational state. In: Change of state: information, policy, and power. Cambridge: MIT Press, 2006. p. 1-8. Disponível em: https://doi.org/10.7551/mitpress/1783.001.0001 . Acesso em: 20 fev. 2024.
https://doi.org/10.7551/mitpress/1783.00...
) nos aproximam de nosso objeto de análise: a implantação e regulamentação do Tratado de Marraqueche no Brasil (EIFL4 4 Electronic Information for Libraries (EIFL) organização não governamental que trabalha com bibliotecas para permitir o acesso ao conhecimento em países em desenvolvimento na África, Ásia-Pacífico, Europa e América Latina. Realiza projeto “[...] para serviços inovadores de bibliotecas por meio dos programas de Licenciamento (Licensing), Direitos Autorais e Bibliotecas (Copyright and Libraries), Acesso Aberto e Inovação em Bibliotecas Públicas (Open Access and Public Library Innovation)” (EIFL, 2020). , 2020ELECTRONIC INFORMATION FOR LIBRARIES( EIFL). O Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso às obras publicadas por pessoas cegas, com deficiência visual, ou com outras dificuldades para acessar o texto impresso: guia EIFL para bibliotecas. São Paulo, FEBAB/CBDA3, 2020. Disponível em: http://repositorio.febab.org.br/items/show/6193 . Acesso em 20 fev. 2024.
http://repositorio.febab.org.br/items/sh...
), com o objetivo de facilitar o acesso às PcD com deficiência visual e com outras dificuldades a obras publicadas, suprimindo as implicações jurídicas relacionadas aos direitos autorais e de propriedade intelectual.

O Tratado surge no bojo da Agenda 2030, no contexto de um regime global voltado para a inclusão social de pessoas em situação de vulnerabilidade social. Por meio dele criou-se leis (Decreto n. 9.522/2018BRASIL. Decreto n. 9.522, de 8 de outubro de 2018. Promulga o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso, firmado em Marraqueche, em 27 de junho de 2013. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 155, n. 195, p. 1-4, 9 out. 2018. , Decreto n. 10.882/2021BRASIL. Decreto n. 10.882, de 3 de dezembro de 2021. Regulamenta o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 159, n. 228, p. 3, 6 dez. 2021., Portaria n. 505, de 21 de fevereiro de 2022 BRASIL. Portaria n. 505, de 21 de fevereiro de 2022. Dispõe sobre o processo administrativo de reconhecimento de entidades autorizadas para a realização do intercâmbio transfronteiriço e a importação de exemplares [...]. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 160, n. 37, p. 75, 22 fev. 2022.(Brasil, 2018BRASIL. Decreto n. 9.522, de 8 de outubro de 2018. Promulga o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso, firmado em Marraqueche, em 27 de junho de 2013. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 155, n. 195, p. 1-4, 9 out. 2018. , 2021BRASIL. Decreto n. 10.882, de 3 de dezembro de 2021. Regulamenta o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 159, n. 228, p. 3, 6 dez. 2021., 2022BRASIL. Portaria n. 505, de 21 de fevereiro de 2022. Dispõe sobre o processo administrativo de reconhecimento de entidades autorizadas para a realização do intercâmbio transfronteiriço e a importação de exemplares [...]. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 160, n. 37, p. 75, 22 fev. 2022.)) que permitem que obras impressas possam ser digitalizadas, desde que para uso exclusivo de PcD e com outras limitações (doentes acamados, idosos com dificuldades de locomoção, etc.). O documento sinaliza para a possibilidade do empréstimo transfronteiriço (empréstimo internacional de obras acessíveis, tendo em vista o alto custo dos materiais acessíveis). Todas estas ações estão respaldadas pela Lei Brasileira de Inclusão (LBI) (2015) que é a base legal que permite a reprodução de obras para formatos acessíveis pelos profissionais que atuam em bibliotecas e outras entidades autorizadas para realizar esse serviço.

