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Universidade de São Paulo: Epicentro de uma controvérsia transnacional

University of Sao Paulo: epicenter of a transnational controversy

Resumo

Trata-se de analisar a controvérsia entre dois professores que ocuparam as cadeiras de sociologia I e II na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo em seus primeiros anos de funcionamento. Essa controvérsia, que opôs sociologia e etnologia, teoria social e pesquisa empírica, enraizou-se em meios intelectuais distintos: a sociologia, no Instituto de Educação da Universidade de São Paulo, e a etnologia, no Departamento de Cultura do Município de São Paulo. Assim, pretende-se mostrar que as transferências intelectuais dependem das afinidades eletivas estabelecidas entre grupos de intelectuais estrangeiros e brasileiros e que, no caso paulista, os intelectuais relativamente mais próximos aos grupos dirigentes se inclinam para a nova disciplina, etnologia, enquanto os relativamente mais dominados no campo do poder preferem a sociologia, já ensinada nas escolas normais. Para isso, utilizo análises documentais e textuais, bem como estudo de trajetórias e de redes de interdependência.

Palavras-chave
Missões francesas; Universidade de São Paulo; Cadeiras de sociologia; Instituto de Educação; Departamento de Cultura

Abstract

The aim is to analyze the controversy between two professors who occupied the chairs of sociology I and II at the Faculty of Philosophy, Sciences and Letters of the University of São Paulo in its early years. This controversy, which opposed sociology and ethnology, social theory and empirical research, was rooted in different intellectual circles: sociology, at the Institute of Education of the University of São Paulo, and ethnology, at the Department of Culture of the Municipality of São Paulo. The aim is to show that intellectual transfers depend on the elective affinities established between groups of foreign and Brazilian intellectuals and that, in the case of São Paulo, the intellectuals relatively closer to the ruling groups lean towards the new discipline, ethnology, while those relatively more dominated in the field of power prefer sociology, already taught in normal schools. To do this, I use documentary and textual analysis, as well as a study of trajectories and networks of interdependence.

Keywords
French missions; University of São Paulo; Chairs of sociology; Institut of Education; Department of Culture

Résumé

L’objectif est d’analyser la controverse entre deux professeurs qui occupaient les chaires de sociologie I et II à la Faculté de philosophie, sciences et lettres de l’Université de São Paulo dans les premières années de sa fondation. Cette controverse, qui opposait sociologie et ethnologie, philosophie sociale et recherche empirique, était ancrée dans deux milieux intellectuels distincts : la sociologie, à l’Institut d’éducation de l’université de São Paulo, et l’ethnologie, au Département de la culture de la municipalité de São Paulo. Il s’agit de montrer que les transferts intellectuels dépendent des affinités électives établies entre des groupes d’intellectuels étrangers et brésiliens et que, dans le cas de São Paulo, les intellectuels relativement plus proches des groupes dirigeants s’orientent vers la nouvelle discipline, l’ethnologie, tandis que ceux relativement plus dominés dans le champ du pouvoir préfèrent la sociologie, déjà enseignée dans les écoles normales. Dans cette étude, j’ai recours à l’analyse documentaire et textuelle, ainsi qu’à l’étude des trajectoires et des réseaux d’interdépendance.

Mots-clés
Missions Françaises; Université de São Paulo; Chaires de Sociologie; Institut de l’Éducation; Département de la Culture

A fundação da Universidade de São Paulo está ligada de modo intrínseco às missões francesas e aos primeiros professores estrangeiros da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas1 1 . Esta pesquisa foi realizada com o apoio da Fapesp – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – e do programa DEA da Fondation Maison des Sciences de l’Homme. Agradeço a Helène Arbousse-Bastide por disponibilizar os arquivos da família para consulta. Ao Rafael Andrade e Bruno Cuer, agradeço o diálogo e a colaboração na elaboração deste estudo. . Estes deixaram suas digitais através de cursos, conferências e publicações, mas também por meio de redes de sociabilidade e de projetos institucionais e intelectuais. Trata-se, neste estudo, de identificar as transformações operadas no espaço intelectual paulista a partir da vinda de dois professores franceses, Paul Arbousse-Bastide e Claude Lévi-Strauss, para ocupar as cadeiras de Sociologia I e II na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo nos anos 1930. O objetivo aqui, contudo, não é retomar a história das ciências sociais ou das missões francesas em São Paulo, mas mostrar que há nuances a respeito dessa circulação internacional ainda pouco exploradas pelos estudos especializados2 2 . A história das ciências sociais no contexto de fundação da Universidade de São Paulo já foi amplamente analisada por estudos anteriores. Ver Antunha, 1974; Schwartzman, 1979; Cardoso, 1982; Miceli, 1989, 1995; Carlotto, 2014), assim como o papel das missões francesas na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Ver Massi, 1988; Massi, 1989; Peixoto, 1998, 2001; Suppo, 2001; Petitjean, 1991, 1996, 2001; Lefevre, 1993; Loyer, 2015; Merkel, 2022; Consolim 2021, 2023. . O núcleo central da controvérsia entre esses dois professores, a definição legítima das ciências do homem ou das ciências sociais a partir da oposição entre “filosofia social” e “pesquisa empírica”, ou entre “sociologia” e “etnologia”, tem origem nos países centrais, em particular França e Estados Unidos, mas seus impactos são mais fortemente sentidos nos países periféricos, em que as instituições de produção científica ainda estão em construção3 3 . A bibliografia especializada faz menção a essa controvérsia, mas de maneira breve e sem a pretensão de extrair do episódio uma chave de interpretação das posições intelectuais e das transferências científicas no período. Ver Cardoso, 1982; Rubino, 1989; Suppo, 2001; Loyer, 2015; Peixoto, 1998; Raffaini, 2001; Valentini, 2011; Silva, 2008, Cerqueira 2014. . Essas oposições, associadas a um conjunto mais amplo de preferências – relativas a modelos institucionais, práticas de ensino, engajamento político, diplomacia intelectual etc. – são tratadas neste artigo com base na figuração da qual participam ambos os professores, ou seja, de suas relações com o poder social e intelectual. Assim, parte-se das trajetórias desses professores em seu contexto de origem, ou seja, na França, para em seguida observar os meios intelectuais paulistas, condicionantes da circulação daquelas proposições no país.

A fundação da Universidade de São Paulo ocorre em uma década extremamente importante do ponto de vista político, econômico e intelectual. Resultando a Universidade de um projeto intelectual maturado desde a primeira década do século XX e de um contexto de confrontação política entre o estado de São Paulo e o governo federal, o estudo dos diversos grupos intelectuais não pode ser separado de suas relações com os grupos dirigentes (Miceli, 1989MICELI, Sérgio. (1989), História das Ciências Sociais no Brasil, vols. 1 e 2. São Paulo, Vértice/Revista dos Tribunais., 2001MICELI, Sérgio. (2001), Intelectuais à brasileira. São Paulo, Companhia das Letras.). O objetivo aqui é analisar essas relações a partir do estudo comparado de duas instituições fundadas nesse período, o Instituto de Educação da Universidade de São Paulo, e o Departamento de Cultura do Município de São Paulo. Além disso, pretende-se articular essa análise às transformações operadas no espaço transnacional e, particularmente, no contexto francês, uma vez que o caso paulista permite complexificar o entendimento dessas transformações (Heilbron et al., 2009). A hipótese deste trabalho é que as simpatias e antipatias, ou melhor, as afinidades eletivas entre professores estrangeiros e intelectuais brasileiros têm por origem uma homologia de posição entre o campo intelectual francês e o campo do poder no estado de São Paulo. A partir de uma comparação entre os espaços intelectuais francês e brasileiro, mostro que a polarização entre os dois professores franceses foi codificada e associada a dois meios intelectuais paulistas: de um lado, Fernando de Azevedo e os professores do Instituto de Educação da Universidade de São Paulo; de outro lado, Mário de Andrade e os membros do Departamento de Cultura do Município de São Paulo. Essas duas redes ocupam duas posições em relação aos grupos dirigentes: o grupo dos estabelecidos compartilha uma mesma origem social que os grupos dirigentes e se beneficia de seus favores, mas sem autonomia institucional, enquanto os outsiders conquistam alguma autonomia graças à expansão do mercado editorial e escolar (Miceli, 2001MICELI, Sérgio. (2001), Intelectuais à brasileira. São Paulo, Companhia das Letras.). Uma análise desses grupos e/ou meios intelectuais mostra que eles se opõem segundo dois estilos de vida intelectual: o intelectual-escritor, criador e engajado politicamente, e o intelectual-professor, veículo da cultura legítima e defensor da neutralidade política. O escritor modernista está mais próximo dos grupos dirigentes, e se distingue por seu estilo de vida cultivado e cosmopolita, enquanto o professor universitário se especializa, abraça a universidade e se subordina às classificações escolares porque a ela deve seu destino.

Vários são os fatores que condicionam as transferências científicas e intelectuais de um país ao outro e, em particular, em uma relação de assimetria em termos de poder social e prestígio intelectual4 4 . A esse respeito, conferir os seguintes estudos: Pollak, 2018; Palmeira, 2017; Jeanpierre, 2004, 2002; Kluger, 2018. Ver também Bourdieu, 2002; Sapiro, 2016, 2019. . A partir do quadro mais geral da política de irradiação da cultura francesa e do empenho por reconhecimento internacional da parte dos intelectuais brasileiros, as redes formadas por afinidades eletivas são mediações centrais para as transferências intelectuais internacionais. Como as posições de origem ocupadas pelos professores franceses são distintas, avaliam distintamente as diretrizes de Georges Dumas à frente da diplomacia intelectual francesa. Lévi-Strauss, que toma distância crítica em relação a Dumas, é um jovem recém-formado próximo das elites intelectuais parisienses e de Paul Rivet; Arbousse-Bastide, herdeiro da diplomacia de Dumas, é um professor da província que pertence à “antiga geração”. Ou seja, a década que os separa representa muito mais do que uma mera diferença de idade, pois é qualitativa a distância intelectual entre quem se formou no fim da década de 1910 e quem o fez no fim dos anos 1920.

O movimento na direção da renovação ou da conservação das ciências articula-se às transformações (e transferências) nas relações entre os próprios países centrais, em que a oposição retórica entre “velho mundo” e “novo mundo” é constitutiva das disputas “disciplinares”. Assim, a oposição entre “etnologia” e “sociologia” na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo faz parte de um processo de transformações estruturais do espaço transnacional que tem impactos distintos em cada contexto nacional. No caso de São Paulo, a oposição entre essas duas “disciplinas”, entre um saber dominante, a sociologia, e outro dominado, a etnologia, está associada a grupos intelectuais que ocupam posição invertida no campo do poder – o saber dominante está associado aos meios outsiders, e o saber dominado aos estabelecidos.

A Guerra das Cadeiras: controvérsias no Departamento de Sociologia (1935-1937)

Uma controvérsia aparentemente sem maiores consequências rondou todos os três anos de convívio entre Arbousse-Bastide e Lévi-Strauss no Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Em 1935, ano de início da controvérsia, Arbousse-Bastide tinha 36 anos e Lévi-Strauss, 27 anos de idade. Arbousse-Bastide havia chegado em 1934 e, como o único professor responsável pelo ensino de sociologia na Universidade de São Paulo, solicitara a criação de uma segunda cadeira de sociologia, sendo nomeado “chefe de departamento”. Lévi-Strauss chega no ano seguinte para assumir a cadeira II e, em princípio, não vira nenhum problema com o título do colega. Pouco tempo depois, no entanto, Lévi-Strauss passa a questionar o título de chefe de departamento do colega em nome da liberdade de cátedra, pois queria autonomia para definir os programas de curso de sua cadeira, enquanto Arbousse-Bastide esperava que o recém-chegado aceitasse os programas e a distribuição proposta por ele para ambas as cadeiras. A partir daí, tem início um conflito que envolve tanto debates sobre a definição legítima das ciências humanas e sociais quanto a função da universidade, ambos associados às relações entre vida política e vida intelectual.

Em carta a Georges Dumas, Arbousse-Bastide se exprime assim sobre o colega: “Quanto a Lévi-Strauss, cegueira ambiciosa com toda a audácia da ambição e os erros da cegueira. LS quer se tornar insuportável para que os brasileiros lhe deem uma cadeira de etnografia a fim de manter a paz. Mas, por enquanto, eles não querem […]” (Arbousse-Bastide, 1936a). Em carta aos pais, atribui a intransigência de Lévi-Strauss ao interesse em conseguir um posto para sua mulher, Dina Dreyfus, que o acompanhara nas missões francesas (Arbousse-Bastide, 1936b). Quanto a Lévi-Strauss, as cartas aos pais durante seu exílio nos Estados Unidos deixam clara sua percepção do colega, pois pensa em recusar um possível convite para voltar à universidade por causa das “histórias de Arbousse-Bastide”5 5 . Ver Lévi-Strauss, Chers tous deux: lettres à ses parents, [28/06/1941], 2015. . Lévi-Strauss retorna a essa controvérsia algumas vezes em publicações posteriores, a fim de denunciar uma espécie de complô entre os dirigentes da universidade, Georges Dumas e seu colega de departamento, protegido por ser supostamente parente de Dumas6 6 . Sobre a crítica ao durkheimismo e ao espírito filosofante, bem como à política de Georges Dumas, ver Lévi-Strauss, Tristes tropiques, 1955, pp. 51-52 e 96-97. Mais de quatro décadas depois, Lévi-Strauss volta ao assunto em entrevista a Didier Eribon: “Georges Dumas havia colocado um jovem parente que era sociólogo na universidade em seu primeiro ano. Quando chegou a minha vez, segundo sociólogo no comando, por assim dizer, ele tentou me colocar em uma posição subordinada. Isso não foi do meu agrado e, como resisti, ele tentou me demitir em nome da tradição comtista, da qual ele era especialista e que meu ensino traía. Os chefes da universidade, que eram também os chefes do grande jornal O Estado de S. Paulo, lhe deram ouvidos simpáticos”. Ver Eribon, 1998, p. 33. Ver também Lévi-Strauss, 1996, e J. Maugué, 1982, p. 85. Ao contrário do que afirma Lévi-Strauss, não há qualquer parentesco entre Dumas e Arbousse-Bastide. .

Esse seria um episódio circunscrito aos bastidores das missões e da história, não fosse sua longa duração, ou seja, o retorno incessante à questão da parte de Lévi-Strauss ou, também significativo, o silêncio de Arbousse-Bastide sobre o colega em suas entrevistas sobre as missões francesas. Nesse sentido, o episódio torna-se aqui um ponto de partida para a reconstrução de dois mundos distintos, ou melhor, de duas formas distintas de legitimação das relações entre intelectuais e poder. A imagem construída por Lévi-Strauss para si mesmo como “pesquisador puro” pode ser contrastada com a imagem de “intelectual de partido” – no caso, socialista – que dele faz Arbousse-Bastide. Por sua vez, a neutralidade ou responsabilidade ética do professor que pretende encarnar Arbousse-Bastide é contraditada pela imagem de “conselheiro do príncipe” – no caso, de Júlio de Mesquita Filho – que dele faz Lévi-Strauss.

De fato, a estratégia de Arbousse-Bastide no Brasil foi orientada ao acúmulo de poder institucional na universidade, o que o tornou relativamente próximo das elites dirigentes paulistas e dos educadores do Instituto de Educação, enquanto Lévi-Strauss priorizara suas pesquisas de campo e, dado o bloqueio a seus projetos na universidade, as instituições mais autônomas em relação à instituição, como o Departamento de Cultura7 7 . Arbousse-Bastide chega a publicar editoriais anônimos no jornal Oesp, enquanto Lévi-Strauss publica muito pouco nesse jornal. . Contudo, ao considerar o perfil dos intelectuais dessas duas instituições, vê-se que o “pesquisador” tem afinidades com os intelectuais mais próximos do poder, enquanto o “embaixador” se aproxima dos educadores, relativamente mais distantes dos grupos dirigentes. Essas preferências tiveram consequências nos meios paulistas, uma vez que se constituíram como duas redes em uma figuração específica, com práticas intelectuais distintas, sociedades científicas diversas e políticas rivais de irradiação francesa na América Latina.

Paul Arbousse-Bastide: trajetória de um “embaixador”

A primeira forma de oposição entre os dois professores diz respeito à definição legítima e aos limites da sociologia ou, mais amplamente, das ciências sociais. A apresentação dos programas das cadeiras de Sociologia I e II chama atenção por sua forma polêmica: a exposição se faz em tom de defesa contra supostos ataques e, ao mesmo tempo, em tom de crítica velada ao programa do colega (Anuário, 2009, pp. 157-174). O programa de Arbousse-Bastide é essencialmente teórico, estruturado com base no “pensamento” dos autores “clássicos” da sociologia, e eclético, pois combina autores da sociologia, filosofia e psicologia8 8 . No programa original que consta do decreto de janeiro de 1934, aparecem como constitutivas do curso as seguintes disciplinas: Psicologia Social, Antropologia Social e Sociologia Política. Ver Oesp, 25/01/1934. No Anuário, o programa publicado foi incluído dentro da rubrica “Sociologia” e dentro dos seguintes cursos: 1º Ano: Sociologia Geral; 2º Ano: Sociologia Mental e Intermental, Sociologia Especial (Ciências dos Costumes, Sociologia Jurídica, Sociologia Criminal, Sociologia Econômica); 3º Ano: Sociologia Especial (doméstica, política, estética, religiosa, linguística, normativa e aplicada, além de noções de etnologia). Ver Anuário, [1934-1935] 2009. Esse programa foi aprovado pelo decreto 7069 de 06/04/1935. . Admite a inspiração nas “diretrizes gerais” de L’Année Sociologique, mas recusa que seja um programa dogmático considerando-se a abertura da própria revista a diversas “tendências doutrinárias” e a liberdade dos professores quanto à escolha dos autores e tópicos de sua preferência. Defende-se contra as críticas feitas ao programa, em particular ao caráter “filosófico” do curso, que ele justifica do seguinte modo: o público brasileiro é admirador de Comte e, portanto, a sociologia para eles é uma disciplina “sistematizada”, constituída por “ideias” e por reflexões “metodológicas” (Arbousse-Batide, Anuário, 2009). A partir da transcrição de alguns de seus cursos, pode-se analisar sua proposta mais detidamente9 9 . Agradeço ao professor Fernando Pinheiro Filho por disponibilizar essa documentação. Trata-se de um resumo de 130 páginas aproximadamente sobre os conteúdos ministrados nos dois semestres do primeiro ano e no primeiro semestre do segundo ano, realizados possivelmente por uma aluna, no ano de 1938. . Arbousse-Bastide utiliza principalmente dois tipos de fonte: manuais de sociologia publicados na França nesse período e artigos publicados em revistas francesas da época, como L’Année Sociologique, Revue Internationale de Sociologie e Revue de Synthèse. Em relação à bibliografia, em torno de 75% dos títulos são de autores franceses, entre eles principalmente Émile Durkheim, Gabriel Tarde, Marcel Mauss, René Worms, além de René Lacombe e Daniel Essertier. Também são referenciados os psicólogos franceses, como Théodule Ribot, Georges Dumas, Pierre Janet e Charles Blondel. Em relação aos temas dos cursos, a ênfase recai na relação entre psicologia e sociologia, em tópicos de metodologia e epistemologia, bem como na “sociologia das formas” e do Estado de vertente alemã10 10 . No caso da relação entre psicologia e sociologia, outras fontes são utilizadas: o Traité de Psychologie de Dumas, textos sobre a IV Semaine de Synthèse de Henri Berr e as publicações do Centro de Documentação Social de Bouglé, além dos psicólogos das “multidões”. Entre os anglo-saxônicos, encontram-se os clássicos da psicologia social anglo-saxônica: J. Baldwin, W. James, Ellwood e MacDougall. Entre os alemães encontram-se: Freud, Stein, Wundt, von Wiese e Simmel. .

Seu projeto de formação no ensino superior é claro e implica um combate em duas frentes distintas. Em primeiro lugar, uma crítica ao modelo norte-americano, à formação especializada e orientada aos problemas sociais com base em métodos estatísticos e em documentação social (Idem, p. 158). Em segundo lugar, um combate à centralidade da etnologia no curso, pois essa ciência seria uma especialização da sociologia e, portanto, deveria ser ensinada apenas no último ano11 11 . “Finalmente acrescentamos noções de etnologia no último ano, a fim de lembrar aos estudantes de sociologia que a observação modesta e minuciosa do etnógrafo deve constituir com a estatística judiciosamente manejada um instrumento de valor para o sociólogo […].” Ver Arbousse-Bastide, Anuário, [1934-1935] 2009, p. 163. . Seus artigos sobre a noção de “cultura” publicados na Revista do Arquivo Municipal e no jornal Oesp, em 1935, são expressão desse duplo combate. Segundo Arbousse-Bastide, a noção antropológica de cultura corresponderia ao nivelamento das “elites” às “massas”, à redução da dimensão espiritual à comportamental/material e, por fim, à mentalidade norte-americana12 12 . Arbousse-Bastide, Oesp, 1935; idem, Revista do Arquivo Municipal, 1935. Ver também essa polêmica em Valentini, 2010; Cerqueira, 2014; e Consolim, 2023. . Esses artigos associavam Lévi-Strauss de maneira velada a convicções políticas, culturais e epistêmicas suspeitas. A oposição entre “espírito” e “matéria”, frequentemente evocada, estava longe de ser meramente filosófica no contexto de 1935, quando intelectuais católicos avançavam em suas pautas relativas ao conteúdo dos cursos de ciências sociais e ao papel da universidade, ou seja, em um período em que o ambiente político e intelectual no país se deslocava rapidamente para a direita (Miceli, 2001MICELI, Sérgio. (2001), Intelectuais à brasileira. São Paulo, Companhia das Letras.).

Por outro lado, Arbousse-Bastide também planeja a construção de centros de documentação social, em primeiro lugar no Departamento de Sociologia da FFCL e, em seguida, no Instituto de Educação. Em um contexto internacional de prestígio crescente das pesquisas aplicadas, inserir esses centros nesse circuito internacional era uma forma de legitimação. Assim, entra em contato com vários centros europeus em busca de acordos visando à troca de “documentação” (obras, revistas, relatórios, anuários etc.)13 13 . Os seguintes centros europeus foram contatados: o Instituto Internacional de Cooperação Intelectual de Paris, o Centro de Documentação Social (CDS) da Escola Normal Superior, o Bureau Internacional de Educação (BIE) e o Bureau Internacional do Trabalho (BIT). Ver Archivos do Instituto de Educação, 1936 e 1937. Sobre as cartas de Arbousse-Bastide a Bouglé, ver Fundo da Escola Normal Superior dos Archives Nationales. Sobre as cartas ao Bureau International de l’Éducation, em Genebra, ver Arquivos da Unesco. Conferir ainda os relatórios de Arbousse-Bastide às autoridades francesas no Ministère des Affaires Étrangères. . Ainda que, por suas inclinações, Arbousse-Bastide preferisse a explicação de textos ao trabalho de documentação social concreta, o contexto internacional e as relações com o governo paulista impeliam a investir em “um centro de documentação sociológica especialmente organizado em relação aos interesses econômicos e sociais de S. Paulo” (Anuário, 2009, p. 169).

Com a aproximação crescente entre Arbousse-Bastide e Fernando de Azevedo, bem como dos conflitos com Lévi-Strauss, esses projetos se deslocam para o Instituto de Educação, onde são fundados dois centros de documentação. Essas iniciativas permitiram articular sua trajetória no Brasil às instâncias de representação e de consagração internacionais, mas também ampliar seu envolvimento com a realidade educacional local, em particular colaborar com o Plano Nacional de Educação, em 1935, ao lado de professores do Instituto de Educação. Assim, a diplomacia intelectual ao estilo de Georges Dumas encontrava um herdeiro em Arbousse-Bastide para ampliar o domínio intelectual francês no Brasil.

Claude Lévi-Strauss: trajetória de um “pesquisador”

Lévi-Strauss, por sua vez, procurava combater os projetos intelectuais e institucionais de Arbousse-Bastide. Na cadeira de Sociologia II, pretendia ensinar o que denominava “Sociologia Cultural”14 14 . Lévi-Strauss, 1996, pp. 9-10. Inúmeros estudos especializados se debruçaram sobre a obra e a trajetória de Lévi-Strauss. Trata-se aqui apenas de realçar as propriedades que o diferenciam de Arbousse-Bastide. Ver Grupioni, 1998; Suppo, 2001; Massi, 1989; Peixoto, 1998; Merkel, 2022; Loyer, 2015; Eribon, 1998. . Para justificar sua proposta, empregara a mesma estratégia de alguns de seus colegas franceses nesse mesmo período: considerar a sociologia como ciência jovem e, por isso, ainda metafísica. Assim, para que essa disciplina se tornasse de fato científica e, além disso, como seu objeto central era o estudo da “cultura”, seria preciso fundir “sociologia” e “etnologia”. Apesar de criticar o caráter filosófico e pouco científico da sociologia, Lévi-Strauss reivindica a “verdadeira” herança durkheimiana para a etnologia15 15 . Segundo ele, o “fato social” seria apenas uma dimensão da “cultura” e, em segundo lugar, o estudo da “cultura material” seria a forma de tratar a cultura “como uma coisa”. Ele ressalta que Durkheim também foi suspeito de “materialismo” (por Tarde). De fato, Lévi-Strauss critica o estudo das “representações” e propõe tratá-las como “objetos desprovidos de consciência”. Ver Lévi-Strauss, Anuário, [1934-1935] 2009. . Ao mesmo tempo, apressa-se em defender o sentido antropológico de “cultura” contra as suspeitas lançadas pelo colega: a “sociologia cultural” não teria nada a ver com “materialismo histórico”, “comportamentalismo” ou “americanismo” – até porque seus fundadores e apoiadores eram, em sua maioria, europeus que viviam na América do Norte. Em consequência, emprega uma definição ampla de etnologia como ciência dos “modos de vida das coletividades humanas”, uma ciência englobante em relação às demais ciências, de modo que a sociologia seria definida por estudos de fatos culturais e não sociais. Em seu combate ao programa de Arbousse-Bastide, Lévi-Strauss propõe uma revisão completa do programa apresentado pelo colega para o Departamento de Sociologia: 1. Excluir a filosofia social; 2. Tratar a história da filosofia de maneira sociológica; 3. Restringir o ensino da psicologia ao estudo do caráter inato/adquirido das estruturas mentais; 4. Incluir o ensino de lógica; 5. Incluir o ensino da etnografia porque, de acordo com o próprio Durkheim, ela seria responsável pelas maiores revoluções na sociologia. Além dessas alterações, o professor francês propõe fundar um seminário de pesquisas desde o primeiro ano do curso para aproximar ensino e pesquisa16 16 . O primeiro curso de Lévi-Strauss intitula-se Formas elementares da vida social, no qual ele aborda as instituições domésticas, econômicas, políticas e religiosas das sociedades primitivas. O segundo curso intitula-se O problema do estado de natureza e do estado de sociedade do século XVIII até os dias de hoje, um curso teórico em que ensina Rousseau, Montaigne, Locke, Hobbes, Spinoza e a Escola de Manchester, observando, contudo, que seu ponto de vista é o da contribuição das ciências positivas “na transição da natureza para a sociedade”. Ver Lévi-Strauss, Anuário, 1937. Sobre o caráter teórico dos seus cursos, ver Florestan Fernandes, 1958. .

Os projetos institucionais de Lévi-Strauss em São Paulo também se diferenciam dos projetos de Arbousse-Bastide. Tratava-se de investir em instituições mais autônomas em relação à universidade, como mostra seu projeto de fundação de um Instituto de Antropologia Física e Cultural, inspirado no Instituto de Etnologia de Paris, dirigido por Marcel Mauss, Lucien Lévy-Bruhl e Paul Rivet17 17 . Ver Lévi-Strauss, Oesp, 1935. Ver também Valentini, 2011. Sobre a importância dessas instituições a partir de 1920, ver Karady, 2011. . Esse modelo visava alguns objetivos principais: aproximar ensino e pesquisa; promover uma formação interdisciplinar, em ciências naturais e sociais; formar pesquisadores especializados. Ora, diante da recusa da direção da FFCL em reformar os programas do Departamento de Sociologia, bem como em apoiar a fundação de um Instituto de Antropologia, ele se aproxima do grupo de intelectuais do Departamento de Cultura, no qual, aliás, sua mulher, Dina Dreyfus, conseguira uma posição.

Os poucos artigos que Lévi-Strauss escreveu para o jornal Oesp, em comparação com Arbousse-Bastide, indicam que suas relações com a elite dirigente paulista eram mais distantes do que as do colega de departamento. Além disso, como suas publicações constavam do Anuário da FFCL, era conhecido seu interesse em Marx, tema de seu memorial. Seus vínculos com Paul Rivet, futuro diretor do Musée de l’Homme e primeiro eleito pelo Front Populaire, contribuíram para construir uma imagem pouco apreciada em São Paulo (Laurière, 2008LAURIÈRE, Christine. (2008), Paul Rivet: Le savant et le politique. [S.l.], Publications Scientifiques du Muséum.)18 18 . Arbousse-Bastide relata em carta aos pais: “Aqui só tem notícia ruim da França. Passa por ser presa dos bolcheviques. […] Lévi-Strauss regressou com uma ‘missão’: a Exposição de 37! No partido se dá um pequeno osso a cada um. Isso aliás terá um efeito muito negativo, pois os brasileiros verão que a Exposição é obra da Front Populaire, o que não vai atraí-los”. Arbousse-Bastide, Carta aos pais, 1937. Sobre a desconfiança em relação aos professores franceses, ver Cardoso, 1987; Almeida, 1984. Em 1937, Paul Rivet é expulso da Academia Brasileira de Ciências por criticar Vargas, um episódio em que Dumas foi chamado para tentar reverter. Ver Atas da ABC, Rio de Janeiro, 1937. . Lévi-Strauss, como os demais membros das missões, estava proibido de escrever sobre política na imprensa – o que constava inclusive em contrato. Contudo, seu artigo sobre a “Escola Única” no jornal Oesp (1935) tinha potencial para ampliar a desconfiança contra ele em razão da defesa que fazia da democratização do sistema escolar francês. Além disso, ele se desgastara com Georges Dumas, pois considerava um rebaixamento de status Arbousse-Bastide assumir uma segunda cadeira no Instituto de Educação. Em razão de todos esses revezes, Lévi-Strauss passa a orientar seus investimentos para instituições externas à universidade, mais flexíveis, bem como em meios intelectuais cujas disposições culturais e estéticas eram afins às suas19 19 . A crítica por parte dos professores franceses marca uma posição: “[…] aqui, todo ensino superior que se assemelhe ao colégio é considerado insuportável e de mau gosto. Acreditamos dar provas de finura ao colocarmo-nos acima de tudo o que possa lembrar o ensino de aulas. Cada um enfrenta essa pequena vaidade e, por aí, acredita que já superou sua época da pedagogia” (Bourdieu, 1992, p. 226). .

Campo intelectual e universitário no período entreguerras: as trajetórias francesas

As tomadas de posição dos dois professores franceses estão associadas às suas trajetórias e às respectivas posições ocupadas no campo intelectual francês. É inegável que a decisão de partir para o Brasil nesse período se devesse em parte às dificuldades para encontrar posições mais vantajosas na França e mesmo, em alguns casos, por nem sempre ser possível obter bolsa de estudos fora do país (Charle, 1994a, 1994b; Charle et al., 2004; Loyer, 2015LOYER, E., (2015), Lévi-Strauss. Paris, Flammarion.)20 20 . Lévi-Strauss não conseguiu a bolsa da Fundação Rockefeller para os Estados Unidos, assim como Arbousse-Bastide, uma década antes, não conseguira bolsa para cursar a graduação. . O período entreguerras na França foi marcado por barreiras para a ascensão nas instituições universitárias, em particular em Paris, e a falta de perspectivas de carreira estimulou a circulação internacional de professores e alunos, possibilitada pelo interesse da filantropia norte-americana em investir em pesquisa na França (Mazon, 1988MAZON, Brigitte. (1988), Aux origines de l'École des hautes études en sciences sociales: Le rôle du mécénat américain (1920-1960). Paris, Éditions du Cerf.; Tournès, 2008TOURNÈS, Ludovic. (2008), "La fondation Rockefeller et la construction d'une politique des sciences sociales en France (1918-1940)". Annales. Histoire, Sciences Sociales, 63e année: 1371-1402., 2011). Desde meados dos anos 1920, observa-se um relativo movimento de deslocamento do poder intelectual na direção dos Estados Unidos: maior volume de resenhas de obras norte-americanas nas revistas de sociologia e psicologia, aumento da mobilidade docente para eventos ou conferências nos Estados Unidos (Marcel Mauss, Célestin Bouglé, Maurice Halbwachs), aumento do número de bolsistas financiados pela filantropia estadunidense etc. A partir dos anos 1930, a Fundação Rockefeller passa a financiar pesquisa empírica em grande escala (condições de vida etc.) e publicações de instituições e grupos de pesquisa franceses, como o Centro de Documentação Social da Escola Normal Superior ou o Instituto de Etnologia. Contudo, a recepção da pesquisa empírica e aplicada na França dependeu das concepções disciplinares associadas à posição ocupada no campo intelectual francês – o que distingue, por exemplo, Rivet de Mauss21 21 . Mauss se mantém na estrita linha da sociologia durkheimiana: “[…] ‘São necessários sociólogos e etnólogos: uns lançam luz, outros informam’ – e uma subordinação das investigações etnográficas a uma sociologia concebida como ‘a’ ciência social […]”. Nisso ele se distingue de Paul Rivet, preocupado em fazer etnologia (apresentado como um novo nome em substituição ao de antropologia). Ver Hirsch, 2017. .

Nos anos 1930, os alunos do Centro de Documentação Social da Escola Normal Superior, em geral normalistas, conseguiram bolsas da Fundação Rockefeller, como foi o caso de Raymond Aron, Robert Marjolin e Jean Stoetzel22 22 . Sobre os investimentos da Fundação Rockefeller na França, consultar Mazon, 1988; Tournès, 2007, 2008, 2011, 2012; Charle et al., 2004. . Também os alunos do Instituto de Etnologia receberam bolsas para realizar pesquisas etnográficas em diversos países – em particular nas colônias francesas. Com a política de irradiação da cultura francesa na América Latina, os jovens professores de liceu passam a mirar um percurso internacional no exterior como forma de ascensão a postos universitários. Ainda que Lévi-Strauss não tenha passado pela Escola Normal Superior ou pelo Instituto de Etnologia, sua trajetória pode ser considerada afim à dos jovens filósofos com trajetória escolar parisiense, ligados a partidos de esquerda, cujas relações com as elites intelectuais – Marcel Mauss, Paul Rivet, Lucien Lévi-Bruhl, Célestin Bouglé, Henri Laugier – aumentavam muito as chances de sucesso.

Lévi-Strauss era aproximadamente dez anos mais novo que Arbousse-Bastide, e sua trajetória se opõe em diversos aspectos à do colega do Departamento de Sociologia. Seu avô era compositor e regente de orquestra, e o pai e dois tios eram pintores. Seu pai era “apaixonado por música e literatura”, o que o levou a conhecer desde cedo uma ampla gama de produções e discussões artísticas e culturais em Paris. Embora sua família fosse rica em capital cultural, era economicamente menos provida, em particular após a crise de 1929, quando seu tio, que trabalhava na bolsa de valores, entra em crise. Por outro lado, como afirma Loyer, sua excelência acadêmica compensava a relativa desvalorização social. Em 1925, após obter o baccalauréat, chegou a frequentar o curso preparatório para a Escola Normal Superior de Paris, mas desistiu de prestar o concurso. Entre 1926 e 1929, cursa filosofia e direito na Sorbonne, obtendo o diploma de graduação e, em seguida, o diploma de Estudos Superiores com uma dissertação sobre Karl Marx, sob a supervisão de Célestin Bouglé. Em 1931, aos 22 anos de idade, obtém o diploma de agrégation em filosofia, mas leciona por apenas dois anos, tomando parte em movimentos sindicais de professores. Desde muito jovem, foi politicamente ativo, ligado ao Partido Socialista e, por certo tempo, assistente de um deputado socialista. Seu vínculo com intelectuais de esquerda havia sido construído desde os anos 1920, o que lhe rendeu um capital de relações sociais muito superior ao do colega de departamento no Brasil23 23 . Sobre a trajetória de Lévi-Strauss, ver Emmanuelle Loyer, 2015. . As relações de Lévi-Strauss com os meios artísticos de Paris foram expandidas em razão de seu convívio com as vanguardas estéticas em torno da revista Documents, na qual publicaram inúmeros surrealistas e etnógrafos24 24 . Sobre a relação entre etnografia e vanguardas estéticas, conferir Debaene, 2010; Ver também Loyer, 2015. .