A reprodução bibliográfica deve ser feita sem fins comerciais e sem ferir os direitos autorais e a propriedade intelectual. A LBI viabiliza que os catálogos eletrônicos sejam colaborativos e inclusivos a nível mundial; considera as tecnologias web como ferramentas inclusivas que devem ser acionadas pelos profissionais para possibilitar o acesso à informação em qualquer lugar do mundo. No entanto, essa ação ainda guarda contradições. No Brasil, dados do IBGE de 2019 indicam que 82,7% dos domicílios possuem acesso à internet, configurando um aumento de quase 4% em relação a 2018. Apesar de ser um aumento expressivo, na ocasião, 12,6 milhões de domicílios brasileiros ainda não tinham acesso à internet.

Para González de Gómez (2009GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As ciências sociais e as questões da informação. Revista Morpheus - Estudos Interdisciplinares em Memória Social, Rio de Janeiro, ano 9, n. 14, p. 18-37, 2009., p. 140) o regime de informação global aflora a oportunidade de se estabelecer convênios e tratados carecendo “[...] de suportes institucionalizados e legitimados por todos os participantes, não só em termos da formalização jurídica das normas, mas também das proposições normativas”. Acrescenta que esses documentos precisam ter ancoragem jurídica, para ter peso regulatório em diferentes circunstâncias.

Os caminhos percorridos para a implantação Tratado de Marraqueche envolveram questões de infraestrutura tecnológica, redes cooperativas, direitos autorais, agências institucionais, legislações etc. e exigiram a presença dos Estados nacionais para que o documento de fato ampliasse os direitos de acesso à informação, constituindo-se como apoio jurídico às ações das bibliotecas nos programas de desenvolvimento de coleções para pessoas com deficiência visual e outras limitações a fim de terem acesso a textos impressos.

Na seção que segue atemo-nos a descrever o percurso jurídico que envolveu a consolidação do Tratado, o protagonismo de atores sociais, agências nacionais como a FEBAB, que atuou mobilizando e sensibilizando os profissionais e toda a sociedade para a questão.

4 O Tratado de Marraqueche no Brasil e o regime de informação das bibliotecas

O Tratado de Marraqueche foi regulamentado no Brasil no contexto da pandemia de covid-19 (2020-2021). Nesse cenário as tecnologias digitais de informação incidiram fortemente sobre o saber-fazer dos profissionais, impactando nos serviços e produtos oferecidos, levando-os a adquirir novas competências para dar conta das demandas de informação do público, já que as bibliotecas estavam fechadas.

Ademais, considerando que no Brasil “[...] apenas cerca de 7% das obras publicadas são disponibilizadas globalmente em formatos acessíveis, diferentemente do que ocorre nos países em desenvolvimento, onde esse número é inferior a 1%” (Coates et al., 2020COATES, J. F. et al. Caminhando - implementação do Tratado de Marraqueche para pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso: um guia prático para bibliotecários. São Paulo, FEBAB/CBDA3, 2020. Disponível em: http://repositorio.febab.org.br/items/show/4608 . Acesso em: 20 fev. 2024.
http://repositorio.febab.org.br/items/sh...
, p. 14), pode-se dizer vivemos durante a pandemia um período crítico na questão do acesso aos documentos.

Nesse contexto, os bibliotecários deram prioridades à disponibilização de materiais digitais e à catalogação de e-books, e a questão dos direitos autorais passou a ser uma preocupação. Também começaram a surgir algumas questões, entre elas, o atendimento a pessoas com deficiência visual que precisavam de recursos acessíveis e a falta de políticas institucionais que dessem respaldo ao acesso por meio de digitalização.