Suas relações com as figuras mais importantes nos meios das ciências sociais e das ciências naturais, em particular depois de 1930, foram muito importantes para sua trajetória no Brasil. Ele contatara Marcel Mauss, juntamente com Dina Dreyfus, e este passou a orientar o casal em suas pesquisas de campo. Além disso, mantinha contato com Célestin Bouglé, que o indicou para Georges Dumas para as missões francesas. Com Paul Rivet fizera contato em 1931, época em que seu pai recebeu encomenda para um mural por ocasião da Exposição Colonial. Em razão das redes formadas por praticantes e professores de sociologia, antropologia, etnologia e psicologia, também se beneficiara da boa vontade de Jean Marx, responsável pelo Serviço de Obras no Ministério das Relações Exteriores da França. No período em que esteve no Brasil, Lévi-Strauss e Dina Dreyfus se correspondem com todos esses professores, obtendo orientações científicas de alguns, apoio financeiro de outros – como junto a Henri Laugier, psicólogo, socialista e presidente do CNRS – Caisse Nationale de la Recherche Scientique, embrião do CNRS. Após suas expedições, passa a receber convites para apresentar o resultado de suas pesquisas e, no início da Segunda Guerra, chega a receber convite de Dumas para voltar ao Brasil como professor da Universidade do Brasil25 25 . Conferir arquivos do Musée National d’Histoire Naturelle. Fundo Paul Rivet. Sobre a correspondência com Bouglé, ver Fundo da Escola Normal, Archives Nationales. A correspondência com Dumas, ver Arquivos do Ministère des Affaires Étrangères. Para a correspondência com Mauss, Arquivos do Collège de France, Fundo Marcel Mauss. . Lévi-Strauss parece ter feito grande proveito dos diversos mundos em que viveu: podia afirmar-se como herdeiro da tradição durkheimiana e, ao mesmo tempo, criticar sua dimensão “filosofante” em nome da “ciência”, ou seja, da etnologia/etnografia; denunciava a figura do “embaixador” encarnada por seu colega no Brasil e, alguns anos depois, fez figura de “embaixador” nos Estados Unidos26 26 . O trabalho de Laurent Jeanpierre sobre o exílio de Lévi-Strauss nos Estados Unidos foi o primeiro a apontar a importância do capital social acumulado por Lévi-Strauss para sua carreira e, mais ainda, a investigar a questão opondo seu estilo de vida intelectual ao de Georges Gurvitch. No Brasil, contudo, Lévi-Strauss encarna antes o “pesquisador” do que o “embaixador”, mas mantém em ambos os contextos relações tensas com os professores que adotam perspectiva “teórica”. Ver Jeanpierre, 2004, 2002. Sobre a oposição entre “pesquisador” e “embaixador”, ver Charle, 1994. .

É possível que a crítica à sociologia durkheimiana, muito em voga no período, fosse parte da atmosfera de descontentamento com o sistema universitário francês por falta de perspectivas de carreira. Exemplos dessa atmosfera de insatisfação encontram-se em dois balanços da sociologia francesa publicados no período, de Raymond Aron (1937)ARON, R. et al. (1937). Les Sciences sociales en France: Enseignement et recherche. Paris, Flammarion. e de Roger Bastide (1936)BASTIDE, Roger. (1936), "L'enseignement de sociologie en France". Revue Internationale de Sociologie, pp. 373-402.. Aron considerava fundamental revisar a dimensão filosófica da teoria durkheimiana a fim de elaborar uma ciência positiva; também defendia a aproximação entre as diversas ciências sociais (sociologia, economia, história, psicologia) e condicionava o avanço da sociologia ao investimento em pesquisas empíricas e coordenadas27 27 . Segundo Aron: “[…] lamentamos não encontrar Institutos de sociologia em nosso país como existem em muitos países. Nos Estados Unidos, em particular, podem-se medir os serviços que prestam: recolha de resultados de pesquisas especiais, preparação de tratados para a formação de professores, criação de grandes investigações coletivas”. R. Aron, 1937, p. 40. . Esse último ponto, a realização de pesquisas empíricas e coordenadas, pressupunha o modelo institucional estadunidense do “instituto”, pois os institutos, ao contrário da universidade, “agrupam o resultado das pesquisas especializadas”, produzem “grandes enquetes coletivas” e publicam os resultados em tratados/manuais. Assim, Aron enfatizava a importância de uma reforma institucional pela fundação de novas instituições para o avanço da ciência, projeto que incentivaria um maior contato com a “realidade social” (Aron, 1937, p. 42). Na França, exemplos dessa inovação institucional seriam, segundo ele, o Instituto de Etnologia, o Instituto de Direito Comparado, o Centro de Estudos de Política Estrangeira e o Centro de Documentação Social da Escola Normal Superior. A autonomia em relação à universidade estaria garantida pela criação de um Conselho Nacional formado com membros desses “institutos”. No balanço de Roger Bastide (1936)BASTIDE, Roger. (1936), "L'enseignement de sociologie en France". Revue Internationale de Sociologie, pp. 373-402., há diferenças importantes em relação ao de Aron, mas também confluências. Bastide toma por objeto os manuais escolares de sociologia, que deveriam ser revisados para oferecer um ensino mais aplicado ou prático, ou seja, voltado ao ensino de métodos e técnicas de pesquisa para o estudo de problemas “concretos” contemporâneos. O ensino superior deveria incentivar estudos sobre realidades concretas a fim de formar experts, como nos Estados Unidos28 28 . “Nossos legisladores ficariam, portanto, certamente felizes de terem a seu lado experts em sociologia. Sabe-se o papel capital que os professores de sociologia desempenham na vida prática americana. Desejamos que a nossa ciência seja chamada a participar na França também nos debates do fórum” (Roger Bastide, 1936, p. 396). . Bastide, assim como Aron, considera positiva a fundação de instituições independentes, mas prefere enfatizar reformas pela via do aumento de postos universitários, como, por exemplo, o posto de “diretor de pesquisa” [direteurs des travaux]. Assim, esses dois autores, que representam duas posições no período, o professor do ensino secundário e o doutorando do Centro de Documentação Social, associam a crítica à sociologia durkheimiana ou aos manuais de sociologia à crise do sistema universitário francês. Por outro lado, propõem dois tipos de renovação institucional: no caso de Aron, a via é externa à universidade; no caso de Bastide, a preferência se dá pela fundação de novos postos de trabalho dentro da universidade.

Comparando-se essas duas tomadas de posição com as práticas dos dois colegas do Departamento de Sociologia, é inegável que a postura insubordinada de Lévi-Strauss está mais próxima da postura crítica de Aron, enquanto a confiança de Roger Bastide na universidade e seu interesse pelas questões pedagógicas são afins às de seu amigo Arbousse-Bastide. Essas tomadas de posição estão associadas às diferenças entre suas trajetórias29 29 . Ver dossiê de aposentadoria de Paul Arbousse-Bastide, Archives Nationales. . Arbousse-Bastide (1899-1985) era originário do Gard, no sul da França, de família protestante, cujo pai era pastor. A preocupação do filho, já adulto, em garantir moradia e melhor condição de vida aos pais indica que a família não tinha muitas posses. Sua trajetória escolar e no ensino superior foi trilhada com dificuldades: obteve o diploma do baccalauréat em letras (1917) e, após o serviço militar, o diploma de graduação (1920) e o diploma de Estudos Superiores (1921) na Sorbonne. Não conseguiu passar no concurso para a Escola Normal Superior e obteve o diploma de agrégation apenas em 1928, após quatro tentativas e sete anos de formado. Durante esse período, teve que trabalhar para continuar seus estudos: entre 1922 e 1925, lecionou em uma escola protestante no sul da França e, após 1925, foi professor em três colégios e liceus. Acumulava, portanto, mais de uma década de magistério quando chegou ao Brasil.

Suas publicações, no início dos anos 1930, estão voltadas às questões pedagógicas e ao ensino de filosofia. Ainda na França fundara com outro professor de filosofia, Georges Bénézé, discípulo de Allain, a revista Méthode: Revue de l’Enseignment Philosophique, que durou apenas dois anos, e cujo propósito era a discussão de novos métodos e tópicos de ensino em filosofia. O interesse de Arbousse-Bastide pelo movimento internacional na área de educação se revela, por exemplo, em 1932, quando escreve para o Bureau International de l’Éducation, dirigido por Jean Piaget, em Genebra, para obter informações sobre o Centro de Pedagogia da instituição – o centro Jean-Jacques Rousseau. Em 1936, já à frente da cadeira de Metodologia do Ensino Secundário no Instituto de Educação, volta a contatar o Bureau30 30 . “Adoraria conversar sobre esses cursos de pedagogia por correspondência que gostaria de organizar para os professores franceses com a colaboração do Instituto J. J. Rousseau. Ver Arbousse-Bastide, 1932. Em 1936, afirma: “Não me esqueci dos projetos de relatórios documentais que gostaria de organizar em São Paulo com o BIE em particular […]” Arbousse-Bastide solicita um plano de classificação da documentação pedagógica e declara querer se vincular ao BIE. Ver Arbousse-Bastide, 1936. . Assim, a trajetória de Arbousse-Bastide se inscreve na geração de professores de filosofia de colégio ou liceu de província que se preocupavam em reformar o ensino de filosofia pela sociologia, principalmente pela teoria sociológica, ainda que demonstrasse interesse em instituições de pesquisa aplicada. Sua vinda ao Brasil, por indicação de Dumas, seu professor na Sorbonne, também se ligava ao interesse pela obra de Comte e pelo positivismo brasileiro – temas de suas teses de doutorado, defendidas naquela universidade em 1954.

No Brasil, as redes de Arbousse-Bastide se concentram nas figuras que ocupam posições de poder na Universidade de São Paulo e no Instituto de Educação, bem como entre as autoridades do Ministério das Relações Exteriores da França, consulado da França em São Paulo e embaixada no Rio de Janeiro. Seu receio, conforme cartas aos pais, era não poder ocupar um posto universitário ou em um liceu em Paris quando retornasse à França. Nos meios das ciências sociais francesas, mantém poucos contatos, pois não recebe resposta de Paul Rivet e apenas uma breve resposta de Célestin Bouglé à solicitação de orientações para seus cursos e seu projeto de um Centro de Documentação Econômica e Social. A grande maioria de sua correspondência trata de questões administrativas e políticas envolvendo as missões francesas (salários, cargos, funções etc.), em particular com Georges Dumas, a quem recorre para reclamar do colega de departamento, além de Jean Marx e das autoridades brasileiras e francesas. Sua postura é a de “chefe das missões”, posição que exerceu nos primeiros anos, e de professor dedicado à difusão da cultura francesa no Brasil. São disposições associadas à sua longa trajetória como professor de filosofia do ensino secundário, longe da vida intelectual parisiense, fruto da escola republicana à qual se deve sua ascensão.

Comparando-se as duas trajetórias, pode-se dizer que a superação das classificações escolares está ao alcance de Lévi-Strauss em razão de suas disposições, que o predispõem a correr os riscos envolvendo a prática de uma nova ciência e o inclinam à insubordinação em relação à diplomacia “oficial” em nome de um novo tipo de diplomacia intelectual, menos mediada pelo Estado e pela universidade pública e baseada em acordos realizados diretamente entre pesquisadores e financiadores31 31 . Sobre essa nova estratégia, ver Jeanpierre, 2022. De fato, Lévi-Strauss não guardou boas lembranças do Brasil e acenou para um possível retorno apenas no caso de não ter outra opção nos Estados Unidos. Seu contato com Fernando de Azevedo foi feito apenas em 1942, quando o último era diretor da FFCL, e as cartas mostram que o interesse principal era a indicação de professores em situação de risco na Europa para a FFCL. O convite para seu retorno, aliás, nunca aconteceu. Ver Lévi-Strauss, 2015. . Ou seja, uma circulação de pessoas e de recursos mais livre das instâncias estatais e universitárias. Por sua vez, Arbousse-Bastide se submete às classificações escolares e às instâncias que delimitam as regras universitárias dada sua trajetória familiar, escolar e profissional na França. Essas posições no campo intelectual francês tiveram impactos no Brasil, pois favoreceram nesse novo contexto afinidades eletivas por homologia de posição: de um lado, a relação entre Lévi-Strauss e o Departamento de Cultura, instituição autônoma em relação à universidade; de outro lado, Arbousse-Bastide e o Instituto de Educação, seu segundo posto na universidade.

Os Meios Intelectuais Paulistas: o campo de possíveis

Durante os anos 1930, as tensões de ordem política e intelectual no país tiveram grande impacto sobre as recém-fundadas universidades, com risco de fechamento ou exoneração de professores32 32 . Sobre as universidades paulistas no contexto da Era Vargas, consultar Miceli, 1989, 1995; Schwartzman, 1979; Antunha, 1974, 1975. . Uma das estratégias mais utilizadas como forma de combate intelectual era, em relação aos professores brasileiros recém-empossados, apontar a falta de títulos ou a não aprovação em concurso para deslegitimá-los em suas novas funções e, no caso dos franceses, levantar suspeitas sobre suas preferências ideológicas33 33 . A correspondência de Arbousse-Bastide à família e a de Fernando de Azevedo a Venâncio Filho são reveladoras a esse respeito. Ver Penna, 1987, e Arquivos da família Arbousse-Bastide. . Na ausência de instâncias de consagração internas, os professores brasileiros, em particular do Instituto de Educação, dependiam do reconhecimento dos professores franceses a suas publicações. No contexto de expansão do mercado editorial, os autores de manuais de sociologia, psicologia, biologia etc. esperavam a validação de suas obras pelos professores franceses. Por sua vez, os professores franceses contavam com o prestígio da França e de Dumas junto às autoridades brasileiras, além do apoio dos colegas brasileiros. Ou seja, as relações entre os professores estrangeiros e os meios intelectuais brasileiros não se resumiam a uma cooperação para a transferência de conhecimento, mas foram pautadas pelo apoio mútuo para o benefício de ambas as partes34 34 . Os intelectuais nacionalistas, católicos e outros críticos da Faculdade de Filosofia publicaram resenhas violentas a esses manuais, como a de Alexandre Correa (1935), na revista católica A Ordem. O manual de sociologia de Fernando de Azevedo, por exemplo, foi considerado ultrapassado e dogmático. Ver Correa, 1935. .

As transferências científicas e intelectuais se deram como fruto de alianças, mas a maneira como cada um acumulou prestígio foi muito distinta. Lévi-Strauss teve suas expedições em parte financiadas, em acordo com Mário de Andrade, pelo Departamento de Cultura; Arbousse-Bastide teve a publicação de sua tese financiada em parte pelo Itamaraty, por intermediação de Fernando de Azevedo. Considerando-se as preferências de Arbousse-Bastide e de Lévi-Strauss, respectivamente, pelo Instituto de Educação e pelo Departamento de Cultura, pode-se colocar a hipótese de que as hierarquias do campo intelectual francês se transferiram para o campo do poder no Brasil, uma vez que, no contexto francês, Lévi-Strauss era figura próxima dos intelectuais parisienses e Arbousse-Bastide estava muito distante desse mundo. Ora, no caso da figuração que se estabelece em São Paulo, os professores do Instituto de Educação, em geral, mantêm certa distância dos grupos dirigentes, pois o princípio de legitimação desse meio é seu capital específico; por sua vez, os escritores modernistas, prestigiados por seu espírito cultivado e capital cosmopolita, possuem relações estreitas com os grupos dirigentes paulistas. Para se diferenciar esses dois meios, comparo a seguir as trajetórias dos principais membros de ambas as instituições.

O Instituto de Educação: a ascensão pela escola

Paul Arbousse-Bastide se aproximou dos professores do Instituto de Educação ao assumir a cadeira de Metodologia do Ensino Secundário, posto que ocupou entre 1936 e 193735 35 . Durante o período em que ocupou tal cadeira, passou a ser remunerado também por essa posição, conforme indica em sua correspondência aos pais. Arbousse-Bastide teve que deixar sua cadeira no fim de 1937, após o decreto de Vargas proibindo acumular cargos no serviço público. Sua cadeira foi assumida interinamente por Milton da Silva Rodrigues. Sobre a seção de formação para o ensino secundário, ver Evangelista, 1997. . A iniciativa foi criticada pelos professores franceses próximos de Lévi-Strauss, que viam tal envolvimento, segundo relata Arbousse-Bastide, como desprestígio para os professores da FFCL. De fato, o Instituto de Educação tinha status inferior na Universidade de São Paulo e, mesmo, em comparação com a FFCL, pois a instituição era originária da Escola Normal de São Paulo e, nessa transferência, manteve as escolas de aprendizado e os cursos de formação de professores nos diversos níveis de ensino.

Considerando-se apenas a “elite” do Instituto, ou seja, os catedráticos em 1937, encontram-se os seguintes professores: Fernando de Azevedo, Antônio Ferreira de Almeida Júnior, Roldão Lopes de Barros, Noemy da Silveira (Rudolfer) e Milton da Silva Rodrigues36 36 . Para esta seção foram consultadas as seguintes obras e arquivos: Andrade, 2023; Oriani, 2022; Angelini, 2002; Azevedo, 1936, 1961; Costa, 2007, 2011; Nascimento, 2012. Ver também Bontempi, 2011; Vidal et al., 2019, 2020; Pinheiro e Miceli, 2008. . Todos foram professores de escola normal primária. Em 1920, Barros reorganizara a Escola Normal do Brás (Padre Anchieta), onde possivelmente conheceu Almeida Júnior, Noemy da Silveira e Milton Rodrigues, professores dessa escola no período. Nesse mesmo ano, realiza um censo das escolas para auxiliar na reforma de Sampaio Doria. Em 1926, parte desse grupo, além de Sampaio Doria e Lourenço Filho, funda o Liceu Rio Branco. Em 1932, Azevedo, Silveira, Barros, Rodrigues e Almeida Júnior lecionavam no curso de Aperfeiçoamento da Escola Normal de São Paulo (denominada então Instituto Pedagógico). Todos assinaram, com exceção de Milton Rodrigues, o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. Em razão de sua formação técnico-científica, todos ocuparam cargos técnicos na administração pública do Estado.

Trata-se de um grupo de professores cujas famílias passaram por instabilidade econômica (alguns são órfãos de um dos pais), o que os tornou relativamente mais dependentes da escola como meio de ascensão social37 37 . Há dois casos, contudo, em que aparecem outros fatores de instabilidade. Almeida Júnior recebeu herança pela morte da mãe, aos 21 anos, e Fernando de Azevedo, oriundo de família abastada que entrou em declínio, parece recuperar sua posição de origem após o casamento com a filha única de um médico militar e acionista do Banco União, que faleceu pouco tempo depois (Almeida Jr., 1966; Azevedo, 1971). . Ainda que tenham conquistado diploma superior, com exceção da única mulher do grupo, tiveram que trabalhar concomitantemente aos estudos. Azevedo e Barros ingressam na Faculdade de Direito de São Paulo, em 1919, com respectivamente 19 e 29 anos de idade; Milton Rodrigues cursa a Escola Nacional de Engenharia no Rio de Janeiro, e Almeida Júnior, medicina na Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, formando-se também tardiamente, aos 29 anos. Durante os estudos, Almeida Júnior morava em uma pensão e ensinava no Instituto Disciplinar à noite. Defendeu tese sobre saneamento público, tornou-se assistente no Instituto de Higiene e, em 1931, livre-docente, quando se associou à cadeira de medicina pública da Faculdade de Direito, tornando-se catedrático em medicina legal na década seguinte. Almeida Júnior e Fernando de Azevedo, os mais velhos, excluindo-se Lopes de Barros, ocuparam postos da direção na Secretaria da Educação do Estado, colaboraram na elaboração do código de educação de 1933, bem como no projeto da Universidade de São Paulo. Suas relações com o governo do estado de São Paulo são mediadas por sua contribuição específica à educação, em particular por meio de suas publicações e das reformas educacionais. Entre os mais jovens, Noemy Silveira e Milton Rodrigues, a legitimação como profissionais da educação se dá de maneira ainda mais clara, uma vez que a partir de meados dos anos 1930, com a expansão das matrículas no Instituto de Educação, a demanda por manuais escolares aumenta de modo exponencial (Toledo, 2020).

Assim, esse grupo tem em comum, com algumas diferenças, uma origem social mais modesta, exigindo um investimento muito maior na excelência escolar e na aquisição de conhecimentos voltados à aplicação (estatística, administração escolar, higiene, orientação profissional, assistência etc.).. Em relação a seus escritos, ficaram conhecidos pela produção de manuais escolares e pesquisa aplicada, o que indica que esse capital específico foi a base para o papel de “conselheiro do príncipe” que por vezes desempenharam. Destacam-se no domínio da biologia, psicologia e sociologia educacional, mas também em estatística e outros métodos quantitativos (Milton Rodrigues). As competências em psicologia (Noemy Silveira), biologia (Almeida Júnior) e sociologia (Fernando de Azevedo) eram consideradas de maneira integrada, ou seja, seu sentido estava dado pela colaboração mútua, motivo pelo qual é difícil autonomizar o estudo de cada um desses saberes nesse período. Tanto é assim que suas publicações se integram nas coleções pedagógicas: todos eles, com exceção de Barros, publicaram nas três coleções da Biblioteca Pedagógica Brasileira. Em outros termos, o capital de relações entre os grupos dirigentes, fundamental para sua ascensão, era função do seu capital técnico-científico – acumulado, por vezes, por meio de bolsas de estudo (Silveira e Rodrigues). Além disso, o volume de suas publicações com a ampliação do mercado de livros didáticos dava-lhes certa autonomia em relação aos revezes da política. Ao contrário dos membros do Departamento de Cultura, essas figuras conquistaram formas mais estáveis de sobrevivência em razão da expansão do mercado editorial. Não publicaram memórias, com exceção de Fernando de Azevedo, não por acaso o mais próximo das elites dirigentes paulistas, de modo que sua posteridade ficou registrada apenas em depoimentos de ex-alunos e de colegas.

Considerando-se a trajetória desse meio e a de Arbousse-Bastide, destaca-se o investimento em questões pedagógicas e institucionais, bem como o interesse em articular ciência (inclusive aplicada) e formação filosófica. Como afirmara Georges Dumas (1924), era preciso que a França valorizasse a formação em ciência aplicada a fim de atuar em países jovens, que demandavam expertise, como os Estados Unidos. Assim, Arbousse-Bastide adota duas frentes de trabalho: por um lado, ajuda a fundar centros de documentação e laboratórios de pesquisa social para legitimar o caráter científico e técnico do Instituto de Educação; por outro lado, ensina filosofia da educação, ou seja, adota uma abordagem normativa das ideias pedagógicas e sociais – tendo por guia a formação “desinteressada”, inspirada no modelo francês38 38 . Ver Carta de Arbousse-Bastide ao Bureau International de l’Éducation, 1937; Carta de Arbousse-Bastide a Bouglé, 1937; Archivos do Instituto de Educação (AIE), 1937. Carta de Bouglé a Fernando de Azevedo, 1936. Arquivos Nacionais. Nos papéis pessoais da família, encontra-se o registro dos contatos de Arbousse-Bastide com organismos de cooperação intelectual. Em relatório ao Ministério das Relações Exteriores da França, afirma que “São Paulo desejava se beneficiar da documentação de tais organismos e fornecer-lhes por sua vez documentação sobre os problemas econômicos, sociais e políticos do Brasil. Os centros contatados pelo professor foram os seguintes: Centro de Estudos e de Documentação da Escola Normal Superior (Célestin Bouglé); Centro de Estudos de Política Estrangeira (Demery); Centro de Pesquisas Econômicas e Sociais (Charles Rist); Centro de Pesquisas Sociais da Universidade de Paris (Vaucher)”. Ver “Efforts de liaison entre certains organismes de documentation internationale à São Paulo”. Documentos Família Arbousse-Bastide. . A orientação à filosofia social e pedagógica, resultado de suas disposições e de sua posição como membro das missões, articula-se aos investimentos em “engenharia social”, resultado de uma reconversão parcial por força de sua inserção no Instituto de Educação39 39 . O perfil do aluno do Instituto de Educação, em particular do curso de formação em pedagogia para o secundário, era homólogo até certo ponto ao dos professores. Ver Evangelista, 1997. Entre 1936 e 1938, havia 113 matriculados. As informações referem-se à idade, sexo, local de nascimento e origem institucional quando da USP. Os alunos tinham uma média de idade de 23 anos, oriundos do interior, majoritariamente mulheres (13% em 1936, e 66% em 1938) e oriundos da FFCL (cursos de filosofia, geografia, história, ciências sociais e políticas e língua estrangeira). Após o segundo ano de funcionamento da FFCL, como se sabe, o perfil dos alunos do IE torna-se semelhante ao da FFCL, pois os professores do ensino primário e secundário são autorizados a cursar a universidade pelo regime de comissionamento. Ver Evangelista, 1997; Limongi, 1989; Miceli, 1989. .

Fernando de Azevedo, diretor do Instituto de Educação, também buscava conciliar seu durkheimismo com a expertise, uma vez que seu projeto para o Instituto envolvia incorporar algumas funções da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo e, mesmo, transformar a instituição em um futuro modelo da política nacional de educação, tendo em vista as eleições presidenciais de 1937. Em termos políticos, era imperativo formular uma base de dados sobre a educação em São Paulo e, nesse sentido, os centros de documentação credenciavam a Universidade de São Paulo a trocar informações diretamente com as instituições estrangeiras sem a mediação das instâncias do governo federal. Em relação ao curso de sociologia de Arbousse-Bastide, a afinidade entre eles era total: o manual de sociologia de Azevedo correspondia passo a passo aos temas, classificações e autores dos três cursos ministrados por seu homólogo na Faculdade de Filosofia, e era, possivelmente, adotado como bibliografia obrigatória. Em relação ao modelo pedagógico para o ensino secundário, Arbousse-Bastide e Fernando de Azevedo também concordavam sobre a excelência do modelo francês, baseado em uma cultura humanista, ou seja, contrário à especialização aos moldes norte-americanos, mas mantiveram suas diferenças relativamente ao conteúdo dessa formação: humanidades clássicas, no caso de Arbousse-Bastide, e modernas, no caso de Azevedo (Mokrejs, 1984MOKREJ, Elisabete. (jul./dez. 1984), "A propósito do cinquentenário do "Curso de Metodologia do Ensino" na USP: uma nota histórica". Revista da Faculdade de Educação, São Paulo, 10 (2): 345-357.; Arbousse-Bastide, 1944ARBOUSSE-BASTIDE, Paul. (1944), Formando o homem: contribuição para o plano de um ginásio ideal. São Paulo, Sociologia Editoria.)40 40 . Formando o homem (Arbousse-Bastide, 1944), prefaciado por Azevedo, com tradução de Antonio Candido. Ver carta de Arbousse-Bastide agradecendo a Fernando de Azevedo: “Estamos inteiramente de acordo, em alguns pontos essenciais, como por exemplo, quanto à função de cultura geral, desinteressada, que cabe ao ensino secundário, senão exclusiva, ao menos primordialmente, e quanto ao momento excepcional desse tipo de ensino, destinado aos adolescentes”. Azevedo, 1944, p. XVIII. .

Dois centros de documentação foram fundados no Instituto de Educação: o Centro de Documentação Pedagógica, ligado à cadeira Metodologia do Ensino Secundário, de Arbousse-Bastide, e o Centro de Documentação Etnográfica e Social, ligado à cadeira de Sociologia da Educação de Fernando de Azevedo. O Centro de Documentação Pedagógica fora projetado para ser um centro “coordenador de todos os dados, informações e iniciativas que interessam aos estudos dos nossos próprios problemas de educação, pública e particular, dentro do Estado, de natureza histórica, estatística e funcional”41 41 . “Embora nascido sob as inspirações do Instituto Internacional de Paris, trazidas até nós por intermédio do ilustre prof. Paul Arbousse-Bastide, o ‘Centro’ só cumprirá bem a missão para a qual é chamado se for lançado nas bases de um serviço eminentemente local, isto é, como órgão coordenador, ele mesmo, de todos os dados, informações e iniciativas que interessam aos estudos dos nossos próprios problemas de educação, pública e particular, dentro do Estado […]”. Archivos do Instituto de Educação, vol. 3, 1937, p. 239. . Ou seja, esse Centro deveria ser um “instrumento de cooperação” e ter em São Paulo o mesmo papel que o Instituto de Cooperação Intelectual de Paris no plano internacional. Seu papel central no projeto educacional do estado de São Paulo está indicado nos objetivos do CDP: dar as diretrizes e viabilizar a colaboração entre todas as cadeiras do Instituto; estabelecer correspondência com órgãos de informação oficiais; instituir um serviço de orientação às pesquisas pedagógicas em São Paulo e fundar um repositório para consulta às pesquisas realizadas; difundir os resultados dessas iniciativas na revista Archivos do Instituto de Educação (AIE, 1937, p. 241). Já o Centro de Documentação Etnográfica e Social, fundado em 1937, seria um anexo do Laboratório de Pesquisas Sociais, lotado na cadeira de Sociologia Educacional ocupada por Fernando de Azevedo. O laboratório também abrigava um museu de etnografia, que, inclusive, realizou uma primeira exposição de uma coleção de Curt Nimuendaju42 42 . Em janeiro de 1937 Nimuendajú informa a Baldus: “O Instituto de Educação da Universidade de São Paulo me comprou uma coleção Canela. E não só comprou, como também pagou!!! Fernando de Azevedo estava no meu pé por causa do material pedagógico – brinquedos dos índios entre outros – e, como eu não pude separá-los do restante da coleção, ele comprou logo toda a tralha, 391 peças, por 8 contos”. Carta de Nimuendajú a Baldus, Belém do Pará, 13 de janeiro de 1937. Ver Welper, 2019, p. 63. Ao que Baldus responde: “Seja como for, a aquisição de sua coleção pelo Instituto de Educação deu motivo para que Fernando agora queira organizar ali uma espécie de Museu etnográfico, sob a denominação de ‘Centro de Documentação Social e Etnográfica’, cuja direção ele pretende entregar a mim. Além disso, estimulado por sua carta, quer que eu viaje a fim de arranjar coleções para o acervo”. Baldus, 5 de fevereiro de 1937. Ver a lista de 391 peças na revista AIE, ano 3, pp. 125-6. . O acervo é considerado, por Fernando de Azevedo, “adequado a objetivar o ensino sociológico” e um “estímulo a pesquisas sociais de cunho rigorosamente científico” (AIE, p. 125). Ora, a terminologia empregada inscreve a exposição etnográfica no domínio das “sociologias das tribos”, o que é indicador das disputas “disciplinares” de classificação envolvendo o Instituto de Educação e o Departamento de Cultura – que, nesse mesmo período, abrigava a Sociedade de Etnografia e Folclore43 43 . “O Centro de Documentação Ethnographica e Social, do Instituto de Educação, já se poz em entendimento com outros ethnologos afim de que, a serviço do respectivo Museu, encetem explorações systematicas nas regiões supra-mencionadas, com o intuito de colherem a maior soma possível de material authentico e significativo. O sr. Herbert Baldus, por exemplo, de quem se conhecem já várias obras a respeito da sociologia geral e especialmente glotológica dos Zamuka e Kashishá, encarregou-se da missão no que toca aos índios Coroados ou Kaingang, com o que o museo em organização ganhará considerável desenvolvimento.” Ver AIE, 1937, p. 126. . Ou seja, a disputa por funções e atribuições institucionais, dentro ou fora da universidade, é acompanhada por controvérsias pela definição legítima das ciências do homem.

A partir de meados dos anos 1930, o Brasil passa a ter um protagonismo maior na Organização Internacional de Cooperação Intelectual através da atuação de Miguel Ozório de Almeida, presidente da Comissão Nacional de Cooperação Intelectual. Em 1936, Ozório de Almeida nomeia uma subcomissão em São Paulo, que conta, entre outros, com Júlio de Mesquita Filho e Mário de Andrade e, no ano seguinte, com Fernando de Azevedo e Almeida Júnior. A Comissão se inspirava na formulação de Paul Valery (1933) segundo a qual aos intelectuais caberia fundar uma “sociedade internacional dos espíritos”44 44 . Tratava-se de incentivar uma “sociedade dos espíritos” para o “desarmamento moral”, baseada na aceitação de uma “doutrina moral universal” e no uso dos “métodos científicos” para entendimento da realidade contemporânea. AIE, 1937, 3: 13-15. Ver Também Dumont, 2008, p. 44; Renoliet, 1981. . Quanto ao papel do educador, segundo a Comissão Internacional de Cooperação Intelectual, cabia a ele ser mediador entre ciência e política: “cabe ao educador, que deve ser antes de tudo um sociólogo, secundar os diplomatas na tarefa magnífica e capital do desarmamento moral” (Boletim Cici, 1934, p. 57). Além dessa ação, o educador era conclamado a revisar os manuais escolares de seus respectivos países visando inibir qualquer incentivo à mentalidade bélica e nacionalista. No contexto brasileiro, Fernando de Azevedo adapta essas diretrizes aos objetivos de um projeto de “civilização” nacional, tendo como sede o Instituto de Educação e, como recurso estratégico, os manuais escolares, a expertise e as ciências sociais.

Quadro 1
: Instituto de Educação de São Paulo (1934-1938)

O Departamento de Cultura: o cultivo cultural como estilo de vida

Em razão do bloqueio sofrido no Departamento de Sociologia e, mais amplamente, na Universidade de São Paulo, Lévi-Strauss orienta seus investimentos na direção de instituições externas à Universidade de São Paulo45 45 . Muitos anos depois, esse depoimento é significativo das pessoas que permaneceram na memória: “[…] sentia-me infinitamente mais à vontade no Departamento de Cultura da municipalidade. Em torno de Mário de Andrade, grande poeta e espírito profundamente original, apaixonado pelo folclore e as tradições populares, agrupavam-se homens jovens e de grande cultura, historiadores, eruditos, ensaístas, como Sérgio Milliet, Rubens Borba de Moraes e sobretudo Paulo Duarte, pois nos unimos numa amizade fraterna que prosseguiu em Nova York e em Paris”. Lévi-Strauss, 1996, pp. 10-11. . Foi no Departamento de Cultura do Município de São Paulo que considerou a possibilidade de desenvolver alguns de seus projetos, ao lado de Dina Dreyfus46 46 . Sobre a relação entre Lévi-Strauss, Dina Dreyfus e o Departamento de Cultura, consultar Cerqueira (2014), Raffaini (2001), Peixoto (1998) e Valentini (2011). . Em princípio, o Departamento de Cultura poderia ser tido como uma instituição que, municipal, ocupa posição dominada em relação ao Instituto de Educação. Contudo, apesar de sua jurisdição municipal, o projeto era ambicioso, conforme relata Dina Dreyfus em um de seus relatórios e como também projetaram seus idealizadores47 47 . “O Departamento de Cultura é a mais importante e a mais fecunda das realizações. Seu objetivo último é a expansão cultural […]. Sua influência e sua ação crescem a cada dia. Atualmente, a maior parte das manifestações intelectuais e artísticas do estado de São Paulo está sob sua dependência; possui meios práticos (seu orçamento anual está em 3 mil contos de réis) que lhe permitem grandes realizações.” Dina Dreyfus, 1936, apud Sandroni, [1983], 2002, pp. 240-1. .