A regulamentação do Tratado de Marraqueche (Brasil, 2021BRASIL. Decreto n. 10.882, de 3 de dezembro de 2021. Regulamenta o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 159, n. 228, p. 3, 6 dez. 2021.) significou um grande avanço na questão da acessibilidade e inclusão no Brasil e em outros países signatários, pois “[...] é o primeiro tratado de direitos autorais com princípios de direitos humanos em sua essência, com referências específicas à Declaração Universal dos Direitos Humanos e à Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (UNCRPD)” (Coates et al., 2020COATES, J. F. et al. Caminhando - implementação do Tratado de Marraqueche para pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso: um guia prático para bibliotecários. São Paulo, FEBAB/CBDA3, 2020. Disponível em: http://repositorio.febab.org.br/items/show/4608 . Acesso em: 20 fev. 2024.
http://repositorio.febab.org.br/items/sh...
, p. 14).

Sobre a história dessa macropolítica de inclusão social, sabe-se que foi idealizada nos Estados Unidos e sua criação envolveu a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (ONPI) e a Organização Mundial dos Cegos. A IFLA e outros parceiros das bibliotecas deram total apoio às negociações realizadas na ONPI. Foram cinco anos de negociação até que o Tratado fosse aprovado, na Conferência Diplomática realizada em 28 de junho de 2013, em Marraqueche, Marrocos. “Governos individuais buscaram apoio nos conselhos de suas organizações nacionais de cegueira e visão subnormal e associações de bibliotecas” (Coates et al., 2020COATES, J. F. et al. Caminhando - implementação do Tratado de Marraqueche para pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso: um guia prático para bibliotecários. São Paulo, FEBAB/CBDA3, 2020. Disponível em: http://repositorio.febab.org.br/items/show/4608 . Acesso em: 20 fev. 2024.
http://repositorio.febab.org.br/items/sh...
, p. 15). O documento tinha como objetivo a remoção das barreiras geradas pelos direitos autorais que impediam que pessoas com deficiência visual e com outras limitações tivessem acesso a obras impressas e digitais, dando respaldo à elaboração de políticas institucionais em prol do acesso universal a todos os recursos informacionais.

No Brasil, o Tratado de Marraqueche entrou em vigência em 30 de setembro de 2016, mas só foi regulamentado pelo Decreto n. 10.882, de 3 de setembro de 2021 (Brasil, 2021BRASIL. Decreto n. 10.882, de 3 de dezembro de 2021. Regulamenta o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 159, n. 228, p. 3, 6 dez. 2021.).

Por se tratar de uma diretriz internacional, o Tratado precisou ser adequado às políticas nacionais. A Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários, Cientistas de Informação e Instituições (FEBAB) por meio do GT de Acessibilidade tomou para si a responsabilidade de fazer a regulamentação do documento no Brasil.

Sobre o percurso jurídico do documento cabe destacar alguns marcos: foi promulgado pelo governo brasileiro em 2018, por meio do Decreto n. 9.522, com o status de Emenda Constitucional5 5 A Constituição Brasileira de 1988 em seu art. 5º, §3º prevê que os tratados sobre direitos humanos serão equivalentes às emendas constitucionais se eles forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por 3/5 dos votos dos respectivos membros (Brasil, 2016). No caso do Tratado de Marraqueche, ele foi aprovado pelo Decreto-legislativo n. 261/2015, votado pelo Congresso Nacional no ano de 2015. No entanto, só foi promulgado em 8 de outubro de 2018, quando foi publicado o Decreto n. 9.522 (Brasil, 2018). e regulamentado pelo Decreto de n 10.882, de 3 de dezembro de 2021 (Brasil, 2018BRASIL. Decreto n. 9.522, de 8 de outubro de 2018. Promulga o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso, firmado em Marraqueche, em 27 de junho de 2013. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 155, n. 195, p. 1-4, 9 out. 2018. , 2021BRASIL. Decreto n. 10.882, de 3 de dezembro de 2021. Regulamenta o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 159, n. 228, p. 3, 6 dez. 2021.). O texto foi debatido na Secretaria Nacional de Direitos Autorais e Propriedade Intelectual com a participação da Comissão de Direitos Autorais e Acesso Aberto da FEBAB. Posteriormente, o texto foi colocado em consulta pública, com grande participação da comunidade bibliotecária brasileira (Couto et al., 2022COUTO, Walter Eler et al. Guia para bibliotecas: direitos de autor e acesso ao conhecimento, informação e cultura. São Paulo: FEBAB/CBDA3, 2022.).

O Tratado de Marraqueche reforça o que está disposto no artigo 42, da Lei Brasileira de Inclusão (Brasil, 2015BRASIL. Lei n. 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 152, n. 127, p. 2-11, 7 jul. 2015. , art. 42), que assegura à pessoa com deficiência o acesso a obras acessíveis, independente das barreiras autorais ou mesmo de propriedade intelectual. O Tratado expande os mecanismos de acesso aos recursos impressos, ampliando as ações cobertas pela Lei de Direitos Autorais (LDA) (Brasil, 1998BRASIL. Lei n. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 136, n. 36-E, p. 3, 20 fev. 1998.) tornando-se um importante dispositivo a auxiliar as bibliotecas na definição de suas diretrizes de preservação e digitalização de acervos, de empréstimos, de acessibilidade etc. Vale destacar o caráter inovador desse Tratado, que se dá em três pontos saber:

  1. amplia o público que pode se beneficiar da lei, a saber: a pessoa:

    [...] a)cega; b) com deficiência visual que não possa ser corrigida ou para quem é impossível realizar a leitura de material impresso de forma substancialmente equivalente à de uma pessoa sem essa deficiência; c) com dificuldade de percepção ou de leitura considerada incorrigível, ou para quem é impossível realizar a leitura de material impresso de forma substancialmente equivalente à de uma pessoa sem essa dificuldade; ou d) com deficiência física que torne impossível sustentar ou manipular um livro, focar ou mover os olhos de forma apropriada à leitura (Brasil, 2021BRASIL. Decreto n. 10.882, de 3 de dezembro de 2021. Regulamenta o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 159, n. 228, p. 3, 6 dez. 2021., art. 3).

  2. cria o conceito de entidade autorizada: “Organização pública ou privada sem fins lucrativos, reconhecida pela administração pública federal para, de acordo com as limitações previstas no Tratado” (Brasil, 2021BRASIL. Decreto n. 10.882, de 3 de dezembro de 2021. Regulamenta o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 159, n. 228, p. 3, 6 dez. 2021.). Dentre as entidades estão “[...] bibliotecas, arquivos, museus, instituições de ensino, de assistência social, representativas das pessoas com deficiência e outras organizações que atuam em benefício da sociedade [...]” (Brasil, 2021BRASIL. Decreto n. 10.882, de 3 de dezembro de 2021. Regulamenta o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 159, n. 228, p. 3, 6 dez. 2021.). São responsabilidade da entidade autorizada:

  3. [...] produzir e disponibilizar aos beneficiários exemplares de obras em formatos acessíveis; e b) obter ou ter acesso a obras em formatos acessíveis, por meio de outras entidades autorizadas, sem a necessidade de autorização ou de remuneração ao autor ou ao titular da obra” (Brasil, 2021BRASIL. Decreto n. 10.882, de 3 de dezembro de 2021. Regulamenta o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às Pessoas Cegas, com Deficiência Visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 159, n. 228, p. 3, 6 dez. 2021.).

  4. possibilita o intercâmbio transfronteiriço das obras que forem convertidas para o formato acessível. Para isso, as entidades autorizadas precisam se credenciar junto ao poder público para que possam atuar como intermediárias dos beneficiários, ato regulamentado pela Portaria de n. 505, de 21 de fevereiro de 2022, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (Couto et al., 2022COUTO, Walter Eler et al. Guia para bibliotecas: direitos de autor e acesso ao conhecimento, informação e cultura. São Paulo: FEBAB/CBDA3, 2022.).