Segundo Paulo Duarte, o Departamento de Cultura seria criação sua, enquanto a Universidade, um projeto de Júlio de Mesquita Filho. A ideia, entretanto, era transformar o Departamento Municipal em um “instituto” estadual, o “Instituto Paulista de Cultura”, e havia até mesmo a perspectiva de fundar, uma vez ganhas as eleições de 1937, um futuro “Instituto Brasileiro de Cultura”48 48 . As cartas entre Paulo Duarte e Mário de Andrade e entre Sérgio Milliet e Mário são reveladoras a respeito desse projeto. Ver Duarte, 2022. . O projeto era inspirado em parte nas instituições francesas e nas políticas culturais que Paulo Duarte conhecera durante seu primeiro exílio, em 1932, em Paris49 49 . Paulo Duarte conhecera Rivet em 1928, quando este passara por São Paulo para visitar o Museu Paulista. . Em razão de seu interesse pela Antropologia Criminal e em fundar um Instituto de Criminologia em São Paulo, entrara em contato com Paul Rivet, o que lhe permitiu conhecer várias instituições francesas, em particular o então Museu de Etnografia do Trocadéro (Duarte, 1960DUARTE, Paulo Alfeu Junqueira de Monteiro. (1960), Paul Rivet por êle mesmo. São Paulo, Anhambi., [1971] 2022; Hayashi, 2010HAYASHI, Marli Guimarães. (2010), Paulo Duarte, um Quixote brasileiro. São Paulo, Hucitec. (Estudos Históricos, 80)., p. 52). A denominação “Instituto de Cultura”, empregada por Paulo Duarte em sua correspondência com Mário de Andrade, é significativa de seu investimento em instituições mais autônomas, voltadas à pesquisa e à prestação de serviços, relativamente independentes da universidade50 50 . Sobre a importância dos projetos envolvendo o futuro Museu de l’Homme, ver Laurière, 2008; Delpuech, Lauriere e Peltier-Caroff (orgs.), 2017; Blanckaert e Coppens, 2015. .

Alguns estudos enfatizam o caráter complementar entre o Departamento de Cultura e o Instituto de Educação – imagem que os próprios agentes ajudaram a construir51 51 . Moraes, 1982, 2001; Paulo Duarte, 1977/1985; Cerqueira, 2014. . De fato, Fernando de Azevedo contribuiu na elaboração do projeto do Departamento de Cultura, mas ao que parece nos anos seguintes as duas instituições se tornaram, sob certos aspectos, rivais. O ápice desse conflito velado foi em 1937, quando as mesmas funções são incorporadas por ambas as instituições. A oposição entre política cultural e política educacional foi objeto de ampla discussão no período – o que possibilita atribuir uma dimensão sociológica à antipatia entre Mário de Andrade e Fernando de Azevedo52 52 . Agradeço a Irene Cardoso, a quem Fernando de Azevedo revelou sua antipatia em relação a Mário, essa informação, e a Fabio Keinert por ter mediado esse contato. . Mário julgava “imprescindíveis” os “institutos culturais” de pesquisa e difusão cultural, pois considerava a formação escolar relativamente restrita em relação ao potencial da formação cultural53 53 . A citação é longa, mas significativa para o argumento. Segundo Mário, “Cumpre organizar os serviços, forçar a vitalidade dos museus e a criação de institutos culturais que ajam pelos processos educativos extrapedagógicos que cada vez mais estão se tornando os mais capazes de ensinar. O que há talvez de mais admirável na pedagogia contemporânea é o seu caráter, por assim dizer, antipedagógico […]. Serão assim os museus, os institutos culturais que desejaria espalhados com mais frequência entre nós. Sim, temos enorme necessidade de escolas primárias e de alfabetização. Mas a organização intelectual de um povo não se processa cronologicamente, primeiro isto e depois aquilo. Tanto mais em povos crianças e contemporâneos como o nosso, com avião, parques infantis, rádio, bibliotecas públicas, jornal, e impossibilitados por isso de qualquer Idade Média. Não entreparemos, portanto, no sofisma sentimental do ensino primário. Ele é imprescindível, mas são imprescindíveis igualmente os institutos culturais em que a pesquisa vá de mãos dadas com a vulgarização, com a popularização da inteligência. […] Não basta ensinar o analfabeto a ler. […] não disseminados organismos outros que salientem no povo o valor e a glória do que se defendeu, tudo será letra morta, gozo sentimental e egoístico de uma elite” (De Mário a Paulo Duarte, [1937] 1977, pp. 231-232. . Essa percepção era compartilhada pelos dirigentes do Departamento de Cultura, uma vez que, ao contrário dos professores do Instituto de Educação, sua relação com a escola era muito distinta, mais “livre” das classificações escolares, ao custo de uma maior dependência em relação às elites dirigentes.

Perfil de Grupo: uma internacional culturalista

Considerando-se o principal idealizador e os diretores do Departamento no período de fundação do Departamento de Cultura, identificam-se os seguintes nomes: Mário de Andrade, Sérgio Milliet, Rubens Borba de Moraes, Nicanor Miranda e o próprio Paulo Duarte. Formavam um grupo mais ou menos homogêneo, ancorado em laços familiares, militância política e estilo de vida cultivado. Mário de Andrade, Sérgio Milliet, Paulo Duarte, Rubens Borba de Moraes e Nicanor Miranda são figuras, como afirma Moraes, oriundas de famílias oligárquicas ou “primos pobres” dessas famílias. Alguns, como Moraes, viviam de rendas e não precisavam trabalhar; outros, como Paulo Duarte e Sérgio Milliet, haviam “caído em desgraça” e viviam com menos recursos. Contudo, eles tinham parentes e/ou amigos próximos entre os grupos dirigentes paulistas, um capital fundamental nesse período54 54 . A entrevista de Rubens Borba de Moraes, assim como as Memórias de Paulo Duarte, é muito instrutiva a esse respeito. Ver Moraes, 1982; Duarte, 1977, vol. 2. . Paulo Duarte conheceu Nicanor Miranda na Faculdade de Direito, alguém que ele denomina “rapaz culto” e que, nos anos 1920, junto com outros intelectuais, frequentou seu apartamento na avenida São João, lugar de encontro desse grupo intelectual. Milliet divide o apartamento com Paulo Duarte por certo tempo, tornando-se em seguida seu cunhado.

Todos eles, com exceção de Mário, foram marcados por trajetórias internacionais. Milliet fora enviado a Genebra para estudar aos catorze anos, após cursar o colégio São Bento; em razão das reviravoltas da família, segundo ele, “de uma existência de moço rico passei à miséria do exilado sem mesada” (Milliet, Diário Crítico, vol. 2, p. 7). Além dos laços familiares, compartilhou com Paulo Duarte o gosto pelo jornalismo, as letras e a militância no Partido Democrático55 55 . Sobre Milliet, ver Paollilo, 2019; Hyaishi, 2010. . Borba de Moraes e Milliet se conheceram no colégio São Bento e, juntos, foram estudar na Suíça, tradição das famílias abastadas, segundo entrevista dada por Borba de Moraes. Após quase uma década fora do país, trouxeram de Genebra “novidades” literárias e artísticas – como Aragon, Cocteau, Breton, Cendrars – para compartilhar com intelectuais brasileiros. Borba de Moraes procura Mário, pois ambos eram oriundos de Araraquara, e tudo leva a crer que as afinidades intelectuais terminaram a costura das relações familiares. O primeiro se tornou bibliófilo e, depois de dirigir a seção de Biblioteca do Departamento de Cultura, é chamado por Capanema para dirigir a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro56 56 . “Quando eu e o Sérgio Milliet chegamos da Suíça, em 1919, depois de termos estudado lá durante muitos anos, nós estávamos muito bem-informados sobre o Movimento Modernista. Nós éramos modernistas em Genebra. Nós tínhamos lido Cocteau, Aragon; a nossa revista era a Nouvelle Revue Française; estávamos a par de Apollinaire. Quando nós chegamos ao Brasil, fomos procurar os grupos de intelectuais. Eu fui procurar o Mário por relações de família; disseram que ele era de Araraquara como eu e tal.” Ver Moraes, 1982. .

Paulo Duarte foi contratado pelo jornal Oesp em 1919 e, alguns anos depois, funda com esses colegas o Diário de Notícias, órgão do Partido Democrático. A militância política desse grupo permite introduzir alguns de seus membros aos meandros das políticas públicas, em particular na área cultural. Mário de Andrade fora escolhido por Paulo Duarte para dirigir o Departamento de Cultura. Não se sabe como se conheceram, mas possivelmente nos meios intelectuais dos anos 1920, envolvidos em projetos políticos e culturais. Mário também era frequentador do apartamento da avenida São João e, em seguida, colaborou com o Diário de Notícias e Oesp. Em 1934, apesar de autodidata, já tinha dado mostras de profundo conhecedor da “cultura brasileira”. Seus contatos com membros dos grupos “antivarguistas” lhe valeram a indicação aos projetos culturais do município de São Paulo e, em seguida, no governo federal (Miceli, 2001MICELI, Sérgio. (2001), Intelectuais à brasileira. São Paulo, Companhia das Letras., 2009MICELI, Sérgio. (2009), "Mário de Andrade: a invenção do moderno intelectual brasileiro". In: BOTELHO, André & SCHWARCZ, Lilia Moritz (orgs.). Um enigma chamado Brasil: 29 intérpretes e um país. São Paulo, Companhia das Letras, pp. 160-174.). A trajetória de Mário mostra um traço característico desse grupo: era o único a não ter um diploma superior, um sinal da insubordinação às classificações escolares e de busca por legitimação por princípios externos à escola. Os laços entre eles foram costurados por outros meios, independentes da trajetória escolar. Além das relações com famílias oligárquicas e do cultivo cultural, que os levou a projetos editorais comuns, mas efêmeros, como a revista Klaxon, também compartilharam posições políticas “socializantes”, entendendo-se pelo termo a ampliação dos direitos políticos e sociais da população.

Assim como sua circulação internacional, outro traço característico desse grupo, quando comparado com o perfil dos professores do Instituto de Educação, é a diversidade de funções desempenhadas (críticos, artistas, professores, jornalistas, tradutores, escritores, políticos etc.). A formação na Suíça, traço da trajetória de Milliet e de Borba de Moraes, permitiu tanto o convívio com as vanguardas literárias e estéticas, quanto contatos com as ideias e instituições voltadas à cooperação intelectual internacional57 57 . Sobre a Sociedade das Nações e os investimentos da Fundação Rockefeller, ver Tournès, 2011, e Mazon, 1988; Renoliet, 1981. . Na direção da Divisão de Documentação Histórica e Social do Departamento de Cultura, busca fazer levantamentos sobre diversos aspectos da vida social do município de São Paulo, em particular sobre padrão de vida, habitação, transporte, assistência social, população etc.58 58 . Várias dessas enquetes foram publicadas na Revista do Arquivo Municipal. Ver também Duarte, [1971] 2022. . Esses levantamentos estavam articulados às pesquisas que se realizavam na Europa e nos Estados Unidos nesse mesmo período, dado o contexto de tensões sociais e políticas crescentes. No caso do Departamento de Cultura, elas tinham, por um lado, a função de pautar as políticas públicas locais e, por outro lado, dar visibilidade internacional aos estudos sociais realizados no país. Assim, a instituição passa a coordenar pesquisas coletivas com o fim de apresentar resultados em congressos internacionais.

No contexto da Exposição Universal, em 1937, inúmeras são as conferências na área de ciências sociais. O Departamento de Cultura apresenta três trabalhos: Milliet, representando o Departamento de Cultura, no Congresso Internacional da População organizado pelo Instituto Internacional de Cooperação Intelectual59 59 . Publicação do trabalho de Sérgio Milliet no Congresso de População da Comissão Internacional de Recenseamento. Revista do Arquivo Municipal, vol. 39, 1937, pp. 281-289. Ver Milliet, 1938, pp. 241-242. ; além dele, Nicanor Miranda, também pelo Departamento de Cultura, apresenta duas pesquisas no Primeiro Congresso Internacional de Folclore60 60 . Foram dois os trabalhos apresentados em nome da Sociedade de Etnografia e Folclore. O primeiro foi coordenado por Mário de Andrade e Dina Dreyfus, e tratou de proibições alimentares, danças populares e cura de terçol com anel. O segundo trabalho, da autoria de Nicanor Miranda (1944), focalizou o lazer dos trabalhadores na cidade de São Paulo. Nicanor Miranda apresentou os dois trabalhos no congresso. Ver Revista do Arquivo Municipal, 1937, 42, pp. 95-96. Os trabalhos foram publicados em Travaux du 1er Congres Internationale de Folklore, Arrault et Cl, Tours, 1938. . Não por acaso esse último congresso fora organizado pelo recém-fundado Museu de Artes e Tradições Populares, dirigido por Georges Henri Rivière, sob a presidência de Paul Rivet61 61 . Nos anos 1920 e 1930, multiplicam-se as conferências internacionais sobre folclore e/ou artes populares. Nesse contexto, Mário de Andrade é convidado a enviar trabalho para o Congresso de Arte Popular, de 1928, realizado em Praga, organizado pelo Instituto Internacional de Cooperação Intelectual. Ver Institut Internationale de Coopération Intellectuelle, 1928; Laurière, 2008. Ver Toni, 2021, e Ducci, 2015. . Em 1937, eram estreitos os laços entre Lévi-Strauss e Dina Dreyfus com Rivet e com Mário de Andrade, com os quais dialogavam sobre as expedições no Brasil e as exposições em Paris, além de serem mediadores das relações entre o Departamento e o Musée de l’Homme. Assim, a apresentação de trabalhos científicos na França credenciava o Departamento e seus pesquisadores brasileiros, mas também servia como relatório de atividades dos professores franceses às autoridades do seu país62 62 . As cartas de Dina Dreyfus e Lévi-Strauss são reveladoras da articulação entre Rivet, o casal e o Departamento de Cultura. Ver Fundo Mário de Andrade, IEB. .

Os escritores do Departamento de Cultura não se dedicaram ao ensino ou à publicação de manuais escolares, mantendo certa distância em relação aos educadores brasileiros do Instituto de Educação. Os alunos que frequentaram os cursos de Dina Dreyfus, cujo perfil se dividia entre funcionários da prefeitura e alunos da FFCL, não formaram uma base de leitores ampla para dar condições de reprodução desse grupo63 63 . Os alunos que frequentaram esses cursos tinham o seguinte perfil: homens e mulheres em fração praticamente equivalente, oriundos majoritariamente do interior, nascidos na década de 1910. Ver Valentini, 2011. . Sem condições de viverem do mercado editorial, como os professores, foram muito mais dependentes das elites dirigentes e do fôlego de seus projetos políticos.

Quadro 2
: Departamento de Cultura (1934-1938)

* * *

Fundada em 1936, a Sociedade de Etnografia e de Folclore estava associada ao Departamento de Cultura, e pode ser considerada um dos principais projetos de Lévi-Strauss e Dina Dreyfus64 64 . As relações entre Lévi-Strauss e Dina Dreyfus com o Departamento de Cultura já foram amplamente documentadas e analisadas. Ver Raffaini, 2001; Valentini, 2011; Cerqueira, 2014; Peixoto, 1998; Pontes, 1998. Interessa aqui apenas diferenciar esses investimentos em relação àqueles feitos por Arbousse-Bastide no Instituto de Educação. . A Sociedade tinha por função institucionalizar as atividades que em parte já haviam sido iniciadas, mas demandavam estatutos e atribuições que Lévi-Strauss resume em uma carta a Mário de Andrade: reuniões periódicas, conferências, comunicações, organização de pesquisas, exposição dos resultados das pesquisas. Ao lado dessas atividades, previam-se serviços de acompanhamento e comunicação do trabalho coletivo, voltado primordialmente à coleta, classificação e fluxo de informações. Dina Dreyfus, à mesma época, também especifica os domínios abarcados pela Sociedade: “orientar, promover e divulgar estudos etnográficos, antropológicos e folkloricos”65 65 . Ver arquivos do IEB. Fundo Mário de Andrade. . Há nessas diretrizes uma delimitação disciplinar nítida, que distingue essa Sociedade da Sociedade de Sociologia, fundada em 1935. No caso desta última, a proposta é abarcar domínios muito mais amplos e compreensivos, como “filosofia social”, “sociologia formal”, “sociologia aplicada” e “antropologia cultural” (AIE, 1936, p. 207). Além dessa diferença, ressaltem-se também outras diferenças entre essas duas Sociedades: a oposição entre teoria e pesquisa; entre macrossociologia e métodos/técnicas de pesquisa de campo. A diferença entre as duas Sociedades, minimizada por alguns estudos, conforme foi apontado por Rubino (1995), não se deve a qualquer tipo de autonomia entre as duas “disciplinas” no período, mas sim às disposições dos grupos que as fundaram e às posições distintas que ocuparam no campo do poder. A Sociedade de Sociologia era dirigida por Fernando de Azevedo e Arbousse-Bastide, enquanto a Sociedade de Etnografia estava nas mãos de Mário de Andrade e Dina Dreyfus. Por isso não há coerência nas posições “disciplinares”: Sérgio Milliet, professor de sociologia, ocupa posição no Departamento de Cultura, enquanto Herbert Baldus, etnógrafo, aproxima-se do Instituto de Educação. Fernando de Azevedo o encarregara de organizar um museu de etnografia no Instituto de Educação e de realizar expedições com o apoio do Instituto, além de dar-lhe espaço para publicar em sua coleção66 66 . Nesse período, as impressões de Baldus sobre Lévi-Strauss são muito ruins, conforme ele declara nas cartas trocadas com Nimuendajú. Destaco a carta de 11/10/1937, na qual critica seu trabalho e mesmo sua postura profissional. Ver Welper et al. (orgs.), 2019, p. 71. . Ou seja, as “filiações” se baseiam na posição ocupada na figuração.

A Sociedade de Sociologia, por sua vez, envia trabalho para o Conferência Internacional de Ciências Sociais, organizada no contexto da Exposição Universal de 1937, com o apoio do Instituto Internacional de Cooperação Intelectual. O trabalho foi publicado nos anais do congresso, possivelmente por um acordo entre Azevedo, Arbousse-Bastide, Georges Dumas e Célestin Bouglé. O artigo, assinado por alunos do Instituto de Educação – Aquilles Archero, Alberto Conte e Eudoro Ramos –, intitula-se “A sociologia brasileira contemporânea”67 67 . Sobre Achilles Archêro, Ver Pinheiro e Miceli, 2008. Alberto Conte prestou concurso no Instituto de Educação, mas perdeu para Noemy Rudolfer. Sobre Eudoro Ramos Costa sabe-se apenas que foi um jornalista. . As classificações propostas nesse artigo – “sociologia das questões sociais”, “sociologia pura” e “sociologia aplicada” – dão destaque ao polo “puro” e, como seu principal representante, Fernando de Azevedo68 68 . A qualidade dos manuais escolares, segundo OS autores, fora atestada pelos professores franceses das cadeiras de sociologia I e II, bem como por Armand Cuvillier. Ver Bouglé, 1937. Ver também Rubino, 1995. . Celestin Bouglé, próximo de Dumas, preside esse congresso e em sua introdução realça a importância do diálogo internacional para “fazer progressivamente desaparecer as marcas nacionais” das ciências sociais (Bouglé, 1937, p. 15).