Assim, a biblioteca ou qualquer outra instituição que tenha acervo documental passível de digitalização, precisa se cadastrar como entidade autorizada para poder atuar em rede a nível nacional e internacional, ampliando a oferta de obras acessíveis aos seus usuários por meio do empréstimo transfronteiriço. Caso não tenha condições ou estrutura para fazer a conversão para o formato acessível, a instituição pode solicitar o serviço a outras entidades autorizadas. Esse serviço permitirá a ampliação de seus catálogos, pois ao fazer parte da rede poderão receber as obras convertidas por outras instituições. Outro benefício é a ampliação dos seus usuários e a troca de experiências que o trabalho em rede proporciona (Couto et al., 2022COUTO, Walter Eler et al. Guia para bibliotecas: direitos de autor e acesso ao conhecimento, informação e cultura. São Paulo: FEBAB/CBDA3, 2022.).

O trabalho de cooperação entre redes colaborativas é fundamental para maximizar acervos e ampliar a oferta de materiais para os usuários, visto que há pouca produção de livros em formato acessível nas bibliotecas (Furtado; Malheiros; Sousa, 2023FURTADO, Margareth Maciel Figueiredo Dias; MALHEIROS, Tania Milca de Carvalho; SOUSA, Clemilda dos Santos. O desenvolvimento de coleções em formato acessível com base no compartilhamento entre redes colaborativas. In: FARIA, Keyla Rosa; GOMES, Suely Henrique de Aquino; SANTOS, Andrea Pereira dos (org.). Bibliotecas inclusivas: informação para todas e todos. Goiás: Ed. da Universidade Federal de Goiás, 2023. p. 43-65.).

González de Gómez (2002GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. Novos cenários políticos para a informação. Ciência da Informação, Brasília, v. 31, n. 1, p. 27-40, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0100-19652002000100004 . Acesso em: 29 fev. 2024.
https://doi.org/10.1590/S0100-1965200200...
, 2009GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As ciências sociais e as questões da informação. Revista Morpheus - Estudos Interdisciplinares em Memória Social, Rio de Janeiro, ano 9, n. 14, p. 18-37, 2009., 2012GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. Regime de Informação: construção de um conceito. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v. 22, n. 3, p. 43-60, 2012. ) e Freire (2008FREIRE, Gustavo Henrique de Araújo. Construção participativa de instrumento de política pública para gestão e acesso à informação. Perspectiva em Ciência da Informação, Belo Horizonte, v. 13, n. 3, p. 195-207, 2008. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-99362008000300013 . Acesso em: 29 fev. 2024.
https://doi.org/10.1590/S1413-9936200800...
) relacionam as políticas de informação à noção de rede (de atores), associando-as aos fluxos, circulações, alianças e movimentos de cooperação. Segundo Freire (2008FREIRE, Gustavo Henrique de Araújo. Construção participativa de instrumento de política pública para gestão e acesso à informação. Perspectiva em Ciência da Informação, Belo Horizonte, v. 13, n. 3, p. 195-207, 2008. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-99362008000300013 . Acesso em: 29 fev. 2024.
https://doi.org/10.1590/S1413-9936200800...
, p. 200), nos estudos sobre os regimes de informação, devemos entender que “[...] uma rede de atores não é redutível a um ator sozinho, nem a uma rede; ela é composta de séries heterogêneas de elementos, animados e inanimados, conectados, agenciados”.

Algumas redes já estão sendo formadas com esse objetivo e com certeza se beneficiarão com a regulamentação do Tratado de Marraqueche, dentre elas destacamos a Rede Brasileira de Estudos e Conteúdos Adaptados (REBECA), Rede Nacional de Leitura Inclusiva e Bibliotecas sem barreiras.

A Rede Brasileira de Estudos e Conteúdos Adaptados (REBECA): primeira rede colaborativa de acervos acadêmicos adaptados, que visa promover o acesso à informação de conteúdos acadêmicos. Tem como objetivo reunir Instituições de Ensino Superior que desenvolvem ações e serviços de atendimento informacional às pessoas matriculadas nos cursos dessas instituições com fins de cooperação técnica e o intercâmbio das obras em formato acessível (FEBAB, 2021FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE ASSOCIAÇÕES DE BIBLIOTECÁRIOS, CIENTISTAS DE INFORMAÇÃO E INSTITUIÇÕES (FEBAB). Diretório Brasileiro de Bibliotecas Acessíveis. São Paulo: FEBAB, 2021. Disponível em: http://repositorio.febab.org.br/items/show/6173 . Acesso em: 6 mar. 2024.
http://repositorio.febab.org.br/items/sh...
).

A Rede Rebeca é uma resposta à legislação brasileira e internacional pelo acesso à informação, tendo nas ações cooperativas em rede a possibilidade de maximizar seus recursos, acervos e ampliar o conhecimento científico sobre a produção de conteúdo em formato acessível no ambiente acadêmico” (Melo et al., 2022MELO, Francisco Ricardo Lins Vieira et al. Rede Brasileira de Estudos e Conteúdos Adaptados (REBECA): desafios e perspectivas na colaboração do acesso à informação às pessoas com deficiência visual no Brasil. RICI: Revista Ibero-Americana de Ciência da Informação, Brasília, v. 15, n. 1, p. 254-265, 2022. Disponível em: https://doi.org/10.26512/rici.v15.n1.2022.42463 . Acesso em: 29 fev. 2024.
https://doi.org/10.26512/rici.v15.n1.202...
, p. 259).

A Rede Nacional de Leitura Inclusiva: projeto de leitura inclusiva idealizado pela Fundação Dorina Nowil para cegos, com o objetivo de fomentar a leitura e a informação para PcD. Além de oferecer livros acessíveis, busca engajar os profissionais que atuam como intermediários da leitura para que esse público seja incluído em suas atividades. É ação de âmbito nacional, onde cada estado se mobiliza na formação de grupos de trabalho para que sejam construídas novas ações de leitura e inclusão, e que sejam potencializadas as já existentes. A participação é voluntária e as atividades são gratuitas, tendo como foco a acessibilidade atitudinal.

As Bibliotecas sem barreiras: rede para atendimento integral às PcD desenvolvido pelo Programa Ibero-Americano de Bibliotecas Pública (IBERBIBLIOTECAS) para bibliotecas públicas e comunitárias.

Os dispositivos normativos e os programas e projetos aqui citados vêm ampliando ações no campo das tecnologias de rede e vêm mudando o regime de informação das bibliotecas. Essa materialidade legal, expressa em Leis e Decretos provoca efeito social, no sentido tornar as nossas bibliotecas inclusivas para todos os grupos sociais. Contribui com esse processo o alinhamento do governo brasileiro com a política internacional de inclusão social e outras macropolíticas, como a Agenda 2030. Esse contexto foi propício para que Tratado de Marraqueche se efetivasse como política pública. Em termos teórico-epistemológico, pode-se dizer que “[...] cada nova configuração de um regime de informação resulta de (e condiciona) diferentes modos de configuração de uma ordem sociocultural e política” (González de Gómez, 2009GONZÁLEZ DE GÓMEZ, Maria Nélida. As ciências sociais e as questões da informação. Revista Morpheus - Estudos Interdisciplinares em Memória Social, Rio de Janeiro, ano 9, n. 14, p. 18-37, 2009., p. 31).

5 Considerações finais

A ONU ao reconhecer a importância e relevância da inclusão social, trouxe para os Estados nacionais signatários de suas convenções e conferências a responsabilidade de buscar meios para mitigar a desigualdade social, colocando no centro desse debate a questão da acessibilidade à informação para grupos em vulnerabilidade social, como as PcD.

Neste contexto, para alcançar objetivos das ODS da Agenda 2030 no que diz respeito à diversidade e o acesso à informação é preciso que sejam formuladas políticas institucionais que assegurem esse direito por meio de leis, decretos, etc., como ocorreu com a regulamentação do Tratado de Marraqueche.