Apesar da confluência entre várias instituições europeias voltadas ao “internacionalismo” como forma de combater o crescente “nacionalismo”, há diferenças importantes entre os congressos de “ciências sociais” e de “folclore”. No caso do congresso de ciências sociais, os trabalhos são balanços ou revisão de autores e obras; no caso do congresso de folclore, os trabalhos são estudos empíricos que tratam de grupos sociais específicos. Esses congressos abriram uma janela de oportunidades para que intelectuais brasileiros e professores franceses exibissem suas credenciais. Essa circulação ligava sociedade científica, pesquisa, apresentação de trabalho no exterior e publicação internacional, ou seja, é um retrato dos primórdios do processo de “internacionalização” que ocorrerá nas décadas seguintes.

Considerações finais

Pretendeu-se mostrar que há diferenças importantes nas trajetórias e nas disposições dos professores que fizeram parte das missões francesas, as quais dizem respeito ao contexto de origem e às transformações no espaço transnacional. Além disso, argumentou-se que a sociabilidade e os projetos desses professores estão necessariamente atrelados ao contexto de destino ou à figuração de que participam. Consideradas isoladamente, a sociologia filosófica e normativa (Arbousse-Bastide) e a etnologia e a pesquisa etnográfica (Lévi-Strauss) ocupam posições distintas no espaço disciplinar: a ciência estabelecida, a sociologia, tenta barrar a ascensão da nova ciência por meio da sua exclusão ou anexação. Entretanto, no caso de São Paulo, os praticantes do novo saber são intelectuais-escritores, em posição socialmente dominante, enquanto os praticantes do saber estabelecido, a sociologia, ocupam posição dominada no campo do poder. Nesse sentido, é significativo o “desprezo” dos professores franceses em relação ao Instituto de Educação, bem como a presença de uma mulher no corpo docente dessa instituição, enquanto Dina Dreyfus não foi contratada pela Faculdade de Filosofia.

Destaca-se o papel dos mediadores na constituição de dois circuitos de diálogo entre os meios intelectuais paulistas e franceses. Nesse contexto, a relação entre Paul Rivet e Lévi-Strauss é central, pois essa cooperação inaugura uma política de irradiação da “ciência francesa” distinta da diplomacia intelectual que praticavam Georges Dumas e Arboussse-Bastide. Não por acaso inexiste praticamente correspondência entre Rivet e Dumas, quando seria de se esperar um diálogo frequente em razão da frequente circulação de ambos na América Latina. Dumas fundara, por seus vínculos com o Ministério das Relações Exteriores francês, e por ser professor da Sorbonne, uma diplomacia “pelo alto”, enquanto Rivet preferiu uma política mediada pelo pesquisador e, do ponto de vista institucional, caracterizada por uma maior abertura aos intelectuais autodidatas. Assim, as preferências distintas dos dois colegas de departamento se articulam a duas modalidades de circulação internacional. Essas preferências permitem atribuir ao primeiro, Lévi-Strauss, uma disposição ao risco para além dos possíveis escolares e, ao segundo, à conservação das práticas escolares e universitárias. Nas décadas seguintes, suas trajetórias na França consolidam essas diferenças: Lévi-Strauss ingressa na Escola Prática de Altos Estudos de Paris e Arbousse-Bastide na Universidade de Rennes.

No que diz respeito à institucionalização da formação em pesquisa na Faculdade de Filosofia, Florestan Fernandes e Antonio Candido, ambos orientandos de Fernando de Azevedo, chegam à conclusão de que seria preciso reformular o curso de ciências sociais (Fernandes, 1958, [1959] 1977; Candido, 1954). Nos anos 1950, esses autores publicam alguns balanços sobre a sociologia e a etnologia em São Paulo no período de fundação. Antonio Candido enfatiza uma relação harmoniosa entre as instituições e agentes, enquanto Florestan prefere realçar a “crise” da sociologia na FFCL dada a falta de recursos para a pesquisa. Referindo-se ao mal-estar causado entre os colegas pela publicação de Tristes trópicos (1955), Florestan procura aproveitar o contexto para realçar as analogias entre a formação universitária na França e no Brasil – a formação teórica seria importante, mas as novas gerações, ao contrário das antigas, precisam se especializar.

Tanto o Departamento de Cultura quanto o Instituto de Educação sofreram revezes após o golpe de Vargas, o que mostra o quanto havia em comum entre eles aos olhos de um outro projeto nacional. Não deve ter contado pouco para esse desfecho a enorme ambição de ambos os grupos em nacionalizar uma experiência local, que pretendiam legítima uma vez amparada por instituições internacionais. O grupo do Departamento se dispersou, o que era condizente com um mundo de indivíduos que circulam mais “livremente” em relação às instituições escolares, mas são presas mais fáceis das ingerências políticas; o grupo dos professores do Instituto foi transferido para a FFCL e, apesar da posição subordinada, manteve sua crença no valor da escola e formou as novas gerações.

Esta pesquisa foi realizada com o apoio da Fapesp – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – e do programa DEA da Fondation Maison des Sciences de l’Homme. Agradeço a Helène Arbousse-Bastide por disponibilizar os arquivos da família para consulta. Ao Rafael Andrade e Bruno Cuer, agradeço o diálogo e a colaboração na elaboração deste estudo.