A popularização da internet proporcionou a informação circular de forma célere entre os países, pessoas e isso resultou no movimento social no sentido da liberdade de expressão, consciência de direitos, etc. por parte da população menos favorecida. Logo, popularizar as tecnologias digitais para que elas proporcionem conforto e conhecimento é do interesse de atores nacionais e internacionais, como IFLA/UNESCO e FEBAB, além do próprio Estado.

A importância de discutir essas questões e entender o seu impacto social, corrobora para o entendimento de um plano democrático no âmbito das políticas de informação para que de fato contemplem as necessidades informacionais da sociedade contemporânea. O Tratado de Marraqueche é um exemplo de como por meio de adequações legais um acordo internacional pode ser implementado no Brasil sem gerar conflitos de interesses. Esse processo de adequação do texto é importante, tendo em vista que cada país tem sua legislação sobre acesso à informação, direitos autorais e propriedade intelectual.

A noção de inovação disruptiva no contexto da acessibilidade e inclusão que levantamos na introdução desse artigo foi necessária nessa abordagem porque entendemos que as pessoas com deficiência têm direito de ocupar os espaços públicos e privados e principalmente aqueles onde o acesso à informação é primordial, como as bibliotecas. Isso exige que procedimentos, políticas e rotinas sejam ajustados para atendê-las. Os catálogos e acervos precisaram se tornar acessíveis, os formulários usados nas bibliotecas precisaram ser ampliados para atender as pessoas com deficiência visual, e os mesmos devem ser disponibilizados também no formato online. Nota-se que as tecnologias assistivas ganharam protagonismo nessa ação, pois contribuíram diretamente para minimizar os problemas enfrentados pelas pessoas com deficiência não só na vida diária, mas também no acesso à informação. Daí a necessidade de repositórios institucionais acessíveis, com avatar para tradução em Libras, textos alternativos (com descrição ou legenda) das figuras dispostas em sites institucionais etc. Todas essas inserções e ajustes podem ser vistos como inovações disruptivas.

A visão de uma sociedade igualitária e justa, discurso amplamente divulgado pelas agências internacionais e nacionais, requer um cenário inclusivo universal, isto é, que acolha a todos, que amplie o acesso a direitos fundamentais, como o acesso à informação sem barreiras físicas, cognitivas e/ou atitudinais.

O Tratado de Marraqueche traz uma visão positiva para a questão da acessibilidade informacional e para o desenvolvimento de acervos acessíveis, permitindo-nos fazer bons prognósticos para o desenvolvimento de redes colaborativas, lembrando que a acessibilidade é para todas as pessoas, não se limitando àquelas que têm deficiência visual, pois todos nós estamos sujeitos a situações imprevisíveis que podem exigir temporariamente o uso de auxílios, como uma muleta ou cadeiras de rodas, circunstâncias, inclusive, que envolvem o processo natural de envelhecimento. Pensar em acessibilidade e inclusão nessa perspectiva além de inovador é urgente e necessário.

Agradecimentos

Agradecemos à Universidade Federal Fluminense (UFF), à Superintendência de Documentação (SDC), à Coordenação de bibliotecas da UFF e ao Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCI-UFF).