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  • VALLANTIN, Catherine Velay. (abr. 1999), "Le Congrès International de Folklore de 1937". Annales. Histoire, Sciences Sociales, 54 (2): 481-506.
  • VIDAL, Diana G. & RABELO, Rafaela S. (jan.-abr. 2019), "A criação de Institutos de Educação no Brasil como parte de uma história conectada da formação de professores". Cadernos de História da Educação, 18 (1): 208-220.
  • VIDAL, Diana G.; SILVA, José C. S. & ABDALA, Raquel. (2020), Fernando de Azevedo em releituras. Sobre lutas travadas, investigações realizadas e documentos guardados São Paulo, Paco.
  • WELPER, Elena (org.). (2019). Chamado da selva: correspondência entre Curt Nimuendajú e Herbert Baldus. Rio de Janeiro, Camera Books.
  • 1
    . Esta pesquisa foi realizada com o apoio da Fapesp – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – e do programa DEA da Fondation Maison des Sciences de l’Homme. Agradeço a Helène Arbousse-Bastide por disponibilizar os arquivos da família para consulta. Ao Rafael Andrade e Bruno Cuer, agradeço o diálogo e a colaboração na elaboração deste estudo.
  • 2
    . A história das ciências sociais no contexto de fundação da Universidade de São Paulo já foi amplamente analisada por estudos anteriores. Ver Antunha, 1974ANTUNHA, Heladio César Gonçalves. (1974), Universidade de São Paulo: fundação e reforma. São Paulo, SP, MEC-Inep-CRPES (Centro Regional de Pesquisa Educacionais do Sudeste). Estudos e Documentos, vol. 10. jun.; Schwartzman, 1979SCHWARTZMAN, Simon. (1979), Um espaço para a ciência: A formação da comunidade científica no Brasil. São Paulo, Companhia Editora Nacional.; Cardoso, 1982CARDOSO, Irene. (1982), A universidade da comunhão paulista. São Paulo, Cortez.; Miceli, 1989MICELI, Sérgio. (1989), História das Ciências Sociais no Brasil, vols. 1 e 2. São Paulo, Vértice/Revista dos Tribunais., 1995; Carlotto, 2014CARLOTTO, M. (2014), Universitas sempre reformada? A história da Universidade de São Paulo e o discurso da gestão à luz da estrutura social. São Paulo, tese de doutorado em sociologia. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.), assim como o papel das missões francesas na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. Ver Massi, 1988; Massi, 1989MASSI, Fernanda. (1989), "Franceses e norte-americanos nas Ciências Sociais brasileiras (1930-1960)". In: MICELI, Sergio (org.). História das Ciências Sociais no Brasil. São Paulo, Vértice.; Peixoto, 1998PEIXOTO, Fernanda Arêas. (1998). "Lévi-Strauss no Brasil: a formação do etnólogo". Mana, 4 (1): 79-107., 2001; Suppo, 2001SUPPO, Rogelio Hugo. (2001), La politique culturelle française au Brésil entre les années 1920-1950. Paris, tese de doutorado, Paris III.; Petitjean, 1991PETITJEAN, P. (1991), "Dimensão cultural, influências ideológicas e imagens científicas na história das relações franco-brasileiras, 1850-1940". In: PARVEAUX, S. & REVEL-MOUROZ, J. (dir.). Images réciproques du Brésil et de la France. Paris, Éditions de l'IHEAL, pp. 845-860., 1996PETITJEAN, P. (dir.). (1996), A ciência nas relações Brasil-França (1850-1950). São Paulo, Edusp., 2001PETITJEAN, P. (2001), "Miguel, Paul, Henri et les autres. Les réseaux scientifiques franco-brésiliens dans les années 1930". In: VIDEIRA, A. & Salinas, S. (dir.). A cultura da Física. Contribuções em homenagem a Amélia Império Hamburger. São Paulo, Editora Livraria da Física, pp. 59-94.; Lefevre, 1993LEFÈVRE, Jean-Paul. (avril-juin 1993), "Les missions universitaires françaises au Brésil dans les années 1930". Vingtième Siècle. Revue d'Histoire, 38: 24-33.; Loyer, 2015LOYER, E., (2015), Lévi-Strauss. Paris, Flammarion.; Merkel, 2022MERKEL, I. (2022), Terms of exchange. Brazilian intellectuals and the French Social Sciences. Chicago, University of Chicago Press.; Consolim 2021CONSOLIM, M. (2021), "Circulação de intelectuais e recepção das novas ciências do homem francesas no Brasil, 1908-1932". Tempo Social, 33 (1): 17-51., 2023CONSOLIM, M. (2023), "L'enseignement des sciences sociales au Brésil: Français, Nord-Américains et Brésiliens (1933-1945)". Revue d'Histoire des Sciences Humaines, 42: 15-48..
  • 3
    . A bibliografia especializada faz menção a essa controvérsia, mas de maneira breve e sem a pretensão de extrair do episódio uma chave de interpretação das posições intelectuais e das transferências científicas no período. Ver Cardoso, 1982CARDOSO, Irene. (1982), A universidade da comunhão paulista. São Paulo, Cortez.; Rubino, 1989RUBINO, Silvana. (1989), "Clubes de pesquisadores: A Sociedade de Etnologia e Folclore e a Sociedade de Sociologia". In: MICELI, Sergio (org.). História das Ciências Sociais no Brasil. São Paulo, Vértice.; Suppo, 2001SUPPO, Rogelio Hugo. (2001), La politique culturelle française au Brésil entre les années 1920-1950. Paris, tese de doutorado, Paris III.; Loyer, 2015LOYER, E., (2015), Lévi-Strauss. Paris, Flammarion.; Peixoto, 1998PEIXOTO, Fernanda Arêas. (1998). "Lévi-Strauss no Brasil: a formação do etnólogo". Mana, 4 (1): 79-107.; Raffaini, 2001RAFFAINI, Patricia Tavares. (2001), Esculpindo a cultura na forma Brasil: o Departamento de Cultura de São Paulo (1935-1938). São Paulo, Humanitas FFLCH/USP, História Social USP.; Valentini, 2011VALENTINI, Luisa. (2011), Um laboratório de antropologia: o encontro entre Mário de Andrade, Dina Dreyfus e Claude Lévi-Strauss (1935-1938). São Paulo, dissertação de mestrado em Antropologia Social, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.; Silva, 2008SILVA, Dimitri Pinheiro. (2008), Da Política à Ciência Política; Da Ciência Política à Política: a trajetória acadêmica de Paula Beiguelman (1949-1969). Dissertação de mestrado, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, FFLCH/USP., Cerqueira 2014CERQUEIRA, Vera Lucia Cardim de. (2014), Ciências sociais na gestão Mário de Andrade: contribuições de Samuel Lowrie e Dina Lévi-Strauss. São Paulo, Annablume..
  • 4
    . A esse respeito, conferir os seguintes estudos: Pollak, 2018POLLAK, Michaël. (2018), "Paul F. Lazarsfeld: fundador de uma multinacional científica". Política & Sociedade, 17 (38): 94-134; Palmeira, 2017PALMEIRA, Miguel Soares. (2017), "Dos efeitos de um exílio: Moses Finley na Inglaterra". Revista de História, 176: 1-31.; Jeanpierre, 2004JEANPIERRE, Laurent. (2004), "Une opposition structurante pour l'anthropologie structurale: Lévi-Strauss contre Gurvitch, la guerre de deux exilés français aux États-Unis". Revue d'Histoire des Sciences Humaines, 11: 13-44., 2002JEANPIERRE, Laurent. (2002), "La politique culturelle française aux États-Unis de 1940 a 1947". In: Entre rayonnement et réciprocité: Contributions à l'histoire de la diplomatie culturelle. Paris, Éditions de la Sorbonne.; Kluger, 2018. Ver também Bourdieu, 2002BOURDIEU, Pierre. (2002), "As condições sociais da circulação internacional das ideias". Tradução: Fernanda Abreu. Enfoques, Rio de Janeiro, 1 (1): IV-XV.; Sapiro, 2016SAPIRO, Gisele. (2016), "Modelos de intervenção política dos intelectuais: o caso francês". Revista Pós Ciências Sociais. 9 (7)., 2019SAPIRO, Gisele. (2019), "A noção de campo de uma perspectiva transnacional: A teoria da diferenciação social sob o prisma da história global". Plural, Revista do Programa de PósGraduação em Sociologia da USP, São Paulo, 26 (1): 233-265..
  • 5
    . Ver Lévi-Strauss, Chers tous deux: lettres à ses parents, [28/06/1941], 2015.
  • 6
    . Sobre a crítica ao durkheimismo e ao espírito filosofante, bem como à política de Georges Dumas, ver Lévi-Strauss, Tristes tropiques, 1955, pp. 51-52 e 96-97. Mais de quatro décadas depois, Lévi-Strauss volta ao assunto em entrevista a Didier Eribon: “Georges Dumas havia colocado um jovem parente que era sociólogo na universidade em seu primeiro ano. Quando chegou a minha vez, segundo sociólogo no comando, por assim dizer, ele tentou me colocar em uma posição subordinada. Isso não foi do meu agrado e, como resisti, ele tentou me demitir em nome da tradição comtista, da qual ele era especialista e que meu ensino traía. Os chefes da universidade, que eram também os chefes do grande jornal O Estado de S. Paulo, lhe deram ouvidos simpáticos”. Ver Eribon, 1998ERIBON, Didier. (1998), De Près et de loin. Paris. Odile Jacob., p. 33. Ver também Lévi-Strauss, 1996LÉVI-STRAUSS, Claude. (1996), Saudades de São Paulo. São Paulo, Companhia das Letras, Instituto Moreira Salles., e J. Maugué, 1982, p. 85. Ao contrário do que afirma Lévi-Strauss, não há qualquer parentesco entre Dumas e Arbousse-Bastide.
  • 7
    . Arbousse-Bastide chega a publicar editoriais anônimos no jornal Oesp, enquanto Lévi-Strauss publica muito pouco nesse jornal.
  • 8
    . No programa original que consta do decreto de janeiro de 1934, aparecem como constitutivas do curso as seguintes disciplinas: Psicologia Social, Antropologia Social e Sociologia Política. Ver Oesp, 25/01/1934. No Anuário, o programa publicado foi incluído dentro da rubrica “Sociologia” e dentro dos seguintes cursos: 1º Ano: Sociologia Geral; 2º Ano: Sociologia Mental e Intermental, Sociologia Especial (Ciências dos Costumes, Sociologia Jurídica, Sociologia Criminal, Sociologia Econômica); 3º Ano: Sociologia Especial (doméstica, política, estética, religiosa, linguística, normativa e aplicada, além de noções de etnologia). Ver Anuário, [1934-1935] 2009. Esse programa foi aprovado pelo decreto 7069 de 06/04/1935.
  • 9
    . Agradeço ao professor Fernando Pinheiro Filho por disponibilizar essa documentação. Trata-se de um resumo de 130 páginas aproximadamente sobre os conteúdos ministrados nos dois semestres do primeiro ano e no primeiro semestre do segundo ano, realizados possivelmente por uma aluna, no ano de 1938.
  • 10
    . No caso da relação entre psicologia e sociologia, outras fontes são utilizadas: o Traité de Psychologie de Dumas, textos sobre a IV Semaine de Synthèse de Henri Berr e as publicações do Centro de Documentação Social de Bouglé, além dos psicólogos das “multidões”. Entre os anglo-saxônicos, encontram-se os clássicos da psicologia social anglo-saxônica: J. Baldwin, W. James, Ellwood e MacDougall. Entre os alemães encontram-se: Freud, Stein, Wundt, von Wiese e Simmel.
  • 11
    . “Finalmente acrescentamos noções de etnologia no último ano, a fim de lembrar aos estudantes de sociologia que a observação modesta e minuciosa do etnógrafo deve constituir com a estatística judiciosamente manejada um instrumento de valor para o sociólogo […].” Ver Arbousse-Bastide, Anuário, [1934-1935] 2009, p. 163.
  • 12
    . Arbousse-Bastide, Oesp, 1935; idem, Revista do Arquivo Municipal, 1935. Ver também essa polêmica em Valentini, 2010; Cerqueira, 2014CERQUEIRA, Vera Lucia Cardim de. (2014), Ciências sociais na gestão Mário de Andrade: contribuições de Samuel Lowrie e Dina Lévi-Strauss. São Paulo, Annablume.; e Consolim, 2023CONSOLIM, M. (2023), "L'enseignement des sciences sociales au Brésil: Français, Nord-Américains et Brésiliens (1933-1945)". Revue d'Histoire des Sciences Humaines, 42: 15-48..
  • 13
    . Os seguintes centros europeus foram contatados: o Instituto Internacional de Cooperação Intelectual de Paris, o Centro de Documentação Social (CDS) da Escola Normal Superior, o Bureau Internacional de Educação (BIE) e o Bureau Internacional do Trabalho (BIT). Ver Archivos do Instituto de Educação, 1936ARCHIVOS do Instituto de Educação. (1936), São Paulo, ano II, n. 3. e 1937. Sobre as cartas de Arbousse-Bastide a Bouglé, ver Fundo da Escola Normal Superior dos Archives Nationales. Sobre as cartas ao Bureau International de l’Éducation, em Genebra, ver Arquivos da Unesco. Conferir ainda os relatórios de Arbousse-Bastide às autoridades francesas no Ministère des Affaires Étrangères.
  • 14
    . Lévi-Strauss, 1996LÉVI-STRAUSS, Claude. (1996), Saudades de São Paulo. São Paulo, Companhia das Letras, Instituto Moreira Salles., pp. 9-10. Inúmeros estudos especializados se debruçaram sobre a obra e a trajetória de Lévi-Strauss. Trata-se aqui apenas de realçar as propriedades que o diferenciam de Arbousse-Bastide. Ver Grupioni, 1998GRUPIONI, Luís Donisete Benzi. (1998), Coleções e expedições vigiadas: Os etnólogos no Conselho de Fiscalização das Expedições Artísticas e Científicas no Brasil. São Paulo, Hucitec/ANPOCS.; Suppo, 2001SUPPO, Rogelio Hugo. (2001), La politique culturelle française au Brésil entre les années 1920-1950. Paris, tese de doutorado, Paris III.; Massi, 1989MASSI, Fernanda. (1989), "Franceses e norte-americanos nas Ciências Sociais brasileiras (1930-1960)". In: MICELI, Sergio (org.). História das Ciências Sociais no Brasil. São Paulo, Vértice.; Peixoto, 1998PEIXOTO, Fernanda Arêas. (1998). "Lévi-Strauss no Brasil: a formação do etnólogo". Mana, 4 (1): 79-107.; Merkel, 2022MERKEL, I. (2022), Terms of exchange. Brazilian intellectuals and the French Social Sciences. Chicago, University of Chicago Press.; Loyer, 2015LOYER, E., (2015), Lévi-Strauss. Paris, Flammarion.; Eribon, 1998ERIBON, Didier. (1998), De Près et de loin. Paris. Odile Jacob..
  • 15
    . Segundo ele, o “fato social” seria apenas uma dimensão da “cultura” e, em segundo lugar, o estudo da “cultura material” seria a forma de tratar a cultura “como uma coisa”. Ele ressalta que Durkheim também foi suspeito de “materialismo” (por Tarde). De fato, Lévi-Strauss critica o estudo das “representações” e propõe tratá-las como “objetos desprovidos de consciência”. Ver Lévi-Strauss, Anuário, [1934-1935] 2009.
  • 16
    . O primeiro curso de Lévi-Strauss intitula-se Formas elementares da vida social, no qual ele aborda as instituições domésticas, econômicas, políticas e religiosas das sociedades primitivas. O segundo curso intitula-se O problema do estado de natureza e do estado de sociedade do século XVIII até os dias de hoje, um curso teórico em que ensina Rousseau, Montaigne, Locke, Hobbes, Spinoza e a Escola de Manchester, observando, contudo, que seu ponto de vista é o da contribuição das ciências positivas “na transição da natureza para a sociedade”. Ver Lévi-Strauss, Anuário, 1937. Sobre o caráter teórico dos seus cursos, ver Florestan Fernandes, 1958.
  • 17
    . Ver Lévi-Strauss, Oesp, 1935. Ver também Valentini, 2011VALENTINI, Luisa. (2011), Um laboratório de antropologia: o encontro entre Mário de Andrade, Dina Dreyfus e Claude Lévi-Strauss (1935-1938). São Paulo, dissertação de mestrado em Antropologia Social, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.. Sobre a importância dessas instituições a partir de 1920, ver Karady, 2011KARADY, V. (2011), "Durkheim e os primórdios da etnologia universitária". Antropolítica: Revista Contemporânea de Antropologia, 1 (28)..
  • 18
    . Arbousse-Bastide relata em carta aos pais: “Aqui só tem notícia ruim da França. Passa por ser presa dos bolcheviques. […] Lévi-Strauss regressou com uma ‘missão’: a Exposição de 37! No partido se dá um pequeno osso a cada um. Isso aliás terá um efeito muito negativo, pois os brasileiros verão que a Exposição é obra da Front Populaire, o que não vai atraí-los”. Arbousse-Bastide, Carta aos pais, 1937. Sobre a desconfiança em relação aos professores franceses, ver Cardoso, 1987CARDOSO, Irene. (1987), Entrevista com Roger Bastide: 18/08/1973. Revista Discurso, 16: 181-197.; Almeida, 1984ALMEIDA, Antonio Marcos. (1984), “Entrevista com Paul Arbousse-Bastide”. In: Língua e Literatura, Numero Comemorativo, ano X: 7-34.. Em 1937, Paul Rivet é expulso da Academia Brasileira de Ciências por criticar Vargas, um episódio em que Dumas foi chamado para tentar reverter. Ver Atas da ABC, Rio de Janeiro, 1937.
  • 19
    . A crítica por parte dos professores franceses marca uma posição: “[…] aqui, todo ensino superior que se assemelhe ao colégio é considerado insuportável e de mau gosto. Acreditamos dar provas de finura ao colocarmo-nos acima de tudo o que possa lembrar o ensino de aulas. Cada um enfrenta essa pequena vaidade e, por aí, acredita que já superou sua época da pedagogia” (Bourdieu, 1992BOURDIEU, Pierre. (1992), A economia das trocas simbólicas. Tradução de Sergio Miceli, Silvia de Almeida Prado, Sonia Miceli e Wilson Campos Vieira. São Paulo, Perspectiva., p. 226).
  • 20
    . Lévi-Strauss não conseguiu a bolsa da Fundação Rockefeller para os Estados Unidos, assim como Arbousse-Bastide, uma década antes, não conseguira bolsa para cursar a graduação.
  • 21
    . Mauss se mantém na estrita linha da sociologia durkheimiana: “[…] ‘São necessários sociólogos e etnólogos: uns lançam luz, outros informam’ – e uma subordinação das investigações etnográficas a uma sociologia concebida como ‘a’ ciência social […]”. Nisso ele se distingue de Paul Rivet, preocupado em fazer etnologia (apresentado como um novo nome em substituição ao de antropologia). Ver Hirsch, 2017HIRSCH, (2017), “‘I’m the whole show’. Marcel Mauss professeur à l’Institut d’Ethnologie”. In: DELPUECH, A.; LAURIÈRE, C. & PELTIER-CAROFF, C. (dir.). Les Années folles de l’ethnographie. Trocadéro 1928-1937. Paris, Publications Scientifique du MNHN: 341-402..
  • 22
    . Sobre os investimentos da Fundação Rockefeller na França, consultar Mazon, 1988MAZON, Brigitte. (1988), Aux origines de l'École des hautes études en sciences sociales: Le rôle du mécénat américain (1920-1960). Paris, Éditions du Cerf.; Tournès, 2007TOURNÈS, Ludovic. (2007), "La fondation Rockefeller et la naissance de l'universalisme philanthropique américain". Critique Internationale, 35: 173-197., 2008TOURNÈS, Ludovic. (2008), "La fondation Rockefeller et la construction d'une politique des sciences sociales en France (1918-1940)". Annales. Histoire, Sciences Sociales, 63e année: 1371-1402., 2011, 2012TOURNÈS, Ludovic. (2012), "La philanthropie américaine, la Société des Nations et la coproduction d'un ordre international (1919-1946)". Relations Internationales, 151: 25-36.; Charle et al., 2004.
  • 23
    . Sobre a trajetória de Lévi-Strauss, ver Emmanuelle Loyer, 2015LOYER, E., (2015), Lévi-Strauss. Paris, Flammarion..
  • 24
    . Sobre a relação entre etnografia e vanguardas estéticas, conferir Debaene, 2010DEBAENE, Vincent. (2010), L'adieu au voyage: l'ethnologie française entre science et littérature. Paris, Gallimard. (Bibliothè que des Sciences Humaines).; Ver também Loyer, 2015LOYER, E., (2015), Lévi-Strauss. Paris, Flammarion..
  • 25
    . Conferir arquivos do Musée National d’Histoire Naturelle. Fundo Paul Rivet. Sobre a correspondência com Bouglé, ver Fundo da Escola Normal, Archives Nationales. A correspondência com Dumas, ver Arquivos do Ministère des Affaires Étrangères. Para a correspondência com Mauss, Arquivos do Collège de France, Fundo Marcel Mauss.
  • 26
    . O trabalho de Laurent Jeanpierre sobre o exílio de Lévi-Strauss nos Estados Unidos foi o primeiro a apontar a importância do capital social acumulado por Lévi-Strauss para sua carreira e, mais ainda, a investigar a questão opondo seu estilo de vida intelectual ao de Georges Gurvitch. No Brasil, contudo, Lévi-Strauss encarna antes o “pesquisador” do que o “embaixador”, mas mantém em ambos os contextos relações tensas com os professores que adotam perspectiva “teórica”. Ver Jeanpierre, 2004, 2002. Sobre a oposição entre “pesquisador” e “embaixador”, ver Charle, 1994.
  • 27
    . Segundo Aron: “[…] lamentamos não encontrar Institutos de sociologia em nosso país como existem em muitos países. Nos Estados Unidos, em particular, podem-se medir os serviços que prestam: recolha de resultados de pesquisas especiais, preparação de tratados para a formação de professores, criação de grandes investigações coletivas”. R. Aron, 1937, p. 40.
  • 28
    . “Nossos legisladores ficariam, portanto, certamente felizes de terem a seu lado experts em sociologia. Sabe-se o papel capital que os professores de sociologia desempenham na vida prática americana. Desejamos que a nossa ciência seja chamada a participar na França também nos debates do fórum” (Roger Bastide, 1936BASTIDE, Roger. (1936), "L'enseignement de sociologie en France". Revue Internationale de Sociologie, pp. 373-402., p. 396).
  • 29
    . Ver dossiê de aposentadoria de Paul Arbousse-Bastide, Archives Nationales.
  • 30
    . “Adoraria conversar sobre esses cursos de pedagogia por correspondência que gostaria de organizar para os professores franceses com a colaboração do Instituto J. J. Rousseau. Ver Arbousse-Bastide, 1932ARBOUSSE-BASTIDE, Paul. (1932; 1936), Correspondance. IBE - Historical Collections. Archives Historiques - BIE - 1925-1969. Arquivos Unesco.. Em 1936, afirma: “Não me esqueci dos projetos de relatórios documentais que gostaria de organizar em São Paulo com o BIE em particular […]” Arbousse-Bastide solicita um plano de classificação da documentação pedagógica e declara querer se vincular ao BIE. Ver Arbousse-Bastide, 1936.
  • 31
    . Sobre essa nova estratégia, ver Jeanpierre, 2022. De fato, Lévi-Strauss não guardou boas lembranças do Brasil e acenou para um possível retorno apenas no caso de não ter outra opção nos Estados Unidos. Seu contato com Fernando de Azevedo foi feito apenas em 1942, quando o último era diretor da FFCL, e as cartas mostram que o interesse principal era a indicação de professores em situação de risco na Europa para a FFCL. O convite para seu retorno, aliás, nunca aconteceu. Ver Lévi-Strauss, 2015LÉVI-STRAUSS, Claude. (2015), "Chers tous deux": Lettres à ses parents (1931-1942). Paris, Seuil..
  • 32
    . Sobre as universidades paulistas no contexto da Era Vargas, consultar Miceli, 1989MICELI, Sérgio. (1989), História das Ciências Sociais no Brasil, vols. 1 e 2. São Paulo, Vértice/Revista dos Tribunais., 1995; Schwartzman, 1979SCHWARTZMAN, Simon. (1979), Um espaço para a ciência: A formação da comunidade científica no Brasil. São Paulo, Companhia Editora Nacional.; Antunha, 1974ANTUNHA, Heladio César Gonçalves. (1974), Universidade de São Paulo: fundação e reforma. São Paulo, SP, MEC-Inep-CRPES (Centro Regional de Pesquisa Educacionais do Sudeste). Estudos e Documentos, vol. 10. jun., 1975ANTUNHA, Heladio César Gonçalves. (1975), "As origens da Faculdade de Educação da USP: a introdução dos estudos pedagógicos de nível superior no estado de São Paulo". Revista da Faculdade de Educação, 1. São Paulo, SP..