Referências

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    » https://doi.org/10.1590/S0103-21002007000200001
  • 1
    De acordo com Bersch (2017BERSCH, Rita. Introdução à tecnologia assistiva. Porto Alegre: Assistiva, Tecnologia da Educação, 2017. ) é um conceito relativamente recente que se refere a um amplo conjunto de recursos e serviços destinados a melhorar ou ampliar as habilidades funcionais de indivíduos com deficiência, com o objetivo de promover a independência e a inclusão em suas vidas.
  • 2
    Pina (2010PINA, Leonardo Docena. Sociedade inclusiva: a face do capitalismo em uma nova fase. Filosofia e educação, Campinas, v. 2, n. 1, p. 127-149, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.20396/rfe.v2i1.8635527 . Acesso em: 20 fev. 2024.
    https://doi.org/10.20396/rfe.v2i1.863552...
    ), ao abordar a inclusão de PcD, faz uma crítica ao modelo de inclusão social como “processo de adequação ao sistema gerais da sociedade”, como o postulado pela ONU por meio da Agenda 2030. Para a autora, esse modelo de inclusão não discute o modelo econômico vigente. Para a autora, trata-se de uma estratégia ideológica da “velha ordem social” que propõe um mundo mais humanizado em relação ao diferente. Além disso, destaca que “[...] eliminar os fatores que excluem certas pessoas da sociedade implica atacar os fundamentos centrais da sociedade capitalista” (Pina, 2010PINA, Leonardo Docena. Sociedade inclusiva: a face do capitalismo em uma nova fase. Filosofia e educação, Campinas, v. 2, n. 1, p. 127-149, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.20396/rfe.v2i1.8635527 . Acesso em: 20 fev. 2024.
    https://doi.org/10.20396/rfe.v2i1.863552...
    , p. 133). Essas considerações são importantes para entendermos as contradições, os limites e as possiblidades que envolvem os estudos em torno da Agenda 2030, mas dado o recorte de nossa abordagem não foi possível explorar neste artigo.
  • 3
    Atualiza a versão de 1994 e alinha o documento com os preceitos da Agenda 2030, destacando a contribuição das bibliotecas para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. A biblioteca é definida como “[...] um componente essencial das sociedades do conhecimento, adaptando-se continuamente a novos meios de comunicação para cumprir sua missão de fornecer acesso universal e permitir o uso significativo da informação para todas as pessoas [...]” (IFLA; UNESCO, 2002INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS (IFLA); ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCAÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA (UNESCO). Manifesto da Biblioteca Pública IFLA-UNESCO. Paris: IFLA, 2022. Disponível em: https://repository.ifla.org/handle/123456789/2187 . Acesso em: 6 mar. 2024.
    https://repository.ifla.org/handle/12345...
    ).
  • 4
    Electronic Information for Libraries (EIFL) organização não governamental que trabalha com bibliotecas para permitir o acesso ao conhecimento em países em desenvolvimento na África, Ásia-Pacífico, Europa e América Latina. Realiza projeto “[...] para serviços inovadores de bibliotecas por meio dos programas de Licenciamento (Licensing), Direitos Autorais e Bibliotecas (Copyright and Libraries), Acesso Aberto e Inovação em Bibliotecas Públicas (Open Access and Public Library Innovation)” (EIFL, 2020ELECTRONIC INFORMATION FOR LIBRARIES( EIFL). O Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso às obras publicadas por pessoas cegas, com deficiência visual, ou com outras dificuldades para acessar o texto impresso: guia EIFL para bibliotecas. São Paulo, FEBAB/CBDA3, 2020. Disponível em: http://repositorio.febab.org.br/items/show/6193 . Acesso em 20 fev. 2024.
    http://repositorio.febab.org.br/items/sh...
    ).
  • 5
    A Constituição Brasileira de 1988 em seu art. 5º, §3º prevê que os tratados sobre direitos humanos serão equivalentes às emendas constitucionais se eles forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por 3/5 dos votos dos respectivos membros (Brasil, 2016BRASIL. [Constituição (1988)] . Constituição da República Federativo do Brasil. Brasília: Senado Federal, Coordenação de Edições Técnicas, 2016.). No caso do Tratado de Marraqueche, ele foi aprovado pelo Decreto-legislativo n. 261/2015, votado pelo Congresso Nacional no ano de 2015. No entanto, só foi promulgado em 8 de outubro de 2018, quando foi publicado o Decreto n. 9.522 (Brasil, 2018BRASIL. Decreto n. 9.522, de 8 de outubro de 2018. Promulga o Tratado de Marraqueche para facilitar o acesso a obras publicadas às pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades para ter acesso ao texto impresso, firmado em Marraqueche, em 27 de junho de 2013. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, ano 155, n. 195, p. 1-4, 9 out. 2018. ).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    06 Mar 2024
  • Aceito
    03 Maio 2024
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