  • 33
    . A correspondência de Arbousse-Bastide à família e a de Fernando de Azevedo a Venâncio Filho são reveladoras a esse respeito. Ver Penna, 1987PENNA, Maria L. (1987), Fernando de Azevedo: educação e transformação. São Paulo, Perspectiva., e Arquivos da família Arbousse-Bastide.
  • 34
    . Os intelectuais nacionalistas, católicos e outros críticos da Faculdade de Filosofia publicaram resenhas violentas a esses manuais, como a de Alexandre Correa (1935), na revista católica A Ordem. O manual de sociologia de Fernando de Azevedo, por exemplo, foi considerado ultrapassado e dogmático. Ver Correa, 1935.
  • 35
    . Durante o período em que ocupou tal cadeira, passou a ser remunerado também por essa posição, conforme indica em sua correspondência aos pais. Arbousse-Bastide teve que deixar sua cadeira no fim de 1937, após o decreto de Vargas proibindo acumular cargos no serviço público. Sua cadeira foi assumida interinamente por Milton da Silva Rodrigues. Sobre a seção de formação para o ensino secundário, ver Evangelista, 1997EVANGELISTA, Olinda. (1997), A formação do professor em nível universitário: O Instituto de Educação da Universidade de São Paulo (1934-1938). São Paulo, tese de doutorado em História e Filosofia da Educação, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo..
  • 36
    . Para esta seção foram consultadas as seguintes obras e arquivos: Andrade, 2023ANDRADE, Rafael de. (2023), Uma ciência de serviços: Formação da Ciência Psicológica Paulista (1945-1957), Dir. Marcia Consolim. Guarulhos, monografia em Ciências Sociais, Universidade Federal de São Paulo.; Oriani, 2022ORIANI, A. P. (2022), "Higiene para as escolas primárias: A produção escrita de Antonio Ferreira de Almeida Júnior (1922-1939)". Educação e Pesquisa, 48.; Angelini, 2002ANGELINI, Arrigo L. (2002), "Centenário do nascimento da acadêmica Noemy da Silveira Rudolfer (08/08/1902 - 16/12/1980)". Boletim Academia Paulista de Psicologia, ano XXII, n. 4/02. Publicação trimestral. São Paulo, out./dez.; Azevedo, 1936AZEVEDO, Fernando. (1936), A educação e seus problemas, tomo I. São Paulo, Melhoramentos., 1961AZEVEDO, Fernando. (1961), Figuras de meu convívio. São Paulo, Melhoramentos.; Costa, 2007COSTA, Hebe C. Boa-Viagem A. (jun. 2007), "Resgatando a memória dos pioneiros em psicologia: Roldão Lopes de Barros. Acad. Paul. Psicol., São Paulo, 27 (1): 17-22., 2011COSTA, Hebe C. Boa-Viagem A. (2011), "Resgatando a memória dos pioneiros: Vida e obra de Milton Camargo da Silva Rodrigues - Acad. Paul. Psicol., São Paulo, 80 (1): 8-11, jun.; Nascimento, 2012NASCIMENTO, Alessandra Santos. (2012), Fernando de Azevedo: Dilemas na institucionalização da sociologia no Brasil. São Paulo, Cultura Acadêmica.. Ver também Bontempi, 2011BONTEMPI JR., Bruno. (2011). "Do Instituto de Educação à Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo". Cadernos de Pesquisa, 41 (142): 188-207.; Vidal et al., 2019, 2020; Pinheiro e Miceli, 2008PINHEIRO FILHO, Fernando Antonio & MICELI, Sergio. (2008), "Entrevista com Mário Wagner Vieira da Cunha". Tempo Social, 20 (2)..
  • 37
    . Há dois casos, contudo, em que aparecem outros fatores de instabilidade. Almeida Júnior recebeu herança pela morte da mãe, aos 21 anos, e Fernando de Azevedo, oriundo de família abastada que entrou em declínio, parece recuperar sua posição de origem após o casamento com a filha única de um médico militar e acionista do Banco União, que faleceu pouco tempo depois (Almeida Jr., 1966; Azevedo, 1971AZEVEDO, Fernando. (1971), História da minha vida. São Paulo, Edusp.).
  • 38
    . Ver Carta de Arbousse-Bastide ao Bureau International de l’Éducation, 1937; Carta de Arbousse-Bastide a Bouglé, 1937BOUGLÉ, C. (1937), "Introduction". In: Les Convergences des Sciences Sociales et l'Esprit Internationale. Travaux de la conférence internationale des sciences sociales. Centre d'Etudes de Politique Etrangère. Paris, Paul Hartmann.; Archivos do Instituto de Educação (AIE), 1937. Carta de Bouglé a Fernando de Azevedo, 1936AZEVEDO, Fernando. (1936), A educação e seus problemas, tomo I. São Paulo, Melhoramentos.. Arquivos Nacionais. Nos papéis pessoais da família, encontra-se o registro dos contatos de Arbousse-Bastide com organismos de cooperação intelectual. Em relatório ao Ministério das Relações Exteriores da França, afirma que “São Paulo desejava se beneficiar da documentação de tais organismos e fornecer-lhes por sua vez documentação sobre os problemas econômicos, sociais e políticos do Brasil. Os centros contatados pelo professor foram os seguintes: Centro de Estudos e de Documentação da Escola Normal Superior (Célestin Bouglé); Centro de Estudos de Política Estrangeira (Demery); Centro de Pesquisas Econômicas e Sociais (Charles Rist); Centro de Pesquisas Sociais da Universidade de Paris (Vaucher)”. Ver “Efforts de liaison entre certains organismes de documentation internationale à São Paulo”. Documentos Família Arbousse-Bastide.
  • 39
    . O perfil do aluno do Instituto de Educação, em particular do curso de formação em pedagogia para o secundário, era homólogo até certo ponto ao dos professores. Ver Evangelista, 1997EVANGELISTA, Olinda. (1997), A formação do professor em nível universitário: O Instituto de Educação da Universidade de São Paulo (1934-1938). São Paulo, tese de doutorado em História e Filosofia da Educação, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.. Entre 1936 e 1938, havia 113 matriculados. As informações referem-se à idade, sexo, local de nascimento e origem institucional quando da USP. Os alunos tinham uma média de idade de 23 anos, oriundos do interior, majoritariamente mulheres (13% em 1936, e 66% em 1938) e oriundos da FFCL (cursos de filosofia, geografia, história, ciências sociais e políticas e língua estrangeira). Após o segundo ano de funcionamento da FFCL, como se sabe, o perfil dos alunos do IE torna-se semelhante ao da FFCL, pois os professores do ensino primário e secundário são autorizados a cursar a universidade pelo regime de comissionamento. Ver Evangelista, 1997EVANGELISTA, Olinda. (1997), A formação do professor em nível universitário: O Instituto de Educação da Universidade de São Paulo (1934-1938). São Paulo, tese de doutorado em História e Filosofia da Educação, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.; Limongi, 1989LIMONGI, Fernando. (1989), "Mentores e clientelas da Universidade de São Paulo". In: MICELI, Sergio (org.). (1989), História das Ciências Sociais no Brasil: 1. São Paulo, Vértice, pp. 111-187.; Miceli, 1989MICELI, Sérgio. (1989), História das Ciências Sociais no Brasil, vols. 1 e 2. São Paulo, Vértice/Revista dos Tribunais..
  • 40
    . Formando o homem (Arbousse-Bastide, 1944ARBOUSSE-BASTIDE, Paul. (1944), Formando o homem: contribuição para o plano de um ginásio ideal. São Paulo, Sociologia Editoria.), prefaciado por Azevedo, com tradução de Antonio Candido. Ver carta de Arbousse-Bastide agradecendo a Fernando de Azevedo: “Estamos inteiramente de acordo, em alguns pontos essenciais, como por exemplo, quanto à função de cultura geral, desinteressada, que cabe ao ensino secundário, senão exclusiva, ao menos primordialmente, e quanto ao momento excepcional desse tipo de ensino, destinado aos adolescentes”. Azevedo, 1944, p. XVIII.
  • 41
    . “Embora nascido sob as inspirações do Instituto Internacional de Paris, trazidas até nós por intermédio do ilustre prof. Paul Arbousse-Bastide, o ‘Centro’ só cumprirá bem a missão para a qual é chamado se for lançado nas bases de um serviço eminentemente local, isto é, como órgão coordenador, ele mesmo, de todos os dados, informações e iniciativas que interessam aos estudos dos nossos próprios problemas de educação, pública e particular, dentro do Estado […]”. Archivos do Instituto de Educação, vol. 3, 1937, p. 239.
  • 42
    . Em janeiro de 1937 Nimuendajú informa a Baldus: “O Instituto de Educação da Universidade de São Paulo me comprou uma coleção Canela. E não só comprou, como também pagou!!! Fernando de Azevedo estava no meu pé por causa do material pedagógico – brinquedos dos índios entre outros – e, como eu não pude separá-los do restante da coleção, ele comprou logo toda a tralha, 391 peças, por 8 contos”. Carta de Nimuendajú a Baldus, Belém do Pará, 13 de janeiro de 1937. Ver Welper, 2019WELPER, Elena (org.). (2019). Chamado da selva: correspondência entre Curt Nimuendajú e Herbert Baldus. Rio de Janeiro, Camera Books., p. 63. Ao que Baldus responde: “Seja como for, a aquisição de sua coleção pelo Instituto de Educação deu motivo para que Fernando agora queira organizar ali uma espécie de Museu etnográfico, sob a denominação de ‘Centro de Documentação Social e Etnográfica’, cuja direção ele pretende entregar a mim. Além disso, estimulado por sua carta, quer que eu viaje a fim de arranjar coleções para o acervo”. Baldus, 5 de fevereiro de 1937. Ver a lista de 391 peças na revista AIE, ano 3, pp. 125-6.
  • 43
    . “O Centro de Documentação Ethnographica e Social, do Instituto de Educação, já se poz em entendimento com outros ethnologos afim de que, a serviço do respectivo Museu, encetem explorações systematicas nas regiões supra-mencionadas, com o intuito de colherem a maior soma possível de material authentico e significativo. O sr. Herbert Baldus, por exemplo, de quem se conhecem já várias obras a respeito da sociologia geral e especialmente glotológica dos Zamuka e Kashishá, encarregou-se da missão no que toca aos índios Coroados ou Kaingang, com o que o museo em organização ganhará considerável desenvolvimento.” Ver AIE, 1937, p. 126.
  • 44
    . Tratava-se de incentivar uma “sociedade dos espíritos” para o “desarmamento moral”, baseada na aceitação de uma “doutrina moral universal” e no uso dos “métodos científicos” para entendimento da realidade contemporânea. AIE, 1937, 3: 13-15. Ver Também Dumont, 2008DUMONT, Juliette. (2008), L'institut international de coopération intellectuelle et le Brésil (1924-1946). Paris, Ihel/Credal., p. 44; Renoliet, 1981RENOLIET, J.-J. (1981), L'Unesco oubliée: La Société des Nations et la coopération intellectuelle (1919-1946). Paris, Éditions de la Sorbonne..
  • 45
    . Muitos anos depois, esse depoimento é significativo das pessoas que permaneceram na memória: “[…] sentia-me infinitamente mais à vontade no Departamento de Cultura da municipalidade. Em torno de Mário de Andrade, grande poeta e espírito profundamente original, apaixonado pelo folclore e as tradições populares, agrupavam-se homens jovens e de grande cultura, historiadores, eruditos, ensaístas, como Sérgio Milliet, Rubens Borba de Moraes e sobretudo Paulo Duarte, pois nos unimos numa amizade fraterna que prosseguiu em Nova York e em Paris”. Lévi-Strauss, 1996LÉVI-STRAUSS, Claude. (1996), Saudades de São Paulo. São Paulo, Companhia das Letras, Instituto Moreira Salles., pp. 10-11.
  • 46
    . Sobre a relação entre Lévi-Strauss, Dina Dreyfus e o Departamento de Cultura, consultar Cerqueira (2014)CERQUEIRA, Vera Lucia Cardim de. (2014), Ciências sociais na gestão Mário de Andrade: contribuições de Samuel Lowrie e Dina Lévi-Strauss. São Paulo, Annablume., Raffaini (2001)RAFFAINI, Patricia Tavares. (2001), Esculpindo a cultura na forma Brasil: o Departamento de Cultura de São Paulo (1935-1938). São Paulo, Humanitas FFLCH/USP, História Social USP., Peixoto (1998)PEIXOTO, Fernanda Arêas. (1998). "Lévi-Strauss no Brasil: a formação do etnólogo". Mana, 4 (1): 79-107. e Valentini (2011)VALENTINI, Luisa. (2011), Um laboratório de antropologia: o encontro entre Mário de Andrade, Dina Dreyfus e Claude Lévi-Strauss (1935-1938). São Paulo, dissertação de mestrado em Antropologia Social, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo..
  • 47
    . “O Departamento de Cultura é a mais importante e a mais fecunda das realizações. Seu objetivo último é a expansão cultural […]. Sua influência e sua ação crescem a cada dia. Atualmente, a maior parte das manifestações intelectuais e artísticas do estado de São Paulo está sob sua dependência; possui meios práticos (seu orçamento anual está em 3 mil contos de réis) que lhe permitem grandes realizações.” Dina Dreyfus, 1936, apud Sandroni, [1983], 2002, pp. 240-1.
  • 48
    . As cartas entre Paulo Duarte e Mário de Andrade e entre Sérgio Milliet e Mário são reveladoras a respeito desse projeto. Ver Duarte, 2022.
  • 49
    . Paulo Duarte conhecera Rivet em 1928, quando este passara por São Paulo para visitar o Museu Paulista.
  • 50
    . Sobre a importância dos projetos envolvendo o futuro Museu de l’Homme, ver Laurière, 2008LAURIÈRE, Christine. (2008), Paul Rivet: Le savant et le politique. [S.l.], Publications Scientifiques du Muséum.; Delpuech, Lauriere e Peltier-Caroff (orgs.), 2017; Blanckaert e Coppens, 2015BLANCKAERT, Claude & COPPENS, Yves (orgs.). (2015), Le Musée de l'Homme: histoire d'un musée laboratoire. Paris, Musée de l'Homme, Artlys..
  • 51
    . Moraes, 1982MORAES, Rubens Borba de. (1982), Entrevista realizada por Marco Aurelio Gomes em 15/08/1982. Rua 7, pp. 96-109., 2001MORAES, Rubens Borba de. (2001), KANTOR, I. et al. A Escola Livre de Sociologia e Política. São Paulo, Ed. Sociologia e Política.; Paulo Duarte, 1977DUARTE, Paulo Alfeu Junqueira de Monteiro. (1977), Paulo Duarte II (depoimento, 1977). Rio de Janeiro, CPDOC, 2010. 178p./1985; Cerqueira, 2014CERQUEIRA, Vera Lucia Cardim de. (2014), Ciências sociais na gestão Mário de Andrade: contribuições de Samuel Lowrie e Dina Lévi-Strauss. São Paulo, Annablume..
  • 52
    . Agradeço a Irene Cardoso, a quem Fernando de Azevedo revelou sua antipatia em relação a Mário, essa informação, e a Fabio Keinert por ter mediado esse contato.
  • 53
    . A citação é longa, mas significativa para o argumento. Segundo Mário, “Cumpre organizar os serviços, forçar a vitalidade dos museus e a criação de institutos culturais que ajam pelos processos educativos extrapedagógicos que cada vez mais estão se tornando os mais capazes de ensinar. O que há talvez de mais admirável na pedagogia contemporânea é o seu caráter, por assim dizer, antipedagógico […]. Serão assim os museus, os institutos culturais que desejaria espalhados com mais frequência entre nós. Sim, temos enorme necessidade de escolas primárias e de alfabetização. Mas a organização intelectual de um povo não se processa cronologicamente, primeiro isto e depois aquilo. Tanto mais em povos crianças e contemporâneos como o nosso, com avião, parques infantis, rádio, bibliotecas públicas, jornal, e impossibilitados por isso de qualquer Idade Média. Não entreparemos, portanto, no sofisma sentimental do ensino primário. Ele é imprescindível, mas são imprescindíveis igualmente os institutos culturais em que a pesquisa vá de mãos dadas com a vulgarização, com a popularização da inteligência. […] Não basta ensinar o analfabeto a ler. […] não disseminados organismos outros que salientem no povo o valor e a glória do que se defendeu, tudo será letra morta, gozo sentimental e egoístico de uma elite” (De Mário a Paulo Duarte, [1937] 1977, pp. 231-232.
  • 54
    . A entrevista de Rubens Borba de Moraes, assim como as Memórias de Paulo Duarte, é muito instrutiva a esse respeito. Ver Moraes, 1982; Duarte, 1977DUARTE, Paulo Alfeu Junqueira de Monteiro. (1977), Paulo Duarte II (depoimento, 1977). Rio de Janeiro, CPDOC, 2010. 178p., vol. 2.
  • 55
    . Sobre Milliet, ver Paollilo, 2019PAOLLILO, Lucas. (2019), Sérgio Milliet, sociólogo: entre observações e transições. Araraquara, dissertação de mestrado em Ciências Sociais, Universidade Estadual Paulista.; Hyaishi, 2010HYAISHI, Marli Guimarães. (2010), Paulo Duarte: um Quixote brasileiro. São Paulo, Hucitec..
  • 56
    . “Quando eu e o Sérgio Milliet chegamos da Suíça, em 1919, depois de termos estudado lá durante muitos anos, nós estávamos muito bem-informados sobre o Movimento Modernista. Nós éramos modernistas em Genebra. Nós tínhamos lido Cocteau, Aragon; a nossa revista era a Nouvelle Revue Française; estávamos a par de Apollinaire. Quando nós chegamos ao Brasil, fomos procurar os grupos de intelectuais. Eu fui procurar o Mário por relações de família; disseram que ele era de Araraquara como eu e tal.” Ver Moraes, 1982MORAES, Rubens Borba de. (1982), Entrevista realizada por Marco Aurelio Gomes em 15/08/1982. Rua 7, pp. 96-109..
  • 57
    . Sobre a Sociedade das Nações e os investimentos da Fundação Rockefeller, ver Tournès, 2011, e Mazon, 1988MAZON, Brigitte. (1988), Aux origines de l'École des hautes études en sciences sociales: Le rôle du mécénat américain (1920-1960). Paris, Éditions du Cerf.; Renoliet, 1981RENOLIET, J.-J. (1981), L'Unesco oubliée: La Société des Nations et la coopération intellectuelle (1919-1946). Paris, Éditions de la Sorbonne..
  • 58
    . Várias dessas enquetes foram publicadas na Revista do Arquivo Municipal. Ver também Duarte, [1971] 2022.
  • 59
    . Publicação do trabalho de Sérgio Milliet no Congresso de População da Comissão Internacional de Recenseamento. Revista do Arquivo Municipal, vol. 39, 1937, pp. 281-289. Ver Milliet, 1938, pp. 241-242.
  • 60
    . Foram dois os trabalhos apresentados em nome da Sociedade de Etnografia e Folclore. O primeiro foi coordenado por Mário de Andrade e Dina Dreyfus, e tratou de proibições alimentares, danças populares e cura de terçol com anel. O segundo trabalho, da autoria de Nicanor Miranda (1944)MIRANDA, Nicanor. (1944), Origem e propagação dos parques infantis e parques de jogos. São Paulo, Departamento de Cultura., focalizou o lazer dos trabalhadores na cidade de São Paulo. Nicanor Miranda apresentou os dois trabalhos no congresso. Ver Revista do Arquivo Municipal, 1937, 42, pp. 95-96. Os trabalhos foram publicados em Travaux du 1er Congres Internationale de Folklore, Arrault et Cl, Tours, 1938.
  • 61
    . Nos anos 1920 e 1930, multiplicam-se as conferências internacionais sobre folclore e/ou artes populares. Nesse contexto, Mário de Andrade é convidado a enviar trabalho para o Congresso de Arte Popular, de 1928, realizado em Praga, organizado pelo Instituto Internacional de Cooperação Intelectual. Ver Institut Internationale de Coopération Intellectuelle, 1928; Laurière, 2008LAURIÈRE, Christine. (2008), Paul Rivet: Le savant et le politique. [S.l.], Publications Scientifiques du Muséum.. Ver Toni, 2021TONI, Flávia. (2021), “Fonografia e projeto nacional: o Brasil no Congresso de Arte Popular de Praga (1928)”. In: TONY, Flávia. & PAIXÃO, Fernando. (orgs.). Estudos brasileiros em três tempos. 1822 – 1922 – 2022. São Paulo, Fino Traço. pp. 223-251., e Ducci, 2015DUCCI, Annamaria. (maio 2015), "Le musée d'art populaire contre le folklore. L'Institut International de Coopération Intellectuelle à l'époque du Congrès de Prague". Revue Germanique Internationale, 21: 133-48..
  • 62
    . As cartas de Dina Dreyfus e Lévi-Strauss são reveladoras da articulação entre Rivet, o casal e o Departamento de Cultura. Ver Fundo Mário de Andrade, IEB.
  • 63
    . Os alunos que frequentaram esses cursos tinham o seguinte perfil: homens e mulheres em fração praticamente equivalente, oriundos majoritariamente do interior, nascidos na década de 1910. Ver Valentini, 2011VALENTINI, Luisa. (2011), Um laboratório de antropologia: o encontro entre Mário de Andrade, Dina Dreyfus e Claude Lévi-Strauss (1935-1938). São Paulo, dissertação de mestrado em Antropologia Social, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo..
  • 64
    . As relações entre Lévi-Strauss e Dina Dreyfus com o Departamento de Cultura já foram amplamente documentadas e analisadas. Ver Raffaini, 2001RAFFAINI, Patricia Tavares. (2001), Esculpindo a cultura na forma Brasil: o Departamento de Cultura de São Paulo (1935-1938). São Paulo, Humanitas FFLCH/USP, História Social USP.; Valentini, 2011VALENTINI, Luisa. (2011), Um laboratório de antropologia: o encontro entre Mário de Andrade, Dina Dreyfus e Claude Lévi-Strauss (1935-1938). São Paulo, dissertação de mestrado em Antropologia Social, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.; Cerqueira, 2014CERQUEIRA, Vera Lucia Cardim de. (2014), Ciências sociais na gestão Mário de Andrade: contribuições de Samuel Lowrie e Dina Lévi-Strauss. São Paulo, Annablume.; Peixoto, 1998PEIXOTO, Fernanda Arêas. (1998). "Lévi-Strauss no Brasil: a formação do etnólogo". Mana, 4 (1): 79-107.; Pontes, 1998PONTES, Heloisa. (1998), Destinos mistos: os críticos do Grupo Clima em São Paulo (1940-68). São Paulo, Companhia das Letras.. Interessa aqui apenas diferenciar esses investimentos em relação àqueles feitos por Arbousse-Bastide no Instituto de Educação.
  • 65
    . Ver arquivos do IEB. Fundo Mário de Andrade.
  • 66
    . Nesse período, as impressões de Baldus sobre Lévi-Strauss são muito ruins, conforme ele declara nas cartas trocadas com Nimuendajú. Destaco a carta de 11/10/1937, na qual critica seu trabalho e mesmo sua postura profissional. Ver Welper et al. (orgs.), 2019, p. 71.
  • 67
    . Sobre Achilles Archêro, Ver Pinheiro e Miceli, 2008PINHEIRO FILHO, Fernando Antonio & MICELI, Sergio. (2008), "Entrevista com Mário Wagner Vieira da Cunha". Tempo Social, 20 (2).. Alberto Conte prestou concurso no Instituto de Educação, mas perdeu para Noemy Rudolfer. Sobre Eudoro Ramos Costa sabe-se apenas que foi um jornalista.
  • 68
    . A qualidade dos manuais escolares, segundo OS autores, fora atestada pelos professores franceses das cadeiras de sociologia I e II, bem como por Armand Cuvillier. Ver Bouglé, 1937BOUGLÉ, C. (1937), "Introduction". In: Les Convergences des Sciences Sociales et l'Esprit Internationale. Travaux de la conférence internationale des sciences sociales. Centre d'Etudes de Politique Etrangère. Paris, Paul Hartmann.. Ver também Rubino, 1995.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2024

Histórico

  • Recebido
    03 Abr 2024
  • Aceito
    08 Abr 2024
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